REl - 0600369-11.2024.6.21.0098 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/07/2025 00:00 a 18/07/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada em 26.11.2024, ocorrendo a interposição recursal na mesma data.

Outrossim, encontram-se presentes os demais requisitos ínsitos à tramitação recursal.

Destarte, conheço do recurso.

Passo ao exame de mérito.

 

MÉRITO

Efetivamente, o art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, ao estabelecer limites para doações de pessoas físicas e para doações de candidatos, em conjunto com a Portaria TSE n. 593/24, que definiu os limites de gastos para as campanhas de prefeitos e vereadores nas Eleições Municipais de 2024, estabeleceu que o teto de gastos para a campanha de vereador, no Município de Boa Vista do Sul/RS, foi de R$ 15.985,08, de forma que o limite para utilização de recursos próprios para o cargo em disputa foi de R$ 1.598,51.

No caso em apreço, a prestação de contas do recorrente foi desaprovada em razão do aporte de recursos financeiros próprios realizados em prol de sua campanha, no montante de R$ 3.832,00, ultrapassando em R$ 2.233,49 o limite de autofinanciamento previsto para o cargo de vereador (qual seja, R$ 1.598,51), sendo condenado ao pagamento de multa equivalente a 100% da quantia em excesso.

A tese vertida no recurso é no sentido de que o Tribunal Superior Eleitoral, em 29.9.2022, determinou a exclusão dos honorários advocatícios e contábeis pagos pelo candidato do cálculo do limite de 10% para o autofinanciamento de campanha. Sustenta que na prestação de contas foram comprovadas despesas com honorários advocatícios na quantia de R$ 400,00 (quatrocentos reais) e contábeis na quantia de R$ 1.000,00 (mil reais), perfazendo um total de R$ 1.400,00 (mil e quatrocentos reais), o qual, entende o recorrente, deve ser reduzido do cômputo dos recursos de autofinanciamento de campanha.

Ainda, requereu que as contas sejam aprovadas em sua totalidade, afastando-se a multa cominada, sob argumento de que o recorrente agiu com total lisura ao demonstrar suas receitas e despesas no sistema SPCE.

Com razão, em parte, o recorrente.

A legislação eleitoral disciplina no art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19 que o candidato pode utilizar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer e estabelece multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, em caso de excesso de autofinanciamento. In verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pela doadora ou pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º) .

§ 1º A candidata ou o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A) .

[...]

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita a infratora ou o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de a candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º) .

Em relação aos valores pagos a título de serviços advocatícios e de contabilidade, efetivamente o TSE definiu que não estão sujeitos ao limite de autofinanciamento:

ACÓRDÃO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL (12626) Nº 0600430–41.2020.6.24.0060 (PJe) – MASSARANDUBA – SANTA CATARINA RELATOR: MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI AGRAVANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL AGRAVADOS: ARMINDO SESAR TASSI E OUTRO ADVOGADOS: THAIS HELENA PEREIRA DE MOURA BASTOS (OAB/SC 50631–A) E OUTROS ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. APROVAÇÃO. CÁLCULO DO LIMITE PARA O AUTOFINANCIAMENTO. GASTOS COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO ART. 23, § 2º–A DA LEI 9.504/1997. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Infirmados os fundamentos da decisão de inadmissibilidade, é de se prover o agravo para julgamento do recurso especial.

2. Hipótese em que o candidato ultrapassou o limite de uso de recursos próprios para quitar despesas com serviços advocatícios.

3. Nos termos dos arts. 18–A, parágrafo único; 26, § 4º; 27, § 1º; e 100–A, § 6º, todos da Lei 9.504/1997, os honorários advocatícios são despesas eleitorais que não compõem o teto global de gastos de campanha.

4. A interpretação sistemática do art. 23, § 2º–A da Lei das Eleições exclui os honorários advocatícios e contábeis pagos pelo candidato do cálculo do limite de 10% para o autofinanciamento de campanha. 5. Recurso especial a que se nega provimento.

(TSE-AREspEl: 06004304120206240060 MASSARANDUBA - SC 060043041, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 29/09/2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 217) (grifo nosso)

Esse entendimento de que “despesas com honorários advocatícios e contábeis não se sujeitam ao limite de autofinanciamento” vem sendo adotada por este Colegiado, conforme ementa que colaciono de recente julgado que se amolda ao recurso ora em análise, de relatoria do Desembargador Federal CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. EXCESSO DE AUTOFINANCIAMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E DESPESAS CONTÁBEIS. NÃO INCIDÊNCIA NO CÁLCULO DO LIMITE. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS. REDUÇÃO DA MULTA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.1. Recurso interposto por candidato, eleito vereador, contra sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa às Eleições de 2024, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, com fundamento na extrapolação do limite legal de 10% para autofinanciamento previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.1. Definir se os valores despendidos com honorários advocatícios e despesas contábeis devem ser excluídos do cálculo do limite de autofinanciamento. 2.2. Verificar se, diante da exclusão desses valores, a irregularidade restante permite a aprovação das contas com ressalvas e a redução proporcional da multa imposta. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.1. A legislação eleitoral disciplina, no art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, que o candidato pode utilizar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer. 3.2. A jurisprudência do TSE e do TRE/RS firmou entendimento de que despesas com honorários advocatícios e contábeis não se sujeitam ao limite de 10% previsto para o autofinanciamento, por constituírem despesas excepcionadas da base de cálculo. 3.3. No caso, afastado o valor gasto com honorários advocatícios e com contador, o excesso de autofinanciamento alcança montante, em valor absoluto, menor de R$ 1.064,10, o que autoriza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para alterar o juízo de reprovação das contas para aprovação com ressalvas. Cabível a redução da multa para o patamar do valor em excesso. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso parcialmente provido. Aprovação com ressalvas. Redução da multa. Teses de julgamento: “1. Os gastos com honorários advocatícios e despesas contábeis não integram o cálculo do limite de 10% do autofinanciamento de campanha, conforme interpretação sistemática do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. 2. Quando a exclusão desses valores resultar em irregularidade de valor inferior a R$ 1.064,10 ou a 10% da arrecadação, é cabível a aprovação das contas com ressalvas, aplicando-se os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 3. A multa por excesso de autofinanciamento deve ser proporcional ao valor excedente.” Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 4º; 27, §§ 1º e 4º. Lei n. 9.504/97, art. 23, § 2º-A. Jurisprudência relevante citada: TSE, AgR-REspEl n. 0600430-41.2020.6.24.0060, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE, 29.9.2022. TRE/RS, REl n. 0600389-02.2024.6.21.0098, Rel. Des. Eleitoral, julgado em 24.3.2025. TRE/RS, REl n. 0600724-60.2024.6.21.0085, Rel. Des. Eleitoral Nilton Tavares da Silva, DJE, 13.02.2025. (TRE-RS - REl: 0600407-39.2024.6.21.0028 VACARIA - RS 060040739, Relator.: Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, Data de Julgamento: 02/07/2025, Data de Publicação: DJE-121, data 04/07/2025)

Além disso, a Lei n. 9.504/97, em seu art. 23, § 10, reforça que o pagamento de honorários advocatícios e de contabilidade não constitui doação de bens e serviços estimáveis em dinheiro e não será considerado para a aferição do limite de gastos, o que resulta na não incidência desses valores sobre o teto de 10% previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim dispõe o normativo:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009) (Vide ADIN 5970)

§ 1o As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano anterior à eleição. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

[...]

§ 10. O pagamento efetuado por pessoas físicas, candidatos ou partidos em decorrência de honorários de serviços advocatícios e de contabilidade, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político, não será considerado para a aferição do limite previsto no § 1º deste artigo e não constitui doação de bens e serviços estimáveis em dinheiro. (Incluído pela Lei nº 13.877, de 2019)

Na hipótese, afastando-se o valor de R$ 1.400,00 (R$ 400,00 – honorários advocatícios e R$ 1.000,00 – despesas com contador), o excesso de autofinanciamento alcança o montante de R$ 833,49, valor absoluto menor de R$ 1.064,10, que autoriza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para alterar o juízo de reprovação das contas para aprovação com ressalvas.

Ante o exposto, VOTO por DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto, para reformar a sentença e julgar aprovadas com ressalvas as contas de JEAN CARLOS DOS SANTOS, relativamente às Eleições Municipais de 2024, reduzindo-se a multa aplicada para o montante de R$ 833,49.