REl - 0600423-94.2020.6.21.0072 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/02/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

Destaco que o recorrente acostou ao recurso alguns documentos, quais sejam, (1) dois termos de cedência temporária de imóveis; (2) dois instrumentos particulares de cedência de uso de veículos sem motorista; e (3) extrato bancário. Observo que a juntada de documentos em fase recursal é prática aceita por este Tribunal na classe processual sob exame quando não apresentar prejuízo à tramitação do processo por se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer as irregularidades apontadas sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares.

Passo ao mérito.

JOSÉ FRANCISCO VENANCIO PINTO interpõe recurso contra a sentença do Juízo da 72ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas de campanha ao cargo de vereador no Município de Viamão, relativas às eleições 2020, em razão de (1) ausência de registro das contas bancárias; (2) omissão de gastos; e (3) extrapolação do limite de gastos com recursos próprios. A decisão hostilizada determinou o recolhimento da quantia de R$ 1.622,54 ao Tesouro Nacional.

À análise.

1. Ausência de registro das contas bancárias

O órgão técnico apontou a existência da conta bancária n. 38983-4, Banco Itaú, Agência 8267, não registrada na prestação de contas e concluiu que “tal omissão, acaba por gerar dificuldade na análise das contas, principalmente, quando os extratos eletrônicos não forem suficientes para a análise do examinador”.

Por seu turno, o prestador acostou o extrato também do Banco Itaú e mesma Agência 8267, mas de outra conta, de n. 38912-3, relativo ao período de 14.10.2021 a 26.11.2020, silenciando em relação à conta específica apontada na análise técnica.

A matéria, regulada na Resolução TSE n. 23.607/19, impõe a apresentação integral dos extratos de todas as contas de campanha:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

(…)

II - pelos seguintes documentos, na forma prevista no § 1º deste artigo:

a) extratos das contas bancárias abertas em nome do candidato e do partido político, inclusive da conta aberta para movimentação de recursos do Fundo Partidário e daquela aberta para movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), quando for o caso, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 3º desta Resolução, demonstrando a movimentação financeira ou sua ausência, em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais ou que omitam qualquer movimentação financeira; (…)

Entendo, portanto, que a falha persiste, pois seguem ausentes quaisquer esclarecimentos a respeito da referida conta bancária, com flagrante inobservância ao art. 53 da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Omissão de gastos

A análise técnica identificou dezesseis despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, todas pagas à Abastecedora de Combustíveis RM Eireli, no montante de R$ 1.570,00.

No campo normativo, a Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece, em seu art. 35, § 11, inc. II, as hipóteses nas quais as despesas com combustíveis são consideradas gastos eleitorais:

Art. 35 (…)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

Junto às razões de recurso, houve a apresentação de dois instrumentos particulares de cedência de uso de veículos sem motorista, destituídos, contudo, dos valores estimados das operações.

Destaco que a legislação somente admite gastos com combustíveis para abastecimento de veículos cedidos quando, em relação a tais despesas, houver declaração originária da cessão na prestação de contas, em conjunto com a apresentação de relatório semanal contendo o volume e o valor dos combustíveis consumidos.

No juízo de origem, o candidato apresentou demonstrativos semanais de despesas com combustíveis. Porém, as cessões dos veículos não foram indicadas no momento oportuno e, mesmo em grau recursal, não há a valoração econômica dos atos, estimativas indispensáveis para a análise da observância dos limites impostos à contabilidade.

Assim, não atendidos os requisitos exigidos para validação da despesa com combustíveis, mantém-se configurada a falha.

3. Extrapolação do limite de gastos com recursos próprios

Destaco que o limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Viamão nas eleições 2020 foi de R$ 60.024,57, teto informado pelo Tribunal Superior Eleitoral no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, o que impunha ao candidato a obediência do limite equivalente a 10% deste valor ao utilizar recursos próprios, ou seja, R$ 6.002,46. No entanto, o candidato aplicou recursos financeiros próprios no valor de R$ 7.625,00, excedendo o limite em R$ 1.622,54.

Nesse sentido, os §§ 1º e 4º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõem:

Art. 27. (...)

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

(…)

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

(…)

 

O recorrente não apresentou irresignação quanto ao ponto.

A definição do limite de gastos em candidaturas visa evitar o abuso de poder econômico dos candidatos mais abastados e, ao estabelecer um teto a ser respeitado por todos os concorrentes eleitorais, o legislador prestigiou a manutenção da paridade de armas na competição eleitoral.

Portanto, correta a aplicação de multa de R$ 1.622,54, adequada e razoável à falha verificada e às peculiaridades do caso. Contudo, em correção a erro material determino, de ofício, seja a importância recolhida ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), conforme disposição do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95, pois a sentença destinou a quantia ao Tesouro Nacional.

Aponto, por fim, que as irregularidades representam o equivalente a 41,86% das receitas declaradas, R$ 7.625,00, e seu valor nominal, R$ 3.192,54, é superior ao parâmetro de R$ 1.064,10 visto como modesto pela jurisprudência, de forma que resta afastada a possibilidade de aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso e, de ofício, destinar a multa, no valor de R$ 1.622,54, ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos.