REl - 0600331-26.2020.6.21.0005 - Voto Relator(a) - Sessão: 31/01/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Preliminarmente, conheço da documentação apresentada com o recurso, seguindo a orientação firmada nesta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO 2016. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CONFIGURADO CERCEAMENTO DE DEFESA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DOCUMENTOS JUNTADOS COM O RECURSO. ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. IRREGULARIDADE SANADA. PROVIMENTO.

1. Preliminar. Afastada a nulidade da sentença. Ausente qualquer prejuízo ao recorrente, pressuposto essencial para a declaração de nulidade.

2. Constatado, pelo órgão técnico, o recebimento de recursos de origem não identificada. Documentos juntados pelo prestador em sede recursal, com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral. Irregularidade sanada.

3. Provimento do recurso para aprovação das contas.

(TRE-RS - RE: 2593 SÃO SEBASTIÃO DO CAÍ - RS, Relator: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 03.12.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 231, Data 11.12.2019, Página 2-4) (Grifo nosso)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. CONHECIMENTO DE NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS AO RECURSO. ART. 266, CAPUT, DO CÓDIGO ELEITORAL. MÉRITO. RECEBIMENTO DE VALORES PROVENIENTES DO DIRETÓRIO NACIONAL DA AGREMIAÇÃO SEM A IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. DOCUMENTOS APRESENTADOS SUPRIRAM A FALHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar acolhida. Juntada de novos documentos com o recurso. Este Tribunal, com base no art. 266, caput, do Código Eleitoral, tem se posicionado pelo recebimento de documentos novos com as razões de recurso, até mesmo quando não submetidos a exame de primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura mostra capacidade de influir positivamente no exame das contas, ou seja, o saneamento da falha deve resultar de plano da documentação, sem necessidade de qualquer persecução complementar.

2. Recebimento de valores provenientes do diretório nacional da agremiação, sem a identificação dos doadores originários, em afronta ao art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15. Os esclarecimentos prestados, associados às informações constantes nos recibos das doações, permitem aferir, de forma clara, os doadores originários com seus respectivos CPFs, cumprindo a determinação normativa. Afastadas as sanções impostas.

3. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 1428 SANTIAGO - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 25.4.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 75, Data 29.4.2019, Página 7) (Grifo nosso)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. CONHECIMENTO DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA INTEMPESTIVAMENTE. PREVISÃO DISPOSTA NO ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS PROVENIENTES DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.464/15. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. INCONSISTÊNCIA COM RELAÇÃO A GASTOS COM COMBUSTÍVEIS. SANADA PARTE DAS IRREGULARIDADES. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. MANTIDA A MULTA FIXADA NA SENTENÇA. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DOS VALORES FIXADA EXCLUSIVAMENTE À ESFERA PARTIDÁRIA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Conhecimento da documentação apresentada com o recurso, a teor do disposto no art. 266 do Código Eleitoral.

2. Recebimento de recursos oriundos de origem não identificada. Ainda que o número de inscrição no CPF corresponda ao do doador informado nas razões recursais, não foram apresentadas outras informações para subsidiar a fiscalização da licitude da receita, não sendo possível, sem a adoção dos procedimentos técnicos de exame destinados à verificação das fontes vedadas, atestar a regularidade do recurso arrecadado.

[…]

6. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 4589 ALVORADA - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 21.3.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 52, Data 22.3.2019, Página 4) (Grifo nosso)

 

Ademais, o exame da documentação independe de novo parecer técnico.

Ainda, em sede preliminar, quanto à arguição de nulidade da sentença, por ausência de intimação válida, ressalta-se que a comunicação acerca do parecer conclusivo ocorreu por meio eletrônico, em 18.01.21, certidão ID 23536783.

Dessarte, a recorrente não nega que tenha sido intimada, mas apenas que a intimação não ocorreu pelo Diário da Justiça Eletrônico, de modo que não há que se falar em ausência de oportunidade para oferecimento de prestação de contas retificadora porque a intimação não havia sido realizada pelo DJE.

Por força do disposto no art. 26, § 4º, da Resolução TRE-RS n. 347/20, após o encerramento do período eleitoral, as intimações nos processos de prestação de contas, relativos às eleições de 2020, passaram a ser realizadas diretamente no Sistema de Processo Judicial Eletrônico (PJe), dispensando-se a publicação do ato no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) e, até 12.02.21, a observância do prazo de ciência de 10 (dez) dias, previsto no art. 5º, § 3º, da Lei n. 11.419/06, em consonância com a normativa posta no art. 51, caput, da Resolução TRE-RS n. 338/19.

Assim, havendo comprovação de que houve intimação (ID 23536783) ainda que via sistema PJe, não há nulidade a ser declarada.

Rejeito a preliminar.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pelo juízo a quo devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados nos arts. 38, inc. I, 53, inc. I, als. “c” e “g”, e art. 60, todos da Resolução TSE n. 23.607/19, restando configurada omissão de receitas e ausência de comprovação dos gastos realizados com recursos do FEFC.

A sentença (ID 23536983) foi prolatada sob os seguintes fundamentos:

A Resolução TSE nº 23.607/2019, a qual dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições, dispõe em seu artigo 45, I, que todos os candidatos devem prestar contas à Justiça Eleitoral.

Pois bem.

No parecer conclusivo, a examinadora apontou as seguintes irregularidades:

1) NÃO APRESENTAÇÃO DOS EXTRATOS COMPLETOS DA CONTA BANCÁRIA:

Como registrado pela examinadora das contas, a não apresentação dos extratos completos da conta bancária pela prestadora foi suprida pela juntada dos extratos eletrônicos e não houve prejuízo à análise das contas.

2) OMISSÃO DE RECEITAS E GASTOS ELEITORAIS:

Observou-se que as doações recebidas do Diretório Nacional do Republicanos, no valor total de R$ 2.000,00, não foram registradas na prestação de contas, em desacordo com o artigo 53, I, c, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

Embora seja possível verificar os créditos no extrato eletrônico ID 71948423, a falha configura irregularidade grave, pois impede o cruzamento dos dados com o sistemas de batimento e prejudica a transparência da prestação de contas.

3) EXAME DE REGULARIDADE DE DESPESAS REALIZADAS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (ART. 53, II, C, DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019)

Em consulta ao Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE), foi verificado que o doador Diretório Nacional do Republicanos declarou e registrou que o valor total de R$ 2.000,00, doado à candidata Maria Tereza Lemes e creditado na conta bancária n. 626635, agência 144, do Banco do Brasil, é oriundo do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Dessa maneira, constata-se que os cheques 850004, 850003, 850006 e 850009 foram utilizados para pagamento de despesas realizadas com recursos oriundos FEFC. No entanto, os respectivos comprovantes dos gastos não foram vinculados ao SPCE, contrariando o disposto no artigo 60 da Resolução TSE n. 23.607/2019:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

I - contrato;

II - comprovante de entrega de material ou da prestação efetiva do serviço;

III - comprovante bancário de pagamento; ou

IV - Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações da Previdência Social (GFIP).

§ 2º Quando dispensada a emissão de documento fiscal, na forma da legislação aplicável, a comprovação da despesa pode ser realizada por meio de recibo que contenha a data de emissão, a descrição e o valor da operação ou prestação, a identificação do destinatário e do emitente pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ, endereço e assinatura do prestador de serviços.

Ainda, conforme apontado pela análise técnica, observa-se que os cheques 850004 e 850003, no valor de R$ 500,00 cada, não foram emitidos de forma cruzada (não consta a contraparte do débito no extrato eletrônico), em desacordo com o artigo 38, I, da Resolução TSE n. 23.607/2019:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado […]

Com relação às despesas pagas por meio dos cheques 850006 e 850009, no valor de R$ 500,00 e 451,00, respectivamente, constatou-se que não foram declaradas no SPCE, nos termos do artigo 53, I, g, da Resolução TSE n. 23.607/2019. Ressalto, novamente, que a falha configura irregularidade grave, pois impossibilita o cruzamento com outros sistemas de batimento.

Assim, haja vista a ausência de comprovação dos gastos realizados com recursos do FEFC e/ou a inconformidade dos comprovantes de pagamento, nos termos do artigo 79, §1º, Resolução TSE n. 23.607/2019, o valor total de R$ 1.951,00 deverá ser devolvido ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado.

4) ANÁLISE DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA:

Não foi verificada a abertura de conta bancária específica destinada ao recebimento de Doações para Campanha, em desatendimento ao disposto no art. 8, §1º, inciso I, e §2º da Resolução TSE nº 23.607/2019:

Art. 8º É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil e que atendam à obrigação prevista no art. 13 desta Resolução.

§ 1º A conta bancária deve ser aberta em agências bancárias ou postos de atendimento bancário:

I - pelo candidato, no prazo de 10 (dez) dias contados da concessão do CNPJ pela Secretaria da Receita Federal do Brasil [...]

§ 2º A obrigação prevista neste artigo deve ser cumprida pelos partidos políticos e pelos candidatos, mesmo que não ocorra arrecadação e/ou movimentação de recursos financeiros, observado o disposto no § 4º deste artigo e no art. 12 desta Resolução.

A não abertura da conta "Doações para Campanha" é considerada falha grave, pois prejudica a fiscalização da movimentação financeira pela Justiça Eleitoral. Observo que a conta bancária n. 626635, agência 144, do Banco do Brasil, foi utilizada para recebimento de recursos do FEFC.

Intimada para se manifestar sobre as irregularidades, a candidata quedou-se inerte (ID 74383970).

O Ministério Público Eleitoral manifestou-se pela desaprovação das contas, pois as irregularidades apontadas violam a transparência e a lisura da prestação de contas e dificultam o efetivo controle por parte da Justiça Eleitoral.

Analisando os autos, entendo que as irregularidades graves apontadas nos itens 2 e 3 prejudicaram a transparência da prestação de contas, haja vista que a real movimentação financeira efetuada na campanha eleitoral do candidato não foi registrada no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE). A ausência desses registros, de forma correta, impossibilita o cruzamentos dos dados com os sistemas de batimento, afetando/impedindo a fiscalização da Justiça Eleitoral sobre a movimentação financeira.

Ainda, a candidata recebeu R$ 2.000,00 de recursos públicos, oriundos do FEFC. Dos gastos realizados com esse montante, R$ 1.951,00 (97,55%) foram irregulares, tendo em vista a ausência ou inconformidade da comprovação das despesas e/ou dos pagamentos.

Dessa forma, tendo em vista que os apontamentos dos itens 2, 3 e 4 comprometeram a regularidade das contas, nos termos dos artigos 74, III, e 79, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/2019, as contas devem ser desaprovadas e determinado o recolhimento do valor de R$ 1.951,00 ao Tesouro Nacional.

Saliento que o julgamento das contas apresentadas está adstrito às informações declaradas pelo prestador de contas e à movimentação financeira apurada nos extratos bancários vinculados à campanha eleitoral, não afastando a possibilidade de apuração por outros órgãos quanto à prática de eventuais ilícitos antecedentes e/ou vinculados, verificados no curso de investigações em andamento ou futuras, conforme previsto no artigo 75 da Resolução TSE 23.607/2019.

III – DISPOSITIVO

Isso posto, julgo DESAPROVADAS as contas da candidata MARIA TEREZA LEMES, relativas às eleições de 2020, nos termos do artigo 74, III, da Resolução TSE 23.607/2019.

Determino o recolhimento do valor de R$ 1.951,00 (mil, novecentos e cinquenta e um reais) ao Tesouro Nacional, conforme artigo 79, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/2019, atualizados na forma do artigo 79, §2º, da Resolução TSE n. 23.607/2019, sob pena de remessa dos autos à Advocacia-Geral da União para fins de cobrança.

 

No caso em tela, as irregularidades configuram-se sob dois aspectos: a) omissão de receitas (R$ 2.000,00) referente a doações recebidas do Diretório Nacional do Partido Republicanos, proveniente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, contrariando o disposto no art. 53, inc. I, al. “c”, da Resolução TSE n. 23.607/19;e b) ausência de comprovação dos gastos realizados com recursos do FEFC.

Com relação à primeira irregularidade, ou seja, ausência de declaração de doações realizadas pelo Diretório Nacional do Partido Republicanos, provenientes de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, no valor de R$ 2.000,00, recebidas pela candidata, a matéria está disposta no art. 53, inc. I, al. “c”, da Resolução TSE n. 23.607/19, que assim dispõe:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

I - pelas seguintes informações:

(…)

c) recursos arrecadados, com a identificação das doações recebidas, financeiras ou estimáveis em dinheiro, e daqueles oriundos da comercialização de bens e/ou serviços e da promoção de eventos.

 

A recorrente não nega o fato, apenas sustenta que a falha será expurgada com a juntada da declaração retificadora.

Da documentação acostada na prestação de contas retificadora pode-se verificar no extrato de ID 23537333 o recebimento de R$ 387,75, quando as transferências recebidas do partido importam em R$ 2.000,00, de modo que subsistem omissões de parte das receitas do FEFC.

No ponto, sem razão a recorrente, pois, de fato, as receitas provenientes do FEFC não constaram em sua integralidade nos registros da prestação de contas da candidata, quer na final, quer na retificadora.

No que tange à segunda irregularidade, ausência de comprovação dos gastos realizados com recursos do FEFC, em função do pagamento dos cheques 85003, 85004, 85006 e 85009 sem vinculação dos comprovantes de gastos no SPCE, contrariando o disposto no art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, a recorrente apresentou quatro recibos de pagamento de prestação de serviços (IDs 23537883, 23537933, 23537983 e 23538033).

Ocorre que a forma de comprovação dos gastos eleitorais está explicitamente disciplinada no art. 35, § 12, da Resolução TSE 23.607/19, que exige o detalhamento e a identificação integral dos prestadores de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

Note-se que os recibos trazidos aos autos, referentes ao serviço de cabo eleitoral, contrariam a legislação vigente ao não especificar o local de trabalho, as horas trabalhadas e a justificativa do preço contratado, sobretudo porque deveriam ter sido acompanhados dos contratos de prestação de serviço.

Em relação aos cheques n. 85003 (R$ 500,00) em nome de Ana Terezinha Queiroga Bames e n. 85004 (R$ 500,00) em favor de Ana Paula Prado da Conceição, não foram emitidos de forma cruzada, não constando a contraparte no débito do extrato eletrônico (ID 23536633), tampouco pode ser verificado no sítio do TSE a contraparte do recurso https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/85073/210000636353/extratos, acesso em 17.12.2021.

A recorrente não nega que os pagamentos tenham sido realizados por meio de cheques nominais, porém não cruzados, o que se verifica das cópias juntadas (IDs 23537833 e 23537683).

Assim, houve infração ao que dispõe o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual impõe que “os gastos eleitorais de natureza financeira (...) só podem ser efetuados por meio de: (I) cheque nominal cruzado; (II) transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; (III) débito em conta; ou (IV) cartão de débito da conta bancária.”

Nesse sentido, o que constou no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 44872983):

(...) os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto.

 

No caso em tela, sendo o pagamento realizado por meio de cheque nominal não cruzado, restou inviabilizado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e aos gastos de campanha.

Outro ponto que restou prejudicado, visto que os valores, embora oriundos dos cofres públicos, não transitaram pelo sistema financeiro nacional, foi o rastreamento para verificação se os destinatários dos pagamentos de fato pertenceram à relação que originou o gasto de campanha, além de outros controles públicos como é o caso da Receita Federal e do COAF.

A legislação eleitoral contempla os arts. 38 e 60, caput e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 para análise conjunta das despesas. O primeiro artigo elenca os meios pelos quais os pagamentos devem ser efetuados e o segundo contempla um rol de documentos complementares à comprovação dos gastos eleitorais.

O art. 60, caput e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 deve ser empregado tão somente para obtenção por meio de terceiro de uma confirmação (com quem o candidato contratou) de que o valor foi efetivamente gasto em um serviço ou produto para a campanha eleitoral.

A Procuradoria Regional Eleitoral explicita em suas palavras a necessidade de analisar de forma conjunta os dados extraídos:

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes distintas, que permite, nos termos da Resolução, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se tratam de recursos públicos, como são as verbas recebidas via FEFC.

 

A matéria em exame foi amplamente debatida nesta Corte, conforme ementa que reproduzo, que bem evidencia o entendimento sufragado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO E VICE. APROVADAS COM RESSALVAS. USO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA-FEFC. IRRESIGNAÇÃO UNICAMENTE QUANTO À DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO ENTRE OS BENEFICIÁRIOS DAS CÁRTULAS E OS EMITENTES DAS NOTAS FISCAIS. INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTOS IDÔNEOS A COMPROVAR A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que julgou aprovadas com ressalvas prestação de contas de candidatos à majoritária, referentes às eleições municipais de 2020, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em face do uso irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

2. Insurgência delimitada à determinação de restituição ao erário, não estando a sentença sujeita à modificação na parte em que aprovou as contas com ressalvas, uma vez que a matéria não restou devolvida à apreciação do Tribunal nas razões de apelo.

3. A norma que regulamenta a forma de pagamento das despesas eleitorais está prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos de natureza financeira devem ser pagos por meio de cheque cruzado e nominal ao fornecedor. Incontroverso, na hipótese, o descumprimento, cabe a análise se, por um lado, essa conduta por si só, conduz à determinação de recolhimento dos valores apurados ao Tesouro Nacional ou, por outro lado, se existem documentos idôneos capazes de comprovar os gastos efetuados por meio dos cheques objeto da glosa.

4. A atual jurisprudência do TSE supera o entendimento até hoje vigente neste colegiado, estabelecendo, em síntese, que a devolução de valores oriundos de recursos públicos ao Tesouro Nacional somente é cabível nas hipóteses de ausência de comprovação da utilização dos recursos ou utilização indevida, comandos estabelecidos no § 1º do art. 79 da já citada Resolução TSE 23.607/19.

5. A análise da microfilmagem dos cheques estabelece que os beneficiários das cártulas foram pessoas estranhas aos fornecedores identificados e que apresentaram as notas fiscais e as declarações tendentes a estabelecer vinculação com os já citados cheques. As regras contidas na Resolução TSE n. 23.607/19 dispõem que os gastos de campanha devem ser identificados com clareza e estabelecendo elos seguros entre os beneficiários dos pagamentos e os serviços prestados. É a chamada rastreabilidade, isto é, os pagamentos devem ser atestados por documentos hábeis a demonstrar o serviço prestado pelo beneficiário e sua vinculação com a despesa, o que não ocorreu no caso concreto.

6. O contexto probatório não revela nenhum documento fiscal idôneo emitido pelos beneficiários dos cheques e tampouco contrato ou prova de prestação de serviços a justificar os pagamentos feitos. Ausente a vinculação entre os beneficiários dos cheques e os emitentes das notas fiscais, bem como a inexistência de provas, por documentos idôneos, de prestação de serviços por parte dos beneficiários das cártulas, resta descumprida a regra posta no art. 60, e parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19. Circunstância que atrai a incidência do disposto no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo a devolução dos valores ao Tesouro Nacional, como determinado na sentença.

7. Provimento negado.

(Rel 0600464-77.2020.6.21.0099, Relator designado: Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, julgado na sessão de 06 de julho de 2021)

(Grifo nosso)

 

Dessarte, descumprido o que determina o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, sem que se possa identificar e rastrear a destinação exata da verba pública (FEFC), correta a determinação de recolhimento da importância ao erário.

Por derradeiro, as despesas pagas por meio dos cheques n. 85006 (R$ 500,00) e n. 85009 (R$ 451,00) não foram declaradas no SPCE, contrariando o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ainda que as despesas relativas aos cheques tenham sido declaradas em sede de prestação retificadora, a falha persiste, pois as cártulas não foram emitidas conforme a legislação eleitoral disciplina, ou seja, nominais e cruzadas (IDs 23537783 e 23537733). Ressalte-se que essa falha configura irregularidade grave, pois impossibilita o cruzamento das informações.

Assim, a realização de gastos com verbas do FEFC por meio de forma de pagamento vedada e sem comprovação da despesa eleitoral importa em utilização indevida de recursos públicos, ensejando o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia irregular (R$ 1.951,00), nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, o valor da irregularidade é superior ao parâmetro considerado como módico pela Corte (R$ 1.064,10) como critério para aprovação das contas com ressalvas e supera em 100% o valor declarado como receita recebida (R$1.951,00), de modo que deve ser mantido o juízo de desaprovação das contas.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, ao efeito de manter a determinação do recolhimento de R$ 1.951,00 ao Tesouro Nacional.