REl - 0600308-96.2020.6.21.0129 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/01/2022 às 14:00

VOTO

As contas do Patriota de Nova Petrópolis/RS foram desaprovadas em virtude de diversas irregularidades: a) descumprimento do prazo de entrega dos relatórios financeiros de campanha; b) omissão de receitas e gastos eleitorais no total de R$ 2.284,95; c) divergência entre o valor total das receitas e despesas apontado nos extratos da prestação de contas final (ID 43100483 – R$ 29.250,00) e os extratos da regularização da omissão (ID 43103183 – R$ 82.935,00).

Sobre as nulidades alegadas nas razões recursais, é preciso ter inicialmente presente ser incabível invocar o desconhecimento da legislação a fim de legitimar atuação equivocada do advogado no processo judicial.

O art. 46, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 é expresso ao estabelecer que as contas de campanha tramitam no sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJe), e os arts. 1º e 2º da Resolução TRE-RS n. 347/20 bem esclarecem que os atos de comunicação judicial por aplicativo de mensagens são dirigidos somente às partes que não estão representadas por advogado, como ocorre nos casos de citação.

Portanto, não há qualquer ilegalidade pela falta de envio de intimação por meio do aplicativo WhatsApp, sobre irregularidades constatadas no parecer preliminar, pois nesse momento processual já havia advogada cadastrada nonao seito para o recebimento de intimações via sistema PJe.

O art. 18 da Resolução TRE-RS n. 347/20 estabeleceu que, no período de 26 de setembro a 18 de dezembro de 2020, a comunicação dos atos processuais seria realizada pelo mural eletrônico, e o § 4º do seu art. 26 é claro ao dispor que, encerrado o período eleitoral com a diplomação dos eleitos, as intimações nos processos de prestação de contas relativas às eleições de 2020 serão realizadas via PJe, dispensando-se a publicação no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) e a observância do prazo de ciência de 10 (dez) dias previsto no art. 5º, § 3º, da Lei n. 11.419/06 (Resolução TSE n. 23.632/20, art. 6º; Resolução TRE-RS n. 338/19, art. 51).

Desse modo, não há irregularidade nos atos de intimação realizados via PJe, pois cabia à advogada, patrona ou substabelecida, a observância das comunicações processuais via mural, no período eleitoral, ou PJe, na forma previamente regulamentada pelo TRE-RS.

É cediço que, em se tratando de processo que tramita por meio eletrônico, as intimações são realizadas no âmbito do sistema PJE. Os atos encaminhados via sistema push ostentam mero caráter informativo.

Do exame dos autos, verifica-se que a procuradora inicialmente constituída no feito era a Dra. Robertina de Fatima Mendes Sutile Flores (procuração do ID 43100083, de 9.11.2020), a qual substabeleceu, em 20.1.2021, sem reserva, os poderes que lhe foram outorgados para a advogada Doris Denise Neumamm, que, inclusive, concorreu no pleito de 2020 para o cargo de prefeita de Nova Petrópolis (ID 43100683).

Então, desde janeiro, após o recesso forense, já estava a advogada Doris Denise Neumamm regularmente atuando no processo como procuradora do Patriota.

A intimação para sanar em 3 (três) dias, sob pena de preclusão, as falhas constatadas no exame preliminar (decisão do ID 43103833), foi regulamente realizada via PJe em nome do partido e da Dra. Doris Denise Neumamm em 8.4.2021 (ID 43103883), certificando-se a seguir que o prazo transcorreu sem manifestação em 22.4.2021 (ID 43103933).

Em 3.5.2021, 11 (onze) dias após o término do prazo, foi requerida sua reabertura, alegando-se que, em outros municípios, as intimações são realizadas por e-mail e por WhatsApp, o que não ocorreu em Nova Petrópolis, e que o sistema é novo/atualizado, diferente das outras eleições, razão pela qual o contador não ativou o push.

O juízo a quo indeferiu o requerimento, apontando que já havia sido apresentado o parecer conclusivo e que “as intimações ocorreram nos exatos termos das Resoluções nº 347/2020 e 338/2019 do TRE/RS, diretamente à procuradora cadastrada”, conforme decisão do ID 43104133:

Sem razão o prestador.

As intimações ocorreram nos exatos termos das Resoluções nº 347/2020 e 338/2019 do TRE/RS, diretamente à procurador cadastrada.

O substabelecimento ocorreu em 21 de janeiro, enquanto que a intimação da defesa ocorreu em abril do corrente ano, dirigida à Bel. Doris Neumann.

O prazo para diligência se esgotou em 22 de abril (sequencial 103).

O pedido de reabertura do prazo, portanto, somente veio aos autos quando já escoado o prazo concedido no despacho 84050455.

Inexistindo defeito na intimação e não tendo observado o prazo legal, inviável a reabertura pretendida.

A hipótese, portanto, é de preclusão, na forma do art. 69, §1º, da Res. 23.607/2019-TSE.

Isto posto, indefiro o pedido retro.

Considerando que já foi apresentado o parecer conclusivo, ao MPE para parecer.

 

Em seguida, o partido juntou nova petição, acompanhada de documentos, requerendo a reabertura do prazo de diligências, afirmando que houve a troca de procuradora, que não foi acionado o push e que o erro era do contador (ID 43104283).

Ocorre que a mudança de advogado nos autos ocorreu em janeiro de 2021 e a intimação sobre o exame preliminar foi realizada em abril, no momento em que a advogada já atuava no feito, sendo inviável atribuir ao contador a falha no acompanhamento da tramitação processual (ID 43104283).

Ato contínuo, o órgão ministerial solicitou exame das alegações aventadas pelo partido (ID 43104483), sobrevindo a oposição de dois embargos de declaração (ID 43104583 e ID 43104883), os quais foram rejeitados (ID 43104933), e a informação do órgão técnico de que os documentos juntados aos autos não tinham reflexos nas contas do partido, pois referentes aos candidatos que concorreram na eleição majoritária (ID 43105033).

Com essa informação técnica, observa-se que, nada obstante a consumação da preclusão, foram conhecidos os documentos intempestivamente juntados aos autos pelo partido em todas as manifestações realizadas após a análise das contas, ausente qualquer prejuízo pela decisão que indeferiu a reabertura de prazo solicitada.

Deve prevalecer, in casu, a máxima positivada no art. 219 do Código Eleitoral: “Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo”.

A seguir, o Parquet eleitoral opinou pela desaprovação (ID 43105133), foi juntado aos autos novo substabelecimento, dessa vez com reserva de poderes (ID 43105233), sobrevindo a interposição de recurso.

Por fim, a alegação de que houve malferimento do princípio da igualdade porque em outros processos fora concedida a reabertura do prazo para sanar diligência merece ser rejeitada.

A Procuradoria Regional Eleitoral realizou acurada análise dos processos invocados nas razões recursais, inclusive do recurso REl 0600330-57-93.2020.6.21.0129, da relatoria do Des. Federal Luís Alberto D’azevedo Aurvalle, e verificou que os pedidos foram realizados no curso do prazo de intimação, quando não consumada a preclusão temporal, circunstância diversa da verificada nos autos.

Aqui, o pedido ocorreu 11 (onze) dias após o escoamento do prazo, inclusive quando já apresentado o parecer conclusivo. Confira-se o parecer do órgão ministerial nesta instância (ID 44872698):

Em suas razões, a agremiação partidária alega violação à isonomia no tratamento conferido no juízo a quo em diversos processos nos quais as partes se encontravam na mesma situação processual. Nesse sentido, afirma que, na PC 0600319-28.2020.8.21.0129, foi deferida reabertura de prazo para apresentação de prestação de contas retificadora, entendimento que não foi adotada no presente feito, apesar da identidade de situação fático-processual. Recorreu o prestador, requerendo o provimento do recurso tão somente para cassar a sentença, deferindo-se a reabertura de prazo para o fim de entregar a prestação de contas retificadora.

Não assiste razão ao recorrente.

Em outro processo (PC n. 0600330-57.2020.6.21.0129), em que o recurso trazia idêntica fundamentação, opinamos favoravelmente à anulação da sentença, pois foi possível verificar que existia identidade de situações fáticas e decisões diametralmente opostas, em afronta ao princípio da isonomia. Para chegar a essa conclusão, comparamos as fases do referido processo com a PC n. 0600319-28.2020.6.21.0129, conforme consta da fundamentação do referido parecer:

“Nesse sentido, tanto neste feito como naquele, houve a prolação de despacho, no dia 12.04.2021, determinando a intimação do prestador para apresentar justificativa sobre a omissão de gastos, contas retificadoras da campanha e respectiva mídia no prazo de 5 dias (IDs 42240033 desta PC e 84575155 da PC 0600319-28).

O prazo para manifestação constante no sistema foi o dia 30.04.2021 nos dois processos, tendo, nessa data, sido juntadas petições requerendo, com idêntica justificativa, a prorrogação do prazo (IDs 42240183 desta PC e 86000646 da PC 0600319-28).

Na PC n. 0600319-28.2020.6.21.0129, sobreveio decisão deferindo o pedido, considerando a justificativa apresentada (ID 86044502 daquele feito). Já no presente processo, houve indeferimento do pedido de reabertura do prazo, sob fundamento que entendemos descabido.

Na decisão de indeferimento, constou que “O substabelecimento ocorreu em 21 de janeiro, enquanto que a intimação da defesa ocorreu em 26 de março do corrente ano, dirigida à Bel. Doris Neumann. O prazo para diligência se esgotou em 8 de abril (sequencial 76). O pedido de reabertura do prazo, portanto, somente veio aos autos quando já escoado o prazo concedido no despacho 83354386..”.

Como se observa da decisão acima transcrita, quando a mesma refere a perda do prazo, certamente, não o faz em relação ao prazo dado para oferecimento da retificadora, em relação ao qual se pedia a reabertura, pelo simples fato de que o próprio despacho que determina a intimação para eventual oferecimento de retificadora, datado de 12 de abril, é posterior ao prazo que o magistrado mencionou ter se esgotado em 08 de abril.

Deste modo, tendo a petição sido acostada no último dia do prazo, da mesma forma que se deu na PC n. 0600319-28.2020.6.21.0129, não há justificativa para tratamento diverso, devendo também no presente caso ser deferida a reabertura do prazo por 5 dias como seu deu naquele feito.”

Contudo, cotejando o procedimento adotado na PC n. 0600319-28.2020.6.21.0129, com o presente feito, é possível verificar que não existe identidade de situações fáticas, de modo que as decisões, opostas, não afrontam o princípio da isonomia.

A diferença entre este processo e o processo paradigma é que, nesta PC, a manifestação pedindo reabertura do prazo foi juntada em 03.05.2021 (ID 43104033), após encerrado o prazo concedido pelo juízo, cujo termo final era 22.04.202, conforme se verifica no PJe da ZE. Na PC paradigma, como referido na transcrição supra, a manifestação foi juntada ainda dentro do prazo, que, naquele processo, era 30.04.2021 (ID 86000646 da PC 0600319-28).

Assim, no presente processo, houve o indeferimento do pedido de reabertura do prazo, enquanto na PC n. 0600319-28.2020.6.21.0129, sobreveio decisão deferindo o pedido, considerando a justificativa apresentada tempestivamente (ID 86044502 daquele feito).

Deste modo, tendo a petição sido acostada após o encerramento do prazo (diferente do que seu deu na PC n. 0600319-28.2020.6.21.0129), inexiste óbice para que situações diversas sejam tratadas de formas diversas, não sendo cabível a reabertura de prazo sob alegação de violação ao princípio da isonomia.

Ante o exposto, o Ministério Público Eleitoral opina pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

 

Com esses fundamentos, seja porque não houve nulidade na intimação e ofensa aos princípios invocados, seja porque os documentos intempestivamente juntados foram conhecidos, denotando-se a ausência de prejuízo, rejeito a alegação de nulidade na tramitação.

No mérito, o recurso não enfrenta as razões de desaprovação das contas.

Entretanto, analiso, de ofício, a adequação do prazo da sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, estabelecido em 12 (doze) meses, em virtude da falta de razoabilidade da fixação no prazo máximo.

O § 7º do art. 74 da Resolução TSE n. 23.607/19 prevê que essa sanção será aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de 1 (um) a 12 (doze) meses, e, na espécie, entendo que o prazo pode ser reduzido para 3 (três) meses em atenção aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade.

O parecer conclusivo aponta que o órgão partidário obteve receitas no total de R$ 82.935,00, sendo R$ 30.000,00 provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), R$ 22.600,00 procedentes do Fundo Partidário (FP) e R$ 30.335,60 de pessoas físicas (ID 43104083).

Nessa linha, tem-se que a falha atinente à divergência entre o valor total das receitas e despesas apontadas nos extratos da prestação de contas final (ID 43100483 – R$ 29.250,00) e os extratos da regularização da omissão (ID 43103183 – R$ 82.935,00) não prejudicou o exame das contas.

A falha relativa ao descumprimento do prazo de entrega dos relatórios financeiros de campanha caracteriza violação aos princípios da publicidade e da transparência e impede o controle social sobre os recursos movimentados pelo partido. Entretanto, o procedimento não conduziu, por si só, à desaprovação das contas.

A omissão de receitas e gastos eleitorais no total de R$ 2.284,95 caracteriza utilização de recursos de origem não identificada, na forma do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, devido à ausência de dados sobre a origem do valor empregado para o pagamento dessas despesas, localizadas a partir de notas fiscais emitidas para o CNPJ do partido, e à falta de trânsito do recurso pela conta bancária de campanha.

Essa falha compromete a confiabilidade das contas, sendo adequado o juízo de desaprovação.

O caput do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19 prevê que tal valor deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, mas a sentença se limitou a desaprovar as contas, sem determinação de recolhimento ao erário.

Nesse cenário, a sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 12 meses afigura-se demasiada, pois o valor da falha, de R$ 2.284,95, representa apenas 2,75% do total da arrecadação (R$ 82.935,00).

Com esses fundamentos, de ofício, reduzo o prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário para o período de 3 (três) meses.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso e, de ofício, reduzo para 3 (três) meses o prazo de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, mantendo a desaprovação das contas.