REl - 0600406-68.2020.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/01/2022 às 14:30

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Do Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidatos a prefeito e vice-prefeito do Município de Campos Borges/RS, relativa às eleições do ano de 2020.

A sentença recorrida julgou desaprovadas as contas dos recorrentes e determinou o recolhimento do valor de R$ 6.878,34 ao Tesouro Nacional, em razão do reconhecimento das seguintes irregularidades: a) recebimento de depósito financeiro, em espécie, em valor superior ao limite de R$ 1.064,10; b) despesas com combustíveis sem o correspondente registro de locações e/ou cessões de veículos; e c) divergências entre a movimentação financeira registrada no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE) e aquela aferida nos extratos eletrônicos.

Passo a analisar, individualmente, as falhas apontadas.

 

a) Recebimento de Depósito em Espécie de Valor Superior a R$ 1.064,10

Inicialmente, a sentença, com base em parecer técnico conclusivo (ID 41310333), assinalou o recebimento de crédito na conta bancária de campanha (conta n. 195286), no valor de R$ 1.500,00, por meio de depósito em espécie, ou seja, realizado de forma distinta das opções de transferência eletrônica ou de cheque cruzado e nominal (ID 41310583).

A matéria objeto de exame encontra-se disciplinada no art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(…).

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

 

Dessa maneira, as doações em montante igual ou superior a R$ 1.064,10 devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou por meio de cheque cruzado e nominal, devendo os valores ser recolhidos ao Tesouro Nacional, caso haja utilização dos recursos recebidos em desacordo com o estabelecido no dispositivo, ainda que identificado o doador.

Os prestadores admitem a falha, mas sustentam que, ao identificar o erro no depósito, não gastaram o valor excedente de R$ 440,00, quantia que foi considerada como “sobras de campanha” e depositada na conta permanente do partido, nunca tendo sido utilizada na campanha.

As razões dos recorrentes não os socorrem.

Verifica-se que o depósito em questão alcançou o montante de R$ 1.500,00, ultrapassando objetivamente o limite previsto na legislação eleitoral, ou seja, a afronta ao dispositivo ocorreu a partir do recebimento de depósito bancário em quantia superior a R$1.064,10 e do seu emprego em campanha, ainda que parcela do valor tenha sido manejado como sobras e revertido à agremiação partidária.

Dessa forma, não há como acolher a tese defensiva de abatimento do valor de R$ 440,00 para atender ao limite diário para utilização do depósito em dinheiro, em razão do seu recolhimento como “sobras de campanha”, pois a observância do teto máximo para a modalidade de crédito bancário é aferida a partir da totalidade da operação.

Ao identificar “erro no depósito”, caberia aos candidatos a adoção das providências estabelecidas no art. 21, §§ 3º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, quais sejam, ao identificar o doador, restituir a ele os valores ou, se isso não for possível, o valor deveria ser considerado de origem não identificada e recolhido ao Tesouro Nacional.

O TSE já assentou que “a ratio essendi da norma é identificar a origem de recurso arrecadado, com o rastreamento a partir da transferência eletrônica efetivada entre estabelecimentos bancários” (Recurso Especial Eleitoral n. 26535, Relatora designada: MIN. ROSA WEBER, DJE de 20.11.2018, p. 32).

A exigência normativa de que as doações de campanha, mesmo que provenientes dos próprios candidatos, sejam feitas por meio de transferência eletrônica, visa coibir a possibilidade de manipulações e de transações ilícitas, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação, o que não pode ser confirmado na espécie.

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância objetiva da norma sobre finanças de campanha.

Não se olvida que este Regional tem arrefecido o rigor dessas disposições normativas quando o prestador, por outros meios, atinge o fim colimado pela norma, qual seja, a demonstração segura da origem dos recursos, mormente, por meio do oferecimento de comprovantes de saque em dinheiro da conta-corrente do doador e imediato depósito em espécie na conta de campanha, demonstrando que a operação de transferência bancária restou meramente decomposta em um saque seguido incontinenti de um depósito na mesma data.

Entrementes, na hipótese vertente, inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos, impossibilitando que a falha seja relevada.

Portanto, a configuração da irregularidade, que afeta a transparência das contas, e a necessidade de recolhimento aos cofres públicos da importância eivada de mácula, nos termos do art. 21, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesse sentido colaciono julgado deste Tribunal Regional:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. CONTAS DE CAMPANHA. DESAPROVADAS. CANDIDATO. VEREADOR. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ALTO PERCENTUAL. INVIÁVEL A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que julgou desaprovadas as contas de campanha relativas às eleições de 2020, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada por meio de depósito bancário em espécie. Determinado o recolhimento da importância correspondente ao Tesouro Nacional.

2. A disciplina do art. 21, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 determina que as doações em montante igual ou superior a R$ 1.064,10 devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário ou cheque cruzado e nominal, devendo os valores ser recolhidos ao Tesouro Nacional caso haja sua utilização em desacordo com o estabelecido no dispositivo, ainda que identificado o doador.

3. No caso dos autos, embora o depósito tenha sido realizado com a anotação do CPF do presumido doador, é firme o posicionamento da Corte Superior no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, ante a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato. Configurada a irregularidade, que afeta a transparência das contas, impõe-se a necessidade de recolhimento da importância ao erário.

4. A falha representa 25,80% da receita arrecadada, sendo inviável a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, na esteira da jurisprudência do TSE e desta Corte. Manutenção da sentença.

5. Desprovimento.

(REl n 0600880-18.2020.6.21.0011, Acórdão de 27/07/2021, Relator: DES. ELEITORAL MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Publicação: PJE) (Grifei.)

 

Dessa sorte, impõe-se a integral manutenção da sentença quanto ao ponto.

 

b) Despesas com Combustíveis Sem o Correspondente Registro de Locações e/ou Cessões de Veículos

A sentença reconheceu, ainda, a existência de despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações e/ou cessões de veículos, infringindo o disposto nos arts. 35 e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

O parecer técnico conclusivo (ID 41310333) identificou notas fiscais emitidas pelo fornecedor de combustíveis AUTO POSTO MACCARINI (CNPJ 08.458.923/0001-01) contra o CNPJ de campanha dos prestadores, conforme o seguinte quadro:

Os recorrentes alegam que as notas fiscais referentes à aquisição de combustível relacionam-se ao abastecimento de dois veículos utilizados em campanha: um deles de propriedade de Glorinha Ramos Moraes, cônjuge do candidato a prefeito, e o outro pertencente ao candidato a vice-prefeito. Sustentam, ainda, que os contratos de cessão dos automóveis não foram incluídos no SPCE, pois entenderam ser dispensável tal registro em razão da autorização legal contida no art. 60, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 e devido ao caráter simplificado das contas.

Em grau recursal, foram juntados aos autos os contratos de cessão e os respectivos documentos de propriedade de dois veículos (IDs 41310933 e 41310983): o automóvel CRUZE LTZ NB AT, placas IYG 0012, da proprietária Glorinha Ramos Moraes, e o veículo RANGER XLT CD4, placas IUG 9868, de propriedade de Zenair Jose Molinaro, o qual também está registrado na lista de bens declarados à Justiça Eleitoral por ocasião do registro de candidatura  (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/85200/210000952217/bens).

A matéria concernente aos gastos com combustíveis e à manutenção de veículo empregado na campanha encontra-se disciplinada na Resolução TSE n. 23.607/19, em seu art. 35, §§ 6º e 11, litteris:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(...).

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

(…).

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

Nesse passo, consoante dispõem os dispositivos transcritos, as despesas do candidato com combustível, reputadas como de natureza pessoal, não se consideram gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha.

Podem tais despesas, entretanto, ser consideradas gastos eleitorais, contanto que preenchidos os requisitos elencados no art. 35, § 11, do aludido diploma normativo.

Contudo, como apontado na instância a quo, percebe-se que não foram declaradas as cessões em questão no sistema de contas, contrariando a prescrição contida no art. 35, § 11, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Vale salientar que, nos termos dos arts. 57, § 2º, e 60, §§ 4º, inc. I, e 5º, do mencionado estatuto regulamentar, é necessário o registro na prestação de contas das doações estimáveis em dinheiro, sendo que a dispensa de sua comprovação não implica desobrigação do lançamento dos valores atribuídos à operação:

Art. 57. A comprovação dos recursos financeiros arrecadados deve ser feita mediante:

(...)

§ 2º A ausência de movimentação financeira não isenta o prestador de contas de efetuar o registro das doações estimáveis em dinheiro.

(...)

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

(...).

§ 4º Ficam dispensadas de comprovação na prestação de contas:

(...).

III - a cessão de automóvel de propriedade do candidato, do cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha.

§ 5º A dispensa de comprovação prevista no § 4º não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações constantes dos incisos I a III do referido parágrafo. (Grifei.)

 

Além disso, embora as notas fiscais de combustíveis tenham sido emitidas contra o CNPJ de campanha (IDs 41307833, 41308083 e 41308133), resta claro que os abastecimentos em questão serviram ao uso pessoal dos candidatos, razão pela qual não poderiam ser pagos com recursos oriundos das contas eleitorais, nos termos do art. 35, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesse sentido, colho os fundamentos indicados no parecer exarado pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral, Dr. Fábio Nesi Venson, os quais agrego às minhas razões de decidir:

Contudo, deve ser mantido o apontamento referente à ausência de registro da receita, uma vez que o fato de o veículo ser cedido gratuitamente pelo próprio candidato ou por familiar não o exime do correspondente registro nas contas, conforme se extrai do art. 15, I e II e art. 21, II, da Resolução TSE nº 23.607/2019, verbis: Art. 15. Os recursos destinados às campanhas eleitorais, respeitados os limites previstos, somente são admitidos quando provenientes de: I - recursos próprios dos candidatos; II - doações financeiras ou estimáveis em dinheiro de pessoas físicas; Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de: (...) II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços.

Outrossim, o art. 60, § 4º, III, da Resolução n. 23.607/2019 somente exime o prestador da comprovação, por documento fiscal, do gasto com a cessão do automóvel, o que não afasta a necessidade de informar o recurso na prestação de contas conforme previsto no § 5º do mesmo artigo, bem como no art. 7º, § 10, da mesma resolução.

Isso, inclusive, para que possam ser somados aos recursos financeiros para verificação do limite de gastos que incidem sobre o autofinanciamento.

Ademais, a justificativa trazida (abastecimento de veículo do próprio candidato), igualmente, não se presta a justificar os gastos eleitorais com combustível, vez que, conforme art. 35, § 6º, alínea “a”, da Resolução TSE 23.607/2019, “Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato: a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;”.

 

Nítida, portanto, a configuração da irregularidade, razão pela qual a sentença não merece reforma quanto ao aspecto.

 

c) Divergências entre a Movimentação Financeira Registrada no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral e a Aferida nos Extratos Eletrônicos

Seguindo na análise das irregularidades apontadas pelo parecer técnico, verifica-se que foram identificadas divergências entre a movimentação financeira registrada no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE-Cadastro) e aquela aferida nos extratos eletrônicos, relativas à conta destinada às verbas do FEFC e à conta “Outros Recursos”.

Em relação à conta para movimentação de recursos do FEFC, o órgão de análise técnica identificou divergência entre o fornecedor declarado na nota fiscal n. 031471526, de CNPJ n. 25.201.281/0001-71, e a contraparte que figura no extrato bancário como sacador final do cheque n. 0001, no valor de R$ 3.000,00, no dia 26.10.2020, o Sr. Rivelino Rodrigues da Silva, CPF n. 028.046.130-54.

Em suas razões, os recorrentes sustentam que foi realizado o pagamento de músicas da campanha para o Sr. Rivelino Rodrigues da Silva, pessoa física, CPF n. 028.046.130-54. Aduzem que a nota fiscal foi proveniente de pessoa jurídica, pois se trata de Micro Empreendedor Individual e explicam que houve um equívoco no momento de fazer o pagamento, confundindo-se a personalidade jurídica da pessoa física e da pessoa jurídica.

Com efeito, ao analisar a nota fiscal juntada aos autos para comprovação da despesa (ID 41308383), verifica-se que o fornecedor registrado sob o CNPJ n. 38.846.339/0001-86 é “Rivelino Rodrigues da Silva 02804613054 – ME”, inclusive o CPF da pessoa física titular da microempresa está descrito na própria razão social.

É inequívoco que o sacador do título de crédito é o mesmo profissional apontado na prestação de contas e na nota fiscal, então por sua constituição como microempresa, ainda que no extrato bancário conste registrado o CPF da respectiva pessoa física como contraparte.

Desse modo, demonstrado que os recursos públicos foram efetivamente utilizados para quitação de despesas com o profissional declarado na prestação de contas e em seu proveito, não subsiste irregularidade sobre a despesa em questão.

De seu turno, em relação à conta “Outros Recursos”, a analista técnica na origem também fez apontamentos de irregularidades por identificar divergências de dados declarados na prestação de contas e o registro do extrato bancário: o depósito em espécie realizado no dia 21.10.2020, no valor de R$ 60,00, foi identificado como doação do candidato a prefeito, porém, no extrato bancário, está registrado o CNPJ n. 38.846.339/0001-86.

Os recorrentes justificam que o depósito foi realizado com a identificação do CNPJ do candidato, quando deveria ter sido realizado com a identificação mediante o CPF de Everaldo da Silva Moraes.

Da análise das provas juntadas aos autos, especialmente o comprovante de depósito ID 41311083, verifica-se que consta, como depositante, Everaldo da Silva Moraes, com a identificação do CNPJ n. 38.846.339/0001-86 da campanha o próprio candidato.

O douto Procurador Regional Eleitoral, em seu parecer, observa que os prestadores, desde o início, incluíram a doação em questão como recursos próprios, não se verificando, portanto, tentativa de ocultar da Justiça Eleitoral o recebimento de recursos de terceiros. E acresce que:

De fato, o que se observa, até mesmo pelo comprovante de depósito eletrônico trazido com o recurso em que aparece como depositante o nome de Everaldo da Silva Moraes (ID 41311083), é um mero engano no momento de se informar os dados do doador no momento do depósito em dinheiro perante a instituição financeira, ocasião em que informado o CNPJ da candidatura em vez do CPF do candidato, circunstância que não afasta a veracidade dos dados informados na prestação de contas.

 

Ocorre que, nos termos dos arts. 21, inc. I e §§ 1º, 4º e 5º, e 32, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, as doações financeiras de valores iguais ou inferiores a R$ 1.064,10 podem ser realizadas por meio de depósito bancário em espécie, desde que o CPF do doador seja obrigatoriamente informado, sendo que, caso haja a falta ou a identificação incorreta do doador, os recursos são reputados como de origem não esclarecida, devendo ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Nessa senda, este Tribunal Regional tem entendido que, no caso de recursos em espécie depositados na conta de campanha em nome do CNPJ de candidatura, a mera declaração do candidato, não confirmada por documentação idônea relacionada à movimentação bancária da receita de sua conta pessoal, não é suficiente para a comprovação da origem dos valores.

Por pertinente, colaciono as ementas dos aludidos julgados:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. APROVADAS COM RESSALVAS. CONHECIDOS DOCUMENTOS NOVOS JUNTADOS AO RECURSO. ART. 266, CAPUT, DO CÓDIGO ELEITORAL. DOAÇÃO IRREGULAR. APORTE FINANCEIRO EM ESPÉCIE EM NOME DO CNPJ DA CANDIDATURA. USO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que aprovou com ressalvas prestação de contas, em virtude do recebimento de depósito bancário, em que consta o CNPJ do candidato como doador, e pagamento de despesa de campanha com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), sem comprovação de utilização de cheque cruzado e nominal, determinando o recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional.

(...)

3. Doação irregular. Evidenciado nos extratos bancários aporte financeiro, por meio de depósito bancário em espécie, em que consta como depositante o CNPJ de campanha e não o CPF do candidato, em afronta ao regramento estabelecido no art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19. Este Tribunal já afastou a tese de que devem ser considerados como recursos próprios os valores depositados na conta de campanha em nome do CNPJ da candidatura, devido à falta de confiabilidade da procedência dessa receita a partir de mera declaração do candidato, não confirmada por documentação idônea. Ademais, o recorrente não se desincumbiu de comprovar o fato que invoca em sua defesa, na forma do art. 373, inc. II, do CPC, sequer quanto à demonstração de que o depósito foi realizado no seu CNPJ por equívoco. Incabível a análise da boa ou má-fé do prestador. A regra sobre a identificação do CPF do doador deve ser aplicada de forma isonômica a todos os candidatos e partidos que disputaram o pleito, independentemente do valor depositado. Prova dos autos inapta para esclarecer a origem do depósito, impondo o recolhimento da quantia ao erário.

(...)

5. Provimento negado.

(TRE-RS, REl n. 0600158-60.2020.6.21.0018, Relator originário: Des. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, Redator do Acórdão: DES. ELEITORAL GERSON FISCHMANN, julgado em 01.9.2021.) (Grifei.)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RONI. GASTO COM COMBUSTÍVEL SEM DEMONSTRAÇÃO DE FINALIDADE. ARGUMENTAÇÃO INSUFICIENTE. NÃO COMPROVADA FONTE DO APORTE. ELEVADO PERCENTUAL E VALOR NOMINAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas, diante do recebimento de recursos de origem não identificada - RONI - e da falta de comprovação de gasto com combustível, determinando o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

2. A falta de confiabilidade e de transparência sobre a origem do recurso não fica afastada pela declaração de que o depósito foi realizado pelo próprio prestador. O art. 21, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 expressamente determina que as doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado. Ainda que o prestador demonstre a sua capacidade financeira para realizar a doação e justifique a falha apontando equívoco de procedimento, em razão de o depósito estar identificado com o CNPJ da campanha e não com o CPF do doador, trata-se de mera alegação que não se sustenta em prova fidedigna, permanecendo a irregularidade. Não se discute a boa ou má-fé, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha. Recolhimento do recurso de origem não identificada ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Despesa com combustível sem registro de utilização de geradores de energia ou de locação, cessão, ou uso de veículo para publicidade, conforme estabelece o § 11 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. Falha que sequer foi abordada na irresignação.

4. Irregularidades representando 62% das receitas arrecadadas e elevado valor absoluto, a ensejar a manutenção do juízo de desaprovação.

5. Desprovimento.

(TRE-RS, REl n. 0600192-46.2020.6.21.0079, Relator originário: Des. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, Redator do Acórdão: DES. ELEITORAL GERSON FISCHMANN, julgado em 08.9.2021.) (Grifei.)

 

Assim, cumpriria ao candidato apresentar, por exemplo, o extrato bancário de sua conta pessoal demonstrando o saque das quantias seguido do correspondente depósito em dinheiro à conta de campanha, dentre outros meios de prova, conferindo segurança sobre a real origem do valor depositado.

Contudo, ausente referida prova, na linha da jurisprudência deste Tribunal, não há confiabilidade na mera declaração unilateral de que a procedência é própria e que o recurso é pessoal.

Nesse passo, deve ser mantida a sentença quanto ao ponto, de modo a se considerar caracterizada a irregularidade, consubstanciada no recebimento de receita de origem não identificada, no total de R$ 60,00, cuja consequência é a necessidade de seu recolhimento ao Tesouro Nacional.

Na sequência, o órgão técnico consignou como irregulares os depósitos de R$ 1.500,00, em 15.10.2020, e de R$ 1.000,00, em 22.10.2020, declarados como doação de Zenair José Molinaro, porém, sem a identificação da contraparte nos extratos bancários.

No tocante ao depósito em cheque de R$ 1.500,00, o apontamento está abrangido pela análise anteriormente realizada no tópico “a” deste voto, em que reconhecida a infringência ao disposto no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, por ser realizado o crédito, acima de R$ 1.064,10, de forma distinta da opção de transferência eletrônica ou de cheque cruzado e nominal.

No que se refere ao depósito de R$ 1.000,00, a falha está saneada pelo comprovante acostado aos autos (ID 41311133, fl. 3), no qual consta o nome e o CPF de Zenair José Molinaro como depositante, atendendo ao disposto no art. 21, caput e inc. I, da  Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, o parecer conclusivo apontou as seguintes divergências identificadas na conta “Outros Recursos”, consoante a seguinte tabela:

As falhas identificadas são no sentido de que as operações nos valores de R$ 51,18, em 21.10.2020, e de R$ 500,00, em 03.11.2020, não teriam observado o pagamento de boleto por meio de cheque conforme declarado pelos prestadores.

Por sua vez, a quantia de R$ 3.000,00, despendida em 23.10.2020, teria sido paga a destinatário diverso do fornecedor declarado na prestação de contas.

Pois bem.

Com relação ao cheque na quantia de R$ 3.000,00, verifica-se que houve um erro material registrado no parecer técnico, pois, nos extratos bancários, não há registro de débito no dia 23.10.2020, sendo correta a data de 26.10.2020 (ID 41308483).

Ainda, o referido cheque de n. 01 envolve a mesma irregularidade já analisada em relação à contratação de músico para a composição de jingles de campanha.

Quantos aos demais apontamentos, os recorrentes afirmam que um dos boletos foi quitado no caixa, mediante saque avulso, e que o outro foi pago por meio de cheque no caixa do banco. Sustentam, também, que, nos comprovantes, estão identificados os pagadores e os beneficiários.

De fato, analisando-se os comprovantes de pagamentos de títulos e os extratos bancários apresentados (IDs 41311183 e 41311233), é possível verificar que os pagamentos em cheque dos boletos foram decompostos, pela própria instituição bancária, em saques seguidos de quitações em dinheiro, em razão de limitações do próprio sistema de compensação para pagamentos de títulos emitidos por outros bancos.

Dessa forma, a despeito da aparente afronta ao art. 38, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, está claro que as quantias foram vertidas aos mesmos fornecedores indicados nos boletos e na prestação de contas, ou seja, o valor de R$ 51,18, em 21.10.2020, para ENDURANCE GROUP B H SITES, e o valor de R$ 500,00, de 03.11.2020, para DLOCAL BRASIL PAGAMENTOS.

Portanto, as operações em análise apresentam meras falhas formais, que não comprometem a efetiva fiscalização e o controle da movimentação financeira dos recorrentes.

 

Percentual das Irregularidades Constatadas

Após análise do conjunto de falhas, remanescem as irregularidades consistentes no recebimento de doação financeira, em espécie, de valor superior a R$ 1.064,10 (R$ 1.500,00), nos gastos eleitorais com combustíveis sem o registro de cessão de veículos (R$ 583,81) e no depósito em dinheiro identificando como doador o CNPJ de campanha (R$ 60,00).

Por consequência, o montante de R$ 1.560,00 (R$ 1.500,00 + R$ 60,00), considerado como recursos de origem não identificada (RONI), deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, por efeito dos arts. 21, § 1º, e 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Contudo, o somatório das falhas perfaz a quantia de R$ 2.143,81, que representa, aproximadamente, 7,9% das receitas declaradas (R$ 26.880,00), ficando, portanto, abaixo do percentual de 10% utilizado como limite para permitir a aprovação das contas com ressalvas por incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, na esteira da jurisprudência desta Corte e do TSE (TRE-RS – REl n. 41060, Relator: DES. ELEITORAL MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, DEJERS de 27/06/2018, e TSE – PC n. 42477, Relator: MIN. OG FERNANDES, DJE de 05.10.2020).

Por conseguinte, a sentença deve ser reformada para aprovar com ressalvas as contas dos recorrentes e reduzir o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 1.560,00 (mil quinhentos e sessenta reais).

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de Everaldo da Silva Moraes e Zenair Jose Molinaro, relativas ao pleito de 2020, e reduzir a determinação de recolhimento de quantias ao Tesouro Nacional para R$ 1.560,00.