REl - 0600042-08.2020.6.21.0001 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/01/2022 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Da Preliminar de Ausência de Citação

A recorrente suscita, em preliminar, ausência de citação, postulando “o afastamento da preclusão decretada em primeiro grau, com o consequente recebimento e acolhimento dos documentos comprobatórios”, uma vez que não teria havido a comunicação processual via mural eletrônico.

Contudo, não lhe assiste razão.

O exame da tramitação do processo revela que a candidata foi intimada do despacho judicial para se manifestar a respeito do exame preliminar de prestação de contas, por intermédio de ato de comunicação via sistema PJe, no dia 08.01.2021, às 14h27min (ID 24001483), encerrando-se o prazo para sua manifestação em 14.01.2021, como certificado no ID 24001583.

Ressalto que a forma de intimação obedeceu à regra expressa prevista no art. 51, caput, da Resolução TRE/RS n. 338/19, vigente à época da realização do ato, segundo a qual, “as intimações, notificações e comunicações, direcionadas à parte representada por advogado […] far-se-ão por meio eletrônico, realizadas diretamente no sistema, dispensada a publicação do ato no Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral ou a expedição de mandado”.

Ainda, conforme disposto na Resolução TSE n. 23.607/19, a previsão específica de realização de intimações pelo mural eletrônico é válida apenas para o período de 15 de agosto a 19 de dezembro.

Consigno que, nos processos de prestação de contas atinentes às Eleições de 2020, os prazos processuais não se suspenderam no período de 7 a 20 de janeiro de 2021, consoante estatuído na Resolução TSE n. 23.632/20, art. 7º, caput, a seguir transcrito:

Art. 7º A fim de assegurar o cumprimento do prazo constitucional para julgamento das contas dos candidatos eleitos até 12 de fevereiro de 2021, os prazos voltarão a fluir, nos processos de prestação de contas relativas às Eleições 2020, a partir de 7 de janeiro de 2021 (art. 215, inciso I, do CPC).

Assim, em face da regularidade do ato intimatório, inexiste mácula processual a ser reconhecida por este Colegiado, razão pela qual afasto a matéria preliminar arguida.

 

Da Preclusão para Juntada de Documentos

Ainda em sede preliminar, cumpre analisar a viabilidade do conhecimento dos documentos não considerados em primeira instância em razão da preclusão.

Sobre o tema, este Tribunal Regional, sempre em juízo de exceção, tem se pautado pela potencialização do direito de defesa no âmbito dos processos de prestação de contas, especialmente quando se trata do conhecimento em segunda instância de documentos simples, que dispensem a necessidade de nova análise técnica ou de diligências complementares, não apresentando prejuízo à tramitação processual.

O posicionamento encontra respaldo no art. 266 do Código Eleitoral e está amparado pela reiterada jurisprudência deste Tribunal, conforme ilustra a ementa da seguinte decisão:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINARES. EFEITO SUSPENSIVO. NÃO CONHECIDO. DOCUMENTOS NOVOS EM GRAU RECURSAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO. DOAÇÃO. OMISSÃO DE RECEITAS E GASTOS ELEITORAIS. COMPROVAÇÃO. PROVIMENTO. APROVAÇÃO DAS CONTAS.

1. Preliminares. 1.1. Enquanto houver recurso pendente de análise jurisdicional, a sentença não gera qualquer restrição à esfera jurídica da parte, de modo que, conferido de forma automática e ex lege, não se vislumbra interesse no pleito de atribuição judicial de efeito suspensivo ao recurso. Não conhecimento. 1.2. Admitida a apresentação extemporânea de documentação, em grau recursal, nos termos do art. 266 do Código Eleitoral. Cabimento de novos documentos, não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura puder sanar irregularidades e não houver necessidade de nova análise técnica.

2. Mérito. No caso dos autos, as falhas foram corrigidas pela documentação acostada, com a comprovação das doações, de forma a coincidir com a arrecadação dos valores oriundos das Direções Municipal e Estadual da agremiação, bem como pela compatibilidade das declarações de doador e candidata. Irregularidades sanadas. Confiabilidade e transparência das contas de campanha da candidata que não restaram comprometidas. Aprovação.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n 37503, ACÓRDÃO de 07.03.2018, Relator: DES. ELEIORAL JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 09.03.2018, Página 2.) (Grifei.)

 

Assim, conheço dos documentos apresentados após o decurso do prazo fixado pelo juízo em primeira instância e pertinentes às alegações recursais.

Prossigo, passando ao exame do mérito.

 

Do Mérito

A sentença recorrida aprovou com ressalvas as contas de TANISE AMALIA PAZZIM e determinou o recolhimento do montante de R$ 12.500,00 (doze mil e quinhentos reais) ao Tesouro Nacional, com fundamento nas seguintes irregularidades: a) despesa com locação de imóvel, quitada com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), sem a juntada de comprovação da propriedade do imóvel em nome do locador; b) insuficiência na comprovação de despesas com atividades de militância e mobilização de rua, pagas com recursos do FEFC, especificamente em relação às contratações de Guilherme Jacob de Oliveira, Elisângela Silva dos Santos e Daniel Menezes da Silva, e c) inconsistência no recebimento de doação advinda de Suelyn Barili Azeredo.

Passo ao exame individualizado dos apontamentos.

 

a) Ausência de Comprovação de Propriedade do Imóvel Alugado para Comitê de Campanha

Em relação à primeira irregularidade, o magistrado sentenciante considerou que a despesa de locação de imóvel, localizado na Avenida Nonoai n. 1576, no Bairro Nonoai, na cidade de Porto Alegre, para constituição de comitê de campanha, no valor de R$ 7.500,00, paga com recursos do FEFC, não foi devidamente comprovada em razão da ausência de apresentação de prova da propriedade do referido imóvel em nome de CHARLES LUIZ PAIM, pessoa física que figura como locador no contrato particular firmado com a candidata.

A recorrente afirma a existência de erro de digitalização de documentos comprobatórios inicialmente apresentados e demonstra a propriedade do imóvel com a juntada de escritura relativa ao bem, em que se constata que o locador signatário do contrato de locação é o titular do bem (ID 24002083).

Assim, comprovada a propriedade do imóvel por documentação idônea, a irregularidade em questão fica devidamente sanada.

 

b) Comprovação com Atividades de Militância e Mobilização de Rua

Nesse tópico, a sentença apontou três irregularidades, envolvendo as contratações de Guilherme Jacob de Oliveira, Elisângela Silva dos Santos e Daniel Menezes da Silva, acolhendo a manifestação técnica assim deduzida:

E) Despesa com Atividade Militância e Mobilização de Rua – fornecedor GUILHERME JACOB DE OLIVEIRA:

Verificou-se irregularidade no registro do pagamento de despesa de prestação de serviço fornecida por GUILHERME JACOB DE OLIVEIRA, no valor de R$ 3.500,00, pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, conforme citado no item 2.3 do Relatório de Exame de Contas (ID 70522906).

Consultando o extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE no site http://divulgacandcontas.tse.jus.br, constatou-se que, nos dados da contraparte recebedora, consta o CPF 384.716.200-49, o qual pertence a BRENO SANTOS DE OLIVEIRA, administrador financeiro da campanha da candidata, infringindo, portanto, o disposto no art. 38, II da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

F) Despesa com Atividade de Militância e Mobilização de Rua – fornecedor ELISANGELA SILVA DOS SANTOS:

Conforme apontado no item 2.5 do Relatório de Exame de Contas (ID 70522906), observou-se falha na apresentação do documento de comprovação de despesa contratada perante ELISANGELA SILVA DOS SANTOS (CPF 728.380.350-53), no valor de R$ 500,00, pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Nos autos, foi juntado contrato de prestação de serviço (ID 61642931) em nome de ELISA OLIVEIRA FRANCO DE MELLO (CPF 764.130.390-00).

Restou não comprovada a despesa, em desacordo como que determina o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

G) Despesa com Atividade de Militância e Mobilização de Rua – fornecedor DANIEL MENEZES DA SILVA:

Conforme apontado no item 2.6 do Relatório de Exame de Contas (ID 70522906), observou-se falha na apresentação do documento de comprovação de despesa contratada perante DANIEL MENEZES DA SILVA (CPF 059.118.760-43), no valor de R$ 500,00, pagos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Nos autos, foi juntado contrato de prestação de serviço (ID 61642906) em nome de DAVI MENEZES DA SILVA (CPF 059.118.630-65).

Restou não comprovada a despesa, em desacordo como que determina o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

Quanto ao primeiro contratado, a recorrente afirma que o pagamento em favor de Breno Santos de Oliveira se deve ao fato de este ser genitor de Guilherme Jacob de Oliveira e titular da conta-corrente em relação à qual a conta mesada do prestador de serviços está vinculada.

De fato, ao verificar a imagem do cartão bancário juntada (ID 24002433), percebe-se que os dados da conta bancária do Banrisul em nome de Guilherme Oliveira, sob o n. 35.820255.1-9, conferem com aqueles constantes no extrato bancário eletrônico, remanescendo tão somente a divergência em relação ao CPF lançado no demonstrativo de movimentação da conta bancária, o qual pertence a Breno de Oliveira. Confira-se (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/88013/210000763436/extratos):

 

Em reforço, a recorrente acostou o recibo de transferência correspondente à operação, na qual se revela como destinatário Guilherme Jacob de Oliveira, para a finalidade expressa de “pagto salário cabo eleitoral” (ID 24003333, fl. 4):

Diante de tais documentos, entendo que está devidamente comprovada a reversão das quantias pagas em benefício do cabo eleitoral, tornando plenamente plausível a justificativa de que a divergência no CPF registrado no extrato eletrônico se deve à conta do contratado ser do tipo “mesada” e manter uma relação de dependência com a conta de titularidade de seu genitor.

Quanto a essa despesa, o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, da lavra do ilustre Dr. Fábio Nesi Venzon, anota outra questão pertinente à contratação, qual seja, eventual discrepância de valores entre a despesa em tela e outras semelhantes sob as mesmas condições contratuais:

Não podemos deixar de observar que os valores pagos a Guilherme Jacob de Oliveira, para a atividade de cabo eleitoral, destoam completamente do que foi pago aos demais cabos eleitorais. Nesse sentido, Elisângela Silva dos Santos e Daniel Menezes da Silva receberam R$ 250,00 por semana, enquanto Guilherme Jacob de Oliveira teria recebido R$ 3.500,00 por um mês de trabalho (o contrato foi firmado em 16.10.20). É dizer, Guilherme recebeu R$ 875,00 por semana, o triplo dos demais, para atividade que, conforme os contratos acostados ao recurso, seria idêntica. Sendo que o art. 35, §12, da Resolução TSE 23.607/2019 prevê que “As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral dos prestadores de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado”. Nos presentes autos não há qualquer justificativa para essa disparidade de valores para a mesma atividade.

 

Embora as considerações sejam pertinentes, a irregularidade apontada no exame técnico, sobre a qual a prestadora exerceu seu direito de defesa, circunscreveu-se apenas à divergência no CPF anotado em relação ao favorecido pelo pagamento, ponto superado por meio dos documentos acostados.

Dessa forma, penso que, em sede recursal, reconhecer irregularidades diversas daquelas constantes no exame técnico, em relação às quais a prestadora de contas não teve oportunidade de se manifestar de forma específica e que sequer foram analisadas na sentença, seria incorrer em inovação incabível nessa etapa do processo.

As duas irregularidades remanescentes quanto à comprovação de gastos com recursos do FEFC dizem respeito à juntada de contratos de prestação de serviços com Elisângela Silva dos Santos e com Daniel Menezes da Silva.

A prestadora de contas alegou equívoco na juntada original dos documentos e trouxe aos autos os contratos firmados com Elisângela (ID 24002183) e Daniel (ID 24002233), afastando a mácula constante da sentença.

Considero superadas, portanto, todas as irregularidades relativas aos gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

 

c) Inconsistência no Recebimento de Doação de Suelyn Barili Azeredo

A última irregularidade diz respeito ao recebimento de doação, no valor de R$ 500,00, realizada por Suelyn Barili Azeredo, sobre a qual o extrato bancário da conta de campanha identifica que o crédito corresponde ao CPF n. 026.068.250-04, pertencente a Guilherme Eliaquim Oliveira do Amaral, que não está incluído entre os doadores da campanha.

A recorrente afirma que Guilherme Eliaquim Oliveira do Amaral é marido de Suelyn Barili Azeredo, sendo o titular da conta conjunta na qual ela figura como dependente, e junta aos autos cópia de “TED Outra Titularidade” (ID 24002383).

O comprovante colacionado aos autos, o qual indica o nome de Suelyn Barili Azeredo, cujos números da agência e da conta-corrente conferem com aqueles constantes na conta de campanha que recebeu a doação, é apto a comprovar a origem dos recursos recebidos pela candidata, de maneira que esta irregularidade está também saneada.

Assim, analisados os documentos juntados aos autos, é possível superar as irregularidades apontadas na análise técnica e aprovar sem ressalvas as contas da candidata, afastando a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto por dar provimento ao recurso para aprovar as contas de TANISE AMALIA PAZZIM, relativas às Eleições 2020, e afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.