PCE - 0602516-23.2018.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/12/2021 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

Os embargos são tempestivos.

Anoto que esta espécie recursal possui fundamentação vinculada, sendo cabível tão somente para sanar os defeitos do ato judicial, taxativamente indicados no artigo 1.022 do Código de Processo Civil, ou seja, (a) obscuridade, (b) contradição, (c) omissão ou (d) erro material.

É sabido que a presença de tais vícios é relevante tanto para o juízo de admissibilidade da irresignação quanto para o exame do mérito.

No primeiro caso, verifica-se a presença em abstrato do vício, sendo a segunda etapa o exame em concreto. Dessa forma, a mera alegação da existência de um dos vícios descritos pela lei autoriza o conhecimento do recurso, sendo a análise da existência concreta de tal vício matéria de mérito.

Alegado o vício, o recurso é admissível; existente o vício alegado, o recurso é provido; caso contrário, nega-se provimento ao recurso (Barbosa Moreira, citado por NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil – volume único. 9. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 1702).

Tendo o embargante sustentado a existência de erro material, contradição e omissão no acórdão, a interposição é adequada, de forma a comportar conhecimento por estarem preenchidos, também, os demais pressupostos de admissibilidade.

 

Do Mérito

No mérito, o recurso insurge-se contra o acórdão que, à unanimidade, desaprovou as contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO TRABALHISTA CRISTÃO – PTC, relativas às eleições de 2018, com fundamento no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17, determinou o recolhimento da quantia de R$ 27.000,00 (vinte e sete mil reais) ao Tesouro Nacional e impôs a suspensão, pelo prazo de 5 (cinco) meses, do recebimento de quotas do Fundo Partidário.

A ementa do acórdão embargado restou assim redigida:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2018. PARTIDO POLÍTICO ESTADUAL. IRREGULARIDADES GRAVES. APRESENTAÇÃO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS. SEM MOVIMENTAÇÃO E FORA DO PRAZO LEGAL. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS. OMISSÃO DO REGISTRO DE DESPESAS E DAS DOAÇÕES FEITAS PELO PARTIDO AOS CANDIDATOS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DIVERGÊNCIA ENTRE RECEITAS E DESPESAS NA CONTABILIDADE. PERCENTUAL DAS IRREGULARIDADES. ELEVADO. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SUSPENSÃO DE REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS.

1. Trata-se da prestação de contas do diretório estadual de partido político referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2018.

2. Ausência de declaração das despesas eleitorais e dos valores utilizados para sua quitação. A omissão da escrituração e do trânsito dos valores pela rede bancária impede que se identifique a origem dos recursos utilizados para pagamento dos fornecedores.

3. O § 5º do art. 37 da Resolução TSE n. 23.553/17 estipula que todos os gastos efetuados por candidato ou partido político em benefício de outro candidato ou partido político constituem doações estimáveis em dinheiro, as quais devem ser escrituradas integralmente na contabilidade do partido doador, nos termos do § 3º do art. 21 da mesma norma. A mácula pela ausência deste registro é irregularidade grave que subsiste, ainda que, no caso concreto, não obrigue o recolhimento ao erário também do equivalente às doações estimáveis para que não ocorra a dupla punição.

3. A omissão da escrituração da despesa e da origem dos recursos utilizados para sua quitação atrai a determinação do recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional. Recursos de origem não identificada, a teor do que dispõe o art. 34 da Resolução TSE n. 23.553/17, não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

4. A prestação de contas foi apresentada fora do prazo, deixando de observar a prescrição contida no art. 52, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17 e, ainda, não foram apresentados extratos bancários de três contas de campanha que o partido declarou titularizar para as eleições de 2018. A falta desses documentos compromete a confiabilidade e transparência da movimentação financeira do partido.

5. As falhas que podem ser mensuradas objetivamente na contabilidade – omissão de despesa e ausência de escrituração de doações estimáveis – atingem montante elevado, devendo ainda lhes serem acrescidas as máculas referentes ao atraso na entrega da documentação e à ausência de extratos bancários. Tais irregularidades comprometem severamente a confiabilidade das contas, impondo o julgamento de desaprovação (art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17).

6. Na hipótese, inviável a aplicação de qualquer regra de proporcionalidade ou razoabilidade, considerando que o partido apresentou a prestação de contas zerada, ou seja, alegou não ter efetuado qualquer movimentação na campanha eleitoral de 2018, além da intempestividade na entrega.

7. Desaprovação das contas, com fundamento no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17. Imposição de recolhimento da quantia referente à omissão de gastos ao Tesouro Nacional e suspensão pelo prazo de 8 (oito) meses do repasse de quotas do Fundo Partidário.

 

Inicialmente, é de se reconhecer a existência de erro material na ementa que refletiu as conclusões do julgado.

O voto estabeleceu que:

Na hipótese, tenho que a suspensão do recebimento de valores do Fundo Partidário pelo ano seguinte seria por demais rigorosa, sendo suficiente que o prazo fixado seja de 05 (cinco) meses.

 

Assim sendo, de fato, houve erro de ordem material, uma vez que o acórdão condenou a agremiação à suspensão, pelo prazo de 5 (cinco) meses, do recebimento de quotas do Fundo Partidário, tendo a ementa, porém, indicado o período de 8 (oito) meses.

Portanto, a ementa do acórdão embargado deve conter a seguinte redação, na parte final de seu item n. 7: “Imposição de recolhimento da quantia referente à omissão de gastos ao Tesouro Nacional e suspensão pelo prazo de 5 (cinco) meses do repasse de quotas do Fundo Partidário”.

O mesmo não ocorre em relação à suposta contradição entre premissa fática e consequência jurídica aplicada.

A decisão inicialmente tratou do mérito das contas para, em seguida, fixar as sanções, verbis:

Repriso que as falhas que podem ser mensuradas objetivamente na contabilidade – omissão de despesa e ausência de escrituração de doações estimáveis – atingem o montante de R$ 50.688,03 (cinquenta mil, seiscentos e oitenta e oito reais e três centavos). A estas, devem ser acrescidas as máculas referentes ao atraso na entrega da documentação e à ausência de extratos bancários.

 

Tais irregularidades comprometem severamente a confiabilidade das contas, impondo o julgamento de desaprovação (art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17).

 

Na hipótese, sequer é possível cogitar a aplicação de qualquer regra de proporcionalidade ou razoabilidade, considerando que o partido apresentou a prestação de contas zerada, ou seja, alegou não ter efetuado qualquer movimentação na campanha eleitoral de 2018, além de ter declarado a destempo.

 

Ainda, a irregularidade do item 1 – omissão de despesas, atrai a determinação de recolhimento dos valores equivalentes ao Tesouro Nacional.

Por fim, em casos como o dos autos, este Tribunal Regional vem impondo a suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, in verbis:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS. UTILIZAÇÃO DE CONTA ÚNICA PARA MOVIMENTAÇÃO DE DIFERENTES RECURSOS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS DE DESPESAS REALIZADAS COM RECURSOS PÚBLICOS. OMISSÃO DO REGISTRO DE DESPESAS. DOAÇÕES IRREGULARES. NÃO COMPROVADA APLICAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO EM COTAS DE GÊNERO. DIVERGÊNCIA DE RECEITAS E DESPESAS NA CONTABILIDADE. ALTO PERCENTUAL DAS IRREGULARIDADES. INVIABILIZADA APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DE REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas de diretório estadual partidário referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2018.

[...]

9. Consectários legais. As irregularidades graves comprometem a higidez e a confiança na contabilidade, envolvendo o percentual de 71,6% das receitas declaradas pelo partido, o que inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade para atenuar a importância das máculas sobre a regularidade. Impositiva a desaprovação das contas, com recolhimento do montante de R$ 8.598,50 ao Tesouro Nacional e, considerando a representatividade das irregularidades sobre o total da arrecadação, aplicada sanção de 8 (oito) meses de suspensão do recebimento do Fundo Partidário.

10. Desaprovação.

(Prestação de Contas n 060251975, ACÓRDÃO de 25/03/2021, Relator DES. ELEITORAL SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. OMISSÃO DE RECEITAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. OMISSÃO DE DOAÇÕES ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO. IRREGULARIDADES DE VALOR EXPRESSIVO E EQUIVALENTE A 42,3% DO TOTAL ARRECADADO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas partidária. Arrecadação e dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2018.

[...].

5. Irregularidades envolvendo valores expressivos, representando 42,3% de toda a receita declarada para a campanha.

6. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional. Suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo período de cinco meses.

(Prestação de Contas n 060252752, Relator DES. ELEITORAL GERSON FISCHMANN, julgado em 08.06.21) (Grifei.)

 

Na hipótese, tenho que a suspensão do recebimento de valores do Fundo Partidário pelo ano seguinte seria por demais rigorosa, sendo suficiente que o prazo fixado seja de 05 (cinco) meses.

 

Assim, encontrando-se irregulares as contas, na esteira da análise técnica e do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, merecem ser desaprovadas por este Tribunal, consoante o disposto no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela desaprovação das contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO TRABALHISTA CRISTÃO – PTC, relativas às eleições de 2018, com fundamento no art. 77, inc. III, da Resolução TSE n. 23.553/17, pela determinação de recolhimento da quantia de R$ 27.000,00 (vinte e sete mil reais) ao Tesouro Nacional e pela suspensão, pelo prazo de 5 (cinco) meses, do recebimento de cotas do Fundo Partidário.

 

Dessa forma, em um primeiro momento, verificou-se se seria o caso de aprovação, se as contas estivessem regulares; pela aprovação com ressalvas, quando verificadas falhas que não lhes comprometessem a regularidade; desaprovação, se constatadas falhas que lhe maculassem a regularidade; ou não prestação, tudo nos termos do art. 77, caput e incisos, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Na hipótese, considerou-se que as irregularidades reconhecidas comprometiam severamente a confiabilidade das contas, impondo o julgamento de desaprovação.

Na etapa seguinte, explicitou-se que, do reconhecimento da omissão de despesas, decorreria a determinação de recolhimento dos valores equivalentes ao Tesouro Nacional.

Concluindo a fixação das sanções, ao analisar a questão da suspensão da distribuição de recursos do Fundo Partidário, iniciou-se por colacionar precedentes deste Tribunal Regional em casos semelhantes: prestações de contas de órgão partidários relativas às eleições 2018.

Nesses julgados específicos, houve desaprovação das contas e determinação de suspensão do Fundo Partidário pelo prazo de 8 (oito) meses e 5 (cinco) meses, respectivamente.

A partir de tais parâmetros, o acórdão expressamente consignou que “a suspensão do recebimento de valores do Fundo Partidário pelo ano seguinte seria por demais rigorosa, sendo suficiente que o prazo fixado seja de 05 (cinco) meses”.

A conclusão exposta se coaduna com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, pela qual a aplicação da referida penalidade não se esgota em uma aferição meramente matemática entre o valor da falha e o prazo fixado, pois “ao julgador cabe ponderar todas as circunstâncias do caso concreto na análise da sanção mais adequada” (REspe n. 33-50/RS, Relator: MINISTRO HENRIQUE NEVES, DJe de 18.10.2016), bem como, “diante da nova sistemática de financiamento dos partidos, com a proibição de doação por pessoa jurídica, é de se primar pela busca de reprimenda que iniba o descumprimento das normas concernentes à prestação de contas e igualmente permita a continuidade de suas atividades” (REspe n. 7237, Relator MINISTRO TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO, DJE de 02.10.2018).

No caso dos autos, tendo havido a apresentação de contas zerada, tornou-se impossível mensurar o percentual de irregularidades em relação à arrecadação do partido, de forma que os parâmetros considerados foram tão somente a natureza dos recursos envolvidos – ausência de recursos públicos – e a diretriz tendente a permitir a continuidade do regular funcionamento do órgão partidário.

Assim, não havendo máculas inusuais ou especialmente grave em relação ao que se verifica de ordinário nas ações da espécie, a fim de permitir a continuidade do funcionamento do partido político, a suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário pelo prazo de 5 (cinco) meses é a medida adequada.

Em conclusão, os embargos devem ser providos para o reconhecimento do erro material constante na ementa e para que se complemente a fundamentação quanto à fixação do prazo de suspensão do repasse de recursos do Fundo Partidário, sem modificação no conteúdo ou sentido do julgado embargado, mantido em sua totalidade.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo conhecimento e parcial acolhimento dos embargos de declaração para reconhecer o erro material na ementa do acórdão, no qual deve constar a suspensão, pelo prazo de 5 (cinco) meses, do recebimento de quotas do Fundo Partidário, e para complementar o acórdão quanto à fixação desse prazo, nos termos da fundamentação, negando-lhes, entretanto, efeitos infringentes.