REl - 0600528-31.2020.6.21.0150 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/12/2021 às 10:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Do Mérito

As contas do recorrente foram desaprovadas com base no parecer conclusivo de exame técnico das contas (ID 40255833), que identificou irregularidade na transferência do valor de R$ 2.605,00 para a conta bancária pessoal do candidato, montante que, por se caracterizar, tecnicamente, como sobras de campanha, deveria ter sido transferido ao partido pelo qual o candidato concorreu.

A fim de evitar tautologia, transcrevo excerto da sentença do Juízo da 150ª Zona Eleitoral, que bem examinou a questão controvertida nos autos:

[...].

 

Contudo, sobreveio novo Relatório Exame de Contas, dando conta de nova irregularidade detectada, por conta de possível transferência irregular de valor para a conta pessoal do candidato realizada após as eleições, sendo o valor transferido caracterizado tecnicamente como sobras financeiras de campanha (ID 78723232).

 

Intimado acerca do novo Relatório exarado, o prestador acostou a Manifestação ID 81214753.

 

Acerca da nova irregularidade, aduz o prestador que os valores não seriam sobras financeiras de campanha e sim valores depositados equivocadamente, sendo feita solicitação ao estabelecimento bancário de que fosse feito o estorno, sendo a devolução comprovada conforme nota explicativa acostada aos autos.

 

[…].

 

Em atendimento ao princípio do contraditório, o prestador foi intimado a fim de prestar esclarecimentos e/ou sanar a falha apontada, tendo acostado manifestação dando conta de que o valor identificado como sobra financeira teria sido depositado por engano, bem como sido estornado pelo estabelecimento bancário.

 

Contudo, não merecem respaldo os argumentos trazidos pelo prestador.

 

O valor de R$ 2.605,00, supostamente “depositado” por engano, foi na realidade aportado na conta de campanha do candidato por transferência interbancária em 27.10.2020, não ocorrendo para o referido valor a modalidade denominada “depósito”.

 

[...].

 

No caso, o recorrente não nega o aporte para a campanha de R$ 2.605,00 com recursos próprios, mas sustenta que ocorreu um depósito equivocado na conta de campanha e que, tão logo verificado o erro cometido na transferência dos recursos, solicitou o “estorno”.

Alega, ainda, que, por conta da pandemia e em razão das dificuldades de acesso à agência bancária, a operação de restituição ocorreu 21 dias depois, apenas em 16.11.2020. Assim, defende que não se trata de sobra de campanha, mas de valores depositados por equívoco e devolvidos, sem utilização na campanha.

Ocorre que, compulsando os autos, se verifica, como bem ressaltado na sentença, que houve uma transferência interbancária, no valor de R$ 2.605,00, em 27.10.2020, da conta pessoal do candidato para a conta de campanha.

Embora o candidato tenha afirmado que houve um equívoco ao transferir a referida quantia, que tais recursos não representam doação eleitoral e que não foram utilizados na campanha, não há prova mínima que confira suporte às suas alegações.

Os valores destinados para a campanha foram realizados por meio de transferência eletrônica da conta pessoal do candidato, em observância à forma exigida no art. 21, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ao contrário do que defende o recorrente, a nota explicativa acostada aos autos (ID 40254083) não comprova uma operação de estorno, mas, sim, a realização de uma transferência interbancária, em conformidade com o registro também constante no extrato bancário (ID 40253983, fl. 2).

Outrossim, não há como acolher a tese de equívoco no crédito original, pois, consoante apontou o exame técnico, o aporte financeiro, ocorrido em 27.10.2020, foi utilizado na campanha para o pagamento, na data de 12.11.2020, do fornecedor TRIANGULLO GRAFICA E EDITORA LTDA., CNPJ 07.104.434/0001-80, conforme Nota Fiscal n. 027.589 e extrato bancário relativo à conta de campanha (IDs 40253633 e 40253883, fl. 2).

Por elucidativo, transcrevo trecho do minucioso parecer conclusivo sobre as contas (ID 40255833):

Assim, a operação que aportou o valor de R$ 2.605,00 foi realizada por transferência interbancária em 27.10.2020, sendo o referido valor utilizado para pagamento da despesa de igual valor, em 12.11.2020, junto ao fornecedor TRIANGULLO GRAFICA E EDITORA LTDA, CNPJ 07.104.434/0001-80 (Nota Fiscal ID 72736335), não havendo de se cogitar depósito do referido valor realizado por engano, pois o valor foi utilizado para pagamento do referido fornecedor.

 

No ponto, a legislação eleitoral estabelece que constituem sobras de campanha a diferença positiva entre recursos financeiros arrecadados e os gastos realizados, as quais devem ser transferidas ao órgão partidário, conforme a origem do recurso e a filiação do candidato, a teor do art. 50, inc. I e § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 50. Constituem sobras de campanha:

I - a diferença positiva entre os recursos financeiros arrecadados e os gastos financeiros realizados em campanha;

[...].

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos e a filiação partidária do candidato, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

 

Assim, as arrecadações financeiras não utilizadas são consideradas sobras de campanha e não podem ser restituídas ao candidato, ainda que se trate de recursos próprios em sua origem.

No mesmo sentido, colaciono julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DESAPROVADAS. IRREGULARIDADES GRAVES. ART. 77, III, DA RES.–TSE 23.553/2017. SUSTENTAÇÃO ORAL. INDEFERIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. ART. 937, VI, § 3º, DO CPC/2015. SOBRAS DE CAMPANHA. RECURSOS PRÓPRIOS. ESTORNO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. NEGATIVA DE PROVIMENTO.1. No decisum monocrático, manteve–se aresto unânime do TRE/MG, que desaprovou as contas de campanha do agravante, candidato ao cargo de deputado estadual em 2018, e determinou o recolhimento de valores ao erário.2. Ausência de cerceamento de defesa pelo TRE/MG quanto ao pedido de sustentação oral. Inexiste previsão na lei para a prática do ato em sede de agravo interno, sendo cabível somente em ação rescisória, mandado de segurança e reclamação (art. 937, VI, § 3º, do CPC/2015). Precedentes.3. No que se refere às sobras de campanha, inviável a restituição ao candidato, ainda que originalmente se trate de recursos próprios, porquanto não há previsão legal para que assim se proceda e existe entendimento desta Corte Superior no sentido de que "o aporte de recursos próprios na campanha eleitoral [...] submete–se aos mesmos requisitos formais das doações realizadas por terceiros" (AgR–REspe 310–48/RS, redator para acórdão Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 28/2/2020). 4. Nesse contexto, não é lícito ao intérprete da lei criar nova modalidade de estorno, de modo que se deve aplicar ao caso a regra contida no § 1º do art. 53 da Res.–TSE 23.553/2017, que determina o recolhimento dos valores ao ente partidário. 5. Agravo interno a que se nega provimento.

(RESPE n. 060308898, Acórdão, Relator: MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 89, Data 18.5.2021) (Grifei.)

 

Do Percentual da Irregularidade Constatada

Desse modo, a falha apontada alcança a cifra de R$ 2.605,00, que representa 35,56% das receitas declaradas pelo candidato (R$ 7.325,00) e compromete substancialmente a confiabilidade e transparência do conjunto das contas, o que inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Assim, a sentença recorrida deve ser mantida em sua integralidade.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso para manter a sentença que desaprovou as contas de Dilceu Medeiros Lopes, relativas ao pleito de 2020, e determinou o recolhimento das sobras financeiras de campanha, no valor de R$ 2.605,00, ao Diretório Municipal do PDT, na forma do art. 5º, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.