REl - 0600286-51.2020.6.21.0060 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/12/2021 às 10:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo, e presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

Trata-se de recurso interposto por SILVIO COITINHO SOUZA, candidato ao cargo de vereador no Município de Pelotas, contra a sentença do Juízo da 60ª Zona Eleitoral que desaprovou suas contas de campanha relativas às eleições 2020, em razão de irregularidade em gastos efetuados com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. A decisão hostilizada determinou o recolhimento do valor de R$ 9.390,00 ao Tesouro Nacional.

Com efeito, verifico que os extratos bancários indicam que os cheques n. 000006, de R$ 5.790,00, e n. 000011, de R$ 3.600,00, foram descontados por “terceiros” sem registro de contraparte a indicar a ausência de nominalidade e cruzamento.

A situação é regulamentada pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

 

A parte recorrente apresentou canhotos dos cheques, contratos e recibos com o fim de provar a regularidade no pagamento das despesas.

Adianto que não assiste razão.

A apresentação de tais documentos não comprova o cumprimento da exigência legal de preenchimento das cártulas de modo nominal e cruzado.

Ressalto que a comprovação segura da aplicação das verbas usadas na campanha eleitoral se faz por meio dos documentos idôneos, corretamente preenchidos e movimentados conforme determinam as regras eleitorais, nos termos dos arts. 53, inc. II, al. "c", e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, como bem esclarece o douto Procurador Regional Eleitoral:

Com efeito, tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento dos valores, apontando-se, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.

Por outro lado, se os valores não transitam pelo sistema financeiro nacional, é muito fácil que sejam, na realidade, destinados a pessoas que não compuseram a relação indicada como origem do gasto de campanha.

Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo, pois, necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi ele quem efetivamente recebeu o referido valor.

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se tratam de recursos públicos, como são as verbas recebidas via FP ou FEFC.

Ademais, a obrigação para que os recursos públicos recebidos pelos candidatos sejam gastos mediante forma de pagamento que permite a rastreabilidade do numerário até a conta do destinatário (crédito em conta), como se dá com o cheque cruzado (art. 45 da Lei 7.357/85), assegura, outrossim, que outros controles públicos possam ser exercidos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

 

Enfatizo que, acertadamente, a sentença determinou recolhimento dos valores, pois a receita utilizada para os pagamentos teve origem em verba pública.

Ainda, o recorrente afirma que “a se admitir eventual erro formal não há de autorizar a rejeição das contas e a cominação de sanção ao candidato, em face da regra contida no art. 30, § 2º, da mesma Lei das Eleições.”, o qual reproduzo:

§ 2º Erros formais e materiais corrigidos não autorizam a rejeição das contas e a cominação de sanção a candidato ou partido.

 

Aqui, os argumentos não merecem guarida.

A irregularidade é grave, não havendo falar em erro formal ou erro material corrigido. O emprego de verbas públicas sem comprovação do destino dos recursos fere a lisura das contas e impede esta Justiça Especializada e a sociedade de exercerem a devida fiscalização das práticas financeiras dos candidatos.

Por fim, destaco que a sentença hostilizada desaprovou as contas de forma alinhada ao entendimento desta Corte e também do Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, que utilizam o parâmetro de R$ 1.064,10 estabelecido no art. 43, caput, e referido no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, como autorizador da aplicação do postulado da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, e na hipótese a irregularidade alcança 36,60% das receitas declaradas, R$ 25.650,00, e seu valor absoluto, R$ 9.390,00, ultrapassa o parâmetro referido.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso.