REl - 0600489-90.2020.6.21.0099 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/12/2021 às 10:00

VOTO

 

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, os embargos de declaração servem para afastar obscuridade, omissão, contradição ou erro material, nos termos do art. 275, incs. I e II, do Código Eleitoral e art. 1.022 do CPC.

Por sua vez, o recorrente sustenta, em síntese, que houve contradição no acórdão quanto à aferição da irregularidade consistente na ausência de comprovação de gastos com combustíveis quitados com verbas do FEFC, na aplicação da sanção de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional e na modulação do percentual da multa aplicada.

Adianto que não assiste razão ao embargante.

A matéria foi analisada no voto condutor do julgado, de minha relatoria, nos seguintes termos:

(…)

II – Da ausência de comprovação de gastos com combustíveis, quitados com recursos do FEFC, em proveito da própria campanha

Quanto ao ponto, a decisão recorrida concluiu que, nos gastos de R$ 3.379,11 com combustíveis, alegadamente efetuados em favor da própria campanha, não foram observados os requisitos reclamados pelo art. 35, § 11, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, consoante os seguintes fundamentos:

O prestador apresentou, em sua Prestação de Contas Retificadora, os termos de cessão de uso de veículos, nos documentos ID 77537276, 77537278, 77537279, 77537282 e 77537283 e também o Relatório de Despesas com Combustível Semanal (documento ID 77536911).

Analisando tais documentos, verifica-se que os requisitos do inciso II do art. 35, §11º, não foram cumpridos, posto que:

a) os veículos não foram “declarados originariamente na prestação de contas”, tendo em vista que as cessões de uso dos veículos para a campanha só foram trazidas aos autos após a apresentação de Prestação de Contas Retificadora, em 08/02/2021. Além disso, todos os termos de cessão são datados de 05/02/2021, mais de 2 meses após a realização das Eleições, conforme docs. ID 77537276, 77537278, 77537279, 77537282 e 77537283;

b) o Relatório de Despesas com Combustível Semanal apresentado não detalha “o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente”, conforme se vê em relação à despesa de R$ 2.999,64, a qual tem em sua descrição apenas “COMBUSTIVEL DECIMO PEDRO” e a data de 13/11/2020.

Desse modo, as despesas com combustível, no valor de R$ 3.379,11, devem ser consideradas irregulares, por violação ao art. 35, §11º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

De seu turno, as razões dos prestadores aduzem que as falhas seriam de caráter formal, bem como que as divergências de datas lançadas nos contratos escritos de cessão dos veículos se justificam porque a contratação foi verbal, ocorrendo a formalização de instrumento escrito apenas em 05.02.2021.

Ora, os próprios candidatos admitem que não lograram sanear a falha em tempo oportuno, vindo a apresentar, após as eleições, termos de cessão inequivocamente pós-datados e, por essa razão, inidôneos para a prova pretendida.

Conforme bem ponderou a Procuradoria Regional Eleitoral:

Por outro lado, o fato de as datas de assinatura dos termos de cessão juntados ser de momento posterior às eleições lança dúvidas sobre a confiabilidade desses documentos como prova de que esses veículos realmente teriam sido empregados em campanha, constituindo a alegação de que teriam sido celebrados verbalmente uma mera informação unilateral, destituída de qualquer suporte nos autos. Importante ressaltar, mais uma vez, que as informações sobre esses gastos somente vieram à tona após identificada a omissão da referida conta bancária pela unidade técnica.

Cumpre anotar, ainda, que, embora o art. 60, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispense de comprovação na prestação de contas a cessão de bens móveis até o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), é imperiosa a consignação dos bens cedidos e de seus valores nos demonstrativos da prestação de contas, conforme prescrito no § 5º daquele artigo, o que não ocorreu na hipótese em forma e tempos devidos.

Destarte, como apontado na instância a quo, não houve cumprimento do prescrito no art. 35, § 11, inc. II, als. “a” e “b”, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez que os veículos não foram contabilizados originariamente na prestação de contas e os termos de cessão produzidos não se mostram idôneos ao suprimento da falha, bem como o “Demonstrativo de Despesas com Combustíveis Semanal” não detalha “o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim” (ID 30432333).

Por essa razão, permanece a irregularidade referente à insuficiente comprovação dos gastos em questão, o que enseja a restituição da quantia ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

(…)

V – Da extrapolação do limite legal para autofinaciamento de campanha

No concernente à última irregularidade, é incontroverso que a candidata Adriana Perin empregou em sua campanha recursos próprios que superam em R$ 20.974,98 o limite previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, correspondente a 10% do teto de gastos estabelecido para o cargo de vereador no Município de Nonoai, ou seja, R$ 12.307,74.

Em suas razões, os recorrentes não controvertem a utilização dos recursos, mas alegam que, dentro da quantia de R$ 16.932,72 transferida pela candidata Adriana para a conta de campanha, em 15.12.2020, estão alocados R$ 7.300,00 provenientes de doação de seu esposo Salmo Dias de Oliveira e R$ 1.500,00 advindos de sua irmã Simone Perin, acostando comprovantes das correspondentes operações bancárias de crédito à sua conta bancária particular.

Ocorre que referidas operações, para se caracterizarem como doações eleitorais, demandariam o efetivo registro na contabilidade de campanha, a emissão de recibo eleitoral (art. 7º da Resolução TSE n. 23.607/19), bem como a transferência bancária ou o depósito mediante cheque cruzado e nominal diretamente na conta bancária de campanha (art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), o que não ocorreu na espécie.

Destaca-se que a omissão das supostas contribuições na contabilidade de campanha permaneceu mesmo após a entrega das contas retificadoras pelos recorrentes.

Em verdade, todas as transferências bancárias efetuadas em 15.12.2020 para a conta eleitoral específica, no montante de R$ 16.932,72, são exclusivamente oriundas da conta bancária de Adriane Perin de Oliveira, não sendo possível, diante da carência de comprovação sobre a finalidade da verba, caracterizar os créditos em conta particular da candidata como doações eleitorais de terceiros, ainda que eventualmente empregados em campanha.

Dessa forma, uma vez verificada a imoderação, a norma incide objetivamente, inclusive como garantia de condições isonômicas entre todos os candidatos, posto que a limitação tem o escopo, em última análise, de proteger a igualdade na disputa, impedindo a utilização de recursos financeiros em medida desproporcional por candidatos que detêm maior capacidade patrimonial.

Diante da caracterização da irregularidade, de rigor a imposição da multa prevista no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97 (art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Quanto ao ponto, os recorrentes pugnam pela redução do montante da multa para 14,36% da importância excedida, o qual corresponde ao percentual que o valor representa em relação ao total dos recursos utilizados na campanha.

Entendo, entretanto, que não merece reparo a decisão monocrática também no ponto em que condenou os prestadores ao recolhimento equivalente a 100% da quantia sobejante, uma vez que, considerando que o excesso representou 170% do limite de gastos legalmente estabelecido para resguardar a isonomia entre os candidatos, a quantia fixada mostra-se adequada, razoável e proporcional às circunstâncias do caso em exame.

 

Conclusão

Assim, as falhas identificadas nas contas alcançam o somatório de R$ 30.123,52 (R$ 652,72 + R$ 3.379,11 + R$ 1.191,42 + R$ 4.000,00 + R$ 20.974,98), cifra que representa 35,53% das receitas declaradas (R$ 84.782,72), tornando inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para a aprovação, ainda que com ressalvas.

(...)

Verifica-se, de forma clara, que todas as teses lançadas no presente recurso, as quais os embargantes sustentam como fundamentos da contradição alegada, foram devidamente tratadas no acórdão recorrido.

No tocante à primeira contradição aventada, os embargantes afirmam que estariam isentos de apresentar comprovação da cessão de bem móvel até R$ 4.000,00, assim a cessão verbal dos automóveis para a campanha não poderia servir de fundamento para reprovação da contabilidade quanto ao gasto do FEFC com combustíveis.

No acórdão o argumento foi expressamente rebatido, explicando que, embora o art. 60, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispense de comprovação na prestação de contas a cessão de bens móveis até o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), seria imperiosa a consignação dos bens cedidos e de seus valores nos demonstrativos da prestação de contas, conforme prescrito no § 5º daquele artigo, o que não ocorreu na hipótese em forma e tempos devidos.

Friso que, conforme constou na decisão recorrida, o gasto eleitoral com combustível somente seria considerado regular, na hipótese de cessão temporária de veículo, se o automóvel fosse declarado originariamente na prestação de contas e se houvesse sido apresentado relatório do qual constasse o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim, nos termos do art. 35, § 11, inc. II, als. “a” e “b”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, o fundamento para a aferição da irregularidade consistiu em outros elementos aquém da cessão verbal ou dos contratos de cessão pós-datados apresentados.

Da mesma forma, inexiste contradição na determinação de recolhimento dos valores irregularmente gastos com recursos proveniente do FEFC, por força do comando previsto no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

No caso dos autos, a utilização de recursos do FEFC para o pagamento de combustível com o desatendimento do comando previsto no art. 35, § 11, inc. II, als. “a” e “b”, da Resolução TSE n. 23.607/19 gerou a irregularidade, a qual acarretou o dever de recolhimento previsto no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, também inexiste contradição ou erro material na modulação da multa estipulada pela extrapolação na doação de recursos próprios para a campanha.

Os embargantes extrapolaram em R$ 20.974,98 o limite, aplicando-se multa de 100%, nos termos do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97 (art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19), sendo que a modulação foi realizada na linha de jurisprudência desta Corte.

Na verdade, os embargantes buscam a rediscussão das matérias afetas ao acerto ou desacerto da decisão (mérito), pretensão que não se coaduna à finalidade da via processual eleita.

Destaco que, conforme entendimento pacífico, a contradição que autoriza o manejo dos embargos de declaração é a contradição interna, verificada entre os elementos que compõem a estrutura da decisão judicial, e não entre a solução alcançada e a solução que almejava o jurisdicionado (REsp 1.250.367/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe de 22/8/2013).

Ainda, no tocante ao prequestionamento da matéria indicada nos embargos, para fins de interposição de recurso perante as instâncias superiores, ressalto que o primordial para o conhecimento dos recursos especial e extraordinário é o enfrentamento da questão jurídica discutida nos autos, o que ocorreu adequadamente no caso em tela.

Por fim, cumpre referir que o art. 1.025 do CPC adotou o prequestionamento ficto, tendo em vista que assim dispõe: "consideram-se incluídos no acórdão os elementos que a embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade".

 

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.