REl - 0600502-32.2020.6.21.0118 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/12/2021 às 10:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

 

Do Mérito

Trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de AUREA REGINA SILVA DE BRITO BAUER e a condenou ao pagamento de multa no valor de R$ 1.015,96, em razão da utilização de recursos financeiros próprios do candidato acima do teto permitido para autofinanciamento, em afronta ao art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A recorrente pugna pela aprovação das contas, sustentando que os dispêndios com serviços advocatícios e contábeis custeados com recursos próprios, no total de R$ 600,00, não estão sujeitos aos limites legais de gastos, de modo que, excluído tal valor, o excesso alcançaria módicos R$ 415,96.

Entretanto, a tese defensiva não prospera, porquanto faz confusão entre limite de gastos de campanha e limite de autofinanciamento.

No caso vertente, a candidata utilizou em sua campanha para a Câmara Municipal recursos financeiros próprios no montante de R$ 2.907,95, excedendo, portanto, o teto de 10% de gastos para o cargo em disputa, estabelecido no citado art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que no Município de Estância Velho restou fixado em R$ 1.891,99.

O art. 4º da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe sobre o montante máximo de despesas para os cargos em disputa nas eleições de 2020, prevendo, em seu parágrafo 5º, que os gastos de contabilidade não se sujeitam a limites de gastos ou a limites que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa, conforme transcrevo:

Art. 4º O limite de gastos nas campanhas dos candidatos às eleições para prefeito e vereador, na respectiva circunscrição, será equivalente ao limite para os respectivos cargos nas eleições de 2016, atualizado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), aferido pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou por índice que o substituir (Lei nº 9.504/1997, art. 18-C).

(...).

§ 5º Os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político, não estão sujeitos a limites de gastos ou a limites que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa (Lei nº 9.504/1997, art. 18-A, parágrafo único).

(Grifei.)

 

Desse modo, a campanha fica jungida ao limite de despesas imposto pela lei para o cargo ao qual concorre, mas pode esse teto ser extrapolado, desde que tal excesso seja utilizado exclusivamente para pagamento de serviços advocatícios ou contábeis relacionados à prestação de serviços em sua campanha eleitoral e em favor desta, ou a processo judicial pertinente.

Nessa hipótese, note-se que o limite para dispêndio com atos relacionados à propaganda eleitoral, por exemplo, que guarda grave potencial para provocar desequilíbrio no pleito, será idêntico para todos os concorrentes a um mesmo cargo, a fim de se evitar preponderância excessiva do poder econômico, ficando livre dos parâmetros legais, tão somente, o desembolso com profissionais da área jurídica e contábil.

De outra banda, o art. 27, § 1º, do diploma normativo em testilha trata do autofinanciamento de campanha, estabelecendo que o candidato somente poderá empregar em sua campanha o máximo de 10% do limite previsto para gastos atinentes ao cargo em que concorrer, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

 

Vê-se, pois, que o limite para custeio da campanha com recursos próprios é objetivo, embora tome por referência o limite legal de gastos relacionados ao cargo em disputa, com esse não se confunde, de modo que as alegações expendidas pelo recorrente não encontram respaldo na legislação afeta ao tema.

Em realidade, todos as arrecadações em campanha provenientes de recursos financeiros próprios, inclusive de bens estimáveis em dinheiro integrantes do patrimônio pessoal do candidato, são consideradas doações eleitorais, submetendo-se à disciplina normativa própria, a qual não ressalva, em seu tratamento, o eventual destino das receitas.

Portanto, os gastos com serviços advocatícios ou contábeis, embora não se sujeitem ao valor máximo total para gastos de campanha, devem ser considerados na aferição do limite legal de autofinanciamento.

Nesse sentido, colaciono o seguinte julgado deste Tribunal Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. DESAPROVADAS. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE GASTOS COM RECURSOS PRÓPRIOS NA CAMPANHA ELEITORAL. VALOR ABSOLUTO REDUZIDO. MANTIDA MULTA IMPOSTA. RETIFICADA DESTINAÇÃO DA PENALIDADE PARA O FUNDO PARTIDÁRIO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

(...).

2. O art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.609/19 trata do autofinanciamento de campanha, estabelecendo que o candidato somente poderá empregar o máximo de 10% do limite previsto para gastos atinentes ao cargo em que concorrer, não havendo exceção a tal preceito. O teto para custeio da campanha com recursos próprios é objetivo, aferido a partir de simples equação matemática. Os gastos com serviços advocatícios ou contábeis, embora não se sujeitem ao valor máximo total para gastos de campanha, devem ser considerados na aferição do limite legal de autofinanciamento.

(...).

4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; REl 0600189-11.2020.6.21.0041, Relator: DES. ELEITORAL SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, sessão de 16.9.2021) (Grifei.)

 

Assim, tendo a candidata ultrapassado o limite permitido para utilização de recursos próprios em R$ 1.015,96, não merece reparo a sentença no ponto em que reconheceu a irregularidade e aplicou multa equivalente a 100% do valor em excesso, medida adequada, razoável e proporcional às circunstâncias do caso em comento.

Conclusão

No caso concreto, portanto, a única irregularidade verificada alcança o valor de R$ 1.015,96, que representa, aproximadamente, 24% dos recursos arrecadados pela candidata (R$ 4.162,95).

O Tribunal Superior Eleitoral tem aprovado com ressalvas as contas de campanha sempre que o montante das irregularidades represente valor absoluto diminuto, ainda que o percentual com relação ao total da arrecadação seja elevado, adotando como referência o valor máximo de R$ 1.064,10 (TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 63967, Acórdão, Relator: MIN. EDSON FACHIN, Publicação: DJE de 06.8.2019).

Dessa forma, considerando-se reduzido o valor nominal da irregularidade, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, nos termos do inc. II do art. 74 da Resolução TSE n. 23.607/19, em face da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Cabe ressaltar que a aprovação das contas com ressalvas não afasta a aplicação de multa eleitoral decorrente do uso de recursos próprios em campanha acima do teto legal, cujo fundamento repousa no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97, independentemente da sorte do julgamento final das contas.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo provimento parcial do recurso para aprovar com ressalvas as contas de Aurea Regina Silva de Brito Bauer, relativas ao pleito de 2020, mantendo a condenação à multa no valor de R$ 1.015,96.