REl - 0600428-83.2020.6.21.0083 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2021 às 10:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e regular, comportando conhecimento.

 

Mérito

PABLO LUIZ ALIEVI MARI, candidato ao cargo de vereador no Município de Sarandi, interpôs recurso contra a sentença proferida pelo Juízo da 83ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas do candidato, com fulcro no art. 74, inc. III, da Resolução TSE 23.607/19, em razão de: (a) comprovação parcial das despesas informadas na prestação de contas; e (b) ausência de comprovação das receitas informadas na prestação de contas.

Conforme constou na sentença recorrida (ID 41604983), o prestador das contas deixou de instruir o processo com os comprovantes das receitas e despesas, o que inviabiliza a aprovação dos registros contábeis. Senão vejamos:

Realizada a análise técnica, restou comprovado que houve a juntada de apenas uma pequena parte da documentação necessária para a efetiva comprovação das despesas informadas na prestação de contas, sendo que em relação às receitas nada foi juntado, afastando a tão almejada transparência na prestação das contas eleitorais, além de comprometer os dados nela lançados.

O Ministério Público Eleitoral opinou pela desaprovação da prestação de contas de campanha.

Gize-se que a última manifestação da prestadora de contas não esclareceu, tampouco sanou, os apontamentos antes referidos.

Assim, nos termos do art. 74, III, da Resolução TSE n. 23.607/2019, as falhas apresentadas e não esclarecidas pelo prestador comprometem a regularidade das contas, ocasionando a sua desaprovação.

 

Observo que o recorrente (ID 41605133), em anexo ao recurso, colacionou dezoito documentos, os quais, segundo seu julgamento, sanariam eventuais falhas na prestação de contas. Os documentos não são novos, pois deveriam ser apresentados no momento apropriado, quando a unidade técnica, formalmente, requereu tal juntada.

Embora seja possível o conhecimento de documentos novos em fase recursal, tenho que neste caso concreto tal exame, mais que desaconselhável, resta vedado pelo sistema jurídico.

Durante o trâmite do feito em primeiro grau, quando do exame preliminar, a unidade técnica constatou a ausência de comprovação das receitas e despesas (ID 41604383), e oportunizou ao candidato (ID 41604433) a possibilidade de nova juntada de documentos. O prestador das contas acrescentou apenas parte dos documentos, restando silente em relação aos demais.

O momento apropriado para a juntada dos documentos restou precluso, sem que o prestador justificasse, minimamente, sua inércia. Existe um rito previsto nos arts. 69, 70, 71 e 72 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual foi desrespeitado pelo recorrente, o que inviabiliza o conhecimento dos documentos nesta esfera recursal.

O tema vai bem sintetizado no parecer do ilustre Procurador Regional Eleitoral (ID 44861132), cujo excerto a seguir transcrevo:

Inicialmente, quanto à juntada de documentos em sede de prestações de contas, a disciplina prevista na Resolução TSE 23.607/2019 é restritiva. Vejamos os dispositivos aplicáveis:

Art. 69. Havendo indício de irregularidade na prestação de contas, a Justiça Eleitoral pode requisitar diretamente ou por delegação informações adicionais, bem como determinar diligências específicas para a complementação dos dados ou para o saneamento das falhas, com a perfeita identificação dos documentos ou elementos que devem ser apresentados (Lei nº 9.504/1997, art. 30, § 4º).

§ 1º As diligências devem ser cumpridas pelos candidatos e partidos políticos no prazo de 3 (três) dias contados da intimação, sob pena de preclusão.

(…)

§ 6º Nas diligências determinadas na prestação de contas, a Justiça Eleitoral deverá privilegiar a oportunidade de o interessado sanar, tempestivamente e quando possível, as irregularidades e impropriedades verificadas, identificando de forma específica e individualizada as providências a serem adotadas e seu escopo.

Art. 71. A retificação da prestação de contas somente é permitida, sob pena de ser considerada inválida:

I - na hipótese de cumprimento de diligência que implicar a alteração das peças inicialmente apresentadas;

II - voluntariamente, na ocorrência de erro material detectado antes do pronunciamento técnico.

Art. 72. Emitido parecer técnico conclusivo pela existência de irregularidades e/ou impropriedades sobre as quais não se tenha dado oportunidade específica de manifestação ao prestador de contas, a Justiça Eleitoral intimá-lo-á para, querendo, manifestar-se no prazo de 3 (três) dias contados da intimação, vedada a juntada de documentos que não se refiram especificamente à irregularidade e/ou impropriedade apontada, salvo aqueles que se amoldem ao parágrafo único do art. 435 do CPC.

Como se observa do art. 71, inc. II, a retificação da prestação de contas de forma voluntária somente é permitida antes do pronunciamento técnico.

Após o exame preliminar, com a intimação do candidato, o mesmo pode juntar documentos, situação que se encontra no art. 71, inc. I.

Emitido o parecer técnico conclusivo é vedada a juntada de novos documentos, somente havendo duas exceções: a) quando o parecer conclusivo traz irregularidades sobre as quais não se tenha dado oportunidade de manifestação ao prestador; b) ou em relação a documento cuja formação, conhecimento, acessibilidade ou disponibilidade é posterior à última oportunidade de manifestação já dada ao prestador, nos termos do parágrafo único do art. 435 do CPC, cabendo a parte comprovar o motivo que a impediu de juntá-lo anteriormente.

O objetivo da norma, certamente, é evitar a montagem de prestações de contas a partir do momento em que vão sendo constatadas as irregularidades.

Desta forma, entendemos que a acolhida de documento em sede recursal somente poderia se dar nas hipóteses do parágrafo único do art. 435 do CPC.

No presente caso, quando do exame preliminar, foi referido pela unidade técnica que “não houve a comprovação das receitas e despesas” (ID 41604383).

Intimado o prestador (ID 41604433), juntou apenas parte da documentação faltante, deixando para acostar o restante em sede recursal.

Saliente-se que era evidente que o prestar tinha ciência de que deveria ter juntado todas as notas fiscais da campanha, pois é da natureza de uma prestação de contas de campanha que se comprovem os gastos eleitorais com a juntada dos documentos fiscais.

Destarte, entende-se que a juntada da referida documentação em sede recursal é extemporânea, razão pela qual os documentos não devem ser admitidos, importando seu conhecimento em verdadeira supressão de instância, mantendo-se, assim, a sentença que desaprovou as contas, vez que os únicos documentos comprobatórios dos gastos eleitorais juntados no momento oportuno foram aqueles acostados nos IDs 41603083 e 41604583, os quais correspondem apenas a despesas no valor de R$ 5.500,00 com a empresa Dlocal Brasil Pagamentos Ltda., relativo aos impulsionamentos no Facebook.

 

Este Tribunal entende possível a análise de algum documento pontual, que eventualmente não tivesse sido juntado em primeiro grau, mas que para fins de revisão da sentença fosse juntado ao recurso. Ou seja, aquele documento que primo ictu oculi, ao primeiro olhar, com a simples leitura, possibilita a compreensão pelo saneamento da irregularidade.

Transcrevo, nesse sentido, ementa de julgado deste Tribunal, de relatoria do Des. Eleitoral Gerson Fischann:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. CONHECIMENTO DE NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS AO RECURSO. ART. 266, CAPUT, DO CÓDIGO ELEITORAL. MÉRITO. RECEBIMENTO DE VALORES PROVENIENTES DO DIRETÓRIO NACIONAL DA AGREMIAÇÃO SEM A IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. DOCUMENTOS APRESENTADOS SUPRIRAM A FALHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar acolhida. Juntada de novos documentos com o recurso. Este Tribunal, com base no art. 266, caput, do Código Eleitoral, tem se posicionado pelo recebimento de documentos novos com as razões de recurso, até mesmo quando não submetidos a exame de primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura mostra capacidade de influir positivamente no exame das contas, ou seja, o saneamento da falha deve resultar de plano da documentação, sem necessidade de qualquer persecução complementar.

2. Recebimento de valores provenientes do diretório nacional da agremiação, sem a identificação dos doadores originários, em afronta ao art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15. Os esclarecimentos prestados, associados às informações constantes nos recibos das doações, permitem aferir, de forma clara, os doadores originários com seus respectivos CPFs, cumprindo a determinação normativa. Afastadas as sanções impostas. 3. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 1428 SANTIAGO - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 25/04/2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 75, Data 29/04/2019, Página 7)  (Grifo nosso)

 

Contudo, no presente caso, o recorrente não cumpriu o rito da prestação de contas, não juntou os documentos necessários (comprovantes de receitas e despesas) no momento processual adequado e, por isso, nem a unidade técnica, nem o juízo de primeiro grau, tiveram a oportunidade de examiná-los dentro da regularidade do rito.

Analisar a vultosa quantidade de documentos trazida pelo recorrente na esfera recursal, alterando o rito processual e mesmo a competência deste Tribunal, acabaria por transformar a exceção em regra.

Com estes fundamentos tenho por não conhecer da documentação acostada ao recurso, mantendo o juízo de desaprovação das contas do candidato.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto por PABLO LUIZ ALIEVI MARI, mantendo a sentença em sua integralidade.

É como voto, senhor Presidente.