REl - 0600313-37.2020.6.21.0156 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2021 às 10:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a sentença desaprovou a contabilidade de JOICINEIA DE JESUS COSTA CORLETA em face de omissão de gastos eleitorais e pagamento de despesas por meio diverso de cheque nominal e cruzado, não determinando o recolhimento de recursos ao erário.

Passa-se, a seguir, à análise individualizada dos apontamentos que ensejaram a rejeição das contas.

I – Omissão de despesa.

O examinador técnico, na instância de origem, em seu parecer conclusivo, sinalizou que foi identificada divergência entre as informações constantes da prestação de contas da candidata e aquelas obtidas a partir de cruzamentos eletrônicos realizados pela Justiça Eleitoral, revelando indícios de omissão de despesa eleitoral (ID 44627883).

O gasto omitido, representado pela Nota Fiscal Eletrônica n. 31479398, no valor de R$ 297,00, foi contratado, em 24.10.2020, com ELEN EUNICE SILVEIRA 01869286022, CNPJ n. 28.855.067/0001-27.

O magistrado a quo entendeu que restou violado o art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19 e que houve comprometimento da lisura das contas, rechaçando a alegação defensiva de que a despesa foi quitada com recursos próprios após o término da eleição, pois tal não justifica nem resolve a grave irregularidade de omissão de gastos e receitas.

Pois bem.

Como restou comprovado, houve despesa de campanha que não foi escriturada no conjunto contábil, em afronta ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

I - pelas seguintes informações:

(...)

g) receitas e despesas, especificadas;

(...)

Destarte, a glosa deve ser mantida integralmente, pois tal omissão macula a confiabilidade das contas.

Nesse trilhar, o egrégio Tribunal Superior Eleitoral entende que a falha em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil, uma vez que a prestação de contas deve ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, com especificação completa, consoante plasmado nos seguintes julgados:

DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2014. DIRETÓRIO NACIONAL. PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL). COMITÊ FINANCEIRO NACIONAL PARA PRESIDENTE DA REPÚBLICA. DESAPROVAÇÃO.

I.  HIPÓTESE

1. Prestação de contas apresentada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e seu Comitê Financeiro Nacional para Presidente da República, relativa às Eleições 2014.

2. A análise da prestação de contas está limitada à verificação das informações declaradas espontaneamente pelo partido, bem como daquelas obtidas a partir de procedimentos de auditoria ordinariamente empregados pela Justiça Eleitoral, em especial análise documental, exame de registros e cruzamento, além de confirmação de dados, por meio de procedimento de circularização.

II. INCONSISTÊNCIAS ANALISADAS

(...)

IRREGULARIDADE - OMISSÃO DE DESPESAS (R$ 84.900,77).

13. A omissão de despesas nas contas prestadas por meio do Sistema de Prestação de Contas Eleitorais - SPCE viola o disposto nos arts. 40, I, g, e 41 da Res.-TSE nº 23.406/2014 e constitui irregularidade que macula a sua confiabilidade.

(...)

(Prestação de Contas n. 97006, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 167, Data 29.8.2019, pp. 39/40.) (Grifei.)

 

DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2014. PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO (PSB). DIRETÓRIO NACIONAL E COMITÊ FINANCEIRO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

I. HIPÓTESE

1. Prestação de contas apresentada pelo Diretório Nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e seu Comitê Financeiro Nacional, relativa às Eleições 2014.

2. A análise da prestação de contas está limitada à verificação das informações declaradas espontaneamente pelo partido, bem como daquelas obtidas a partir de procedimentos de auditoria ordinariamente empregados pela Justiça Eleitoral.

(...)

III. IRREGULARIDADES

(…)

10. Omissão de despesas: confronto com informações externas (R$ 369.860,32). Gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, violam o disposto no art. 40, I, f e g, da Res.-TSE nº 23.406/2014 e constituem omissão de despesas.

(...)

(Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE, Tomo 241, Data 16.12.2019, p. 73.) (Grifei.)

Além disso, a despesa não declarada implica, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação da dívida de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada.

A rigor, deveria ter sido determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia equivalente, nos termos do art. 32, caput e § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19, todavia não houve recurso do Ministério Público Eleitoral, sendo inviável que a referida providência seja adotada nesta instância, em face da impossibilidade de agravamento da situação jurídica da candidata, por incidência do princípio da non reformatio in pejus.

Por consequência, deve ser mantida a glosa referente ao gasto de R$ 297,00.

II – Da realização de gastos sem observância da forma prescrita no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A unidade técnica apontou divergência entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela constante nos extratos eletrônicos, relativamente aos seguintes gastos, em favor de:

a) ROGERIO DA SILVA BUENO, CPF n. 73612235087, no valor de R$ 250,00, em 19.10.2020, pelo serviço de “Produção de jingles, vinhetas e slogans”, pago pelo cheque n. 8500001;

b) DESIREE SEBEN ROFRIGUES STEINHAUS, CNPJ n. 31455235000100, no valor de R$ 40,00, em 21.10.2020, pelo serviço de “Publicidade por materiais impressos”, pago pelo cheque n. 850002.

O cheque atinente ao primeiro dispêndio foi compensado em favor de POSTO DE COMBUSTIVEIS CANQUERINI LTDA., CNPJ n. 91169078000190, em 28.10.2020, ao passo que a cártula concernente à segunda despesa foi compensada em benefício de JOSE CLEO QUADROS RODRIGUES, CPF n. 10511342004, em 22.10.2020.

No apelo, a recorrente aduz que não houve informação de pagamento na prestação de contas, visto que os serviços prestados por advogado e contador foram pagos integralmente pelo Diretório Estadual do PSL e contabilizados na prestação de contas do referido Diretório, e que os arts. 20 e 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelecem que tais serviços não constituem doação de serviços estimáveis em dinheiro.

Contudo, essas alegações não têm pertinência com as irregularidades objeto da sentença.

Sobre o ponto, reproduzo excerto do bem-lançado parecer ministerial:

No que diz com as despesas objeto dos pagamentos acima referidos, dizem com “publicidade por materiais impressos” e “produção de jingles, vinhetas e slogans”, sendo que os cheques acostados para comprovação do pagamento não se encontram nominais, conforme IDs 44627783 e 44627833.

Destarte, não foi observado o art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019, o qual impõe que “os gastos eleitorais de natureza financeira (...) só podem ser efetuados por meio de: (I) cheque nominal cruzado; (II) transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; (III) débito em conta; ou (IV) cartão de débito da conta bancária”.

Assim, remanesce, igualmente, essa irregularidade.

Deveras, analisando-se as ordens de pagamento, ns. 850001 (ID 44627833) e 850002 (ID 44627783), observa-se que, conquanto tenham sido cruzadas, não foram emitidas de modo nominal, em afronta ao art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

(...)

A norma em apreço possui caráter objetivo e exige, sem exceções, que o cheque manejado para pagamento de despesa eleitoral seja não apenas cruzado, mas também nominal ao fornecedor.

Tais exigências visam permitir a rastreabilidade das movimentações financeiras de campanha, conferindo maior confiabilidade às informações inseridas na escrituração, em especial, que os prestadores de serviço informados na demonstração contábil foram efetivamente os beneficiários dos créditos.

Logo, há de ser mantida a glosa, relativamente aos gastos de R$ 250,00 e R$ 40,00, porquanto não houve a devida comprovação de que os pagamentos foram direcionado aos respectivos fornecedores declarados.

Assim, as falhas identificadas nas contas alcançam o somatório de R$ 587,00 (R$ 297,00 + R$ 250,00 + R$ 40,00), cifra que, embora represente mais de 100 % das receitas declaradas (R$ 350,00), se mostra, em termos absolutos, reduzida e, inclusive, bastante inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), possibilitando a aprovação das contas com ressalvas, na linha da jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral e desta Corte.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de JOICINEIA DE JESUS COSTA CORLETA, candidata, nas eleições de 2020, ao cargo de vereadora em Palmares do Sul.