REl - 0601007-72.2020.6.21.0134 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2021 às 10:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Da Preliminar de Nulidade da Sentença

Em suas razões recursais, a recorrente suscita, preliminarmente, a nulidade da sentença, sob a alegação de ausência de intimação para manifestação sobre o parecer conclusivo.

Em que pesem os argumentos apresentados, a prefacial não prospera, tendo em vista a inexistência de apontamentos ou documentos novos no parecer conclusivo.

Vejamos.

No exame preliminar, a unidade técnica já havia apontado uma única irregularidade a inquinar as contas, qual seja, que “os recursos próprios aplicados em campanha superam o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura, situação que deve ser esclarecida junto ao candidato” (ID 44807223).

Intimada (ID 44807224), a candidata nada manifestou, culminando com a emissão do parecer conclusivo final (ID 44807226), no qual a examinadora técnica tão somente reafirmou os apontamentos então tecidos em seu relatório anterior.

Sendo assim, nos termos do art. 69, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, uma vez concedida ao prestador a possibilidade para manifestar-se quanto às falhas apontadas no relatório preliminar, não será necessária nova notificação por ocasião do parecer conclusivo, que especificou apenas irregularidades já constatadas e discutidas.

Dessa forma, tendo em vista a ausência de inovação no exame conclusivo em face da manifestação técnica preliminar, verifica-se a preclusão para esclarecer ou justificar as impropriedades assinaladas.

Portanto, afasto a preliminar de nulidade da decisão.

Prossigo, passando ao exame do mérito.

 

Do Mérito

Na origem, as contas de campanha da recorrente foram desaprovadas em razão da ausência de comprovação de que o valor utilizado como recursos próprios, na monta de R$ 803,50, já integrava o seu patrimônio em período anterior ao registro de candidatura.

Entendeu a magistrada a quo que, uma vez que a candidata não havia declarado patrimônio por ocasião do registro de candidatura, a doação financeira aplicada em campanha caracteriza o recebimento de recursos de origem não identificada, impondo, ainda, o recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por sua vez, a recorrente sustenta que não é possível presumir a sua incapacidade financeiro ante a ausência de patrimônio declarado no registro de candidaturas e que é funcionária do Sindicato dos Empregados no Comércio de Bens e Serviços do Rio Grande do Sul desde 2019, circunstância que confere renda pessoal suficiente para o aporte realizado.

No caso concreto, assiste razão à recorrente.

Primeiramente, é importante referir que a situação patrimonial do candidato, declarada no momento do registro da candidatura, não se confunde com a sua capacidade financeira, a qual tende a acompanhar o dinamismo próprio do exercício de atividades econômicas, relacionando-se, portanto, mais diretamente, ao percebimento de renda, e não à titularidade de bens e direitos.

Nesse sentido, colaciono jurisprudência da egrégia Corte Superior:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO DE RECURSOS FINANCEIROS PRÓPRIOS. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. VALOR MÓDICO DA INCONSISTÊNCIA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso especial eleitoral, mantendo aprovadas com ressalvas as contas de campanha referentes às Eleições 2016.

2. Hipótese em que o TRE/CE aprovou com ressalvas as contas de campanha do recorrido, candidato ao cargo de vereador nas Eleições 2016.

3. O acórdão regional alinha-se à jurisprudência desta Corte no sentido de que o patrimônio do candidato, declarado no momento do registro da candidatura, não se confunde com a sua situação financeira ou capacidade econômica, que é dinâmica e se relaciona aos rendimentos auferidos. Precedentes.

4. No caso, o TRE/CE assentou que, a despeito da declaração de ausência de bens por ocasião do registro de candidatura, é razoável concluir que a atividade de agricultora declarada pelo candidato justifique a aplicação em campanha de recursos próprios na ordem de R$ 1.153,72.

5. Desse modo, o acórdão consignou não se tratar de receita de origem não identificada ou de fonte vedada.

6. Além disso, o montante de recursos próprios utilizados na campanha é muito inferior ao teto de gastos estabelecido pelo TSE para o cargo pretendido (R$ 10.803,91).

7. A jurisprudência desta Corte inclina-se no sentido de que irregularidades em valores módicos, sem evidência de má-fé do prestador e que não prejudiquem a correta análise das contas pela Justiça Eleitoral, ensejam a sua aprovação com ressalvas. Precedentes.

8. A modificação da conclusão do TRE/CE quanto à ausência de gravidade da falha apontada exigiria o revolvimento do acervo fático-probatório constante dos autos, vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

9. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 73230, Acórdão, Relator: MIN. LUÍS ROBERTO BARROSO, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 27, Data 07.02.2020, pp. 31/32.) (Grifei.)

 

No requerimento de registro de candidatura apresentado (RRC 0600224-80.2020.6.21.0134), a candidata informou exercer a profissão de “Auxiliar de Escritório e Assemelhados”, o que está comprovado por meio da apresentação da Carteira de Trabalho Digital, na qual se anota o contrato de trabalho com a Federação dos Empregados no Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul, desde 12.02.2019, com remuneração de R$ 1.500,00 (ID 44807242, fl. 5).

Assim, o aporte em questão é compatível com os rendimentos mensais da prestadora e, inclusive, inferior ao valor de R$ 1.064,10, que qualquer eleitor poderia despender pessoalmente em favor de candidato, sem sujeição à contabilização, nos termos do art. 43 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nessa senda, o uso de recursos financeiros próprios em campanha em montante superior ao patrimônio declarado no registro de candidatura não é motivo suficiente, por si só, para desaprovar contas, quando compatível com a realidade financeira de candidato que declara sua ocupação, como na hipótese, na esteira do entendimento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVAÇÃO. USO DE RECURSOS FINANCEIROS PRÓPRIOS EM CAMPANHA EM MONTANTE SUPERIOR AO PATRIMÔNIO DECLARADO. COMPATIBILIDADE. REALIDADE FINANCEIRA E OCUPAÇÃO DO CANDIDATO. VALOR ÍNFIMO. DESPROVIMENTO.

1. O uso de recursos financeiros próprios em campanha em montante superior ao patrimônio declarado no registro de candidatura não é motivo suficiente, por si só, para desaprovar contas, quando compatível com a realidade financeira de candidato que declara sua ocupação. Precedentes.

2. No caso dos autos, embora o TRE/CE tenha assentado a existência de outras irregularidades que ensejaram a rejeição do ajuste contábil, consignou, especificamente quanto ao tema, que a renda mensal do candidato, declarada no valor de R$ 2.000,00, possibilitou a doação de recursos próprios no montante de R$ 2.500,00, e que a hipótese não cuida de recursos de origem não identificada.

3. Concluir em sentido diverso demandaria reexame de fatos e provas, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

4. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 35885, Acórdão, Relator MIN. JORGE MUSSI, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 61, Data 29.3.2019, pp. 64-65.) (Grifei.)

 

Dessa forma, descabe considerar como recursos de origem não identificada as verbas próprias vertidas à campanha pela candidata, bem como, por consequência, não havendo outras irregularidades reconhecidas, impõe-se a reforma da sentença para aprovar as contas e afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela rejeição da preliminar de nulidade da sentença e, no mérito, pelo provimento do recurso, para aprovar as contas de Isabela Luzardo Monteiro, relativas ao pleito de 2020, e afastar a determinação de recolhimento de R$ 803,50 ao Tesouro Nacional.