REl - 0600515-68.2020.6.21.0138 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/12/2021 às 10:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão do recebimento de sete depósitos em espécie efetuados na mesma data, 13.11.2020, sendo seis de R$ 1.000,00 e um de R$ 800,00, totalizando R$ 6.800,00, caracterizando-se como recebimento de recursos de origem não identificada.

No relatório preliminar (ID 41691933), a unidade técnica apontou que os depósitos foram efetuados da seguinte forma:

 

Embora os depositantes tenham sido identificados com o CPF de Ivan Karlinski, Juiclei Tramontina (candidato a prefeito) e Wilson Jose Karlinski, o procedimento de realizar depósitos sucessivos no mesmo dia contraria o disposto no art. 21, inc. I, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que estabelece o limite de R$ 1.064,10 para doações bancárias sucessivas em espécie efetuadas por um mesmo doador na mesma data:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

(...)

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

§ 6º É vedado o uso de moedas virtuais para o recebimento de doações financeiras.

Nesse cenário, apesar de os comprovantes de depósitos indicarem como doador o CPF de simpatizantes e do próprio candidato a prefeito, está correta a conclusão do juízo a quo no sentido de que os valores não estão com a origem devidamente identificada.

Ressalto que é firme o posicionamento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, em virtude da ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA ELEITORAL. VEREADOR. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INCONFORMISMO. RESSARCIMENTO. VALORES DE DOAÇÃO. TESOURO NACIONAL.

1. A atual jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que as doações acima de R$ 1.064,10 devem ser feitas mediante transferência eletrônica, nos exatos termos do art. 18, § 1º, da Res.-TSE 23.463, e o descumprimento da norma regulamentar não é reputado como falha meramente formal. Nesse sentido, já se assentou que “a aceitação de doações eleitorais em forma diversa da prevista compromete a transparência das contas de campanha, dificultando o rastreamento da origem dos recursos” (AgR-REspe 313-76, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 3.12.2018).

(...)

3. Em face da jurisprudência consolidada no tema, se não se admite a realização de depósito na "boca do caixa" para fins de prova da origem de doação, também a mera emissão do recibo eleitoral pelo candidato não possibilita, por si só, comprovar tal fato, o que ocorre justamente pela providência alusiva à transferência eletrônica entre contas bancárias, modalidade preconizada na resolução destinada a possibilitar a confirmação das informações prestadas.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 25476, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 02.8.2019.) (Grifei.)

 

Consigno, a tal respeito, que a Corte Superior entende que a obrigação de as doações acima de R$ 1.064,09 serem realizadas mediante transferência bancária não se constitui em mera exigência formal, sendo que o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas, consoante precedente a seguir colacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO. DEPÓSITO BANCÁRIO. EM ESPÉCIE. VALOR SUPERIOR A R$ 1.064,10. TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. EXIGÊNCIA. ART. 18, § 1º DA RES. TSE Nº 23.463/2015. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO.

(...)

2. Nas razões do regimental, o Parquet argumenta que não foi observado o art. 18, § 1º, da Res.-TSE nº 23.463/2015, segundo o qual "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação". 3. A Corte Regional, soberana na análise dos fatos e provas, atestou a identificação da doadora do valor apontado como irregular por meio do número do CPF impresso no extrato eletrônico da conta de campanha.

4. Consoante decidido nesta sessão, no julgamento do AgR-REspe nº 265-35/RO, a maioria deste Tribunal assentou que a exigência de que as doações acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) sejam feitas mediante transferência eletrônica não é meramente formal e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas.

(...)

7. Agravo regimental acolhido para dar provimento ao recurso especial, com determinação de recolhimento ao erário do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

(Recurso Especial Eleitoral n. 52902, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 250, Data 19.12.2018, pp. 92/93.) (Grifei.)

 

No caso dos autos, inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos ou o motivo pelo qual não foram realizados depósitos por transferências bancárias de modo conjunto, impossibilitando que a falha seja relevada.

Desimporta ao caso dos autos que as operações tenham sido concretizadas na sexta-feira anterior à data do pleito. A exigência normativa visa assegurar a rastreabilidade dos recursos (origem e destino) recebidos pelos candidatos, o que resta comprometido quando a operação é efetuada por meio diverso, como feito pelos recorrentes.

O raciocínio é que o descumprimento da regra de transferência bancária ou de cheque nominal cruzado não fica suprido pela realização de depósito em espécie identificado por determinada pessoa, circunstância que não se mostra apta a comprovar a efetiva origem do valor devido à ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário.

Destarte, o depósito em dinheiro igual ou acima de R$ 1.064,10, mesmo no caso de ser identificado com um CPF, ainda que um deles do próprio candidato a prefeito, é meio incapaz de atestar a efetiva origem da receita devido à natureza essencialmente declaratória do ato.

E por esse motivo, ainda que o prestador, em suas razões, alegue que os depósitos foram efetuados em uma sexta-feira, antevéspera das eleições de 2020, visto que não poderiam ser realizados na segunda-feira, pós-eleições, o procedimento não se trata de mero erro formal.

Os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, caso haja utilização dos recursos recebidos em desacordo com o estabelecido no dispositivo, ainda que identificado o doador, sendo essa a hipótese dos autos.

Não se trata de análise da boa ou má-fé dos prestadores, ou de hipótese de malversação e desvio dos recursos públicos recebidos, mas de manifesto e injustificável descumprimento de norma eleitoral aplicável a todos os candidatos.

Evidentemente, é forçada a interpretação de que a expressão “doações sucessivas” contida no § 2º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19 implicaria a exclusão do primeiro depósito. Ora, o total dos depósitos sucessivos realizados por doador, em um mesmo dia, deve ser somado para fins de aferição do limite legal de R$ 1.064,10, pois é a integralidade do crédito recebido na mesma data que acarreta a superação do limite diário de doações, comprometendo a confiabilidade e a transparência das contas.

Desse modo, é inviável a tese de que apenas a partir do segundo depósito devem os valores ser recolhidos ao erário.

Por conseguinte, deve-se compreender o conjunto de cada bloco de depósitos, ou seja, R$ 2.000,00 por Ivan, R$ 2.800,00 por Juiclei (candidato a prefeito) e R$ 2.000,00 por Wilson, no dia 13.11.2020, como operações únicas, em espécie, totalizando R$ 6.800,00, em afronta às normas de regência.

Dessa forma, as razões recursais e a documentação acostada às contas são insuficientes para sanar a irregularidade em questão.

No caso concreto, considerando que os depósitos em dinheiro realizados na conta bancária caracterizam recursos de origem não identificada, o total da quantia recebida deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Inviável, portanto, o pedido de devolução aos depositantes, visto que, embora nominados nas doações, não se tem a certeza da origem dos valores doados.

Nesses termos, o recurso não comporta provimento dada a irregularidade de R$ 6.800,00, quantia que representa 65,64% do total das receitas financeiras, no montante de R$ 10.358,61, e ultrapassa o valor de parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a Resolução TSE n. 23.607/19 considera módico.

Com essas considerações, não é adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, pois a falha é grave e compromete de forma insanável a confiabilidade da movimentação financeira.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 6.800,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.