REl - 0600488-54.2020.6.21.0019 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/12/2021 às 10:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O apelo é tempestivo nos termos do art. 258 do Código Eleitoral e, ademais, encontram-se presentes todos os pressupostos de admissibilidade, de forma que a irresignação merece conhecimento.

Mérito

A presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral tem por causa de pedir alegada prática de fraude à cota de gênero na composição da chapa proporcional do Movimento Democrático Brasileiro de Encruzilhada do Sul no pleito de 2020, notadamente pelo registro das candidaturas de NATIELE LUZ DA SILVA e AMALI TERESINHA SILVA.

O rol dos candidatos à vereança ainda era composto por ÁLVARO LUIZ PEREIRA SPERB, ARDONSO SOARES RODRIGUES, JOSE ARGEMIRO ROSA DE QUADRO, CLÁUDIO RUTIKOSKI SMOLARKI, CARLOS GASTÃO OURIVES, ALDROVANDO SILVEIRA DE FREITAS, EDERSON SANTOS CARDOSO, GIANI SILVEIRA DE ALMEIDA PEREIRA, JOELMA MENDES DA SILVEIRA, LOVANI BISPO VEREADOR, ANTÔNIO FELIX BATISTA SODRE, LEANDRO JOSE HENDGES, RAMIRO SOARES HOPP, RENAN ANDRADE DE SOUZA.

Originariamente, a parte autora trouxe como causas de pedir um conjunto de fatos que, conforme alegado, demonstraria a inexistência de candidatura de fato de parte de NATIELE e AMALI, e tais circunstâncias seriam a ausência de propaganda eleitoral das candidatas nas redes sociais; o desconhecimento da existência de materiais de propaganda impresso; um baixo número de votos auferidos, e a não obtenção de recursos ou realização de despesas, de parte das candidatas.

Na sentença hostilizada, contudo, a conclusão foi de que outras situações afastavam o cometimento de fraude, pois houve publicações de campanha veiculadas pelas candidatas mulheres no Facebook, bem como a contratação de profissional da área contábil para a prestação de contas da campanha eleitoral e a confecção de “santinhos”, em atos típicos de campanha eleitoral.

E as razões de recurso, como bem indicado no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, não se insurgem propriamente contra os fundamentos da sentença, mas sim quanto ao indeferimento da oitiva das pessoas indicadas na inicial e da juntada das prestações de contas das candidatas investigadas NATIELE LUZ e AMALI SILVA, bem como requerem:

Dessa forma, considerando que desde a exordial se requereu o depoimento das candidatas laranjas, na condição de testemunha, bem como a juntada das prestações de contas respectivas, visto que elas não constavam do PJE, pede-se a invalidação da sentença por negativa de prestação jurisdicional para que outra seja proferida ou, a reforma do julgado para prosseguimento do feito à semelhança do processo paradigma, sob pena de cerceamento de defesa e contraditório. (ID 41934383, fl. 4 do PDF)

 

Sem razão os recorrentes. A sentença há de ser mantida pelos próprios fundamentos, e também pela condução da instrução do feito que não merece reparo.

A magistrada concedeu oportunidade para ambas as partes se manifestarem acerca da produção de provas, em especial da prova oral, na data de 26.02.2021:

Vistos. Considerando que a inicial imputa aos requeridos a suposta utilização fraudulenta de candidaturas femininas e fim de perfazer o quota de gênero, inegável que as candidatas objeto da suposta fraude possuem legitimidade para figurarem no polo passivo. Ainda, dê-se ciência da ação ao MPE e, após, intimem-se as partes para declinarem objetivamente o interesse na produção de provas em 10 dias, sendo que em caso de pedido de prova oral/testemunhal deverão de pronto indicar o rol de pessoas a serem ouvidas, a fim de se adequar a pauta. Intimem-se. Encruzilhada do Sul, 28 de fevereiro de 2021. Magali Wicket de Oliveira Juíza Eleitoral

 

Destaco que tanto a parte autora quanto os demandados deixaram transcorrer o prazo em branco, conforme certificado nos autos eletrônicos:

CERTIFICO que, na data 18.03.2021, transcorreu o prazo de 10 dias concedido no despacho anterior (ID 80354226) para que as partes demonstrassem interesse na produção de prova oral/testemunhal. Dou fé. Encruzilhada do Sul, 19 de março de 2021.

 

Nesse norte, a fase do rito foi acobertada pela preclusão, pois foi concedido prazo após a contestação, momento em que poderia haver mudança de entendimento quanto à necessidade da prova. Como bem salientado no parecer ministerial, a alegação dos recorrentes de que houve cerceamento de defesa não procede, pois durante a instrução processual lhes fora oportunizado declinar objetivamente o interesse na produção de provas, notadamente prova oral.

E igualmente não procedem os argumentos no sentido de tratamento desigual em relação à AIJE n. 0600489.39.2020.6.21.0019, proposta contra o Partido Democrático Trabalhista do mesmo município, pois naquela demanda fora proferida decisão idêntica, também sem aproveitamento pelas partes, conforme certificado.

Contudo, em decorrência de petição dos autores, sobreveio decisão deferindo a juntada da prestação de contas das supostas candidatas fictícias, bem como designando audiência para oitiva, em circunstâncias que fazem diferir um processo de outro, pois aqui não foi apresentada petição, quer tempestiva ou intempestiva.

Novamente, valho-me do bem lançado parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, no sentido de que “(...) no caso em tela, após oferecida a contestação e tendo em vista que as partes, intimadas para declinarem o interesse na produção de provas, restaram silentes, entendeu o Juiz a quo que o conjunto fático-probatório produzido era suficiente ao deslinde da controvérsia.”

A situação veio bem esclarecida na decisão de rejeição dos embargos de declaração opostos pelos recorrentes contra a sentença hostilizada:

Basicamente, os autores questionam dois pontos da sentença atacada: a não oitiva das pessoas indicadas na Inicial e a ausência das prestações de contas das candidatas na instrução dos autos. Quanto ao primeiro ponto, determinei, ainda em 26.02.2021, a intimação dos autores para que declinassem objetivamente o interesse na produção das provas, com indicação do rol de pessoas a serem ouvidas (despacho ID nº 80323692), visto que as pessoas indicadas na inicial não constavam como testemunhas, mas sim como partes do processo. As partes, então, foram intimadas (ID 80354226) mas não se manifestaram, deixando transcorrer o prazo concedido (ID 83062965), ao oposto do que ocorreu no processo mencionado pelos embargantes (AIJE 0600489-39.2020.6.21.0019), no qual repisaram os pedidos de produção de provas (ID 83630658), reputando-se, assim, desistentes da prova genericamente postulada na inicial. No tocante ao segundo ponto questionado, referente aos processos de prestação de contas de campanha, trata-se de diligência que poderia ter sido providenciada pela própria parte, uma vez que os processos de prestação de contas eleitorais são públicos e encontram-se disponíveis para acesso pela internet, não havendo falar em prejuízo à instrução processual. Por último, com relação aos fundamentos jurídicos mencionados na parte final da peça, esses foram amplamente abordados no decisório, inclusive com indicações de precedentes que enfrentaram tema semelhante (RE 8-83.2017.6.21.0164, RE 7-98.2017.6.21.0164 e RE 1-92.2017.6.21.0099), não havendo qualquer omissão na sentença vergastada. Ou seja, conforme exaustivamente exposto e embasado em julgados anteriores dos tribunais eleitorais, o baixo número de votos alcançados pelas candidatas e o reduzido valor financeiro empregado na campanha não fazem, por si sós, provas de que o pleito fora fraudado com candidaturas fictícias, impondo-se uma comprovação robusta e concreta para configurar tal comportamento fraudulento. Pelo exposto, recebo os embargos, desacolhendo-os para manter a sentença em seus próprios fundamentos. […]. (ID 41934233)

 

É consabido que o princípio da ampla defesa está cravado no catálogo dos direitos e garantias fundamentais – inc. LV, art. 5º, da CF, e um dos pontos altos de efetivação do princípio está, justamente, no direito da parte de produzir provas, bem como sejam elas consideradas materialmente pelo magistrado - ou tribunal.

Contudo e em resumo, não há princípios absolutos, impondo-se limites à amplitude do direito de defesa exatamente para que ela não se torne arbitrária e fira postulados de igual jaez constitucional como os princípios da isonomia e da igualdade perante a lei. No caso, o primeiro limite é a preclusão.

Preclusa a oportunidade, como de forma incontroversa os autos estampam, não há se falar em cerceamento.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso