PC-PP - 0600590-70.2019.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/12/2021 às 14:00

VOTO

 

Cuida-se da prestação de contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO DEMOCRACIA CRISTÃ – DC e seus responsáveis, abrangendo o exercício financeiro de 2018.

A Secretaria de Auditoria Interna – SAI, após os procedimentos de verificação da movimentação contábil partidária e análise dos argumentos e documentos apresentados (ID 44805328), concluiu pela existência das irregularidades que passo a examinar pontualmente.

 

1. Da Ausência do Comprovante de Remessa à Receita Federal da Escrituração Contábil Digital

 

A unidade técnica relata que não houve a apresentação do comprovante de remessa à Receita Federal do Brasil da escrituração contábil, documento solicitado desde o exame preliminar (ID 4205833), esclarecendo, ainda, quanto ao ponto, o seguinte:

A partir do exercício de 2016 os partidos políticos em âmbito regional não mais necessitam entregar à Justiça Eleitoral os Livros Razão e Diário, este último autenticado no cartório de registros. No entanto, devem manter Escrituração Contábil Digital e encaminhá-la à Receita Federal do Brasil por meio do SPED contábil. Após o recebimento, a Receita Federal disponibiliza os dados da Escrituração Contábil Digital ao TSE. Assim, as unidades técnicas de exame de contas podem aferir a escrituração contábil a fim de avaliar a efetividade e consistência do Balanço Patrimonial e Demonstrativo de Resultados apresentados na prestação de contas. A falha compromete a regularidade da prestação de contas.

 

De fato, a Escrituração Contábil Digital (ECD) corresponde à versão digital dos Livros “Diário” e “Razão” e seus auxiliares, nos termos do art. 26 da Resolução TSE n. 23.546/17, in verbis:

Art. 26.  A escrituração contábil digital compreende a versão digital:

I – do Livro Diário e seus auxiliares; e

II – do Livro Razão e seus auxiliares.

§ 1º  A escrituração contábil digital deve observar o disposto nesta resolução e nos atos expedidos pela RFB e pelo CFC.

§ 2º  Na escrituração contábil digital, os registros contábeis devem:

I – identificar:

a) a origem e o valor das doações e contribuições;

b) as pessoas físicas com as quais tenha o órgão partidário transacionado, com a indicação do nome e do CPF do doador ou contribuinte ou do CNPJ, em se tratando de partido político; e

c) os gastos de caráter eleitoral, assim considerados aqueles definidos no art. 26 da Lei nº 9.504/1997;

II – especificar detalhadamente os gastos e os ingressos de recursos de qualquer natureza.

 

Como se depreende, por meio desse documento eletrônico são lançadas todas as operações patrimoniais ocorridas, incluídas as doações estimáveis em dinheiro, revelando-se, portanto, instrumento imprescindível à atividade de fiscalização desempenhada pela Justiça Eleitoral.

Nesses termos, a obrigatoriedade de apresentação do comprovante de remessa à Receita Federal do Brasil da Escrituração Contábil Digital é expressa nos arts. 29, inc. I, e 66, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17, conforme transcrevo:

Art. 29.  O processo de prestação de contas partidárias tem caráter jurisdicional e inicia-se com a apresentação, ao órgão da Justiça Eleitoral competente, das seguintes peças elaboradas pelo Sistema de Prestação de Contas Anual da Justiça Eleitoral:

I – comprovante de remessa, à RFB, da escrituração contábil digital;

 

[...].

 

Art. 66.  A adoção da escrituração digital e o encaminhamento pelo Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), previstos nos arts. 26, § 2º, e 27, são obrigatórios em relação às prestações de contas dos:

(...).

II – órgãos estaduais dos partidos políticos, a partir da apresentação de contas do exercício de 2016, a ser realizada até 30 de abril de 2017; e

 

A despeito da determinação legal da adoção da escrituração digital, este Tribunal já entendeu que a omissão do referido documento representa impropriedade formal quando for possível efetuar a análise técnica das contas a partir de outros elementos disponíveis, mormente por meio da digitalização dos livros contábeis gerados pelo sistema específico da Justiça Eleitoral (TRE-RS – REl n. 963, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DEJERS de 04/09/2019).

Na hipótese concreta, entretanto, não houve o referido suprimento por outros meios, tendo a unidade técnica atestado que, em razão da sonegação da escrituração contábil digital, “não tem como aferir com segurança a validade das informações apresentadas no Balanço Patrimonial e no Demonstrativo de Resultados”, bem como que “é imprescindível a manutenção de Escrituração Contábil Digital, para dar efetividade aos demonstrativos contábeis apresentados na prestação de contas”.

Dessa forma, a irregularidade em liça, não saneada por outros meios, configura falha grave e capaz, por si só, de gerar a desaprovação das contas, na linha da jurisprudência:

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO. ANO 2017. PARTIDO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. INSTRUÇÃO NORMATIVA DA RFB. ESCRITURAÇÃO CONTÁBIL DIGITAL. OBRIGATORIEDADE. DESAPROVAÇÃO. 1 - Consta dos autos a identificação de irregularidade grave, especificamente quanto à não apresentação da Escrituração Contábil Digital (ECD) à Receita Federal do Brasil - RFB. 2 - De acordo com o art. 25 da Resolução-TSE nº 23.464/2015, com a leitura conjunta do art. 66, III, da Resolução-TSE nº 23.546/2017, os órgãos partidários municipais deverão adotar escrituração contábil digital, a partir do exercício financeiro de 2017. 3 - Verificada irregularidade que compromete a integralidade das contas e a fiscalização por parte da justiça eleitoral, bem como de outros órgãos de controle. São condutas como essas que muitas vezes encobrem a existência de ilícitos e irregularidades não só eleitorais, cabendo a Justiça Eleitoral desestimular o enriquecimento ilícito e os desvios de dinheiro público, fazendo renascer a confiança dos cidadãos nas Instituições e resgatando a finalidade dos partidos políticos, que possuem como sua maior função a de representação. 4 - Nos últimos anos, várias leis surgiram realizando alterações diversas no sistema de prestação de contas, objetivando em especial o aprimoramento e a fiscalização das receitas e despesas eleitorais e partidárias. Tivemos muitos avanços de forma a dificultar a influência do poder econômico no cenário político e nas campanhas eleitorais, permitindo uma maior moralização e transparência das contas, bem como buscando garantir a igualdade entre todos os players do processo eleitoral. 5 - Sentença mantida. Recurso desprovido.

(TRE-CE - RE: 425 SÃO GONÇALO DO AMARANTE - CE, Relator: KAMILE MOREIRA CASTRO, Data de Julgamento: 05/05/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 81, Data 07/05/2020, Página 04/05) Grifei.

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. OMISSÃO DE RECEITAS ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO. AUSÊNCIA DE ESCRITURAÇÃO CONTÁBIL DIGITAL. LIVROS DIÁRIO E RAZÃO. EFETIVO PREJUÍZO A ANÁLISE DAS CONTAS. DESAPROVAÇÃO. (...). 2. As ausências dos livros de escrituração contábil Diário e Razão, nos quais são lançadas todas as operações patrimoniais ocorridas, comprometeram sobremaneira a consistência e a confiabilidade das contas, porquanto obstaram o seu efetivo controle por parte desta Justiça Especializada, revestindo-se de irregularidade grave apta a ensejar a desaprovação das contas. (...).

(TRE-ES - PC: 5209 VITÓRIA - ES, Relator: RODRIGO MARQUES DE ABREU JÚDICE, Data de Julgamento: 18/11/2019, Data de Publicação: DJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do ES, Data 09/12/2019, Página 05) Grifei.

 

RECURSO ELEITORAL - PRESTAÇÃO DE CONTAS - PARTIDO POLÍTICO - COMISSÃO PROVISÓRIA MUNICIPAL - EXERCÍCIO FINANCEIRO 2016. LEI Nº 9.096/1995. RESOLUÇÃO TSE Nº 23.464/2015. JUNTADA DE DOCUMENTOS EM GRAU RECURSAL. PRECEDENTES. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LIVROS DIÁRIO E RAZÃO. IRREGULARIDADE GRAVE QUE COMPROMETE A ANÁLISE E FISCALIZAÇÃO DAS CONTAS. DESAPROVAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A ausência de livros diário e razão compromete a análise das contas. Ainda, a inexistência, ou falta de autenticação ou registro do Livro Diário no órgão competente é requisito extrínseco de validade desse documento, o que fica inviabilizado com a ausência de sua juntada. Ademais, não havendo a juntada do comprovante de remessa da escrituração contábil à Receita Federal via Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) impossível se aferir com certeza e precisão a veracidade e regularidade das informações prestadas pela agremiação partidária. Precedente: PC nº 176-33.2017.6.16.0000. Rel. Luiz Fernando Wowk Penteado, julgado em 21 de Janeiro de 2019 2. Recurso conhecido e desprovido, mantendo-se a sentença de desaprovação das contas.

(TRE-PR - RE: 5303 GUARATUBA - PR, Relator: CARLOS ALBERTO COSTA RITZMANN, Data de Julgamento: 23/10/2019, Data de Publicação: DJ - Diário de justiça, Tomo 204/, Data 28/10/2019) Grifei.

 

2. Do Recebimento de Recursos em Espécie sem Identificação do Doador

 

A partir dos extratos bancários apresentados pela agremiação, o examinador técnico detectou depósitos, na conta n. 13.1664700-4, agência 0027, do Banrisul, no total de R$ 1.850,50, cujos doadores não puderam ser identificados pelo CPF ou CNPJ nas operações realizadas, conforme discriminado na seguinte tabela:

Com efeito, o art. 7º, caput, e o art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17 estabelecem que as transações bancárias em favor do prestador de contas devem ser feitas, obrigatoriamente, mediante cheque cruzado ou depósito bancário direto, sempre com identificação do CPF ou CNPJ do doador. Transcrevo o teor dos dispositivos em comento:

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

 

(...).

 

Art. 8º. (...).

§ 1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político ou por depósito bancário diretamente na conta do partido político (Lei nº 9.096/1995, art. 39, § 3º).

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deve ser realizado na conta “Doações para Campanha” ou na conta “Outros Recursos”, conforme sua destinação, sendo admitida a efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou contribuinte ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, seja obrigatoriamente identificado.

 

Por sua vez, o art. 13, inc. I, al. “a”, da citada Resolução dispõe que se consideram de origem não identificada os recursos recebidos pelo partido em que o nome ou inscrição no CPF ou CNPJ do doador não tenha sido informado, litteris:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I – o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF ou no CNPJ do doador ou contribuinte:

a) não tenham sido informados; e

 

Nesses termos, a jurisprudência deste Tribunal pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave que impede o controle da Justiça Eleitoral sobre eventuais fontes vedadas e prejudica a transparência das declarações contábeis.

Nessa linha, colaciono julgado deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. AFASTADA A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DE DIRIGENTE PARTIDÁRIO. MÉRITO. LICITUDE DAS DOAÇÕES REALIZADAS POR DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. DEPUTADO ESTADUAL. FALTA DE IDENTIFICAÇÃO DO CPF DE CONTRIBUINTES NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. REPASSE DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO A ÓRGÃO IMPEDIDO DE RECEBER VALORES DESSA RUBRICA. INOBSERVÂNCIA DA APLICAÇÃO DO PERCENTUAL DE PROMOÇÃO À PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. SUSPENSÃO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS.

(...).

3. Emprego de verbas de origem não identificada. Valores depositados em espécie e na conta da agremiação, sem a identificação do CPF do contribuinte. Irregularidade que enseja o recolhimento do montante indevidamente utilizado ao Tesouro Nacional.

(...).

7. Desaprovação.

(TRE-RS, PC 54-16, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 10.10.2018, publicado no DEJERS n. 187, de 15.10.2018, págs. 4-5) Grifei.

 

Indiscutível, portanto, a caracterização de recurso de origem não identificada em relação aos valores percebidos pelo partido político, via depósito bancário, sem a indicação do doador.

Por consequência, o recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional é medida impositiva, porquanto corolário inafastável do recebimento pelo órgão partidário de quantia de origem não identificada, de acordo com o previsto no art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.546/17:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

§ 1º O disposto no caput também se aplica aos recursos provenientes de fontes vedadas que não tenham sido estornados no prazo previsto no § 5º do art. 11, os quais devem, nesta hipótese, ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

 

Conclusão

Assim, malgrado a irregularidade relativa ao recebimento de recursos de origem não identificada seja percentualmente diminuta, representando pouco mais de 1% da receita financeira total arrecadada no exercício (R$ 171.285,62), a ausência do comprovante de remessa da escrituração contábil digital constitui falha grave, uma vez que impede a triangulação de dados entre os sistemas de controle e prejudica a aferição da veracidade e regularidade das informações prestadas, impossibilitando a verificação transparente e confiável da movimentação financeira.

Por essa razão, entendo pela desaprovação das contas, com fulcro no art. 46, inc. III, al. "b”, da Resolução TSE n. 23.546/17.

Outrossim, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada decorre a obrigação de recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 1.850,80, com base no art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, c/c. o art. 14, caput, ambos da Resolução TSE n. 23.546/17.

Deve incidir, ainda, multa de até 20% sobre a quantia irregular, nos termos do art. 49, caput, da Resolução TSE n. 23.546/17 (art. 37 da Lei n. 9.096/95), a qual, conforme estabelece o parágrafo 2º do referido dispositivo legal, deve ser dosada de forma proporcional e razoável, observando-se as cifras percentuais e absolutas da falha detectada.

Nessa esteira, tendo em vista as circunstâncias do caso concreto, mormente a diminuta monta da mácula financeira estabelecida, bem como o prejuízo à confiabilidade e transparência das contas, de conteúdo inestimável, relacionado à ausência de escrituração contábil, entendo pela aplicação da penalidade no patamar máximo legal de 20% sobre o valor de R$ 1.850,80, fixando-se, assim, a multa na quantia de R$ 370,16.

Por sequência, sendo reconhecida a utilização de recursos de origem não identificada ou esclarecida, cabe a análise da previsão contida no art. 47, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17 (art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95), que prevê a suspensão do repasse de quotas do fundo partidário para o caso “até que o esclarecimento seja aceito pela Justiça Eleitoral”.

Ocorre que, interpretando referida norma, este Tribunal tem entendido pelo afastamento da penalidade ao fundamento de que a medida somente teria sentido no curso do processamento, porquanto, uma vez julgadas as contas, tal prova sequer teria espaço para ser realizada por força da preclusão processual.

Ademais, em muitas ocasiões, pode restar demasiado difícil, ou mesmo impossível, ao prestador oferecer o clareamento devido sobre a origem dos valores, o que culminaria em penalidade perpétua.

Trago à baila aresto desta Corte sufragando tal posicionamento:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO DE 2015. DESAPROVAÇÃO. MATÉRIA PRELIMINAR ACOLHIDA. INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 55-D DA LEI N. 9.096/95, INCLUÍDO PELA LEI N. 13.831/19. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA E DE FONTE VEDADA. PORCENTAGEM REPRESENTATIVA DAS IRREGULARIDADES DIANTE DA TOTALIDADE DOS RECURSOS ARRECADADOS NO PERÍODO. AFASTADA A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DO JUÍZO DE DESAPROVAÇÃO. REDUZIDO O PERÍODO DE SUSPENSÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO. AFASTADA A CONDIÇÃO DE QUE A SANÇÃO SUBSISTA ATÉ QUE OS ESCLARECIMENTOS SEJAM ACEITOS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. PROVIMENTO PARCIAL.

(…). 5. Afastada a penalidade de suspensão do recebimento de novas quotas até que a origem do recurso seja informada. A interpretação teleológica do texto do art. 46, inc. II, da Resolução TSE n. 23.432/14 evidencia que o repasse de novas quotas do Fundo Partidário somente ficará suspenso até que a justificativa seja aceita pela Justiça Eleitoral ou haja o julgamento do feito. Reduzido prazo de suspensão do Fundo Partidário para seis meses. Recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia impugnada, oriunda de origem não identificada e de fonte vedada.

6. Parcial provimento.

(TRE; PC 35-92.2016.6.21.0005; Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann; julgado em 01.07.2019, DJE de 23.08.2019) Grifei.

 

Contudo, a partir de proposta do eminente Des. Eleitoral Gerson Fischmann, encaminhada na sessão de 28.01.2020, por ocasião do julgamento do RE 8-98, esta Corte sinalizou a necessidade de aprofundar a reflexão sobre o tema, de modo que o posicionamento não implique negativa de aplicação de qualquer forma de reprimenda à utilização de recursos de origem não identificada, enquanto inequívoca a vontade legislativa de sancionar em específico a irregularidade.

Por outro lado, compatibilizando os princípios da segurança jurídica, da isonomia e da confiança dos jurisdicionados para que se promova a atualização dos iterativos precedentes deste Tribunal em um mesmo sentido, foi que se enunciou que eventual mudança jurisprudencial deve ocorrer apenas para os exercícios financeiros de 2019 e posteriores, conforme ilustra a seguinte ementa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AFASTAMENTO, DE OFÍCIO, DA PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO REPASSE DE NOVAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESPROVIMENTO.

1. Afastada preliminar de nulidade da sentença devido à suposta deficiência do exame técnico e falta de análise dos documentos juntados pela grei. Documentação devidamente considerada por esta Corte, sem alterações quanto à garantia da ampla defesa, ao procedimento técnico de exame e à fundamentação da sentença recorrida.

2. Recebimento de recursos sem a identificação do CPF dos doadores, em dissonância com o art. 13 da Resolução TSE n. 23.464/15. Insuficiência dos documentos declinando nomes e números de contas bancárias dos contribuintes para suprir a falta de indicação de suas inscrições no CPF.

3. Falha que representa 85,08 % do montante auferido pelo partido no exercício financeiro em análise. Manutenção do recolhimento ao erário e da aplicação de multa. Afastada a penalidade de suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário imposta de modo a persistirem seus efeitos até que os esclarecimentos sobre a origem dos recursos sejam aceitos pela Justiça Eleitoral. Proposta a discussão do tema para as prestações de contas do exercício financeiro de 2019, a fim de conferir efetividade e compatibilidade entre as sanções de suspensão de recebimento de quotas do Fundo Partidário e de recolhimento dos recursos ao Tesouro Nacional, estabelecidas no inc. I do art. 36 e no § 3º do art. 37 da Lei n. 9.096/1995, respectivamente.

4. Desprovimento.

(TRE-RS; RE 8-98.2018.6.21.0083, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgamento em 09.03.2020) Grifei.

Na mesma linha, o seguinte julgado:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO ESPONTÂNEO DO MONTANTE IRREGULAR. SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ART. 37, CAPUT, DA LEI N. 9.096/95. DESAPROVAÇÃO.

(...).

5. Outrossim, afastada a mesma penalidade, prevista no art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95, em decorrência da utilização de recursos de origem não identificada, ao fundamento de que pode ser impossível ao prestador esclarecer a origem dos valores, ou mesmo, de que, após o julgamento das contas, sequer teria lugar o exame de novos esclarecimentos, o que culminaria em penalidade perpétua. Em julgamento recente, ainda em aberto por pedido de vista, esta Corte sinalizou a necessidade de aprofundar a reflexão sobre o tema, de modo que o posicionamento não implique negativa de aplicação de qualquer forma de reprimenda à utilização de recursos de origem não identificada, enquanto inequívoca a vontade legislativa de sancionar em específico a irregularidade, ressalvando-se futura reanálise do tema para os exercícios financeiros de 2019 e posteriores. Ademais, na hipótese, comprovado o pagamento devido ao Tesouro Nacional, não há que se falar em suspensão do Fundo Partidário em decorrência do recebimento de recursos de origem não identificada.

6. Desaprovação.

(TRE-RS; PC 0600301-74.2018.6.21.0000, Relator: Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgamento em 04.02.2020) Grifei.

 

Dessa forma, mostra-se indevida a penalidade prevista no art. 36, inc. I, da Lei n. 9.096/95, no caso concreto, envolvendo a movimentação financeira de 2018, na esteira da jurisprudência deste Tribunal.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas do exercício financeiro de 2018 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO CIDADANIA, na forma do art. 46, inc. III, al. "b”, da Resolução TSE n. 23.546/17, e pela condenação da agremiação:

a) ao recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 1.850,80, com fulcro no art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, c/c. o art. 14, caput, ambos da Resolução TSE 23.546/17; e

b) ao pagamento de multa de 20 % sobre o montante irregular, perfazendo a quantia de R$ 370,16, com fundamento nos arts. 37 da Lei n. 9.096/95 e 49 da Resolução TSE n. 23.546/17.