REl - 0600497-10.2020.6.21.0021 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/12/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas devido à realização de abastecimento com 91,4 litros de gasolina, em um mesmo dia, no valor de R$ 420,74, paga com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), deixando de demonstrar com termo de cessão de veículos ou documentação equivalente que justificasse o gasto.

Compulsando os autos, verifica-se que a candidata informou que utilizou dois veículos em sua campanha, um de sua propriedade e outro de propriedade do Sr. Willian D. Werhausen, entretanto juntou apenas o Termo de Cessão referente a seu veículo (ID 43517333 e 43517783).

A unidade técnica apontou essa irregularidade, indicando que a recorrente não juntou documentos comprobatórios de haver um outro veículo além do seu, transcrevo:

2. Existem despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, situação que deve ser esclarecida pelo prestador de contas.

 

 

Em resposta ao Relatório de Exame de Contas (ID 80417270), a prestadora de contas apresentou termo de cessão de veículo (VW Saveiro) firmado por ela própria (ID 82410518). Alegou ainda ter utilizado veículo de Willian D. Werhausen, reconhecendo, contudo, ter deixado de formalizar o termo de cessão respectivo. Tampouco especificou que espécie de veículo teria sido utilizado. Também omitiu-se em apresentar prestação de contas final retificadora com a devida inclusão no sistema SPCE das receitas estimadas com a utilização de automóveis, o que prejudica a transparência e publicidade das contas apresentadas.

 

Assim sendo, ainda que se possa considerar comprovada a utilização do veículo próprio, a despeito das falhas formais acima relatadas, não é possível a mesma conclusão para a cessão de veículo alheio, ante a completa falta de prova documental.

 

Por consequência, a destinação dos gastos realizados com combustíveis para a campanha da candidata não restou integralmente comprovada. Frise-se que o documento ID 82410512 demonstra a aquisição de aproximadamente 91 litros de combustível na mesma ocasião, totalizando R$ 420,74 (quatrocentos e vinte reais e setenta e quatro centavos). Ante a parca comprovação documental dos meios de utilização deste produto, não é possível considerar idôneos os gastos realizados com recursos públicos em benefício da campanha da candidata. Recomenda-se, pois, a devolução deste valor ao erário.

Por tal razão, tratando-se de apenas um automóvel, mostra-se irregular o fato de a nota fiscal do Scheeren Comércio de Combustíveis Ltda. indicar que, no dia 09.11.2020, a candidata abasteceu 91,4 litros de gasolina, pagando o valor de R$ 420,74. O elevado consumo não foi justificado com a realização de carreata, registro de locações, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia.

Essa foi a falha que motivou a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento da quantia de R$ 420,74 ao erário, conforme consta da sentença recorrida:

No caso em tela, no entanto, não houve adequada comprovação documental dos gastos realizados para compra de combustíveis com recursos oriundos do FEFC, o que constitui a segunda irregularidade apontável ao caso. Feita a análise técnica, verificou-se que a candidata realizou no dia 09/11/2020 despesa com recurso do FEFC no valor de R$ 420,74, referente a aquisição de combustível (ID 82410512). Do respectivo documento fiscal inferem-se quatro abastecimentos: 50,020 litros, 33,66litros, 6,526 litros, e 1,202 litros, totalizando 91,4 litros adquiridos em 09/11/2020. Na mesma data, houve outro abastecimento no valor de R$ 169,26 (34,55 litros) no mesmo posto de combustível também pago com recursos públicos (ID 82410513).

Ocorre que não foram declarados veículos suficientes a comportar a aquisição de tamanho volume de combustível em um único dia de campanha. Ainda que o documento ID 82410513 consubstancie gasto de combustível compatível com a esperada utilização em campanha, o mesmo não ocorre com os abastecimentos que compõe o documento fiscal ID 82410512, os quais totalizam 91,4 litros de combustível.

Note-se que há apenas um termo de cessão juntado aos autos de veículo próprio da candidata na categoria passeio. Nada há a justificar os quatro abastecimentos referidos no documento ID 82410512, o qual, portanto, mostra-se inidôneo.

O pagamento de despesa de campanha com recursos públicos exige a demonstração inequívoca de que seu emprego foi realizado estritamente nos termos legalmente permitidos, o que, no caso em exame, não ocorreu.

Seja fazendo uso de um veículo, sejam dois, a forma desidiosa com que a prestadora reuniu informações sobre a utilização de recursos públicos em sua campanha não lhe desincumbe do ônus de comprovar os gastos realizados.

O documento apresentado (ID 43517483) não afasta a irregularidade, visto que todos os gastos eleitorais devem ser contabilizados com nota fiscal individualizada, específica, na data de aquisição do produto/serviço, e não foi o que se verificou no caso dos autos.

Nas razões recursais, a candidata alega ter seguido orientação da coordenação de campanha, razão pela qual abasteceu seu veículo em diversos dias, mas só efetuou o pagamento e recebeu a respectiva nota fiscal em uma única data (09.11.2020), ao final da campanha.

O procedimento adotado é irregular e o fato de ter sido efetuado por orientação da coordenação não escusa a prestadora da responsabilidade de observar a legislação que regulamenta os gastos de campanha, especialmente no que se refere à aplicação das verbas públicas do FEFC.

O § 2º do art. 45 da Resolução TSE n. 23.607/19 expressamente prevê que o candidato é solidariamente responsável com as pessoas que administram a campanha e os profissionais de contabilidade pela regularidade das contas de sua campanha.

Ademais, ocorre que, como bem demonstrou a magistrada em sua decisão, na mesma data, 09.11.2020, houve a emissão de duas notas fiscais, referentes a abastecimento com gasolina nas seguintes quantias e valores: 91,4 litros, R$ 420,74; e 34,5 litros, R$ 169,26. E, no dia 06.11.2020, houve o fornecimento de combustível na quantia de 32,6 litros, no valor de R$ 150,00 (ID 43515383).

Portanto, a tese defendida pela recorrente não encontra amparo em sua prestação de contas, uma vez que foram emitidas três notas fiscais contra o CNPJ da candidata, fato que vai de encontro ao argumento de que tinha seguido orientação de abastecer seu veículo e somente no final emitir comprovante único de abastecimento.

De qualquer modo, frisa-se que tal procedimento está em desacordo com a transparência exigida na prestação de contas, em particular tratando-se de verba pública, visto que os recursos utilizados são oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Além da falha apontada na sentença, a Procuradoria Regional Eleitoral acrescenta que a candidata reconhece ter utilizado somente seu veículo próprio na campanha, conforme termo de cessão do ID 43517783, e que o abastecimento foi efetuado com recursos do FEFC, em violação ao disposto no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O dispositivo legal em questão estabelece que não configura gasto eleitoral e não pode ser pago com recursos de campanha o valor despendido em combustível usado para uso do próprio candidato, verbis:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

De fato, embora o juízo a quo não tenha considerado essa questão, observa-se que diante da ausência de gasto com combustíveis para uso de veículos em carreata, registro de locações, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, são irregulares todas as despesas com combustíveis efetuadas durante a campanha, conforme bem concluiu a Procuradoria Regional Eleitoral.

Desse modo, as razões recursais são insuficientes para ser infirmada a conclusão de que o pagamento foi irregular.

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência e a lisura da prestação de contas.

A irregularidade, no total de R$ 420,74, representa 21,55% das receitas declaradas (R$ 1.952,25), dentro do parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Assim, torna-se viável o provimento parcial do recurso para que as contas sejam aprovadas com ressalvas, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Ressalto que permanece o dever de recolhimento ao erário, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, devido à utilização indevida dos recursos do FEFC verificada nas contas, como determinado na decisão do juízo a quo.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para reformar em parte a sentença e aprovar as contas com ressalvas, mantendo a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 420,74, nos termos da fundamentação.