REl - 0600517-96.2020.6.21.0151 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/12/2021 às 10:00

VOTO

Da Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Do Mérito

Trata-se de recurso interposto por JAIR MACHADO e VITOR BINFARE MOTTIN, candidatos, respectivamente, ao cargo de prefeito e vice-prefeito no Município de Barra do Ribeiro-RS, contra sentença que desaprovou suas contas e determinou o recolhimento do valor de R$ 4.156,00 ao Tesouro Nacional, em razão das seguintes irregularidades: a) omissão de receitas e gastos eleitorais relativos ao fornecedor WIX.COM BRASIL Serviços de Internet Ltda., no valor de R$ 156,00; b) ausência de comprovação de gastos eleitorais com a utilização de recursos do FEFC, no montante de R$ 4.000,00, e pagamentos desses gastos em desacordo com o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19; c)  irregularidades no pagamento de despesas eleitorais com recursos privados por não observação da regra que exige a utilização de cheque nominal e cruzado.

 Procedo ao exame das irregularidades de forma individualizada, tais como expostas na sentença:

a) Ausência de comprovação do gasto eleitoral com o fornecedor WIX.COM BRASIL Serviços de Internet Ltda.

O parecer conclusivo (ID 40009433), mediante confronto de informações com a Administração Fiscal do Município de Santana de Parnaíba/SP, detectou a emissão de nota fiscal, não declarada à Justiça Eleitoral, contra o CNPJ do candidato.

Os dados omitidos são relacionados à nota fiscal n. 4247106, no valor total de R$ 156,00, emitida por WIX.COM BRASIL Serviços de Internet Ltda., vinculada ao gasto com a criação de site para a campanha, sem que tenha havido o registro da despesa na prestação de contas dos candidatos.

A emissão de nota fiscal sem a correspondente contabilização na prestação de contas revela indícios de omissão de gastos eleitorais, em violação ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

(…)

g) receitas e despesas, especificadas;

 

Os recorrentes admitem que a despesa foi omitida das contas eleitorais. Contudo, alegam que houve o pagamento por meio de cartão de crédito pessoal e que, após intimação do juízo de primeiro grau para esclarecer o apontamento, juntaram toda a documentação pertinente à contratação do site e à identificação da origem dos recursos.

Todavia, ao analisar a prova acostada aos autos, consistente em print da compra por cartão de crédito, fatura e recibo, verifica-se que não há a identificação do responsável pelo pagamento ou o nome do titular do cartão de crédito utilizado (ID 40007283), ou seja, não foi comprovada a origem dos recursos manejados para a quitação do referido gasto eleitoral.

Desse modo, a omissão em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil, uma vez que a prestação de contas deve ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, com especificação completa, na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2014. PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO (PSB). DIRETÓRIO NACIONAL E COMITÊ FINANCEIRO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

(...).

III. IRREGULARIDADES

10. Omissão de despesas: confronto com informações externas (R$ 369.860,32). Gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, violam o disposto no art. 40, I, f e g, da Res.-TSE nº 23.406/2014 e constituem omissão de despesas.

(...).

(Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator MIN. LUÍS ROBERTO BARROSO, Publicação: DJE, Tomo 241, Data 16.12.2019, p. 73.) (Grifei.)

 

O recurso financeiro utilizado para o pagamento pelo serviço prestado não transitou pelas contas bancárias da campanha, tornando-se impossível a identificação da sua origem e comprometendo, assim, a fiscalização da Justiça Eleitoral e a confiabilidade das contas.

No mesmo sentido colaciono julgado deste Tribunal Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. OMISSÃO DE DESPESAS. PERCENTUAL E VALOR ABSOLUTO REDUZIDOS. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MANTIDA A PENALIDADE IMPOSTA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Insurgência contra sentença que julgou desaprovadas as contas de candidato ao cargo de vereador, relativas ao pleito de 2020, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada, com determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

2. Constatada omissão de receitas e gastos eleitorais. A documentação constante nos autos não esclarece a origem dos recursos utilizados para pagamento das referidas despesas, uma vez que os valores não transitaram pela conta de campanha, impossibilitando a fiscalização pela Justiça Eleitoral.

3. Embora o montante da falha represente 27,06% das receitas arrecadadas para a campanha, a sua expressividade absoluta é reduzida e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e a dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19). No ponto, a jurisprudência do TRE-RS admite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas quando o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante.

4. Provimento parcial. Aprovação com ressalvas. Mantida a imposição legal de transferência dos valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19. (RE n. 0600310-27.2020.6.21.0142, j. em 06.07.2021, Relator:  DES. ELEITORAL AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI.) (Grifei.)

 

Por conseguinte, tendo em vista que a omissão de despesa paga com verbas que não transitaram nas contas específicas de campanha se configura utilização de recurso de origem não identificada, deve a quantia irregular ser recolhida aos cofres do Tesouro Nacional, consoante o previsto no art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE 23.607/19.

 

b) Da comprovação de despesa com recursos do FEFC, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em prosseguimento, a decisão do juízo a quo imputou mácula na quitação de despesa com recursos do FEFC, no montante de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), determinando, por consequência, o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional por irregularidade na comprovação do gasto eleitoral com recursos públicos (ID 40009633).

Em um primeiro aspecto, de acordo com as informações constantes do Demonstrativo de Despesas Efetuadas (ID 40008133), o pagamento refere-se à despesa contratada com o fornecedor Alexsandro Rutkoski Dumke (CPF: 004.864.890-60), descrita, de forma genérica, como "prestação de serviço para campanha política 2020".

Solicitada a especificação e comprovação da despesa em primeira instância, os prestadores limitaram-se a apresentar recibo subscrito pelo fornecedor (ID 40009083) e, posteriormente, com as razões de recurso, acostaram contrato de prestação de serviços (ID 40009983), no qual consta a contratação, em 10.11.2020, para “layout de santinho, composição e diagramação, contratação de prestadores de serviço para panfletagem, criação de revista virtual e impressa, layout de bandeiras, material de divulgação em redes sociais, Facebook”.

Conforme bem pontuou o ilustre Procurador Regional Eleitoral, Dr. Fábio Nesi Venzon, em seu parecer escrito, o pagamento de R$ 4.000,00, para cinco dias de serviços, há menos de uma semana do pleito, não se coaduna com extensão e espécie dos trabalhos indicados:

(...) referente à ausência de comprovação do gasto eleitoral – com o recurso é acostado um contrato de prestação de serviços (ID 40009983) que, contudo, não atende ao disposto no § 12º do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/20191, pois não há justificativa do preço contratado. Nesse sentido, teriam sido pagos R$ 4.000,00 para 5 dias de serviço. Estranha, contudo, o prazo exíguo e próximo ao pleito (o contrato foi assinado no dia 10.11.20), que não é compatível com os serviços previstos: layout de santinho, composição e diagramação, contratação de prestadores de serviço para panfletagem, criação de revista virtual e impressa, layout de bandeiras, material de divulgação em redes sociais, Facebook. Bem se vê que esses não são serviços contratados há menos de uma semana do pleito.

 

Além da inconsistência relativa ao preço contratado, o contrato não está de acordo com o disposto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 em relação à contratação de serviços de panfletagem, tendo em vista que o dispositivo em comento exige o detalhamento da contratação de pessoal, com a identificação dos nomes e locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado, litteris:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

[...]

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral dos prestadores de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

 

Portanto, o termo contratual apresentado está eivado de incongruências e desconformidades, que lhe subtraem a idoneidade para a prova do gasto eleitoral.

Outrossim, o adimplemento da despesa ocorreu por meio de cheque nominal e não cruzado, cuja cópia consta no ID 4007133, em violação ao comando do art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, com a seguinte redação:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I – cheque nominal cruzado;

II – transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III – débito em conta; ou

IV – cartão de débito da conta bancária. (grifei)

 

A norma em apreço possui caráter objetivo e exige, sem exceções, que o cheque manejado para pagamento de despesa eleitoral seja não apenas nominal, mas também cruzado.

A exigência de cruzamento do título visa a impor que o seu pagamento ocorra mediante crédito em conta bancária, de modo a permitir a rastreabilidade das movimentações financeiras de campanha, conferindo maior confiabilidade às informações inseridas na escrituração, em especial, que os prestadores de serviço informados na demonstração contábil foram efetivamente os beneficiários dos créditos.

Na hipótese, em consulta ao Sistema DivulgaCand (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/85375/210000811295/extratos), verifica-se, no extrato bancário eletrônico, que não consta no campo CPF/CNPJ a contraparte que teria descontado o cheque n. 000001, em 09.11.2020, da conta bancária n. 06.035141.0-1, do Banco Banrisul, de titularidade do candidato a vice-prefeito Vitor Binfaré Mottin.

Portanto, é incontroverso que o cheque referido foi emitido de forma não cruzada e que seu desconto ocorreu mediante saque em caixa, impossibilitando a identificação do beneficiário do pagamento na operação bancária.

Embora os candidatos afirmem que comprovaram a realização da despesa com a juntada dos documentos previstos no art. 60 Resolução TSE n. 23.607/19, ou seja, com “documento fiscal idôneo ou outros meios que possibilitem a verificação de sua natureza e regularidade”, trata-se de exigências distintas e simultâneas, que atendem a finalidades diversas.

Embora a prova oferecida seja suficiente para a caracterização da contratação do gasto, não foi possível verificar se o sacador do documento de crédito foi aquele apontado como fornecedor dos bens ou serviços, de modo a comprovar o ciclo do gasto em todas as suas fases.

Além disso, documentos unilaterais, como é o caso dos recibos e do contrato de prestação de serviços, não devem ser considerados isoladamente para suprir a ausência do cheque nominal e cruzado.

Nessa linha, este Tribunal Regional sufragou o entendimento de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitem a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado, sob pena de recolhimento do equivalente ao Tesouro Nacional, conforme ementa que reproduzo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO E VICE. APROVADAS COM RESSALVAS. USO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA-FEFC. IRRESIGNAÇÃO UNICAMENTE QUANTO À DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO ENTRE OS BENEFICIÁRIOS DAS CÁRTULAS E OS EMITENTES DAS NOTAS FISCAIS. INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTOS IDÔNEOS A COMPROVAR A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que julgou aprovadas com ressalvas prestação de contas de candidatos à majoritária, referentes às eleições municipais de 2020, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em face do uso irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

2. Insurgência delimitada à determinação de restituição ao erário, não estando a sentença sujeita à modificação na parte em que aprovou as contas com ressalvas, uma vez que a matéria não restou devolvida à apreciação do Tribunal nas razões de apelo.

3. A norma que regulamenta a forma de pagamento das despesas eleitorais está prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos de natureza financeira devem ser pagos por meio de cheque cruzado e nominal ao fornecedor. Incontroverso, na hipótese, o descumprimento, cabe a análise se, por um lado, essa conduta por si só, conduz à determinação de recolhimento dos valores apurados ao Tesouro Nacional ou, por outro lado, se existem documentos idôneos capazes de comprovar os gastos efetuados por meio dos cheques objeto da glosa.

4. A atual jurisprudência do TSE supera o entendimento até hoje vigente neste colegiado, estabelecendo, em síntese, que a devolução de valores oriundos de recursos públicos ao Tesouro Nacional somente é cabível nas hipóteses de ausência de comprovação da utilização dos recursos ou utilização indevida, comandos estabelecidos no § 1º do art. 79 da já citada Resolução TSE 23.607/19.

5. A análise da microfilmagem dos cheques estabelece que os beneficiários das cártulas foram pessoas estranhas aos fornecedores identificados e que apresentaram as notas fiscais e as declarações tendentes a estabelecer vinculação com os já citados cheques. As regras contidas na Resolução TSE n. 23.607/19 dispõem que os gastos de campanha devem ser identificados com clareza e estabelecendo elos seguros entre os beneficiários dos pagamentos e os serviços prestados. É a chamada rastreabilidade, isto é, os pagamentos devem ser atestados por documentos hábeis a demonstrar o serviço prestado pelo beneficiário e sua vinculação com a despesa, o que não ocorreu no caso concreto.

6. O contexto probatório não revela nenhum documento fiscal idôneo emitido pelos beneficiários dos cheques e tampouco contrato ou prova de prestação de serviços a justificar os pagamentos feitos. Ausente a vinculação entre os beneficiários dos cheques e os emitentes das notas fiscais, bem como a inexistência de provas, por documentos idôneos, de prestação de serviços por parte dos beneficiários das cártulas, resta descumprida a regra posta no art. 60, e parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19. Circunstância que atrai a incidência do disposto no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo a devolução dos valores ao Tesouro Nacional, como determinado na sentença.

7. Provimento negado.

(TRE-RS; REl 0600464-77.2020.6.21.0099, Relator designado: DES. ELEITORAL OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, julgado na sessão de 06 de julho de 2021.) (Grifei.)

 

Diante disso, houve irregularidade no gasto eleitoral, por infringência ao disposto no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, acarretando a obrigação de recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), a teor do disposto no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

c) Pagamento de gasto eleitoral com recursos privados, em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A terceira irregularidade apontada no parecer técnico (ID 40009433) também se refere ao pagamento de despesas eleitorais sem a utilização de cheque nominal e cruzado, porém com o manejo de recursos privados, nos seguintes termos:

A partir das cópias das cártulas acostadas aos autos pelo recorrente, depreende-se que, de fato, os títulos foram emitidos de forma nominal, mas não cruzados (ID 40007133).

Outrossim, em consulta ao sistema DivulgaCand (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/85375/210000811295/extratos), observa-se a ausência, no campo CPF/CNPJ, das contrapartes que teriam descontado os cheques e a informação de que houve o saque por caixa.

Consoante analisado no tópico anterior, o cheque não cruzado pode ser compensado sem depósito bancário, subtraindo a transparência e a confiabilidade na identificação dos beneficiários dos gastos em questão, uma vez que impossibilita a rastreabilidade das quantias utilizadas na campanha.

A transgressão do preceito normativo não foi refutada pelo prestador que, inclusive, admitiu o erro ao deixar de cruzar os cheques utilizados como meio de pagamento dos gastos eleitorais, caracterizando, de modo incontroverso, a irregularidade na forma de pagamento de suas despesas.

A alegação de que a exigência em tela impediria a contratação de “pessoas mais humildes” para as atividades em campanha não enseja a mitigação da regra, pois a sua finalidade é, justamente, impor que a movimentação dos recursos ocorra por meio do sistema bancário, garantindo maior transparência às transações.

Assim, não merece reforma a sentença no ponto em que reconheceu a presente irregularidade por infringência ao disposto no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, deixando, com acerto, de impor o recolhimento das quantias ao Tesouro Nacional em razão da natureza particular dos recursos empregados.

Conclusão

Finalmente, passo à análise da repercussão das irregularidades na prestação de contas.

Considerando que a totalidade das falhas apontadas (R$ 7.746,00) representa, aproximadamente, 20,34% das receitas declaradas pelos candidatos (R$ 38.075,59), não há que se falar em aplicação dos princípios da proporcionalidade ou da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Na espécie, as irregularidades identificadas alcançam parcela substancial da movimentação financeira e comprometem o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha, de forma que a manutenção da sentença de desaprovação é medida que se impõe.

No mesmo sentido, cito precedente deste Tribunal Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2016. UTILIZAÇÃO DE VERBAS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. INCONSISTÊNCIA ENTRE VALORES DECLARADOS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS RETIFICADORA E O RECIBO ELEITORAL. DESPESA COM TRANSPORTE. PERCENTUAL EXPRESSIVO DE COMPROMETIMENTO DAS CONTAS. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. NEGADO PROVIMENTO. 1. Emprego de verbas de origem não identificada. Valores depositados em espécie na conta de campanha do candidato, conforme os extratos bancários presentes nos autos. Alegada a procedência do Fundo Partidário. Ausência, entretanto, de documentos fiscais que comprovem a origem e a regularidade dos recursos, ensejando a manutenção do comando de recolhimento do montante indevidamente utilizado ao Tesouro Nacional. 2. Inconsistência na quantia declarada como despesas com transporte e deslocamento. Divergência entre o recibo eleitoral correspondente e os extratos da prestação de contas final apresentados à Justiça Eleitoral. 3. Irregularidades que impedem a verificação da real origem e aplicação dos recursos. Comprometimento expressivo, equivalente a 38,68% do somatório de recursos arrecadados. Mantida a desaprovação das contas. Desprovimento.

(TRE-RS – RE: 52324 ENTRE IJUÍS – RS, Relator: DES. ELEITORAL JORGE LUÍS DALL`AGNOL, Data de Julgamento: 18/12/2017, Data de Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 10, Data 24/01/2018, Página 9.) (Grifei.)

 

Portanto, deve ser mantida, de forma integral, a sentença recorrida.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, para manter a desaprovação das contas de Jair Machado e Vitor Binfare Mottin, relativas ao pleito de 2020, e a determinação de recolhimento do valor de R$ R$ 4.156,00 (quatro mil, cento e cinquenta e seis reais) ao Tesouro Nacional.