REl - 0600382-28.2020.6.21.0105 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/12/2021 às 10:00

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de campanha, eleições 2020, cargo de vereador, de JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS, no Município de Campo Bom.

Consta que a sentença desaprovou as contas do candidato em razão de doações com recursos próprios acima do limite legal, fixando multa no valor correspondente a 100% da quantia em excesso, com fulcro no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

In casu, o candidato poderia ter doado para a própria campanha a quantia de R$ 2.842,55, a qual corresponde a 10% do limite de gastos estabelecido para o cargo em que concorria (R$ 28.425,45), porém, doou R$ 7.300,00, excedendo, portanto, em R$ 4.457,45 o teto legalmente permitido.

No ponto, a Resolução TSE n. 23.607/19, que regulamenta a matéria, assim dispõe:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

 

O recorrente alega que o valor doado em excesso é módico, de apenas R$ 4.457,45, que desconhecia a legislação e que não houve desequilíbrio no pleito, tampouco má-fé por parte do candidato. Defende, ainda, que a multa deve ser reduzida e que a sentença não fundamentou seu patamar em 100% do valor do excesso.

Os argumentos não possuem o condão de alterar a decisão recorrida.

Com efeito, a regra é objetiva, o teto previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos é deduzido da regra estabelecida no art. 18-C da Lei das Eleições. Definido o valor para o cargo em relação a determinado município, o candidato pode autofinanciar sua campanha em montante de até 10% do aludido limite.

Nesse sentido, trago julgado de minha relatoria:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PROPORCIONAL. DESAPROVAÇÃO. APLICAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. MULTA. PATAMAR 30%. ART. 27, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. GASTOS ADVOCATÍCIOS E CONTÁBEIS. DISTINÇÃO ENTRE OS LIMITES DEFINIDOS QUANTO AO PLANO DE DESPESAS GERAIS E O TETO DE APLICAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS PELO CANDIDATO. AUTOFINANCIAMENTO. IRREGULARIDADE EM PERCENTUAL DE 24,69% DO TOTAL DECLARADO. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO DE MULTA AO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas do recorrente, tendo como fundamento a extrapolação do limite legal de doações com recursos próprios, e fixou multa correspondente a 30% da quantia em excesso, com fulcro no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Aporte de recursos próprios em campanha acima do teto de 10% conforme o cargo pleiteado na municipalidade, em afronta ao art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19. Distinção entre as regras definidas para os gastos globais, norma disposta no art. 4º, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e as pertinentes às receitas de campanha, no caso, art. 27, § 1º, da aludida resolução. Regra objetiva que visa limitar o valor a ser utilizado pelo candidato, para fins de autofinanciamento em sua campanha.

3. Irregularidade que representa 24,69% das receitas declaradas, mas de valor absoluto reduzido, a permitir, diante da incidência dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, a mitigação do juízo de desaprovação para aprovar as contas com ressalvas. Correção de ofício da sentença, para que o recolhimento da multa seja destinado ao Fundo Partidário.

4. Parcial provimento.

(Rel 0600194-33.2020.6.21.0041, julgado na sessão de 10.08.2021.) (Grifo nosso)

 

Assim, não importa a aferição quanto à ocorrência de desequilíbrio no pleito, se houve boa ou má-fé, ou se o candidato conhecia a legislação para a incidência da norma, nos termos do que constou no parecer da douta Procuradoria Eleitoral:

A regra prevista no art. 23, § 2º-A, da Lei nº 9.504/971, reproduzida no art. 27, § 1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, é objetiva, somente sendo possível o autofinanciamento que importe em até 10% do limite previsto para gastos de campanha no cargo em que concorrer o candidato. Esse limite, por sua vez, é estabelecido de acordo com a previsão contida no art. 18-C da Lei das Eleições.

No caso em tela, conforme destacado pela Unidade Técnica no Parecer Conclusivo (ID 44025433), a falha apontada compromete a regularidade das contas apresentadas, pelo uso de recursos próprios acima dos limites fixados.

Nesse contexto, correto o Juízo a quo ao julgar desaprovadas as contas, aplicando a multa prevista no § 4º do art. 27 da Resolução TSE nº 23.607/20193, no percentual máximo de 100%, vez que os recursos próprios utilizados representam 256,8% do limite legal; ou seja, não se trata de valor de pequena monta e/ou insignificante, ao contrário do que alega o recorrente. Inviável, portanto, a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para reduzir o quantum da multa imposta (TRE-RS, RE em PC nº 600202-53.2020.6.21.0156 – Palmares do Sul, Rel. Desembargador Eleitoral Sílvio Ronaldo Santos Moraes, DJe 14.05.2021). Trata-se, isso sim, de hipótese de aplicação do princípio da igualdade na disputa eleitoral, pois outros candidatos certamente cumpriram o dispositivo legal e limitaram seus gastos de campanha com recursos próprios, enquanto o recorrente não o fez, desequilibrando a disputa de forma ilícita.

Finalmente, não merece reforma a sentença que desaprovou as contas, vez que a irregularidade (R$ 4.457,45) representa 41,96% do total das receitas declaradas (R$ 10.623,50 – ID 44024233), percentual bem superior ao limite de 10% utilizado por essa egrégia Corte para aprovar as contas com ressalvas.

 

Quanto à alegada falta de fundamentação da multa, igualmente não procede o apelo no ponto.

A sentença examinou com percuciência a matéria, concluindo pela fixação da multa em seu grau máximo, diante do elevado excesso verificado. Por oportuno, transcrevo a decisão do juízo a quo (ID 44025583):

A Lei 9504/97 em seu artigo 18 prevê o limite de gastos com o intuito de manter o equilíbrio de forças entre os candidatos. Ocorre que esse regramento foi aprimorado pelo legislador ao incluir, por meio da Lei nº 13.878, de 2019, o § 2º-A no art. 23 da Lei 9504/97, o qual restringe o uso de recursos próprios até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha.

Esse foi um aperfeiçoamento da legislação que não pode ser ignorado, pois a limitação a patamares medianos do uso de recursos próprios é mais um instrumento legal com vistas a nivelar o fator financeiro na disputa eleitoral.

A jurisprudência considera que a desaprovação das contas em virtude dessa irregularidade poderia ser superada através da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, caso o valor da despesa fosse diminuto. No caso em tela os recursos próprios representam 256,8% do limite legal. Tal grandeza não autoriza a aplicação dos princípios citados.

600202-53.2020.621.0156 RE - Recurso Eleitoral n 060020253 - Palmares Do Sul/RS

ACÓRDÃO de 12.05.2021

Relator DES. ELEITORAL SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES

Publicação:DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 14/05/2021

 

Ementa:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. CANDIDATO. VEREADOR. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. FIXAÇÃO DE MULTA DE 100% SOBRE A QUANTIA EM EXCESSO. FALHA GRAVE. INVIÁVEL A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas de candidato a vereador, referentes às eleições municipais de 2020, por utilização de recursos próprios acima da demarcação legal, em campanha. Aplicação de multa de 100% sobre a quantia em excesso.

2. Extrapolado o limite permitido para autofinanciamento. Emprego de recursos financeiros próprios excedendo o teto de 10% do teto de gastos para campanha ao cargo de vereador no município, estabelecido no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. A tese articulada na irresignação faz confusão entre limite de gastos de campanha e limite de autofinanciamento. O art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe sobre o montante máximo de despesas para os cargos em disputa nas eleições de 2020, e o seu § 5º prevê que os custos de contabilidade não se sujeitam a limites de gastos ou a restrições que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa. Entretanto, o art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que trata do autofinanciamento de campanha, estabelece que o candidato poderá empregar o máximo de 10% do limite previsto para gastos atinentes ao cargo para o qual concorre, não havendo exceção a tal preceito. O limite para custeio da campanha com recursos próprios do candidato é objetivo, aferido a partir de simples equação matemática em relação à demarcação legal de gastos referentes ao cargo em disputa. Portanto, os gastos com serviços advocatícios ou contábeis, que realmente não se sujeitam ao valor máximo para gastos de campanha, devem ser considerados na aferição do limite de autofinanciamento.

4. Inviável a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade como forma de atenuar a gravidade das falhas sobre o conjunto das contas, uma vez que a irregularidade representa 40,48% da receita arrecadada. Nesse sentido, jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral e desta Corte.

5. O valor que ultrapassa o teto permitido para utilização de recursos próprios corresponde a 86,87% daquilo que poderia ser despendido em autofinanciamento de campanha. Manutenção da multa de 100% sobre o valor em excesso, pois adequada, razoável e proporcional à falha verificada.

6. Provimento negado.

Decisão: Por unanimidade, negaram provimento ao recurso.

Nesse sentido convergem os pareceres técnico conclusivo e do Ministério Público Eleitoral ao opinarem pela desaprovação das contas e pela imposição da multa, no valor de 100 % da quantia que ultrapassou o limite estabelecido para o uso de recursos próprios na campanha eleitoral.

Ante o exposto, acompanhando o parecer do Ministério Público Eleitoral, julgo DESAPROVADAS as contas de JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS, relativas às Eleições de 2020, em que concorreu ao cargo de Vereador, com fundamento nos artigos 30, inciso III, da Lei nº 9.504/97 c/c o artigo 74, inciso III da Resolução TSE nº 23.607/2019 e o condeno ao pagamento de multa no valor de R$ 4.457,45, o que corresponde a 100% (cem por cento) da quantia arrecadada em excesso, nos termos do artigo 27, § 4º da Resolução TSE 23.607/2019, a ser recolhida ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, conforme disposto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

 

Dessarte, não merece reforma a sentença, pois, de fato, o prestador utilizou recursos próprios que superam em R$ 4.457,45 o limite legalmente permitido, sendo a multa fixada em 100% do excesso adequada e proporcional.

Observe-se que a irregularidade em debate, excesso de autofinanciamento em R$ 4.457,45, representa 41,96% das receitas declaradas pelo prestador, percentual que extrapola em muito o utilizado como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas (10%).

Importa destacar que, em outros casos analisados por esta Corte versando sobre autofinanciamento acima do limite legal, ainda que as irregularidades importassem em percentual superior a 10% das receitas declaradas, se o valor estivesse abaixo de R$ 1.064,10, as contas poderiam ser aprovadas com ressalvas.

Entretanto, no caso dos presentes autos, não há como afastar o juízo de desaprovação das contas com base nos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, pois o valor nominal da irregularidade se mostra superior ao valor adotado como referência, ou seja, a quantia de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Ante o exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO do recurso, mantendo a sentença que desaprovou as contas de JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS e fixou multa no valor de 100% da quantia em excesso, ou seja, R$ 4.457,45, com fulcro no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.