REl - 0600547-69.2020.6.21.0010 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/12/2021 às 09:00

VOTO

Eminentes Colegas.

Tempestividade.

Muito embora o Juízo Eleitoral tenha considerado a irresignação extemporânea, verifico que a sentença foi prolatada em 30.3.21 e que a interposição do recurso ocorreu em 14.4.21, sem que houvesse intimação formal. O ato foi suprido pelo conhecimento implícito do teor do acórdão pela parte recorrente. conclusão lógica da própria interposição.

Ademais, reputo vencida a tese de extemporaneidade do recurso prematuro, nos termos do § 4º do art. 218 do Código de Processo Civil, o qual dispõe que “será considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo.”

Presentes os pressupostos de admissibilidade, passo ao mérito.

CARLOS ALBERTO ALVES, recorre da sentença que desaprovou suas contas de campanha relativas às eleições 2020 ao cargo de vereador no Município de Cerro Branco, em razão de (1) despesa irregular com combustível; (2) omissão de gastos; (3) divergência entre a movimentação financeira apresentada na prestação e aquela registrada nos extratos bancários; (4) omissão de receitas oriundas de recursos próprios; e (5) pagamento de despesas em desacordo com a legislação. A decisão hostilizada determinou o recolhimento da quantia de R$ 13,01 ao Tesouro Nacional.

1. Da despesa irregular com combustível

O prestador declarou dois gastos com combustíveis nos valores de R$ 171,00 e R$ 29,00, fornecedor UNI BRANCO AUTO POSTO LTDA., sem apresentar o correspondente registro de locação, cessão de veículo, publicidade com carro de som ou despesa com gerador de energia, hipóteses constantes do art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35 (…)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

Nas razões, alega o recorrente que o veículo abastecido era de sua propriedade, “não existindo razões lógicas para o mesmo candidato fazer uma doação estimável em dinheiro para utilizar o seu próprio automóvel”.

Contudo, ao indicar abastecimento em automóvel próprio e a utilização do referido veículo em atos de campanha eleitoral, o recorrente revela, na realidade, conduta que afronta o disposto no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…) § 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

(Grifei.)

A vedação é expressa no sentido de que o pagamento de combustível em veículo de uso do próprio candidato não pode ser originário de receitas de campanha, quer públicas, quer privadas. Além disso, todo recurso próprio, inclusive aquele estimável em dinheiro, está sujeito aos limites estabelecidos na legislação de regência, e a omissão de doações impede o controle efetivo sobre as contas do candidato.

Nesse norte, permanece a irregularidade.

2. Da omissão de gastos

Por meio do confronto de documentos fiscais integrantes da base de dados da Justiça Eleitoral, foi identificada a nota fiscal n. 21786, emitida contra o CPF do prestador por UNI BRANCO AUTO POSTO LTDA., no valor de R$ 13,01, sem correspondência nas informações registradas na prestação de contas.

Desde logo, observo que omitir gastos na campanha eleitoral é considerado falha relevante, pois impede a apuração da origem dos recursos utilizados para a correspondente quitação, e a utilização de tais verbas tem, como consequência, o juízo de desaprovação das contas, como segue:

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

(...)

§ 2º O disposto no caput também se aplica à arrecadação de recursos para campanha eleitoral os quais não transitem pelas contas específicas previstas nesta resolução.

Argumenta o recorrente que a nota fiscal em questão fora lançada por equívoco pelo fornecedor do serviço, o qual teria se compromissado a proceder o cancelamento, mas não o fez. Destaco que não veio aos autos elemento probatório a corroborar o alegado, e indico que a legislação prevê que cabe ao recorrente buscar o cancelamento da nota.

A verificação de gasto eleitoral não declarado, pago com verba que não transitou pela conta de campanha, caracteriza recurso de origem não identificada – RONI, exigindo o recolhimento do valor respectivo ao Tesouro Nacional, como bem determinado na sentença.

3. Da divergência entre a movimentação financeira apresentada na prestação e aquela registrada nos extratos bancários

Verifico do extrato bancário que a conta “Doações para Campanha” recebeu o aporte de R$ 205,40 no dia 29.10.2020, os quais não foram registrados na contabilidade ora analisada.

O recorrente silencia sobre o ponto, e os argumentos levados ao juízo de origem se mostraram obscuros. Em resumo, tratar-se-ia de quantia do FEFC recebida do candidato a prefeito na conta “Doações para Campanha”, valor posteriormente devolvido por meio de dois saques, conforme os extratos, como “cheque terceiros por caixa” nos valores de R$ 83,40 e R$ 122,00. Indico que, recebendo doação indevida, caberia ao candidato a transferência direta à conta doador, e não a emissão de cheques em valor fracionado para desconto por terceiros não identificados.

Sem esclarecimentos, não há como afastar a irregularidade.

Destaco que a decisão hostilizada não determinou o recolhimento da verba irregularmente movimentada.

4. Da omissão de receitas oriundas de recursos próprios

Foi identificada receita, por meio dos extratos bancários, proveniente de recursos próprios, na quantia de R$ 29,00, a qual não foi registrada na prestação de contas. O prestador silenciou a respeito da falha.

A prática produz o efeito de obstruir a fiscalização da Justiça Eleitoral, especialmente quanto à utilização de recursos próprios dentro do limite de 10% previsto para os gastos totais de campanha, e nesta não computados, ao qual o candidato está sujeito. Comprovado o ingresso de valor oriundo de recursos próprios não contabilizados na prestação, resta configurada a irregularidade.

5. Do pagamento de despesas em desacordo com a legislação

O parecer conclusivo apontou o pagamento irregular de despesas, ao considerar os descontos de dois cheques nos valores de R$ 122,00 e R$ 83,40 e a operação bancária de R$ 29,00, tratada no item anterior. Verifico que o desconto dos cheques na agência, em 30.10.2020, indica o preenchimento dos títulos de modo não nominal e cruzado, como determina o art. 38 da Resolução n. 23.607/19:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

Também neste tópico, o prestador silencia.

Não há nos autos cópias dos cheques, nem esclarecimentos corroborados por provas a respeito do destino dos valores, apenas a alegação de que os cheques de R$ 122,00 e R$ 83,40 constituíam a devolução do recurso de R$ 205,40, indevidamente transferido para a conta de campanha do candidato – sobre o qual, no ponto 3, já concluí se tratar de argumento obscuro, inaceitável, mormente porque os extratos bancários não apresentam as contrapartes sacadoras dos valores, apenas indicando “Cheque terceiros por caixa”.

Igualmente aqui a falha subsiste.

Por fim, sublinho que as irregularidades apresentam módico valor nominal, e o recolhimento recai sobre a irrisória quantia de R$ 13,01, permitindo a aplicação do princípio da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas por ser inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10, utilizado por este Tribunal para a construção de um juízo de aprovação com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO para dar provimento ao recurso, aprovar as contas com ressalvas  e manter a determinação de recolhimento de R$ 13,01 ao Tesouro Nacional.