REl - 0600639-51.2020.6.21.0138 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/11/2021 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Do Mérito

A sentença desaprovou as contas, sem determinar o recolhimento de quantias ao Tesouro Nacional, em razão da omissão de gastos eleitorais referentes à aquisição de combustível, no valor de R$ 329,01 (trezentos e vinte e nove reais e um centavo).

Nos autos, verifica-se a NF 50935 que demonstra o gasto de R$ 329,01 (trezentos e vinte e nove reais e um centavo) na troca de óleo e compra de combustível, na qual consta o CNPJ de campanha da candidata.

Ainda, conforme parecer conclusivo, a campanha foi inteiramente financiada com recursos privados.

A recorrente alegou erro no lançamento do CNPJ de campanha na NF, sustentando que deveria ter sido emitida contra o seu CPF, mas que, apesar do equívoco, não houve o dispêndio de receitas eleitorais no pagamento da compra.

Pois bem.

A legislação eleitoral preconiza que a emissão de nota fiscal para o CNPJ de campanha gera a presunção de existência da despesa, conforme preceitua o art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

 

Da leitura do dispositivo depreende-se que, se há a nota fiscal, houve o gasto correspondente. Nesse sentido, impõe-se ao candidato o dever de comprovar que o gasto eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma regular.

Se o gasto não ocorreu ou se o candidato não reconhece a despesa, a nota fiscal deve ser cancelada, consoante estipula o art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, e, em sequência, adotados os procedimentos previstos no art. 92, §§ 5º e 6º, da mesma Resolução, in verbis:

Art. 59. O cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular.

[...].

 

Art. 92. (...)

§ 5º O eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, apresentado por ocasião do cumprimento de diligências determinadas nos autos de prestação de contas, será objeto de notificação específica à Fazenda informante, no julgamento das contas, para apuração de suposta infração fiscal, bem como de encaminhamento ao Ministério Público.

§ 6º Na situação de eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, o prestador deverá apresentar a comprovação de cancelamento, junto com esclarecimentos firmados pelo fornecedor.

Na hipótese concreta, a mera alegação de equívoco não é suficiente para o saneamento da falha, sendo certo que não foi realizado o cancelamento da nota fiscal nem se comprovou a impossibilidade de sua efetivação.

Assim, a emissão de nota fiscal sem o registro da despesa correspondente na prestação de contas, revela indícios de omissão de gastos eleitorais em violação ao 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

(…)

g) receitas e despesas, especificadas;

Na mesma linha, a jurisprudência desta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. SUPLENTE. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. OMISSÃO DE DESPESA. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. BAIXO PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Omissão de despesas caracterizada pela existência de documentos fiscais sem o correspondente registro na prestação de contas. Falha grave que impossibilita a identificação da origem dos recursos utilizados para pagamento das despesas contratadas. Na espécie, apesar das alegações da prestadora acerca da emissão unilateral da nota fiscal e da argumentação sobre a responsabilização por ato de terceiro, não foi demonstrado o cancelamento do documento, de forma que se impõe o reconhecimento da omissão na prestação de contas. 2. As despesas omitidas na prestação de contas caracterizam recursos de origem não identificada, visto que foram ou serão pagas com recursos que deixarão de transitar pelas contas de campanha e de submeter-se ao controle da Justiça Eleitoral, o que atrai a imposição de recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional. Falha equivalente a 4,67% do total da receita declarada, possibilitando a aplicação dos precedentes desta Corte e do TSE que autorizam a aprovação com ressalvas das contas. (PC n. 0602542-21.2018.6.21.0000, j. em 05.11.2019, Relator: DES. ELEITORAL GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHALER)

Assim, inexistindo o cancelamento das notas fiscais, há evidência da realização do gasto eleitoral, situação que impede o afastamento da irregularidade.

Por conseguinte, a omissão de registro financeiro no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral deve ser considerada, tecnicamente, como recebimento de recurso de origem não identificada e, portanto, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Entretanto, como não houve determinação na sentença e somente o candidato recorreu, não cabe à Corte determinar o recolhimento de ofício, sob pena de violação do princípio da non reformatio in pejus.

Por outro lado, embora a irregularidade apontada (R$ 329,01) represente 52,39 % das receitas declaradas pelo candidato (R$ 628,00), em termos absolutos, o montante envolvido representa valor irrisório.

O Tribunal Superior Eleitoral tem aprovado com ressalvas as contas de campanha sempre que o montante das irregularidades represente valor absoluto diminuto, ainda que o percentual com relação ao total da arrecadação seja elevado.

Para tanto, a Corte superior adota como referência o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), como uma espécie de "tarifação do princípio da insignificância", considerando a quantia o máximo absoluto entendido como diminuto, conforme demonstram os julgados abaixo colacionados:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. VEREADOR. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DOAÇÃO A TÍTULO DE RECURSOS PRÓPRIOS MEDIANTE DEPÓSITO BANCÁRIO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. VALOR DIMINUTO DA IRREGULARIDADE CONSIDERADO SEU VALOR ABSOLUTO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto, ainda que o percentual no total da arrecadação seja elevado. Precedentes. 2. No caso dos autos, embora o percentual da irregularidade seja elevado, aproximadamente 76%, seu valor absoluto (R$ 950,00) deve ser considerado módico, uma vez que inferior a R$ 1.064,10 (mil, sessenta e quatro reais e dez centavos – 1.000 UFIRs). 3. Manutenção da decisão. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral nº 63967, Acórdão, Relator: MIN. EDSON FACHIN, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Data 06.8.2019).

Assim, na hipótese dos autos, embora o percentual da irregularidade na prestação de contas da candidata seja superior ao utilizado como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas, o seu valor absoluto (R$ 329,01) deve ser considerado módico, pois inferior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos – 1.000 UFIRs), sendo insuficiente para a desaprovação das contas.

Dessa forma, considerando-se reduzido valor absoluto da irregularidade, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, nos termos do inc. II do art. 74 da Resolução TSE n. 23.607/19, em face da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso para aprovar com ressalvas as contas de Rozeli Maria Camargo Piran, relativas ao pleito de 2020.