REl - 0600429-29.2020.6.21.0096 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/11/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e regular, comportando conhecimento.

 

Conhecimento de Novos Documentos Juntados na Fase Recursal

Inicialmente, consigno que, no âmbito dos processos de prestação de contas, expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura possa sanar irregularidades e não haja necessidade de nova análise técnica.

Potencializa-se o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de maneira a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha, como denota-se da ementa abaixo colacionada:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS COM A PEÇA RECURSAL. ACOLHIDA. MÉRITO. AUSENTE OMISSÃO. DIVERGÊNCIA ENTRE OS DÉBITOS CONSTANTES NOS EXTRATOS E OS INFORMADOS NA CONTABILIDADE. PAGAMENTO DESPESAS SEM TRÂNSITO NA CONTA DE CAMPANHA. IMPOSSIBILIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA MEDIANTE A JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS. INVIÁVEL NOS ACLARATÓRIOS. REJEIÇÃO. 1. Preliminar. Admitida a apresentação de novos documentos com o recurso, quando capazes de esclarecer irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. 2. Inviável o manejo dos aclaratórios para o reexame da causa. Remédio colocado à disposição da parte para sanar obscuridade, contradição, omissão ou dúvida diante de uma determinada decisão judicial, assim como para corrigir erro material do julgado. Presentes todos os fundamentos necessários no acórdão quanto às falhas envolvendo divergência entre a movimentação financeira escriturada e a verificada nos extratos bancários bem como do pagamento de despesas sem o trânsito dos recursos na conta de campanha. Não caracterizada omissão. Rejeição.

(TRE-RS - RE: 50460 PASSO FUNDO - RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 25.01.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 13, Data 29.01.2018, Página 4.) (Grifei.)

Logo, conheço da documentação juntada com o recurso.

 

Mérito

No mérito, a prestação de contas dos recorrentes foi desaprovada em virtude de: descumprimento quanto à entrega dos relatórios financeiros de campanha no prazo estabelecido pela legislação eleitoral, em relação às doações com recursos do FEFC, recebidas do Diretório Estadual (art. 47, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19); existência de despesas realizadas com combustíveis, no valor de R$ 845,07, sem o correspondente registro de locação ou cessão de veículos; abertura de conta específica para recursos do FEFC fora do prazo (art. 8º, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19); ausência de comprovantes de depósito bancário de financiadores de campanha e de documentos comprobatórios de gastos eleitorais; divergências entre as informações relativas às despesas constantes da prestação de contas final e aquelas integrantes da prestação de contas parcial, frustrando a execução tempestiva das medidas de controle concomitante, transparência e fiscalização (Resolução TSE n. 23.607/19, art. 47, § 6°).

Em relação ao primeiro ponto, que trata do atraso na entrega dos relatórios financeiros, tenho que não é capaz de prejudicar a idoneidade dos dados presentes na prestação de contas, sendo, isoladamente, fato incapaz de levar à desaprovação das contas.

Observo que a doação ocorreu em 05.11.2020 e o envio do relatório, em 09.11.2020. O atraso no cumprimento da obrigação foi de apenas um dia, o que não prejudica a análise das contas. Seria excesso de formalismo a desaprovação quando o encargo foi cumprido, mesmo que a destempo.

Sobre a segunda irregularidade, existência de despesas com combustíveis, no valor de R$ 845,07, sem o correspondente registro de locação ou cessão de veículos, tenho que os recorrentes não trouxeram argumentos capazes de alterar o resultado de julgamento.

A alegação de que os veículos são próprios e de que os prestadores das contas operaram em equívoco ao não registrar a cessão do bem, apenas consolidam o entendimento delineado na sentença recorrida. A cessão deveria ser devidamente registrada, nos termos do art. 7º, § 10, da Resolução TSE n. 23.607/19, e os gastos com combustível de veículo próprio não são considerados dispêndios eleitorais, conforme o art. 35, § 6º, da mesma resolução.

A despesa declarada de R$ 845,07 é irregular, pela ausência da correta declaração da cessão do bem e pela natureza da aplicação do recurso. Sem razão os recorrentes.

Quanto à terceira irregularidade apontada, houve mero atraso na abertura da conta para o recebimento de recursos do FEFC, o que fora providenciado quando o Diretório informou sobre o aporte de recursos. O mero atraso é incapaz de ocasionar a reprovação das contas, visto que o fim fiscalizatório foi atendido. Com razão os recorrentes neste ponto. 

Quanto à quarta falha, ausência de comprovantes de depósito bancário de financiadores de campanha e de documentos comprobatórios de gastos eleitorais, observo que os recorrentes realizaram a juntada dos demonstrativos de depósito bancário de financiadores de campanha, conforme ID 41675783, e das notas fiscais das despesas realizadas (ID 41675833).

Como antes introduzido, tenho que, embora o recomendável seja que o exame da documentação ocorra em primeiro grau e pela unidade técnica, não é possível ignorar a juntada dos documentos faltantes assinalados no parecer conclusivo (ID 41615233). Cruzando as receitas e despesas listadas no parecer conclusivo com os documentos acostados ao apelo (ID  41675783 e  41675833), observo que os recorrentes cumpriram o encargo, embora a destempo.

Não desconheço que os prestadores das contas deixaram transcorrer in albis o prazo para a comprovação das despesas e receitas (ID 41675183). A juntada dos documentos ao presente recurso possibilita a averiguação da regularidade das contas, o que, no presente caso, restou evidenciado. Neste ponto, merece provimento o recurso.

Ao fim, em relação à quinta irregularidade, a divergência apontada é da ordem de R$ 11,55, quantia que se afigura irrisória, não sendo capaz de inviabilizar a aprovação das contas.

A pretensão recursal merece ser parcialmente acolhida.

Outrossim, quanto aos gastos com combustíveis, os prestadores não acostaram documentos, sequer na fase recursal, que demonstrem a regularidade da despesa de R$ 845,07. Portanto, neste ponto, permanece não saneada a irregularidade apontada na sentença.

Por outro lado, o valor total das irregularidades é de R$ 845,07, o que  representa 4,73% das receitas arrecadadas para o financiamento da campanha (R$ 17.856,00).

Ademais, o valor nominal da irregularidade é inferior a R$ 1.064,10, autorizando a aprovação das contas com ressalvas. Nessa linha, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e deste Tribunal admite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha frente ao conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10, como colho das seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator(a) Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data 29.09.2017.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.7.2020.) (Grifei.)

 

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas dos recorrentes relativas ao pleito de 2020, com fundamento no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

É como voto, Senhor Presidente.