REl - 0600328-48.2020.6.21.0142 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/11/2021 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo e regular, comportando conhecimento.

Do Conhecimento de Novos Documentos Juntados na Fase Recursal

O recorrente acosta, após a prolação da sentença pelo Juízo Eleitoral, contas retificadoras (ID 28619183, 28619083, 28618983, 28617733, 28617683).

Inicialmente, consigno que, no âmbito dos processos de prestação de contas, expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando, a partir de sua simples leitura, primo ictu oculi, seja possível esclarecer as irregularidades, sem a necessidade de nova análise técnica.

Entretanto, com esteio nessas premissas, tenho por não conhecer a prestação de contas retificadora oferecida com as razões recursais, porquanto demandaria a realização de exame pormenorizado dos lançamentos contábeis, em cotejo com os extratos bancários e demais batimentos integrantes dos procedimentos técnicos de exame, atividade a ser realizada, nas eleições municipais, em primeira instância.

Na mesma esteira, a inteligência do art. 71 da Resolução TSE n. 23.607/19 denota que somente é admitida a retificação das contas perante do juízo originário para o processamento do feito, restringindo-se a duas hipóteses, sob pena de ser considerada inválida: “I – na hipótese de cumprimento de diligência que implicar a alteração das peças inicialmente apresentadas;” e “II – voluntariamente, na ocorrência de erro material detectado antes do pronunciamento técnico”.

Transcorrido o momento processual adequado, tornou-se preclusa a possibilidade a apresentação de contas retificatórias, na esteira da jurisprudência deste Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINAR. EFEITO SUSPENSIVO À DECISÃO QUE JULGA AS CONTAS. NÃO CONHECIDA PRESTAÇÃO DE CONTAS RETIFICADORA APRESENTADA COM O APELO. REGULARIDADE DA INTIMAÇÃO REALIZADA PELO DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA ELEITORAL. MÉRITO. DIVERGÊNCIA ENTRE O REGISTRO DE DESPESAS NA ESCRITURAÇÃO DO CANDIDATO E OS EXTRATOS ELETRÔNICOS. OMISSÃO DE GASTOS COM COMBUSTÍVEIS. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS E CONTÁBEIS. BAIXO PERCENTUAL ENVOLVIDO NAS FALHAS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar. 1.1. Os arts. 68, 72 e 73 da Resolução TSE n. 23.463/15 preveem aplicação das sanções apenas após o trânsito em julgado da decisão relativa às contas. 1.2. Admissibilidade de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. Providência que não se coaduna à hipótese de juntada da própria prestação de contas retificadora. Não conhecido o documento juntado com o apelo. 1.3. Regularidade da intimação realizada por meio do Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral, ferramenta prevista no art. 84, §2º, da Resolução TSE n. 23.463/15, tratando-se de candidato não eleito com advogado habilitado nos autos. Nulidade não configurada.

(...).

(TRE-RS, RE n. 44135, Relator Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, DEJERS de 07.12.2017, p. 6.) Grifei.

Com essas considerações, não conheço das contas retificadoras juntadas após a sentença.

Do Mérito

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de WAGNER LOPES PINTO ao cargo de vereador nas Eleições de 2020, no Município de Candiota, e determinou-lhe o recolhimento de R$ 300,00 em favor do Tesouro Nacional, por omissão de gastos e consequente arrecadação de recursos de origem não identificada.

O ilustre magistrado a quo entendeu que o candidato, não tendo declarado em sua contabilidade o gasto com serviços advocatícios, os quais efetivamente foram prestados em prol da campanha, incorreu em omissão de despesa, cujo pagamento se deu com a utilização de recursos de origem não identificada. Tendo em vista não ser possível apurar o exato montante sonegado, foi esse fixado pela autoridade judicial em R$ 300,00, equivalente à média dos valores cobrados por advogados no município em questão para o desempenho de serviços similares.

Com efeito, segundo estabelece o art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, a prestação de contas deve ser integrada por todas as receitas e despesas, especificadamente, verbis:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

I - pelas seguintes informações:

[...]

g) receitas e despesas, especificadas;

In casu, não foi escriturada nas contas de campanha a despesa com serviços advocatícios, os quais efetivamente foram prestados ao candidato.

Desse modo, mostra-se patente a infringência à retrocitada norma.

O recorrente argumenta que o pagamento não constou em sua prestação de contas porque a despesa foi custeada pelos candidatos da chapa majoritária.

O argumento, entretanto, não foi amparada em qualquer documento probatório acerca da assunção da dívida por outros candidatos ou partidos políticos.

Outrossim, ainda que o gasto houvesse sido suportado por outros candidatos, o que, ressalto, não restou demonstrado no feito, tal fato não teria o condão de afastar a mácula, porquanto, de qualquer maneira, não houve o registro da despesa e da receita na prestação de contas, ainda que como doação estimável em dinheiro.

Logo, a receita utilizada para satisfação do débito com advogado, financeira ou estimável em dinheiro, caracterizou-se como recursos de origem não identificada, consoante o disposto no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesse passo, entendo que não merece reparo a decisão monocrática que, com base na média dos valores cobrados por outros advogados nas contas apresentadas por candidatos do Município de Candiota, conforme apurado pelo órgão técnico em primeira instância (ID 28617133), arbitrou em R$ 300,00 o quantum da despesa omitida e determinou ao candidato o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional.

Dessa forma, como bem pontuou a Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer (ID 40759933):

(...) caracterizado o recebimento de recursos de origem não identificada, está correta a sentença na parte em que reconheceu a irregularidade em tela, determinando o recolhimento dos valores omitidos ao Tesouro Nacional nos termos do art. 32 da referida Resolução. Outrossim, tendo em vista a ausência de qualquer informação pelo prestador, o valor utilizado pela unidade técnica para estimar o valor gasto com serviços de advocacia tomou com base outras prestações de contas referentes ao mesmo município.

Nessa linha, trago à colação recentes arestos desta Corte, em que foi assentado que a falta de escrituração no ajuste contábil de gastos com honorários advocatícios configura recursos de origem não identificada, sendo adequado o arbitramento do valor da despesa pelo juiz eleitoral:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO DE BEM ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. PRODUTO DO SERVIÇO OU ATIVIDADE ECONÔMICA DO DOADOR. NÃO COMPROVADO. OMISSÃO DE GASTOS. NOTA FISCAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSENTE REGISTROS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. IRREGULARIDADES DE ELEVADO PERCENTUAL. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que desaprovou as contas de candidato a vereador, relativas ao pleito de 2020, em virtude de recebimento de valor estimável em dinheiro, que não constituiu produto do serviço ou atividade econômica do doador; e de omissão de gastos com publicidade e serviços advocatícios, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional.

2. O art. 25 da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que os bens ou serviços estimáveis em dinheiro devem constituir produto de serviço ou atividade econômica do doador ou, no caso de bens, integrarem seu patrimônio. O relatório preliminar apontou a doação estimável em dinheiro de publicidade por materiais impressos sem a contrapartida de constituir produto de serviço ou atividade econômica da pessoa física que constou como doadora do material ao candidato.

3. Omissão de gastos relativos à emissão de uma nota fiscal de compra de adesivos e à falta de escrituração de despesa com honorários advocatícios, os quais foram fixados na sentença com base na média de mercado. Despesas que não constaram nas contas e caracterizam infringência ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. As irregularidades presentes nas contas, relativas à falta de escrituração de bem estimável e de despesas com adesivos e serviços advocatícios, impossibilitam a Justiça Eleitoral de verificar a origem dos valores utilizados para o pagamento dos gastos eleitorais da campanha, caracterizando recursos de origem não identificada.

5. As irregularidades representam 127,36% do total de receitas declaradas. Entretanto, apesar do percentual elevado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao que a disciplina normativa das contas considera módico. Desse modo, as contas podem ser aprovadas com ressalvas em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Circunstância que não afasta o dever de recolhimento ao erário, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, dos recursos sem identificação de origem verificados nas contas.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, REl n. 0600350-09.2020.6.21.0142, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 21.10.2021.) Grifei.

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. OMISSÃO DE GASTOS. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. REDUZIDO VALOR ABSOLUTO. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. MANTIDO O DEVER DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas, relativas ao pleito de 2020, em virtude da omissão de gastos com serviços advocatícios, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional.

2. Constatadas despesas com honorários advocatícios, omitidas na contabilidade do candidato, caracterizando infringência ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Na espécie, a tese articulada na irresignação não foi amparada por documento probatório acerca da assunção da dívida pelos candidatos da campanha majoritária. Portanto, a origem do recurso em suposta doação efetuada por outros candidatos não se sustenta em prova fidedigna, permanecendo a falha.

3. Diante do reduzido valor absoluto, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), podem as contas ser aprovadas com ressalvas, em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

4. Provimento. Aprovação com ressalvas. Mantido o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS, REl n. 0600349-24.2020.6.21.0142, Relator Des. Eleitoral Amadeo Henrique Ramella Buttelli, julgado em 20.10.2021.) Grifei.

 

Por derradeiro, cabe salientar que, na espécie, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, bem como a transparência, a confiabilidade e a lisura da prestação de contas.

Destarte, a falha identificada nas contas, consubstanciada no valor de R$ 300,00, conquanto represente 69,77% das receitas declaradas (R$ 430,00), mostra-se, em termos absolutos, reduzida e, inclusive, bastante inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módica, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), possibilitando a aprovação das contas com ressalvas.

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação do critério do valor nominal diminuto, que prepondera sobre eventual aferição do alcance percentual das falhas, de modo a afastar o juízo de desaprovação das contas quando o somatório das irregularidades se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10 (TRE-RS: PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020, e REl n. 0600399-70.2020.6.21.0103, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 20.05.2021).

 

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de campanha de WAGNER LOPES PINTO, relativas às eleições de 2020, mantendo a determinação de recolhimento de R$ 300,00 ao Tesouro Nacional.