REl - 0600358-09.2020.6.21.0005 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/11/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é regular e tempestivo, comportando conhecimento.

 

Mérito

A prestação de contas da recorrente foi desaprovada em virtude de: (a) utilização de recursos de origem não identificada (R$ 55,00), assim compreendidos por se tratar de doação realizada com o CNPJ da própria campanha e que não foram declarados na prestação de contas; (b) utilização de recursos de origem não identificada (R$ 1.200,00), assim compreendidos por se tratar de recursos próprios em valor incompatível com o patrimônio declarado no registro de candidatura; (c) ausência de abertura de conta bancária específica para o recebimento de recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha; (d) ausência de comprovação de gastos realizados com recursos do FEFC (R$ 542,50), mais especificamente, não comprovação da propriedade de veículo locado para uso na campanha; (e) ausência de lançamento de despesas no SPCE, identificadas pelos extratos bancários, no valor de R$ 135,50; (f) extrapolação do limite de gastos com aluguel de veículo automotor (R$ 90,60); e (g) existência de sobras de campanha decorrentes de erros de lançamento no SPCE. Foi determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores equivalentes aos recursos de origem não identificada (R$ 55,00 + R$ 1.200,00) e dos recursos do FEFC não comprovados (R$ 542,50), totalizando R$ 1.797,50. Por fim, foi aplicada multa correspondente a 100% do valor que extrapolou o limite de gastos, ou seja, R$ 90,60.

Em suas razões, a recorrente aborda apenas os itens b e d, deixando de recorrer dos demais (a, c, e, f e g). Quanto ao autofinanciamento (item b), argumenta que a ausência de declaração de patrimônio no registro de candidatura não se confunde com ausência de renda. Alega que recebe cerca de R$ 1.400,00 mensais a título de aposentadoria e que a doação de recursos próprios, no valor de R$ 1.200,00, respeita o limite de 10% dos seus ganhos, devendo, consequentemente, ser considerada lícita. Com a finalidade de comprovar o alegado, apresenta demonstrativo de crédito de benefícios (extrato) emitido pelo Banco Itaú (ID 43066233). No que diz respeito à ausência de comprovação da propriedade do veículo automotor locado com recursos do FEFC (item d), sustenta que a propriedade encontra-se comprovada pelos documentos apresentados com o recurso, quais sejam, contrato de locação do veículo (ID 43066183) e certificado de registro de veículo (ID 43066133). Ao final, requer o provimento do recurso a fim de que as contas sejam aprovadas sem ressalvas, bem como afastada a determinação de recolhimento de valores.

Pois bem.

Inicialmente, uma vez que a prestadora deixou de recorrer quanto aos itens demais (a, c, e, f e g), bem como em relação à determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional de R$ 55,00, a título de RONI, e da aplicação de multa no valor de R$ 90,60 pela extrapolação do limite de gastos, cabe consignar que tais pontos transitaram em julgado.

Portanto, a matéria recursal restringe-se aos itens b e d, os quais serão a seguir examinados.

Quanto à irregularidade do item b, consistente na ausência de comprovação da origem do autofinanciamento no valor de R$ 1.200,00, a recorrente argumenta que a ausência de declaração de patrimônio no registro de candidatura não se confunde com ausência de renda. Alega que recebe cerca de R$ 1.400,00 mensais a título de aposentadoria e que a doação de recursos próprios, no valor de R$ 1.200,00, respeita o limite de 10% dos seus ganhos, devendo, consequentemente, ser considerada lícita. Com a finalidade de comprovar o alegado, apresenta demonstrativo de crédito de benefícios (extrato) emitido pelo Banco Itaú (ID 43066233).

Com razão a recorrente.

Em grau recursal, a prestadora trouxe aos autos demonstrativo de crédito de benefícios emitido pelo Banco Itaú (ID 43066233), o qual não se refere a proventos de aposentadoria, mas a auxílio-doença, sendo datado de abril de 2021. Tais documentos, apresentados com o recurso, têm sido conhecidos por este Tribunal, conforme pacífica e consolidada jurisprudência.

Assim, tal como bem pontuou o douto Procurador Regional Eleitoral, embora tal documento “não seja contemporâneo ao período eleitoral, considerando que a carência para o auxílio-doença é de 12 (doze) contribuições mensais, nos termos do art. 25, inc. I, da Lei 8.213/91, presume-se que a candidata se encontrava empregada, recebendo remuneração equivalente a do benefício (R$ 1.408,99), ao menos desde março de 2020”.

Desse modo, em que pese tal vínculo empregatício não seja compatível com a declaração da ocupação de “dona de casa” feita no registro de candidatura, infere-se que tal documento tem o condão de comprovar a capacidade financeira da candidata para realizar o autofinanciamento. 

Portanto, entendo saneada a irregularidade, devendo ser reformada a sentença a fim de ser afastada a determinação de recolhimento do valor de R$ 1.200,00 ao Tesouro Nacional.

Em relação à irregularidade do item d, consistente na ausência de comprovação da propriedade do veículo automotor locado com recursos do FEFC, a recorrente sustenta que a propriedade está comprovada por meio dos documentos apresentados com o recurso, quais sejam, contrato de locação do veículo (ID 43066183) e certificado de registro de veículo (ID 43066133).

Também em relação ao este ponto tenho que assiste razão à recorrente.

Inicialmente, cabe registrar que a candidata deixou de abrir conta bancária específica para o recebimento de recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, razão pela qual todos os gastos realizados na única conta bancária aberta com o CNPJ de campanha, passaram, a partir do recebimento de valores do FEFC (R$ 1.000,00 – 09.11.2020 – ID 43061833), a ser considerados gastos realizados com recursos públicos, os quais exigem fiscalização mais rigorosa.

Assim, acolhendo parecer técnico contábil emitido pela Unidade Técnica da Justiça Eleitoral, a sentença concluiu que não houve a devida comprovação dos gastos com FEFC referentes ao pagamento do contrato de locação de veículo automotor (não comprovação da propriedade do veículo locado).

Entretanto, em grau recursal, a prestadora apresentou o certificado de registro do veículo placas IPV1819 (ID 43066133), havendo concordância entre a pessoa indicada como proprietário (Marcos Flavio Medida Machado) e o fornecedor informado na prestação de contas.

Por consequência, tenho por afastar a irregularidade acima referida, pois esclarecido e comprovado o gasto realizado com recursos do FEFC, no valor de R$ 542,50, motivo pelo qual deve ser afastada a determinação de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional. 

Desse modo, remanescem apenas as irregularidades envolvendo a utilização de recursos de origem não identificada no valor de R$ 55,00, ausência de abertura de conta bancária específica para recebimento de R$ 1.000,00 de recursos do FEFC, ausência de lançamento de despesas no SPCE identificadas pelos extratos bancários, no valor de R$ 135,50, e extrapolação do limite de gastos com veículo automotor em R$ 90,00.

Contudo, aqui cabe referir tênue divergência em relação ao parecer lançado pelo douto Procurador Regional Eleitoral, em relação à irregularidade consistente na ausência de abertura de conta bancária para movimentação de recursos do FEFC.

Explico.

O eminente Procurador entende que tal irregularidade deva ser quantificada em seu valor absoluto de R$ 1.000,00.

E aqui se encontra a minha divergência. Isso porque entendo que, embora a aludida conta não tenha sido aberta, os recursos do FEFC, no total de R$ 1.000,00, transitaram pela conta “Outros Recursos” e tiveram sua origem e destinação devidamente comprovadas.

Desse modo, tenho que a não abertura da referida conta enseja apenas ressalva na contabilidade, não devendo tal valor (R$ 1.000,00) ser computado como irregular para o fim de se aplicar ou não os postulados da proporcionalidade e razoabilidade com vistas a se aprovar as contas com ressalvas.

Assim, as irregularidades remanescentes importam em R$ 281,60 (R$ 55,00 + R$ 135,50 + R$ 90,60 + R$ 0,50), justificando-se, em consonância com a jurisprudência do e. TSE, acolhida e pacificada neste Regional, a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a fim de aprovar as contas com ressalvas, forte no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, visto que o valor das falhas é inferior a R$ 1.064,10.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e parcial provimento do recurso interposto por ZELIA DA SILVA TRINDADE, a fim de aprovar com ressalvas as suas contas relativas ao pleito de 2020, afastando a determinação do recolhimento da quantia de R$ 1.742,50 (R$ 1.200,00 + R$ 542,50) ao Tesouro Nacional e mantendo o recolhimento da quantia de R$ 55,00 ao Tesouro Nacional, bem como o pagamento da multa no valor de R$ 90,60.

É como voto, Senhor Presidente.