REl - 0600371-14.2020.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/11/2021 às 14:00

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de campanha, eleições 2020, cargo de vereador, de CLÁUDIO GIRARDI, no Município de Tapejara.

Consta que a sentença desaprovou as contas do candidato em razão de doações com recursos próprios acima do limite legal, fixando multa no valor correspondente a 30% da quantia em excesso, com fulcro no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

In casu, o candidato poderia ter doado para a própria campanha a quantia de R$ 1.706,48, a qual corresponde a 10% do limite de gastos no cargo em que concorria, mas doou R$ 3.082,13 (R$ 1.032,13 em moeda corrente e R$ 2.050,00 em bem estimável em dinheiro).

No ponto, a Resolução TSE n. 23.607/19, que regulamenta a matéria, assim dispõe:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

 

Quanto ao argumento do recorrente no sentido de que os gastos efetuados a título de uso de veículo automotor não estariam sujeitos a limites de gastos, razão pela qual os recursos próprios utilizados para a satisfação de tais débitos também não poderiam se sujeitar ao limite imposto na sentença, como muito bem frisado no parecer da douta Procuradoria Eleitoral, há regras distintas a fim de disciplinar situações diversas (ID 44367583).

A exceção prevista no art. 27, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/2019, que exclui as doações estimáveis do limite legal, faz remissão ao caput do aludido dispositivo, que estabelece limite para doações de pessoas físicas, não sendo específico para o candidato. É dizer, a ressalva do § 3º não se aplica ao limite de gastos com recursos do próprio candidato estabelecido no § 1º do mesmo dispositivo. Ademais, o art. 5º, inc. III, da Resolução TSE nº 23.607/2019 dispõe expressamente que doações estimáveis em dinheiro devem ser contabilizadas para efeito de cálculo de limite de gastos realizados pelo candidato.
 

O art. 5º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 explicita que os valores utilizados como recursos financeiros próprios e os bens estimáveis, como no caso a cessão de veículo pessoal, são contabilizados cumulativamente para fins de submissão ao limite de gastos.

Ademais, as doações estimáveis em dinheiro estão incluídas no limite de autofinanciamento com recursos próprios com o objetivo de assegurar o princípio da isonomia entre os candidatos que tenham condições financeiras distintas. Tendo como exemplo o uso de veículo automotor na campanha, tanto o candidato que utiliza o seu próprio veículo quanto o que utiliza veículo de terceiro devem prestar contas de igual maneira para que ambos constem do cômputo do limite de gastos.

A regra é objetiva, o teto previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos é deduzido da regra estabelecida no art. 18-C da Lei das Eleições. Definido o limite para o cargo, em relação a determinado município, o candidato pode autofinanciar sua campanha em valores de até 10% do aludido montante.

Nesse sentido, trago julgado de minha relatoria:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PROPORCIONAL. DESAPROVAÇÃO. APLICAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS ACIMA DO LIMITE LEGAL. MULTA. PATAMAR 30%. ART. 27, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. GASTOS ADVOCATÍCIOS E CONTÁBEIS. DISTINÇÃO ENTRE OS LIMITES DEFINIDOS QUANTO AO PLANO DE DESPESAS GERAIS E O TETO DE APLICAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS PELO CANDIDATO. AUTOFINANCIAMENTO. IRREGULARIDADE EM PERCENTUAL DE 24,69% DO TOTAL DECLARADO. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. APLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO DE MULTA AO FUNDO PARTIDÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas do recorrente, tendo como fundamento a extrapolação do limite legal de doações com recursos próprios, e fixou multa correspondente a 30% da quantia em excesso, com fulcro no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Aporte de recursos próprios em campanha acima do teto de 10% conforme o cargo pleiteado na municipalidade, em afronta ao art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19. Distinção entre as regras definidas para os gastos globais, norma disposta no art. 4º, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e as pertinentes às receitas de campanha, no caso, art. 27, § 1º, da aludida resolução. Regra objetiva que visa limitar o valor a ser utilizado pelo candidato, para fins de autofinanciamento em sua campanha.

3. Irregularidade que representa 24,69% das receitas declaradas, mas de valor absoluto reduzido, a permitir, diante da incidência dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, a mitigação do juízo de desaprovação para aprovar as contas com ressalvas. Correção de ofício da sentença, para que o recolhimento da multa seja destinado ao Fundo Partidário.

4. Parcial provimento.

(Rel 0600194-33.2020.6.21.0041, julgado na sessão de 10.08.2021.) (Grifo nosso)

 

Não merece reforma a sentença, pois, de fato, o prestador utilizou recursos próprios que superam em R$ 1.375,65 o limite previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e a multa, fixada em 30% do excesso (R$ 412,69), é adequada e proporcional.

Observe-se que a irregularidade em debate, excesso de autofinanciamento em R$ 1.375,65, representa 40,71% das receitas declaradas pelo prestador (financeiras e estimáveis), percentual que extrapola em muito o utilizado como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas (10%).

Importa destacar que em outros casos analisados por esta Corte versando sobre autofinanciamento acima do limite legal, ainda que as irregularidades importassem em percentual superior a 10% das receitas declaradas, se o valor estivesse abaixo de R$ 1.064,10 as contas poderiam ser aprovadas com ressalvas.

Entretanto, no caso dos presentes autos, não há como afastar o juízo de desaprovação das contas, com base nos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, quando o valor nominal da irregularidade se mostra superior ao valor adotado como referência, a quantia de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR), que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

No que refere ao valor da condenação à multa eleitoral por excesso do limite para doação de recurso próprio (R$ 1.375,65), prevista no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, cujo fundamento legal encontra-se no art. 23, § 3º, da Lei 9.504/97, a importância deverá ser recolhida ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), conforme previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

Constatada, pois, a extrapolação do limite de gastos com recursos próprios, a desaprovação das contas é medida que se impõe, com fundamento no art. 30, inc. III, da Lei n. 9.504/97 e no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, assim como a aplicação da multa em valor correspondente a 30% da quantia em excesso, na forma do art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Cabe esclarecer que a multa de 30% recai sobre o valor em excesso de utilização de recursos próprios, ou seja, sobre a importância de R$ 1.375,65 (um mil, trezentos e setenta e cinco reais e sessenta e cinco centavos).

Ante o exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO do recurso, mantendo íntegra a sentença a quo que desaprovou as contas de CLÁUDIO GIRARDI e o condenou ao pagamento da multa de R$ 412,69, equivalente a 30% do valor em excesso (R$ 1.375,65), a ser recolhida ao Fundo Partidário.