REl - 0600174-20.2020.6.21.0016 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/11/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é regular e tempestivo, comportando conhecimento.

Nesse sentido, esclareço que estou superando a preliminar de não conhecimento do recurso, suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, com base na inobservância do princípio da dialeticidade, por não ter o recorrente, supostamente, impugnado especificamente os fundamentos da sentença, conforme exigem o art. 932, inc. III, do Código de Processo Civil e o Enunciado da Súmula n. 26 do Tribunal Superior Eleitoral.

Isso porque o recorrente formulou pedido expresso de reforma da sentença para que as contas sejam aprovadas sem qualquer ressalva, sob o argumento de que possuía capacidade financeira para arcar com o valor de R$ 479,50, tido na sentença como de origem não identificada.

Assim, a pretensão deduzida pela parte, ainda que inserida em um contexto argumentativo mais amplo, aparentemente dissociado das razões de decidir adotadas na sentença, atende minimamente ao requisito da dialeticidade, bem como demonstra o interesse recursal na alteração do resultado do julgamento, viabilizando o conhecimento do recurso.

Superada esta questão prefacial, adentro no exame do mérito.

 

Mérito

A prestação de contas do recorrente foi desaprovada em razão (a) de declaração de recebimento de doação de partido político, sem que esta tenha sido informada na prestação de contas da agremiação; (b) da utilização de recursos de origem não identificada decorrente da existência de notas fiscais não declaradas, no valor total de R$ 479,50, cujo adimplemento teria ocorrido com recursos que não transitaram na conta de campanha, sendo determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional do referido valor; e (c) de divergência entre os extratos bancários e os registros no SPCE em relação ao depósito de R$ 270,00 verificado na conta de campanha e não declarado.

Em suas razões, o recorrente apenas alega que “declara Imposto de Renda anualmente, tendo plenas condições para realizar a doação a sua campanha”. Sustenta inexistir regulamento que o impeça de realizar doação ínfima. Afirma que junto às razões anexa sua declaração de imposto de renda (embora a informação não se confirme, pois tal declaração não foi juntada ao processo); e, ao final, requer o provimento do recurso a fim de que as contas sejam aprovadas sem ressalvas.

Pois bem.

Em relação à primeira e à terceira irregularidades, não houve manifestação expressa do recorrente em sua irresignação.

Registro que a primeira irregularidade se refere à suposta doação recebida do PCdoB de Caxias do Sul, no valor de R$ 115,38, a qual não foi declarada na prestação de contas da agremiação.

Quanto à terceira irregularidade, trata-se de divergência entre os extratos bancários do candidato e os registros no SPCE em relação ao depósito de R$ 270,00, verificado na conta de campanha e não declarado. Ou seja, no extrato da conta-corrente de campanha do Banco do Brasil (n. 1661639) constou crédito de R$ 270,00 que não foi registrado na prestação de contas. De igual modo, referida quantia foi debitada da referida conta por meio de cheque compensado na conta de número 30000149863, agência 3962, da Caixa Econômica Federal. Toda essa questão não constou na prestação de contas do recorrente e, de igual forma, não foi objeto de irresignação no presente recurso. Suspeita-se que tal despesa possa se referir ao fornecedor VINCERE INDUSTRIA DE ADESIVOS LTDA., CNPJ 16.918.198/0001-27, NF 5075 (identificada por meio de circularização realizada de ofício pela Justiça Eleitoral). Contudo, sem que haja afirmação do candidato nesse sentido, a conclusão por este Juízo não se mostra recomendável, sob pena de se tomar uma suposição como verdade, resultando em avaliação superficial.

Por fim, no que diz respeito à segunda irregularidade, o recorrente apenas alega ter condições financeiras para arcar com as despesas que totalizam R$ 479,50.

Contudo, a questão aqui não se restringe à capacidade financeira de o candidato arcar com as despesas, mas sim à constatação de que ocorreram gastos à margem da contabilidade, os quais não foram informados na prestação de contas de campanha. Vejamos.

No Parecer Conclusivo (ID 42661833), o examinador assinalou a existência de três despesas eleitorais, no total de R$ 479,50, com valores que não transitaram pela conta-corrente de campanha, quais sejam:

- TRAMPU'S SERIGRAFIA LTDA: CNPJ 07.326.528/0001-02, data de 15.10.2020, Nota Fiscal 417, valor de R$ 200,00;

- CYBERWEB NETWORKS LTDA, CNPJ 05.305.671/0001-84, data de 21.10.2020, Nota Fiscal 202000000715094, valor de R$ 9,50; e

- VINCERE INDUSTRIA DE ADESIVOS LTDA, CNPJ 16.918.198/0001-27, data de 21.10.2020, Nota Fiscal 5075, valor de R$ 270,00.

Assim, havendo despesas emitidas contra o CNPJ de campanha do recorrente sem que este as tenha registrado na prestação de contas, infere-se pela irregularidade de tais transações, visto que inviável à Justiça Eleitoral verificar a origem dos recursos que foram utilizados para o pagamento dos referidos gastos.

Logo, ausente qualquer esclarecimento por parte do recorrente quanto a essas falhas, os valores envolvidos, que totalizam R$ 479,50, caracterizam o uso de recursos de origem desconhecida, que devem ser obrigatoriamente transferidos ao Tesouro Nacional, consoante dispõem o art. 14, caput, c/c o art. 32, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

(...)

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(…)

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

(…).

 

Por outro lado, diante do fato de que o conjunto das irregularidades constatadas perfaz a quantia de R$ 479,50, justifica-se, em consonância com a jurisprudência do e. TSE, acolhida e pacificada neste Regional, a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a fim de aprovar as contas com ressalvas, forte no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, visto que o valor da falha é inferior a R$ 1.064,10.

Registro, em desfecho, que o julgamento pela aprovação das contas com ressalvas não afasta a imposição legal de transferência dos valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional (art. 79, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e parcial provimento do recurso interposto por FABIANO FRANCISCO DA COSTA, a fim de aprovar com ressalvas as suas contas relativas ao pleito de 2020, mantendo a determinação do recolhimento da quantia de R$ 479,50 ao Tesouro Nacional.

É como voto, Senhor Presidente.