REl - 0600432-66.2020.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/11/2021 às 14:00

 

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas da candidata, cujas razões impugnam especificamente duas irregularidades: a extrapolação do limite legal de arrecadação com recursos próprios, em R$ 229,23, e a omissão na apresentação de peças e documentos relacionados aos recursos recebidos do FEFC, no montante de R$ 880,00.

No tocante à primeira irregularidade questionada, é incontroverso que a recorrente aplicou em sua campanha recursos próprios que superam em R$ 229,23 o teto permitido previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, correspondente a 10% do limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Campos Borges.

Diante disso, o juízo sentenciante determinou o recolhimento do equivalente a 100% da quantia em excesso ao Tesouro Nacional, com esteio no art. 27, § 4º, da mesma resolução.

Com efeito, a matéria atinente ao limite de autocusteio de campanha eleitoral encontra-se regulamentada no art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual dispõe:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º). 

 (Grifei.)

 

Desse modo, restou caracterizada a irregularidade, que se perfectibilizou pelo simples excesso na quantia autofinanciada.

Em suas razões, a candidata assevera que ultrapassou o limite de gastos em quantia irrisória, não devendo ser penalizada, uma vez que o valor excedido corresponde a somente 1,86% dos recursos totais arrecadados.

Ocorre que, uma vez verificada a imoderação, faz-se impositiva a aplicação da multa, que incide objetivamente, inclusive como garantia de condições isonômicas entre todos os candidatos, posto que a limitação tem o escopo, em última análise, de proteger a igualdade na disputa, impedindo a utilização de recursos financeiros em medida desproporcional por candidatos que detêm maior capacidade patrimonial.

Assim, eventuais aferições da representatividade absoluta ou do percentual da falha, para a justa aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, devem ocorrer apenas no momento de dosimetria da penalidade pecuniária e o juízo final de mérito sobre as contas, não tendo o condão de afastar a própria configuração da infringência legal.

Destarte, não merece reparo a decisão monocrática, no ponto em que considerou irregular o excesso de gasto e condenou a prestadora ao recolhimento de R$ 229,23, equivalente a 100% da quantia sobejante, medida adequada, razoável e proporcional às circunstâncias do caso em exame.

Ressalto, entretanto, ser necessária a correção, de ofício, do erro material contido na sentença quanto à destinação de tal penalidade ao Tesouro Nacional.

Em realidade, considerando que a sanção tem respaldo no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97, deve o valor correspondente ser recolhido ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), como previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95, e não ao Tesouro Nacional, como especificado no comando sentencial.

A segunda irregularidade controvertida nas razões recursais refere-se à presença de divergência entre doações diretas declaradas na prestação de contas em exame e as expostas pelo diretório municipal do partido político, revelando o recebimento de recursos de origem não identificada, nos termos do art. 32, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Na hipótese, a candidata contabilizou o recebimento de serviços estimáveis de contabilidade, pagos com recursos do FEFC, do Diretório Municipal do PTB de Campos Borges, porém não encaminhou o correspondente recibo de doação, descumprindo os arts. 7º e 29, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

De seu turno, a recorrente defende “que a responsabilidade pelo encaminhamento do recibo é do Partido Político doador, pois foi esse quem realizou tal pagamento, tendo a Recorrente se limitado a receber essa doação do Partido a que pertence”, bem como que:

Em relação aos recursos recebidos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), cuja doação não constou da prestação de contas do Partido doador, no caso o Diretório Municipal do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) de Campos Borges, tal inconsistência certamente será solucionada quando do encaminhamento da respectiva Prestação de Contas do PTB de Campos Borges, que ainda não foi encaminhada à Justiça Eleitoral, vez que o prazo para o seu encaminhamento iniciou em 07 de janeiro de 2021 terminando somente no dia 08 de março de 2021.

 

Ocorre que, conforme atestou o parecer conclusivo das contas (ID 28820883):

Do exame do Sistema de Prestações de Contas Eleitorais (SPCE) constatou-se que o Diretório Municipal do PTB de Campos Borges efetivou sua prestação de contas no sistema (Nº Controle: P14000485200RS0687235), informando possuir receita de R$ 8.000,00 do FEFC.

Ocorre que mesmo declarando despesas do FEFC o que possibilitaria realização de doações desses recursos aos seus candidatos, o Partido declarou que não efetivou despesa alguma, nem mesmo desse recurso público.

 

Destarte, considerando que nas contas da candidata foi realizada a declaração desses valores, mas que não é possível à Justiça Eleitoral efetuar o rastreamento dos recursos e confirmar a identidade do doador originário, as doações configuram receitas de origem não identificada, as quais ensejam o recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Logo, o pedido recursal de afastamento da determinação de recolhimento de valores ao erário somente poderia ser provido caso fosse demonstrado que o partido retificou suas contas e que o procedimento foi admitido por decisão judicial, ou que o valor da condenação já foi recolhido, o que não ocorre no caso em comento.

Assim, as falhas identificadas nas contas alcançam o somatório de R$ 1.109,23, cifra que representa 37,60% das receitas declaradas (R$ 2.949,60), mostrando-se inviável a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para atenuar sua gravidade perante o conjunto das contas e aprovar a contabilidade com ressalvas, na esteira da jurisprudência do TSE e desta Corte.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, determinando, de ofício, a correção de erro material na sentença, para que o recolhimento da penalidade de R$ 229,23, aplicada com base no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, seja feito ao Fundo Partidário, na forma do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.