REl - 0600393-83.2020.6.21.0064 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/11/2021 às 14:00

VOTO

A prestação de contas foi desaprovada devido à omissão de registro de despesas de R$ 150,00, valor que representa 7,99% do total da movimentação financeira declarada, na quantia de R$ 1.875,50, a qual foi custeada pelo candidato sem informação sobre a fonte utilizada para pagamento, conforme consta do seguinte trecho da sentença recorrida:

[…]

Em relação à outra irregularidade apontada pela Unidade Técnica, consistente na existência de nota fiscal referente ao gasto de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) realizado pelo candidato junto à empresa Roger Tomazi (CNPJ: 19.254.706/0001-08) e não declarado à Justiça Eleitoral, o prestador de contas nada manifestou em sua defesa. Em consulta ao sistema SPCE-WEB constata-se que, no dia 10/11/2020, a citada empresa emitiu uma nota fiscal no valor de R$ 150,00 (chave: 43201119254706000108550010000001301005300161) em favor do candidato (CNPJ: 38.521.556/0001-04).

Da análise dos extratos bancários apresentados pelo candidato e enviados pela instituição financeira à Justiça Eleitoral, constata-se a inexistência débito correspondente a tal valor, bem como que todos os recursos recebidos durante sua campanha eleitoral foram integralmente utilizados para o pagamento de outras despesas declaradas, o que permite concluir que o pagamento da despesa realizada junto à empresa Roger Tomazi, além de não ter sido declarada pelo candidato na prestação de contas, foi realizado com recursos que não transitaram na conta bancária específica utilizada durante sua campanha eleitoral, configurando recurso de origem não identificada, nos termos do art. 32, VI, da Resolução TSE 23.607/2019.

A omissão desta despesa e da origem da receita utilizada para seu pagamento configura inconsistência grave, por violação ao disposto no art. 53, I, "c" e "g", da Resolução TSE 23.607/2019, a impor a desaprovação das contas apresentadas, na medida em que demonstra a existência de gastos e receitas eleitorais que transitaram por outro meio que não a conta bancária específica utilizada durante a campanha eleitoral, inviabilizando a adequada fiscalização pela Justiça Eleitoral.

[...]

 

Nas razões recursais, o recorrente sustenta a ausência de dolo e afirma que, por desconhecimento da legislação, deixou de registrar a despesa de R$ 150,00, realizada junto à empresa Roger Tomazi, e de declarar a origem dos recursos utilizados para seu pagamento,  mas que a quantia é de pequena monta e não comprometeu suas contas.

A despesa foi localizada pelo exame técnico mediante confronto com notas fiscais eletrônicas emitidas contra o CNPJ do prestador, conforme informado pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul/RS à Justiça Eleitoral.

A documentação constante nos autos durante a tramitação não esclareceu a origem dos recursos utilizados para o pagamento do respectivo fornecedor, cuja nota fiscal foi juntada pelo recorrente na fase recursal (ID 24425383), circunstância que poderia ter sido facilmente demonstrada por documentos identificando os dados com o CPF da pessoa de onde partiram os recursos utilizados para o referido custeio, ainda que sejam procedentes do próprio candidato.

Outrossim, não se discute o dolo ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência, a confiabilidade e a lisura da prestação de contas.

Verifica-se que a despesa foi inicialmente omitida e que, após identificada, a parte recorrente não se desincumbiu de comprovar a origem dos valores utilizados para o pagamento, que se caracterizam como recursos de origem não identificada e se sujeitam a recolhimento ao Tesouro Nacional.

Porém, o percentual da falha representa apenas 7,99% sobre o total da arrecadação, e o valor absoluto de R$ 150,00 é reduzido, inclusive inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Acerca da incidência dos aludidos princípios sobre irregularidades nominalmente diminutas, cumpre trazer à colação precedente do Tribunal Superior Eleitoral apontando a possibilidade de aprovação das contas com ressalvas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017.) (Grifei.)

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha diante do conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020.) (Grifei.)

 

Destarte, tendo em vista que a irregularidade representa quantia e percentual pouco expressivos, acolho parecer da Procuradoria Regional Eleitoral no sentido de que o recurso comporta provimento, podendo as contas ser aprovadas com ressalvas, ressaltando que permanece o dever de recolhimento ao erário dos recursos de origem não identificada verificados nas contas.

A determinação de recolhimento da quantia indevida ao erário é decorrência expressa do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Todavia, considerando que foram juntados, com o presente recurso, a guia de recolhimento GRU e o comprovante de pagamento,  no valor de R$ 150,00 (ID 24425333), e que a Secretaria de Auditoria Interna confirmou o cumprimento da obrigação (ID 43407483), deve ser considerada quitada a dívida em face do adimplemento espontâneo promovido pelo recorrente.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas, e declaro cumprida a determinação de recolhimento da quantia de R$ 150,00 ao Tesouro Nacional, na forma fixada na sentença, nos termos da fundamentação.