REl - 0600355-45.2020.6.21.0105 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/11/2021 às 14:00

VOTO

Inicialmente, afasto a preliminar de nulidade da sentença.

O recorrente alega que, em dezembro de 2020, sofreu grave acidente de trânsito, e que o juízo a quo não deferiu o pedido de suspensão do processo até a melhora de seu estado de saúde.

Ocorre que os processos de contas de campanha têm prazos extremamente exíguos e rito sumaríssimo, sem previsão de prova oral ou pericial, e que o recorrente não demonstrou o efetivo prejuízo sofrido com a alegada nulidade, pois não indica que prova poderia ser produzida com a suspensão do processo.

No caso em apreço, observa-se que o candidato estava regularmente representado por advogado constituído, o qual atendeu às intimações peticionando nos autos, e que a única irregularidade constatada nas contas se refere ao excesso de autofinanciamento de campanha de R$ 5.608,45.

A falha não demanda a necessidade de discussão fática ou de instrução probatória, pois diz respeito à regra do limite legal de autofinanciamento. Em Campo Bom, para o cargo de vereador, o limite era de R$ 2.842,55, e o candidato aplicou recursos próprios no total de R$ 8.450,99, consistentes em 3 transferências eletrônicas para a conta de campanha, nos valores de R$ 1.251,00, R$ 2.200,00 e R$ 4.999,99.

Ademais, observa-se ter sido atendido o pedido do candidato de dilação de prazo para manifestação sobre o parecer de diligências que apontou a irregularidade, tendo a magistrada concedido 2 (dois) dias a mais para a apresentação de defesa (ID 38136233).

Desse modo, ainda que o candidato estivesse gravemente doente durante a tramitação e o julgamento das contas, as peculiaridades do caso concreto demonstram que o prosseguimento do processo não lhe causou efetivo prejuízo, sequer tendo sido declinada qual prova ficou pendente de produção e que impacto teria no julgamento do feito.

Aplica-se, na hipótese, o art. 219 do Código Eleitoral:

Art. 219. Na aplicação da lei eleitoral o juiz atenderá sempre aos fins e resultados a que ela se dirige, abstendo-se de pronunciar nulidades sem demonstração de prejuízo.

Com essas considerações, rejeito a preliminar.

No mérito, cumpre primeiramente consignar que não prospera a arguição de inconstitucionalidade do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, pois é desarrazoada a pretensão do recorrente de que as regras eleitorais sejam as mesmas para candidatos e eleitores, sem distinções.

O dispositivo tem a seguinte redação:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

(...)

 

A norma regulamenta o disposto no art. 23, § 1º e § 2º-A, da Lei n. 9.504/97, incluído na Lei das Eleições pela Lei n. 13.878/19:

Art. 23. Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 1º As doações e contribuições de que trata este artigo ficam limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano anterior à eleição. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

II - (revogado). (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

§ 1º-A (Revogado pela lei nº 13.488, de 2017)

§ 1º-B - (VETADO) (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

§ 2º As doações estimáveis em dinheiro a candidato específico, comitê ou partido deverão ser feitas mediante recibo, assinado pelo doador, exceto na hipótese prevista no § 6o do art. 28. (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

§ 2º-A. O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer. (Incluído pela Lei nº 13.878, de 2019)

 

(...)

 

Não se verifica inconstitucionalidade alguma, justamente porque, para evitar abuso do poder econômico, foi estabelecida uma distinção e limitação diferente para cidadãos e candidatos, no que se refere à aplicação de recursos próprios nas campanhas, a depender do cargo e do município da disputa.

Conforme consta da exposição de motivos do projeto de lei que deu origem à Lei n. 13.878/19, a regra tem o objetivo de proporcionar eleições mais justas e evitar a representação de interesses pessoais em detrimento do coletivo.

Nem mesmo a pandemia causada pelo novo coronavírus e a doença Covid-19 afasta o dever de os candidatos respeitarem a norma aplicável a todos os concorrentes ao pleito, de modo a não se permitir uma vantagem absolutamente desproporcional para aqueles com maior poder econômico.

Não se trata de análise de má-fé ou de ofensa à lisura do pleito, mas de desobediência à norma cogente aplicável a todos os candidatos.

Os eleitores, por sua vez, têm limitação diferenciada, relativa ao percentual de patrimônio aplicável, e as normas se afiguram adequadas, razoáveis e proporcionais à legitimidade e à regularidade de campanhas eleitorais cada vez mais justas.

Portanto, rejeito a arguição.

Quanto ao pedido de reforma da sentença, verifica-se inegável o excesso de autofinanciamento de campanha de R$ 5.608,45, tendo o recorrente se limitado a referir que o patamar foi extrapolado em razão da pandemia.

Ocorre que a regra objetiva alcançar uma igualdade, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, é uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais dos candidatos que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Desse modo, considerando que a pandemia foi óbice enfrentado por todos os candidatos no pleito de 2020, impõe-se a confirmação da sentença.

A irregularidade de R$ 5.608,45 representa 46,95% do total de receitas declaradas (R$ 11.945,40), quantia e percentual expressivos e acima do valor de R$ 1.064,10, considerado módico pelo art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, razão pela qual é inviável a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para que as contas sejam aprovadas.

A penalidade de multa fixada na sentença em 100% da quantia em excesso, equivalente ao valor de R$ 5.608,45, encontra previsão no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e o patamar se afigura razoável, adequado e proporcional à falha verificada.

Nesse ponto, verifico que o recorrente postulou a redução da multa alegando que a penalidade deveria obedecer à sua capacidade financeira, mas não apresentou nenhum documento para demonstrar a impossibilidade de pagamento ou a insuficiência de recursos econômicos para arcar com o custeio do débito.

A falha se apresenta grave uma vez que os recursos próprios arrecadados corresponderam a 293,3% do limite legal estabelecido, e o valor de R$ 5.608,45, aplicado pelo candidato, é quase o dobro do patamar legal de R$ 2.842,55.

Portanto, as razões recursais são insuficientes para infirmar a conclusão no sentido de que o candidato excedeu o limite de recursos próprios que poderia ter doado para a sua campanha.

Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a aprovação das contas com ressalvas e a sanção de multa de R$ 5.608,45, nos termos da fundamentação.