REl - 0600405-83.2020.6.21.0101 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/11/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pelo juízo a quo, devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados nos arts. 38 e 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Acertadamente, a sentença (ID 40248033) foi no seguinte sentido:

Cuida-se de apreciar as contas eleitorais de 2020, apresentadas pelo(a) referido(a) candidato(a). A análise técnica apontou preliminarmente a necessidade de juntar informações complementares.

Intimado, o candidato apresentou defesa, trazendo informações complementares parciais. Não foram juntados comprovantes fiscais dos gastos efetuados com o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, no entanto, foram juntados recibos e contratos dos gastos realizados com o FEFC em conformidade com o permitido pelo § 2º, art. 60, da referida resolução.

Contudo, vale dizer, que o contrato não cumpriu art. 35 § 12: não foi detalhada a identificação integral dos prestadores de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado. Frise-se que, apesar de declarar no contrato a função de serviço de panfletagem, o candidato não declarou despesas com material gráfico em sua prestação de contas.

Segue o relatório conclusivo, em relação aos R$ 3.000,00 recebidos pelo candidato do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, "permanecem sem esclarecimentos as divergências, apontadas no item 3.1 do exame preliminar. No relatório foram identificadas divergências entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos (art. 53, I, alínea "g" e II, alínea "a", da Resolução TSE nº 23.607/2019. Isso porque, o pagamento da prestação de serviço, não transitou em conta bancária declarada na prestação de contas. No extratos bancários, não aparecem os pagamentos feitos para ORICO MARTINS DA ROSA e ODIR LUIZ HOFFMANN, descumprindo o art 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019. Cabe referir que o pagamento deve ser por cheque nominal cruzado ou transferência bancária. Conforme extratos bancários, as despesas foram realizadas com dinheiro em espécie, após saque dos valores da conta. Dessarte, a falha apontada configura irregularidade por não comprovar o gasto realizado com recursos públicos."

A Resolução TSE nº 23.607/2019 é taxativa ao afirmar:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou IV - cartão de débito da conta bancária.
 

Art. 79 (...)

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

O Ministério Público opinou pela desaprovação das contas prestadas, em consonância com o parecer técnico conclusivo.

Por fim, cabe mencionar que não houve impugnação por parte dos demais partidos políticos, candidatos, coligações ou de quaisquer outros interessados.

Assim, não havendo comprovada a regularidade nas contas apresentadas, o corolário lógico é a desaprovação, nos termos do disposto no inciso III do art. 74 da Resolução 23.607/2019.

 

Dois são os pontos combatidos no presente recurso: quanto à forma de pagamento com recursos do FEFC (art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19) e quanto à comprovação da despesa (art. 35 § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19).

No que tange à forma de pagamento com recursos do FEFC, o recorrente informou ter realizado saque na boca do caixa de R$ 3.000,00 (três mil reais), para pagar as despesas com os prestadores que realizaram o serviço de panfletagem. Contrariou, assim, o disposto no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos eleitorais de natureza financeira só podem ser efetuados por meio de:

  1. cheque nominal cruzado;

  2. transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

  3. débito em conta; ou

  4. cartão de débito da conta bancária.

 

Nesse sentido, o que constou no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 44121383):

(...) os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto.

 

No caso em tela, sendo o pagamento realizado por meio de saque e não mediante cheque cruzado, restou inviabilizado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e aos gastos de campanha, vez que impediu fosse alimentado o sistema Divulgacandcontas com a informação sobre o beneficiário do cheque, impedindo o controle e a fiscalização da destinação dos recursos públicos.

Outro ponto que restou prejudicado, visto que os valores, embora oriundos dos cofres públicos, não transitam pelo sistema financeiro nacional, foi o rastreamento para verificação se os destinatários dos pagamentos de fato pertenceram à relação que originou o gasto de campanha, além de outros controles públicos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

A legislação eleitoral contempla os arts. 38 e 60, caput, e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 para análise conjunta das despesas. O primeiro dispositivo legal elenca os meios pelos quais os pagamentos devem ser efetuados e o segundo contempla um rol de documentos complementares à comprovação dos gastos eleitorais.

O art. 60, caput, e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 deve ser empregado tão somente para obtenção de uma confirmação por meio de terceiro (com quem o candidato contratou) de que o valor foi efetivamente gasto em um serviço ou produto para a campanha eleitoral. Isso se justifica por dois motivos: a) porque documentos como recibo, contrato ou nota fiscal não possuem fé suficiente; e b) porque não há como rastrear quem efetivamente recebeu o referido valor.

Dessa maneira, a Justiça Eleitoral construiu uma análise circular das despesas, contando, para isso, com dados das instituições financeiras, dos prestadores de contas e dos terceiros contratados para atestar a origem e o destino dos valores.

A Procuradoria Regional Eleitoral explicita em suas palavras a necessidade de analisar de forma conjunta os dados extraídos (ID 44121383):

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes distintas, que permite, nos termos da Resolução, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se tratam de recursos públicos, como são as verbas recebidas via FEFC.

 

Quanto à comprovação da despesa, o prestador, ao juntar os contratos de prestação de serviço (ID 40246033), não cumpriu o disposto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual exige, como medida de transparência, a identificação integral dos prestadores de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado. Nesse sentido foi a sentença (ID 40248033) e o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 44121383), de que o contrato acostado declara a função de serviço de panfletagem, porém, não explicita os demais aspectos mencionados.

Ainda, a irregularidade representa 65,58% do total das receitas declaradas (R$ 4.574,00), percentual superior ao limite utilizado (10%) como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas.

No que tange ao recolhimento dos recursos do FEFC utilizados indevidamente, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, não merece reforma a sentença, permanecendo o juízo de desaprovação das contas.

Diante do exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO do recurso, nos termos da fundamentação.