REl - 0600619-83.2020.6.21.0001 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/11/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada em virtude de 3 irregularidades: 1) despesa com o fornecedor SIAR SERVIÇOS DE PORTARIA E LIMPEZA LTDA., CNPJ 12978380000112, em 01.11.2020, no valor de R$ 33.750,00, pois são serviços não compatíveis com atividades de uma campanha eleitoral; 2) despesa paga com cheque não cruzado a MARIA APARECIDA FERREIRA, no valor de R$ 1.600,00, implicando a realização de gastos sem cumprimento dos requisitos previstos no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19; 3) existência de dívidas de campanha decorrentes do não pagamento de despesas contraídas, no montante de R$ 46.635,00, pois não houve a apresentação das informações e dos documentos exigidos no art. 33, §§ 2° e 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A sentença (ID 24220133) acolheu os apontamentos lançados no parecer conclusivo (ID 24230183):

De fato os três apontamentos são remanescentes de outros apresentados no relatório preliminar e, antes, na impugnação das contas apresentada pelo Ministério Público Eleitoral no prazo do edital.
 

A primeira irregularidade envolve a quantia de R$ 33.750,00 pago para fornecedor incomum em campanha eleitoral e que o prestador não logrou justificar a contratação. Os valores foram destinados a empresa de limpeza e vigilância SIAR SERVIÇOS DE PORTARIA E LIMPEZA LTDA. O gasto foi comprovado com a apresentação da nota fiscal (ID 57546991). Os serviços prestados referem-se à vigia pelo período de 05 de novembro a 14 de novembro de 2020. Instado a explicar a relação do gasto com a campanha eleitoral, o prestador limitou-se a comprovar o gasto com a nova juntada da NF (ID 73936557). O art. 35 da Resolução TSE 23.607/2019 elenca os gastos eleitorais sujeitos a registro e não inclui os serviços de vigilância. Desta forma as despesas com vigia, declaradas pelo prestador, deveriam ser justificadas no processo de prestação de contas, diante da falta de previsão legal específica e também por não se enquadrar em qualquer descrição genérica do que a legislação concebe como gastos de campanha. Os valores declarados deverão ser recolhidos ao Tesouro Nacional.

Referente ao pagamento realizado a fornecedora MARIA APARECIDA FERREIRA no valor de R$ 1.600,00, na mesma linha, o prestador não superou a irregularidade apontada. O pagamento da despesa foi realizado através de cheque não cruzado (ID 73936570) em confronto com a regra cristalina do art. 38, da Resolução TSE 23.607/2019 assim redigido:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou IV - cartão de débito da conta bancária.

A regra visa dar transparência e controle aos gastos com a garantia de que todas as movimentações financeiras (origem e destino) fiquem registradas no sistema bancária. O cheque sem estar cruzado possibilita o saque diretamente no caixa sem registro idôneo do destinatário dos valores. A juntada de recibo (ID73936570) não resolve a ilegalidade, considerando tratar-se de recibo sem certificação para atestar de forma idônea a transferência dos valores à fornecedora indicada. Também os valores deverão ser recolhidos ao Tesouro nacional, nos termos do art. 79, § 1º da Resolução TSE 23.607/2019, afinal trata-se de utilização indevida de recursos proveniente do FEFC.

O terceiro apontamento não superado pelo prestador, diz com o não pagamento de despesas realizadas no valor de R$ 46.635,00, associado a omissão no cumprimento das obrigações impostas pelo art. art. 33, §§ 2° e 3º, da Resolução TSE 23.607/2019, assim transcritas:

Art. 33. Partidos políticos e candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º; e Código Civil, art. 299).

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

O prestador não noticiou a origem dos valores destinados ao pagamento da dívida. Como já referido, não trouxe qualquer cronograma de pagamento. Os valores destinados às dívidas estão submetidos às regras do financiamento das campanhas eleitorais, daí que as pendências sem o cumprimento das imposições do art. 33, acima transcritas, gera a obrigação de recolher ao Tesouro Nacional os valores representativos do montante da dívida. O descumprimento dos requisitos legais apontados, impede a efetiva fiscalização das contas ao passo que inviabiliza o rastreamento dos recursos empregados na operação. O § 5º, do já citado art. 33 ressalta o caminho que deveria ser percorrido.

§ 5º Os valores arrecadados para a quitação dos débitos de campanha a que se refere o § 2º deste artigo devem, cumulativamente:

I - observar os requisitos da Lei nº 9.504/1997 quanto aos limites legais de doação e às fontes lícitas de arrecadação;

II - transitar necessariamente pela conta "Doações para Campanha" do partido político, prevista na resolução que trata das prestações de contas anuais dos partidos políticos, excetuada a hipótese de pagamento das dívidas com recursos do Fundo Partidário;

III - constar da prestação de contas anual do partido político até a integral quitação dos débitos, conforme o cronograma de pagamento e quitação apresentado por ocasião da assunção da dívida.

Os apontamentos registrados no laudo técnico e aqui reconhecidos como irregularidades não superadas pelo prestador, comprometeram as suas contas.

A soma dos valores que atestam as não conformidades é de R$ 81.985,00 ( oitenta e um mil, novecentos e oitenta e cinco reais). É um valor bastante expressivo que atinge 27,58% da receita financeira estimável da campanha. Supera, e muito, o percentual de 10% tolerável pela aplicação jurisprudencial dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade (TRE-RS PRESTAÇÃO DE CONTAS (11531) - 0600251-14.2019.6.21.0000 - Porto Alegre - RIO GRANDE DO SUL RELATOR: GERSON FISCHMANN).

Os demais apontamentos constantes na impugnação do Ministérios Público e descritos no relatório preliminar, foram solucionados e neste sentido o analista técnico das contas bem apontou. O Ministério Público Eleitoral também reconheceu que os demais apontamentos foram sanados pelo prestador.

Em face do registro da existência, no parecer técnico, de Relatório de Inteligência Financeira - RIF, do COAF/MF, procedi na análise do RIF e não identifiquei qualquer elemento que atestasse apontamento irregular. A anotação indica o recebimento de recursos da Direção Estadual/Distrital do prestador, porém os valores foram devidamente declarados prestação de contas.

Por fim, a prestação de contas em análise, nos termos do fundamentado, não observou integralmente o disposto na Resolução nº 23.607/19 do TSE, nem o previsto pela Lei 9.504/1997.

Assim, concluo, considerando os três apontamentos do parecer conclusivo (ID75469639), pela aplicação do disposto no art. 30, III, da Lei n. 9.504/97, combinado com o art. 74, III, da Resolução n. 23.607/2019 do TSE, desaprovando as contas prestadas.

III - DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo DESAPROVADAS as contas de ALEXANDRE WAGNER DA SILVA BOBADRA nos termos do art. 74, inciso III, da Resolução 23.607/19, do TSE.

Determino o recolhimento do valor total de R$ 81.985,00 ( oitenta e um mil, novecentos e oitenta e cinco reais) ao Tesouro Nacional.

 

Quanto à primeira irregularidade, o recorrente sustenta que a despesa no valor de R$ 33.750,00 refere-se à contratação de serviço de panfletagem e divulgação de sua campanha, tendo havido equívoco do fornecedor ao descrever, erroneamente, na nota fiscal, a contratação de prestação laboral de vigilância, conforme recibos e fotografias dos trabalhos prestados acostados ao recurso

Sem razão.

O recorrente, ao ser intimado para sanar a irregularidade no momento oportuno, limitou-se a reapresentar a nota fiscal, cuja descrição consta serviços de vigia por 10 dias, incompatível com atividades de campanha eleitoral. Aliás, o valor pago (R$ 33.750,00) é relevante, representando a quantia de R$ 3.375,00 por dia por serviços de vigilância.

Apenas em sede recursal alega que houve “equívoco na descrição do objeto da contratação”, correspondendo a serviços de panfletagem e divulgação da campanha.

A alegação é intempestiva e, ademais, ainda que fosse considerada verossímil, padeceria de irregularidade o contrato apresentado (ID 24208783), pois não há o detalhamento da contratação com a identificação dos locais de trabalho, dos prestadores de serviço, das horas trabalhadas, das atividades executadas e da justificativa do preço estabelecido, como exige o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

[...]

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral dos prestadores de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

 

Por derradeiro, as fotografias juntadas de pessoas físicas realizando atividades de panfletagem e divulgação de sua campanha, por óbvio, não possuem o condão de suprir a irregularidade em tela, pois não há como relacionar ou vincular àquelas que teriam sido contratadas, as quais, aliás, sequer constaram no contrato apresentado pelo recorrente (ID 24208783).

Desse modo, é de ser mantida a irregularidade, assim como a determinação de recolhimento do respectivo valor ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, visto que envolve aplicação irregular de recursos do FEFC.

Quanto à segunda irregularidade, despesa paga com cheque não cruzado a MARIA APARECIDA FERREIRA no valor de R$1.600,00, o recorrente alega que o recurso foi efetivamente destinado à pessoa física beneficiária do cheque nominal emitido para pagamento do respectivo gasto eleitoral, conforme microfilmagem da referida cártula anexada ao recurso (ID 24232233).

Sem razão o recorrente.

O cheque acostado ao recurso, sob ID 24232233, apenas comprova que não houve o cruzamento da cártula, em desacordo com o que determina o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou IV - cartão de débito da conta bancária.

§ 1º O pagamento de boletos registrados pode ser realizado diretamente por meio da conta bancária, vedado o pagamento em espécie.

§ 2º É vedado o pagamento de gastos eleitorais com moedas virtuais.

 

Além disso, em consulta ao https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/88013/210000961010/extratos, acesso em 11.10.2021, é possível verificar que o cheque foi sacado na “boca do caixa”, sem que se possa identificar a contraparte beneficiada com o recurso.

Assim, restou inviabilizada a comprovação da correta destinação do recurso público, irregularidade que macula a higidez e transparência das contas.

Nesse sentido, na sessão do dia 06.7.2021, esta Corte assim decidiu sobre a matéria:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO E VICE. APROVADAS COM RESSALVAS. USO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA-FEFC. IRRESIGNAÇÃO UNICAMENTE QUANTO À DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO ENTRE OS BENEFICIÁRIOS DAS CÁRTULAS E OS EMITENTES DAS NOTAS FISCAIS. INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTOS IDÔNEOS A COMPROVAR A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

 

1. Recurso contra sentença que julgou aprovadas com ressalvas prestação de contas de candidatos à majoritária, referentes às eleições municipais de 2020, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em face do uso irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

2. Insurgência delimitada à determinação de restituição ao erário, não estando a sentença sujeita à modificação na parte em que aprovou as contas com ressalvas, uma vez que a matéria não restou devolvida à apreciação do Tribunal nas razões de apelo.

3. A norma que regulamenta a forma de pagamento das despesas eleitorais está prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos de natureza financeira devem ser pagos por meio de cheque cruzado e nominal ao fornecedor. Incontroverso, na hipótese, o descumprimento, cabe a análise se, por um lado, essa conduta por si só, conduz à determinação de recolhimento dos valores apurados ao Tesouro Nacional ou, por outro lado, se existem documentos idôneos capazes de comprovar os gastos efetuados por meio dos cheques objeto da glosa.

4. A atual jurisprudência do TSE supera o entendimento até hoje vigente neste colegiado, estabelecendo, em síntese, que a devolução de valores oriundos de recursos públicos ao Tesouro Nacional somente é cabível nas hipóteses de ausência de comprovação da utilização dos recursos ou utilização indevida, comandos estabelecidos no § 1º do art. 79 da já citada Resolução TSE 23.607/19.

5. A análise da microfilmagem dos cheques estabelece que os beneficiários das cártulas foram pessoas estranhas aos fornecedores identificados e que apresentaram as notas fiscais e as declarações tendentes a estabelecer vinculação com os já citados cheques. As regras contidas na Resolução TSE n. 23.607/19 dispõem que os gastos de campanha devem ser identificados com clareza e estabelecendo elos seguros entre os beneficiários dos pagamentos e os serviços prestados. É a chamada rastreabilidade, isto é, os pagamentos devem ser atestados por documentos hábeis a demonstrar o serviço prestado pelo beneficiário e sua vinculação com a despesa, o que não ocorreu no caso concreto.

6. O contexto probatório não revela nenhum documento fiscal idôneo emitido pelos beneficiários dos cheques e tampouco contrato ou prova de prestação de serviços a justificar os pagamentos feitos. Ausente a vinculação entre os beneficiários dos cheques e os emitentes das notas fiscais, bem como a inexistência de provas, por documentos idôneos, de prestação de serviços por parte dos beneficiários das cártulas, resta descumprida a regra posta no art. 60, e parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19. Circunstância que atrai a incidência do disposto no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo a devolução dos valores ao Tesouro Nacional, como determinado na sentença.

7. Provimento negado.

(REl 0600464-77.2020.6.21.0099, Relator designado: Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes.)

 

Dessarte, deve ser mantida a sentença com a correlata determinação de recolhimento da importância ao Tesouro Nacional.

Quanto à terceira irregularidade, dívidas de campanha decorrentes do não pagamento de despesas contraídas, no montante de R$ 46.635,00, sustenta o recorrente que a regra que exige a assunção de obrigação pelo partido relativa a gastos inadimplidos é “extremamente prejudicial à integralidade dos candidatos em eleições para prefeitos e vereadores, vez que tal regramento os coloca plenamente nas mãos dos partidos políticos”.

Com efeito, sobre o tema dívidas de campanha, assim dispõe o art. 33, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, em comento:

 

Art. 33

[...]

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

O recorrente limita-se a aduzir que o procedimento é prejudicial aos candidatos, alegação que não tem o condão de afastar a incidência da norma.

Dessa forma, a existência de dívidas de campanha sem que fossem acostados os documentos exigidos pelo art. 33, §§ 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, relativos à assunção do débito pelo partido, é irregularidade que deve ser mantida.

Nesse sentido, recente decisão do TSE:

 

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PREFEITO. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. FALHAS GRAVES. COMPROMETIMENTO DA REGULARIDADE E CONFIABILIDADE DAS CONTAS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 26/TSE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO VERGASTADA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. O princípio da dialeticidade impõe ao agravante o ônus de impugnar os fundamentos da decisão agravada, sob pena de vê–los mantidos. Incidência da Súmula nº 26/TSE.2. Na espécie, o agravante deixou de rebater os fundamentos da decisão da Presidência do TRE/MG de que (i) a adoção de entendimento contrário aos interesses da parte não autoriza o reconhecimento de omissão na decisão; (ii) a desaprovação das contas decorreu também de outras irregularidades, e não somente da omissão de despesas; (iii) faltaram documentos para comprovar a regular assunção de dívida pelo partido e, (iv) ainda que assim não fosse, [...] a declaração das despesas no Termo de Assunção de Dívida não elide a exigência de que referidos gastos sejam declarados no momento próprio (ID 139883188, p. 14–15).3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Agravo de Instrumento nº 47656, Acórdão, Relator(a) Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 161, Data: 31/08/2021.) (Grifo nosso)

 

No mesmo sentido, a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral (ID 43606433):

O recorrente, de sua parte, limita-se alegar que a regra que exige a assunção de dívida pelo partido relativa a despesas inadimplidas é “extremamente prejudicial a integralidade dos candidatos em eleições para prefeitos e vereadores, vez que tal regramento os coloca plenamente nas mãos dos partidos políticos”. E pugna pelo deferimento de autorização “para efetivar o adimplemento de R$ 43.153,68” com recursos próprios do candidato, após o que remanesceria pendência de apenas R$ 3.481,32, cuja obrigação poderia ser assumida pela agremiação.

Ocorre que, em caso de persistência de dívidas de campanha relativas a despesas realizadas e não pagas até a apresentação das contas, deve ser aplicado o procedimento específico previsto no art. 33, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE 23.607/2019, que assim dispõem: Art. 33. Partidos políticos e candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição. § 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral. § 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º; e Código Civil, art. 299).

Por isso, pagamentos programados para depois da análise e do julgamento das contas, e fora do procedimento de assunção de dívida pelo diretório partidário, devem ser considerados como valores de origem não identificada, por total falta de identificação do doador, a teor do art. 32, § 1º, I, da Resolução TSE n. 23.553/17, vazado nos seguintes termos: Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU). § 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada: I - a falta ou a identificação incorreta do doador;

Ademais, o pleito deduzido pelo recorrente de pagamento de parte da dívida com recursos próprios do candidato, após o esgotamento do processo eleitoral, não se mostra possível, no presente caso.

Isso porque, conforme entendimento dessa Egrégia Regional Eleitoral, “O pagamento da dívida pelo candidato após o esgotamento do processo eleitoral, situação proposta pelo próprio, está fora dos parâmetros trazidos pela legislação e representa infração grave às normas que regulamentam a arrecadação de recursos, pois os valores manejados escapam a qualquer controle ou exame pela Justiça Eleitoral” (PC n 060235173, Ac. de 03.12.2019, Relator Desembargador Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, publicação em sessão).

Correta, pois, a determinação de recolhimento do respectivo montante ao Tesouro Nacional, com fulcro no art. 32, § 1º, I, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Conforme consta, as três irregularidades que conduziram à desaprovação da contabilidade (R$ 33.750,00 + R$ 1.600,00 + R$ 46.635,00 = R$ 81.985,00) representam 27,58% do total das receitas declaradas (R$ 297.259,30), circunstância que torna inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença que desaprovou as contas de ALEXANDRE WAGNER DA SILVA BODABRA, relativas ao pleito de 2020, e determinou o recolhimento do valor de R$ 81.985,00 ao Tesouro Nacional.