REl - 0600783-80.2020.6.21.0055 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/11/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pelas quais dele conheço.

 

Mérito

O juízo de origem desaprovou as contas do recorrente (ID 40396233), em razão do recebimento de doações em valor superior a R$ 1.064,10 mediante depósitos bancários realizados de forma distinta da opção de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, e determinou o recolhimento de R$ 1.119,50 (mil, cento e dezenove reais e cinquenta centavos) ao Tesouro Nacional, conforme disposto no art. 21, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Conforme consta nos autos, o relatório conclusivo (ID 40396083) apontou que foram realizados dois depósitos sucessivos em 13.11.2020, identificados com o CPF do recorrente, nos valores de R$ 119,50 (cento e dezenove reais e cinquenta centavos) e R$ 1.000,00 (mil reais).

O recorrente não negou os depósitos referindo apenas que foram realizados em datas distintas. Sustentou acreditar que, em razão do encerramento do horário de expediente bancário, constou, equivocadamente, a mesma data para ambos os depósitos, situação que ocasionou a falha. Ainda, ressaltou que o dever de recolhimento deve recair apenas sobre a diferença entre o limite diário legalmente admitido e os valores depositados, o que corresponde a R$ 55,40.

Adianto que não assiste razão ao recorrente.

De fato, o conjunto de operações em tela está em desacordo com o art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual as doações financeiras acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) devem ser realizadas por meio de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, in verbis:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I – transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

[...]

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

Embora os depósitos glosados, isoladamente, não tenham excedido o valor de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), o conjunto de transações alcançou o montante de R$ 1.119,50 (mil, cento e dezenove reais e cinquenta centavos), ultrapassando objetivamente o limite previsto na legislação eleitoral.

No mesmo sentido, colho os seguintes arestos deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. DOAÇÕES SUCESSIVAS EM ESPÉCIE CUJA SOMA ULTRAPASSA O LIMITE REGULAMENTAR. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO DO VALOR CORRESPONDENTE AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 só poderão ser efetivadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação. Na hipótese, realizados depósitos sucessivos em dinheiro, realizadas pelos mesmos doadores, nas mesmas datas, cuja soma ultrapassa o limite legal para depósitos em espécie previsto nos arts. 22, §§ 1º e 2º, e 34, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17. As doações sucessivas, realizadas por um mesmo doador, em uma mesma data, devem ser somadas para fins de aferição do limite regulamentar.

2. Posicionamento firme do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o depósito, mesmo no caso de ser identificado, é meio incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória do ato. A ausência de comprovação segura do doador caracteriza o recurso como de origem não identificada, devendo o valor correspondente ser recolhido ao Tesouro Nacional.

3. Desaprovação.

(TRE-RS – Recurso Eleitoral n. 0602858-34.2018.6.21.0000, Acórdão, Relator Desembargador Eleitoral Roberto Carvalho Fraga – PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE) (Grifei.)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. MAJORITÁRIA. DESAPROVAÇÃO. VALORES RECEBIDOS VIA DEPÓSITOS SUCESSIVOS. EXTRAPO-LADO O LIMITE LEGAL. VIOLAÇÃO À NORMA REGENTE. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. APORTE IRREGULAR EM PERCENTUAL EXPRESSIVO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. DESPROVIMENTO

1. Insurgência contra sentença que desaprovou a contabilidade de campanha dos recorrentes, com determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, por violação ao disposto no art. 21, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Doações em valor superior a R$ 1.064,10 mediante depósitos bancários.

2. Ainda que cada um dos depósitos apresente valor inferior ao limite estabelecido, foram feitos no mesmo dia e pelos mesmos doadores. A realização de depósitos sucessivos em dinheiro demonstra a clara tentativa de burlar a norma eleitoral, o que é expressamente vedado pela citada resolução. Prática que permite o ingresso de valores na conta do candidato sem a possibilidade de segura verificação da pessoa do doador, vez que o CPF de identificação lançado pelo depositante não reflete, necessariamente, o autor da contribuição, o que somente poderia ser garantido por meio das operações indicadas nas normativas legais.

3. O montante recebido de forma irregular corresponde a 21,29% do total declarado como recebido, percentual que inviabiliza a aprovação das contas, mesmo com ressalvas, visto que compromete substancialmente a confiabilidade e transparência da movimentação contábil. Manutenção da sentença com determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS – RE: 0600553-37.2020.6.21.0023, AJURICABA – Relator Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Data de Julgamento: 11/05/2021, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE) (Grifei.)

Destaco que, embora o recorrente tenha alegado que os depósitos foram realizados em dias distintos, mas que constaram na mesma data por um equívoco, o extrato bancário acostado aos autos (ID 40395883) comprova que os citados depósitos foram aportados na conta na mesma data, em 13.11.2020.

Cabe ressaltar, ainda, que as doações realizadas por meio de depósito, mesmo que identificadas por determinada pessoa, não são suficientes para comprovar a origem real dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário – na linha da jurisprudência desta Corte, conforme demonstra o julgado do TSE abaixo colacionado:

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros – R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha – oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso – especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador – demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral nº 25104, Acórdão, Relator Ministro Jorge Mussi, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Tomo 066, Data 05/04/2019, Página 68-69) (Grifei.)

Nesse contexto, a quantia recebida em desacordo com a legislação eleitoral, bem como a forma utilizada para doação, prejudicam o cruzamento das informações, impedindo a confirmação da exata origem dos recursos recebidos, uma vez que para o depósito em espécie são lançadas as informações declaradas pelo depositante.

Para além, a ausência de comprovação segura do doador compromete a regularidade das contas prestadas e qualifica o recurso como de origem não identificada, cujo valor correspondente deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 21, § 3º e § 4º, e 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ressalta-se ainda que, conforme bem pontuado no parecer do ilustre Procurador Regional Eleitoral, Dr. Fábio Nesi Venzon, consoante a jurisprudência da Corte para as eleições de 2016 (RE 210-53.2016.6.21.0113), tanto para determinar o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional, quanto para verificar o percentual da irregularidade, deve ser considerado o valor integral dos depósitos e não apenas o que excede o limite de R$ 1.064,10.

Por fim, destaca-se que as falhas no valor total de R$ 1.119,50 (mil, cento e dezenove reais e cinquenta centavos) representam 33,05% do total de receitas arrecadadas na campanha (R$ 3.386,83), motivo que levaria à desaprovação das contas.

Contudo, interposto recurso apenas pelo candidato, não cabe, nesta instância, de ofício, desaprovar as contas do recorrente, sob pena de violação do princípio da non reformatio in pejus.

Por essas razões, a sentença deve ser mantida integralmente.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, para manter a aprovação com ressalvas das contas de Selmar Pedrinho Bavaresco, relativas ao pleito de 2020, bem como pela determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 1.119,50 (mil, cento e dezenove reais e cinquenta centavos).