REl - 0600778-73.2020.6.21.0050 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/11/2021 às 14:00

VOTO

Passo ao exame da preliminar de nulidade do feito por falta de intimação pessoal do candidato, de sua advogada e do presidente do partido pelo qual concorreu, PT de General Câmara, e adianto que não prospera.

Do exame dos autos, observa-se que o recorrente prestou contas representado por advogada legalmente constituída, conforme procuração do ID 40993133, a qual foi intimada em 16.3.2021 do prazo de 3 (três) dias para manifestação sobre o parecer técnico de exame das contas (ID 40995583), transcorrendo o prazo, em branco, em 31.3.2021.

A forma do ato intimatório obedeceu à regra expressa prevista no § 4º do art. 26 da Resolução TRE-RS n. 347/20, segundo a qual as intimações nos processos de prestação de contas relativos às eleições de 2020 seriam realizadas por meio de ato de comunicação via sistema no Processo Judicial Eletrônico (PJe), observando-se o prazo de ciência de 10 (dez) dias previsto no art. 5º, § 3º, da Lei n. 11.419/06 (Resolução TRE-RS n. 338/19, art. 51).

Assim, não se verifica qualquer nulidade.

Além disso, ressalto que o presidente do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores não é parte no presente processo, sendo descabida a alegação de nulidade com base na ausência de sua intimação.

Portanto, afasto a preliminar arguida.

No mérito, as contas foram desaprovadas em virtude do recebimento de recurso de origem não identificada, localizado a partir do procedimento de circularização de despesas realizado pelo cartório eleitoral.

O procedimento indicou o pagamento no valor de R$ 1.810,00, referente à nota fiscal n. 32155, emitida pela empresa Jeferson Luiz Althaus ME em 23.10.2020 contra o CNPJ do candidato, para aquisição de material gráfico de propaganda eleitoral (ID 40995533).

Considerando que o valor utilizado para a compra do material não transitou pela conta bancária de campanha, a quantia destinada ao pagamento caracteriza-se como recurso de origem não identificada, o qual deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma do caput do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador;

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político;

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

V - as doações recebidas sem a identificação do número de inscrição no CPF/CNPJ no extrato eletrônico ou em documento bancário;

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

VII - doações recebidas de pessoas físicas com situação cadastral na Secretaria da Receita Federal do Brasil que impossibilitem a identificação da origem real do doador; e/ou

VIII - recursos utilizados para quitação de empréstimos cuja origem não seja comprovada.

§ 2º O comprovante de devolução ou de recolhimento, conforme o caso, poderá ser apresentado em qualquer fase da prestação de contas ou até 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas de campanha, sob pena de encaminhamento dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

§ 3º Incidirão atualização monetária e juros moratórios, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.

§ 4º O disposto no § 3º deste artigo não se aplica quando o candidato ou o partido político promove espontânea e imediatamente a transferência dos recursos para o Tesouro Nacional, sem deles se utilizar.

§ 5º O candidato ou o partido político pode retificar a doação, registrando-a no SPCE, ou devolvê-la ao doador quando a não identificação decorra do erro de identificação de que trata o inciso III do § 1º deste artigo e haja elementos suficientes para identificar a origem da doação.

§ 6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o § 5º, o valor deverá ser imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.

 § 7º A devolução ou a determinação de devolução de recursos recebidos de origem não identificada não impede, se for o caso, a desaprovação das contas, quando constatado que o candidato se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos, assim como a apuração do fato na forma do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 e do art. 14, § 10, da Constituição da República.

 

Em suas razões, o recorrente alega que a nota fiscal em questão, n. 32155, foi cancelada e que, em seu lugar, foi emitida pelo mesmo fornecedor, também no dia 23.10.2020, a nota fiscal n. 32156, desta vez contra o CNPJ do Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de General Câmara (ID 40994883), o qual doou o material gráfico para sua campanha.

Ocorre que não foi comprovado nos autos o cancelamento da nota fiscal n. 32155, localizada pela Justiça Eleitoral.

Desse modo, o recebimento da doação de propaganda, comprovado pela nota fiscal n. 32156, foi considerado regular pelo juízo a quo. Contudo, permaneceu a falha quanto à nota fiscal que teria sido emitida por equívoco, como alega o candidato, contra o CNPJ da sua candidatura.

A tese de que houve um equívoco e de que o documento fiscal foi cancelado não passa de alegação, pois não foi trazido aos autos documento probatório do fato. A justificativa consiste em mera afirmação, sem força suficiente para invalidar a emissão.

Embora o cartório eleitoral não tenha juntado o documento fiscal aos autos, elemento necessário para a verificação da irregularidade, pode-se verificar a chave de acesso da nota fiscal n. 32155, emitida contra o CNPJ do recorrente, no site DivulgaCandContas (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/). A partir de pesquisa da chave, no portal da Nota Fiscal Eletrônica, é possível constatar que seu status é de "autorizada", estando ausente qualquer registro de cancelamento (https://www.nfe.fazenda.gov.br/).

A necessidade de cancelamento do documento fiscal está prevista no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual, “o cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular”. Por conseguinte, permanece a falha.

Como se vê, o recorrente não se desincumbiu de comprovar o fato modificativo que invoca em sua defesa, na forma do art. 373, inc. II, do Código de Processo Civil, pois sequer demonstrou ter solicitado o cancelamento ao estabelecimento comercial.

Se evidenciado o cancelamento do documento fiscal, a irregularidade pode ser considerada sanada, mesmo em grau recursal. Esse é o entendimento desta Corte, de acordo com a seguinte ementa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINARES. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PENALIDADE NÃO DETERMINADA. NULIDADE DA SENTENÇA NÃO CONFIGURADA. MÉRITO FAVORÁVEL À PARTE. DOCUMENTOS NOVOS EM SEDE RECURSAL. ADMISSIBILIDADE. MÉRITO. RECURSOS PRÓPRIOS NÃO DECLARADOS NO REGISTRO DE CANDIDATURA. DESPESAS NÃO ESCLARECIDAS. FALHAS CORRIGIDAS. APROVAÇÃO. PROVIMENTO. (...) 2. Mérito. 2.1. A omissão de gastos com fornecedor, inicialmente identificada, foi esclarecida pelo prestador. Nota fiscal cancelada e substituída pela de número subsequente, comprovada pela juntada de cópia do próprio documento fiscal sob controvérsia, contendo o termo de cancelamento e a declaração emitida pela Administração Tributária do Município. 2.2. Superada a irregularidade atinente à utilização de recursos próprios na campanha, e não declarados no registro de candidatura, pois comprovada a capacidade financeira do candidato, decorrente dos rendimentos de sua atividade laboral, suficiente para suportar as despesas efetuadas. 3. Irregularidades sanadas. Identificadas as fontes dos recursos aplicados na campanha. Afastada a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. Aprovação das contas. Provimento.

(TRE-RS - RE: 57857 CHARQUEADAS - RS, Relator: DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Data de Julgamento: 27.9.2017, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 175, Data: 29.9.2017, p. 10.) (Grifei.)

 

Assim, permanece a irregularidade no valor de R$ 1.810,00, que representa 23,65% das receitas declaradas (R$ 7.652,50), percentual superior ao considerado (10%) como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas, por aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e acima do limite de R$ 1.064,10 que a Resolução TSE n. 23.607/19 considera como módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Com essas considerações, afigura-se razoável e proporcional o juízo de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento do recurso de origem não identificada ao Tesouro Nacional.

Diante do exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a sentença de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento da quantia de R$ 1.810,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.