REl - 0600477-47.2020.6.21.0044 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/11/2021 às 14:00

 VOTO

O recurso é tempestivo e, preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, comporta conhecimento.

Em sede recursal, os recorrentes renovam pedido de remoção dos conteúdos impugnados, fornecendo, para tanto, os URLs, ao argumento de que os ilícitos eleitorais narrados na exordial foram praticados por servidores públicos por meio de rede social e da plataforma virtual do FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL (Facebook Brasil).

Em suas contrarrazões (ID 40958483), o Facebook Brasil requer seja reconhecida a superveniente perda do objeto, em relação ao pedido de remoção dos conteúdos, julgando-se o processo extinto, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil.

Com razão.

Não cabe à Justiça Eleitoral rever determinação de remoção de conteúdo supostamente favorável a candidato nas eleições de 2020, uma vez que encerrado o processo eleitoral, restando exaurido o prazo de propaganda eleitoral.

Com efeito, de acordo com o art. 38, § 7º, da Resolução TSE n. 23.610/19, ordens de remoção de conteúdo da internet, caso não tenham sido confirmadas por decisão de mérito transitada em julgado, deixam de produzir efeitos, sem prejuízo da adoção de medidas perante a Justiça Comum pela parte interessada:

 

ELEIÇÕES 2018. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. PUBLICAÇÃO DE CONTEÚDO OFENSIVO E DIFAMATÓRIO. FACEBOOK. PERÍODO ELEITORAL. ENCERRAMENTO. PERDA DO OBJETO. ORDEM JUDICIAL SEM EFEITO. DESPROVIMENTO.

1. A pretensão recursal não comporta êxito, porquanto, segundo o disposto no art. 33, § 6º, da Res.–TSE 23.551/2017, encerrado o período eleitoral, as ordens judiciais de remoção do conteúdo da internet proferidas por esta Justiça especializada, independentemente da manutenção dos danos gerados pelas inverdades divulgadas, deixam de surtir efeito, devendo a parte interessada redirecionar o pedido, por meio de ação judicial autônoma, à Justiça Comum.

2. Recurso inominado desprovido.

(Representação n. 060163531, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 83, Data 06.05.2019.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR. SENADOR. PERDA DO OBJETO. PREJUDICIALIDADE.

1. Conforme precedentes do Tribunal Superior Eleitoral, exaurido o período da propaganda eleitoral relativa ao primeiro turno das Eleições 2014, tem-se a perda superveniente do objeto do presente recurso (REspe 5428-56/GO, Rel. Min. Marco Aurélio, PSESS de 19.10.2010; AgR-REspe 1287-86/AL, Rel. Min. Cármen Lúcia, PSESS de 16.12.2010; AgR-REspe 5110-67/RN, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe de 14.12.2011).

2. Agravo regimental prejudicado.

(Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 148407, Acórdão de 23.10.2014, Relator Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 23102014.)

 

Também esse é o entendimento da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 44805398):

[…]

as ordens já proferidas até o pleito e que não forem confirmadas por decisão de mérito transitada em julgado deixam de produzir efeitos a partir da data da eleição, ou seja, não há mais que se falar na existência de ato que possa prejudicar a candidatura ou a igualdade de tratamento entre os candidatos a justificar a atuação da Justiça Eleitoral.

No presente caso, verifica-se que o pedido liminar de remoção das postagens indicadas na exordial restou indeferido pelo Juiz a quo ao fundamento de ausência dos requisitos autorizadores ao deferimento da tutela liminar.

 

Dessarte, relativamente ao recorrido Facebook, é de ser julgado prejudicado o apelo, diante da superveniente ausência do interesse de agir.

No mérito, antes de adentrar no caso concreto, convém trazer breves apontamentos sobre os ilícitos mencionados na peça recursal: abuso de poder, condutas vedadas e captação ilícita de votos.

A Constituição Federal, em seu art. 14, § 9º, prescreve que lei complementar estabelecerá casos de inelegibilidade, visando à proteção da normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

A atuação com desvio das finalidades legais, de forma a comprometer a legitimidade do pleito, seja em favor do próprio agente ou de terceiro, caracteriza o exercício abusivo do poder previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político;

 

O abuso de poder, conforme a doutrina eleitoralista, é instituto de textura aberta, não sendo definido por condutas taxativas, mas pela sua finalidade de impedir comportamentos que extrapolem o exercício regular e legítimo da capacidade econômica e de posições públicas dos candidatos capazes de causar indevido desequilíbrio ao pleito.

Em um primeiro momento, como nos ensina Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, 7ª ed. 2020, p. 661-663), a jurisprudência do TSE exigia que o ato abusivo tivesse relação direta com a alteração do resultado final do pleito, por meio de um cálculo aritmético (abuso vs. diferença de votos entre os candidatos). Era o que, nas palavras do Min. Sepúlveda Pertence, denominava-se prova diabolicamente impossível de ser obtida (RESPE n. 19.553, de 21.03.2002).

Após, evoluiu-se à necessidade de demonstração da potencialidade de influenciar o pleito, desvinculando a caracterização do abuso do resultado matemático das urnas.

E, após alteração legislativa e jurisprudencial, a caracterização da violação ao bem jurídico protegido, atualmente, está vinculada à gravidade da conduta, capaz de alterar a normalidade e macular a legitimidade do pleito, sem a necessidade da demonstração de que, sem a conduta abusiva, o resultado das urnas seria diferente.

É o que dispõe o art. 22, inc. XVI, da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 22.

[...]

XVI - para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

 

No que refere ao reconhecimento do abuso do poder econômico, o TSE considera que é necessário o emprego desproporcional e excessivo de recursos patrimoniais, públicos ou privados, em benefício eleitoral do candidato, que seja capaz de comprometer a legitimidade do pleito e a paridade de armas (REspe n. 941-81, Rel. Maria Thereza de Assis Moura, j. em 15.12.2015).

Em relação às condutas vedadas, a Lei n. 9.504/97 traz capítulo específico sobre as condutas proibidas aos agentes públicos durante a campanha eleitoral, na formulação trazida nos arts. 73 a 78.

O bem jurídico tutelado é a isonomia entre os concorrentes ao pleito. As hipóteses relativas às condutas vedadas são taxativas e de legalidade restrita, sendo que “a conduta deve corresponder ao tipo definido previamente” (Recurso Especial Eleitoral n. 24.795, Rel. Luiz Carlos Madeira).

Para o reconhecimento da conduta vedada é suficiente a demonstração da sua prática e respectiva tipificação legal.

Em relação à captação ilícita de sufrágio, esta somente se aperfeiçoa quando alguma das ações típicas elencadas no art. 41-A da Lei n. 9.504/97 (doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza a eleitor, ou, ainda, praticar violência ou grave ameaça ao eleitor), cometidas durante o período eleitoral, estiver intrinsecamente associada ao objetivo específico de agir do agente, consubstanciado na obtenção do voto do eleitor (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, p. 725), sendo que a ausência de qualquer um desses vetores integrativos conduz, inevitavelmente, ao juízo de improcedência da demanda (TSE, AI n. 00018668420126130282/MG, Relator Ministro Gilmar Ferreira Mendes, DJE de 02.02.2017, pp. 394-395).

Transcrevo o dispositivo legal em tela:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999)

§ 1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 2º As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 3º A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 4º O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Postas as notas características de cada instituto, passo a analisar o caso posto.

Imputa-se aos recorridos OSVALDO FRONER e ANSELMO CARDOSO a “negociação” de cargos de confiança e/ou cargos em comissão, tendo como contrapartida a cooptação ilegal de “cabos eleitorais”, por meio de postagens nas redes sociais (Facebook), em pleno horário de expediente.

As condutas ilícitas estariam consubstanciadas em mensagens postadas no perfil pessoal do Facebook de servidores públicos municipais ocupantes de cargo efetivo e/ou cargo comissionado de livre nomeação e exoneração e de uma estagiária, conforme conteúdo trazido pelo douto Procurador Eleitoral:

 

Servidor Carlos Humberto Munareto, postou no dia 01.10.2020, às 13:53, sua foto e a propaganda eleitoral EU SOU 11, número do Partido Progressistas (PP) ao qual o candidato FRONER é filiado (ID 40954283);

Servidora Cláudia Marivani de Sales Pereira, postou no dia 21.10.2020, às 11:44, fotos de obras e mensagem de texto parabenizando a comunidade de Capão de Cipó pela conquista de uma caixa de água de 200 mil litros ligada a um novo poço artesiano com capacidade de vazão de 45 mil litros por hora de bombeamento (ID 40954333, fls. 3 e 4 do PDF);

Servidora Dienifer Corteline, postou no dia 14.09.2020, às 11:12, sua foto e propaganda eleitoral EU SOU 11, e fotos da obra da caixa de água e mensagem de texto parabenizando a comunidade pela conquista (ID 406954383, fls. 3 e 4 do PDF);

Servidor Giuliano de Andrade Estivalet, postou no dia 26.10.2020, às 09:14, foto em que aparece ao lado dos candidatos FRONER e ANSELMO, seguida de mensagem de texto “Na reta final de campanha, convidamos a todos a se integrarem conosco, por que juntos somos mais fortes. Bora busca mais um!” (ID 40954433, fl. 3 do PDF);

Servidor Luís Henrique do Nascimento Viana, postou no dia 07.10.2020, às 13:59, propaganda eleitoral com fotos dos candidatos FRONER e ANSELMO (ID 40954433, fl. 3 do PDF);

Estagiária Josiane Moraes de Oliveira, postou em dia e horários não visualizados, sua foto e propaganda eleitoral EU SOU 11; postou no dia 09.10.2020, às 08:05, propaganda eleitoral dos candidatos FRONER e ANSELMO e propaganda eleitoral com a foto do candidato Dilcione pelo PP – 11 (ID 40954533, fls. 2 e 3 do PDF);

Servidora Lair de Oliveira, postou no dia 21.10.2020, às 10:43, propaganda eleitoral com fotos dos candidatos FRONER e ANSELMO, e fotos da obra da caixa de água e mensagem de texto parabenizando a comunidade (ID 40954583, fls. 3 e 4 do PDF);

Servidora Letícia Perlin Nascimento de Pellegrini, postou no dia 28.10.2020, às 13:12, propaganda eleitoral com fotos dos candidatos FRONER e ANSELMO, pela Coligação PP/PT/PDT e mensagem de texto grifada na cor vermelha “COMPARTILHE CONOSCO DESTA IDEIA” (ID 40954633, fl. 4 do PDF);

Servidor Luciano dos Santos Oliveira, postou no dia 21.09.2020, às 09:47, sua foto e propaganda eleitoral EU SOU 11 (ID 40954683, fl. 3 do PDF);

Servidor Willian Assunção Vielmo, postou nos dias:

01.10.2020, às 14:03, mensagem de texto “Willian Assunção está com Froner Anselmo” seguida de longa mensagem de apoio aos candidatos, propaganda eleitoral com foto dos candidatos pela Coligação PP/PT/PDT e mensagens de texto grifada na cor vermelha “COMPARTILHE CONOSCO DESTA IDEIA” (40954733, fl. 2 do PDF);

04.10.2020, às 21:07, mensagem de texto “Venha conosco, faça parte dessa grande família Progressista, PDT e PT, #juntossomosmaisfortes” (40954733, fl. 4 do PDF);

06.10.2020, às 14:46, mensagem de texto “Venha conosco, faça parte dessa grande família....#juntossomosmaisfortes É 1 1 ” (40954733, fl. 4 do PDF);

09.10.2020, às 11:08, foto do Senador do Estado do Rio Grande do Sul Luís Carlos Heinze pelo PP/RS (40954733, fl. 5 do PDF);

20.10.2020, às 14:12, longa mensagem de texto externando opinião pessoal sobre discussão havida nas redes sociais quanto ao número de CCs existentes (40954733, fl. 6 do PDF).

 

Ocorre que, nos termos da decisão da magistrada a quo (ID 40957983) todas as postagens foram realizadas nas páginas pessoais dos servidores públicos e da estagiária, condutas que se encontram amparadas pelas previsões constitucionais que garantem a liberdade de manifestação e expressão do pensamento (ID 40957983).

No ponto, colho os fundamentos exarados na sentença (ID 40957983):

Como se verifica a causa de pedir da presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral diz com abuso do poder econômico e abuso do poder político, indicando a parte autora a utilização pelo prefeito e candidato a reeleição, da máquina pública em seu benefício através de postagens de servidores públicos em horário de expediente.

Como já delineado na decisão liminar, a questão que se apresenta é complexa, pois demanda a observação das questões que dizem com o abuso do poder econômico e político, mas também com a observação das questões inerentes à liberdade de expressão e propaganda eleitoral.

Destaco que as postagens dos servidores públicos trazidas com a inicial foram realizadas em suas páginas pessoais.

Assim, imperioso que se tome por base as previsões constitucionais que garantem a liberdade de expressão, vedado o anonimato e resguardada a intimidade e vida privada, honra e imagem das pessoas, verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

IV - é livre a manifestação do pensamento sendo vedado o anonimato;

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Quanto à manifestação do pensamento, tratando-se de matéria eleitoral, ainda há que se considerar a previsão expressa no artigo 28, §, 6º, da Resolução TSE 23.610/2019:

Art. 28. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas (Lei nº 9.504/1997, art. 57-B, I a IV):

(...)

§ 6º A manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidato ou partido político, não será considerada propaganda eleitoral na forma do inciso IV, desde que observados os limites estabelecidos no § 1º do art. 27 desta Resolução e a vedação constante do § 2º deste artigo. 

Feitas essas considerações, observo que a a manifestação por elogio ao candidato e partido, em página pessoal do servidor público em rede social, seja ele em cargo de comissão ou não, não demonstra por si só o abuso do poder político, pois, presume-se estar a conduta no âmbito da livre manifestação do pensamento.

Todavia, verifico que os horários das postagens condizem com o horário de expediente, o que determina a necessidade de processamento da presente AIJE, sem descuidar da possibilidade de postagens por qualquer outro meio (smartphone, tablet ou similiar com internet própria pessoal), sem uso dos equipamentos públicos.

Quanto aos documentos acostados com a contestação, observo que as Portarias de nomeação, com exceção de Willian Assunção Vielmo, não foram publicadas em período eleitoral. Ao passo que respectivamente quanto a Willian, verifico que a nomeação se deu em razão de licença maternidade de outra servidora, sendo que o mesmo já havia sido nomeado anteriormente no ano de 2013.

Desta forma, considerando a garantia constitucional de liberdade de expressão, que as postagens foram realizadas nas páginas pessoais dos servidores citados, concluo não ter restado demonstrado o abuso de poder político.

Neste sentido também a manifestação do Ministério Público Eleitoral em Parecer de evento n. 42054025, no qual opinou pela improcedência da ação, verbis:

(...)

A ação proposta pelos autores se baseia, em suma, no fato de que servidores e estagiários estariam, durante seus horários de expediente, fazendo publicações de cunho eleitoral em suas redes sociais. Com relação a isso, é necessário frisar que não existe proibição legal à veiculação de propaganda eleitoral por parte de agentes públicos, desde que o façam de acordo com os ditames legais.

No mais, a utilização, por parte de tais servidores, de seus perfis particulares para publicar propaganda aos demandados não constitui qualquer abuso de poder político ou econômico apto a desequilibrar a captação do sufrágio

Ainda, considerando a grande possibilidade de as postagens por meios particulares (smartphones, tablets, com internet própria pessoal), também inexiste nos autos qualquer comprovação de que as publicações tenham sido feitas por meio de equipamentos públicos.

Feitas todas essas considerações acerca dos fatos trazidos autos, tem-se que o que autoriza a veiculação da AIJE é justamente o cometimento dos atos elencados no artigo 22 da Lei Complementar nº 64/90 que guardem relação com a finalidade de captar votos em disparidade com os demais candidatos, o que não se verificou nos elementos trazidos pelos autores.

Em outras palavras, o ônus de provar a veracidade de suas alegações, bem como de sua relação com o objeto que justificaria a veiculação da presente ação eleitoral, recai sobre os autores. E, no caso dos autos, tem-se que eles não se desincumbiram desse ônus.

Dessa forma, tendo em vista a ausência de provas que confirmem a relação dos fatos alegados com qualquer abuso do poder político ou econômico, visando à captação de votos em desigualdade de condições com os demais candidatos, não há, na visão deste órgão ministerial, elementos que autorizem a procedência da ação.

 

 

Também nesse sentido o parecer da douta Procuradoria Eleitoral (ID 44805398):

A manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidato ou partido político, prevista no art. 28, § 6º, da Resolução TSE 23.610/2019, alcança também os servidores públicos, sendo-lhes conferindo o direito de participar do processo político-eleitoral de forma espontânea.

 

Esse entendimento está em consonância com a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, que definiu que a divulgação de realizações do governo ou mensagens de apoio em perfil pessoal do agente público, voltada à exaltação de determinada candidatura, não é apta à configuração de ilícito eleitoral, consistindo em exercício legítimo da liberdade de pensamento e expressão (art. 5º, incs. IV e IX, da Constituição Federal), indissociáveis do debate político e da formação da vontade do eleitor em ambiente genuinamente democrático.

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. CONDUTA VEDADA. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. VEICULAÇÃO EM PERFIL PARTICULAR DE REDE SOCIAL. UTILIZAÇÃO DA MÁQUINA PÚBLICA NÃO DEMONSTRADA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso especial eleitoral interposto para impugnar acórdão que manteve sentença de improcedência da ação de investigação judicial eleitoral por uso indevido dos meios de comunicação social e conduta vedada.

2. O desequilíbrio gerado pelo emprego da máquina pública é a essência da vedação à publicidade institucional prevista no art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997, que objetiva assegurar a igualdade de oportunidades entre os candidatos.

3. A veiculação de postagens sobre atos, programas, obras, serviços e/ou campanhas de órgãos públicos federais, estaduais ou municipais em perfil privado de rede social não se confunde com publicidade institucional autorizada por agente público e custeada com recursos públicos, a qual é vedada nos três meses que antecedem as eleições (art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997).

4. É lícito aos cidadãos, inclusive os servidores públicos, utilizarem–se das redes sociais tanto para criticar quanto para elogiar as realizações da Administração Pública, sem que tal conduta caracterize, necessariamente, publicidade institucional.

5. Da moldura fática do acórdão regional se extrai que: (i) houve divulgação de realizações do governo municipal, por meio de fanpage gerenciada pelo primeiro agravado, servidor público, fora do seu horário de trabalho; (ii) não há notícia do emprego de recursos ou equipamentos públicos para a produção e divulgação das postagens, integralmente feitas sob responsabilidade do agravado, inclusive no que diz respeito à digitalização de encarte distribuído pela Prefeitura antes do período vedado; e (iii) inexiste prova de que tenha havido o uso de algum artifício nas postagens impugnadas que permitisse caracterizá–las como redirecionamento dissimulado de publicidade institucional autorizada ou mantida por agente público em período vedado.

6. Acertada, portanto, a conclusão de que tal conduta está protegida pela liberdade de expressão (arts. 5º, IV e IX, e 220 da Constituição Federal) e não configura publicidade institucional.

7. Não se conhece de recurso especial eleitoral por dissídio jurisprudencial nos casos em que em que inexiste similitude fática entre as hipóteses tratadas nos acórdãos confrontados (Súmula nº 28/TSE).

8. O adequado desempenho do dever de fundamentação pelos órgãos judiciais colegiados não exige que, no julgamento, todos os argumentos trazidos por voto divergente sejam refutados pelos demais juízes. Proclamado o resultado, considera–se fundamentado o acórdão pela tese jurídica prevalecente nos votos que compuseram a maioria vencedora, como ocorreu, no caso, em relação à atipicidade da conduta.

9. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 37615, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 74, Data 17.04.2020.) (Grifei.)

 

Nesse sentido, a jurisprudência deste Tribunal, tendo esta Corte decidido, na sessão de 06.05.2021, nos autos do RE 0601260-06.2020.6.21.0055, da relatoria do ilustre Des. Eleitoral Gerson Fischmann, no sentido de ser lícito até mesmo aos candidatos à reeleição a divulgação de obras em seus perfis pessoais, raciocínio que, de igual sorte, deve ser aplicado aos servidores públicos:

RECURSOS. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. AIJE. PARCIAL PROCEDÊNCIA. PRELIMINAR ACOLHIDA. AUSÊNCIA INTERESSE RECURSAL. RECORRENTE NÃO CONDENADO NA SENTENÇA. CONDUTAS VEDADAS. LEI N. 9.504/97. CONCEDIDA LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIVULGAÇÃO DE CONTEÚDO EM PERFIL PARTICULAR DE REDE SOCIAL. NÃO CONFIGURADO ILÍCITO. PROVIDO RECURSO DO CANDIDATO REMANESCENTE. DESPROVIDO RECURSO INTERPOSTO PELA AGREMIAÇÃO.

1. Irresignação em face de sentença que julgou parcialmente procedente ação de investigação judicial eleitoral, condenando o candidato reeleito ao cargo de chefe do executivo municipal pela prática da conduta vedada descrita no art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97.

2. Acolhida a preliminar ministerial de ausência de interesse recursal relativa ao recorrente não condenado na sentença. Não conhecimento do apelo, com fundamento no art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil.

3. Alegada distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social em favor da campanha, divulgação de publicidade institucional em período proibido, e veiculação de notícia falsa na propaganda eleitoral. Deferida parcialmente tutela provisória de urgência, determinando a imediata exclusão de parte das publicações impugnadas. Impetrado mandado de segurança e concedida liminar ao efeito de cassar a decisão do juízo a quo.

4. Inexistência de ilegalidade nas postagens realizadas pelo candidato a prefeito em seu perfil de rede social. A mais recente jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, relativa a caso análogo ao presente, em interpretação estrita do art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, definiu que a divulgação de realizações do governo em perfil pessoal do agente público, voltada à exaltação de determinada candidatura, não é apta à configuração da conduta vedada em comento, consistindo em exercício legítimo da liberdade de pensamento e expressão (art. 5º, incs. IV e IX, da Constituição Federal), indissociáveis do debate político e da formação da vontade do eleitor em ambiente genuinamente democrático. Não caracterizada a propaganda institucional vedada aos agentes públicos pela legislação eleitoral. Improcedência da ação.

5. Provimento ao recurso do candidato remanescente. Desprovimento ao apelo do partido.

(Grifo nosso)

 

Acrescento, ainda, que em nenhuma das condutas imputadas aos recorridos há a mínima descrição de uso indevido de bens públicos afetados à administração pública. Apenas manifestações, em rede social, de apoio a determinada candidatura, atos legítimos e albergados pela livre manifestação política e democrática.

No ponto, peço vênia para transcrever o que constou no parecer da douta Procuradoria Eleitoral (ID 44805398):

Destarte, ainda que as poucas manifestações de apoio político tenham sido postadas no horário do turno único das 08h às 14h estabelecido no art. 2º do Decreto Municipal nº 008 de 19 de março de 2020, não restou comprovado o uso efetivo do aparato estatal em prol da campanha dos candidatos.

Assim, não vislumbramos a prática das condutas vedadas noticiadas e com mais razão do abuso do poder político ou utilização indevida dos meios de comunicação social, os quais pressupõem a gravidade para afetar negativamente a normalidade e legitimidade do pleito, o que, pelas razões já deduzidas, não se faz presente no caso em tela.

Nesse sentido, a vontade do eleitor expressa nas urnas configura manifestação do princípio democrático, basilar na República Federativa do Brasil e pressuposto do Estado Democrático de Direito. Dessa forma, as sanções de cassação do diploma e inelegibilidade previstas no inc. XIV do art. 22 da LC 64/90 para os casos de abuso de poder devem consistir em exceção, ultima ratio no processo eleitoral, e somente diante da ocorrência de condutas graves, e substanciosamente comprovadas, viáveis a comprometer a normalidade e legitimidade do sufrágio.

Finalmente, os recorrentes alegam também que a nomeação de Willian Assunção Vielmo para ocupar cargo em comissão se deu somente por interesses políticos, especificamente em troca de trabalho na campanha eleitoral, caracterizando captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei das Eleições).

Primeiro, o ilícito do art. 41-A da LE pressupõe mercancia em troca de voto e não de trabalho na campanha. Segundo, os investigados comprovaram que Willian foi nomeado no dia 05.10.2020, para ocupar o cargo em comissão de

Assessor Técnico Administrativo da Secretaria de Saúde em razão de ter sido

concedido à servidora Franciele de Mendonça Raffo licença-gestante, a partir de 15.09.2020 (ID 40956683); bem como porque Willian possuía experiência, vez que havia assumido o mesmo cargo comissionado em 01.02.2013, na gestão do então Prefeito Municipal Alcides Meneghini (ID 40956733). Destarte, não há qualquer comprovação da alegada captação ilícita de sufrágio.

Desta forma, a manutenção da sentença de improcedência é medida que se impõe.

 

Dessa forma, diante da inexistência de uso de bens públicos para beneficiar candidatura, e constituindo-se as postagens como exercício legítimo da liberdade de pensamento e expressão (art. 5º, incs. IV e IX, da Constituição Federal), indissociáveis do debate político e da formação da vontade do eleitor em ambiente democrático, deve ser mantida a sentença que julgou improcedente a ação.

Ante o exposto, VOTO no sentido de julgar prejudicada a análise do recurso quanto ao pedido deduzido em face da empresa Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., diante da ausência superveniente do interesse de agir (art. 485, inc. VI, do CPC), e pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença que julgou improcedente a ação.