REl - 0600783-87.2020.6.21.0085 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/10/2021 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo, e presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

MARCOS PAULO KLASSEN, candidato ao cargo de vereador no Município de Torres, recorre da sentença do Juízo da 85ª Zona Eleitoral que desaprovou suas contas de campanha relativas às eleições 2020, em razão de (1) não apresentação de peças obrigatórias; (2) pagamento irregular de despesas com recursos do FEFC; e (3) utilização de recursos de fonte vedada. A decisão hostilizada determinou o recolhimento do valor de R$ 2.860,00 ao Tesouro Nacional.

No concernente à primeira irregularidade, a sentença apontou a ausência das peças obrigatórias nos seguintes termos:

Pois bem, compulsando os autos verifico que MARCOS PAULO KLASSEN não apresentou documentos obrigatórios, contrariando o artigo 53, a Resolução TSE 23.607/19: Extrato da prestação de contas; . Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC); Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de Outros Recursos consolidada de todo o período; Comprovante de recolhimento à respectiva direção partidária das sobras financeiras de campanha relativas a Outros Recursos; Documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC); Comprovantes bancários de devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada ou guia de recolhimento ao Tesouro Nacional de recursos de origem não identificada, conforme o caso e Comprovante de recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos do FEFC não utilizados.

A parte recorrente alega ter realizado a juntada tempestiva do extrato de prestação de contas, bem como dos extratos bancários. Indica páginas.

Com efeito, constato a entrega do extrato de prestação de contas e verifico a presença dos extratos bancários das contas de n. 06.116090.0-4, para movimentação dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, e n. 06.115750.0-2, para trânsito das verbas privadas, os quais indicam as operações de todo o período da campanha.

Entendo, nessa linha, que o recorrente cumpriu as obrigações a ele atribuídas na condição de candidato pela legislação de regência, ao menos no presente ponto.

O segundo apontamento recai sobre despesa declarada pelo prestador no valor de R$ 2.380,00, paga com recursos do FEFC ao fornecedor J R Nunes, por atividade de intermediação com militância e mobilização de rua.

Contudo, muito embora haja nos autos cópia do cheque nominal a J R Nunes, contrato de prestação de serviços e três recibos de repasse de valores pela empresa aos subcontratados, não restou comprovado o pagamento ao fornecedor.

Explico.

A matéria atinente aos gastos eleitorais é regulamentada pelo art. 38 da Resolução n. 23.607/19, o qual determina:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

Sublinho que o cheque foi preenchido de modo nominal, porém não cruzado, desatendendo à determinação acima transcrita. Em consequência, foi descontado na “boca do caixa”, com registro no extrato bancário “cheque terceiros por caixa” e ausência de contraparte.

Ressalto que a satisfatória comprovação dos pagamentos decorre da observância às formas prescritas para saldar as despesas eleitorais, ou seja, por meio de transferência entre contas com completa identificação das partes mediante cheque nominal cruzado, como bem esclarece o douto Procurador Regional Eleitoral:

Com efeito, os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto. Tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento dos valores, apontando-se, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.

Por outro lado, se os valores não transitam pelo sistema financeiro nacional, é muito fácil que sejam, na realidade, destinados a pessoas que não compuseram a relação indicada como origem do gasto de campanha. É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes distintas, que permite, nos termos da Resolução, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se tratam de recursos públicos, como são as verbas recebidas via FP ou FEFC.

Enfatizo que, acertadamente, a sentença determinou o recolhimento do valor de R$ 2.380,00, pois a receita utilizada para os pagamentos teve origem em verba pública, e não há, nos autos, a suficiente clareza acerca do destinatário dos valores.

Entendo que a segunda irregularidade persiste, portanto.

O parecer conclusivo anota ainda uma terceira irregularidade, esta relativa ao percebimento de recursos oriundos de fonte vedada:

10.12 DO RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA (ART. 31 DA RESOLUÇÃO 23.607/2019)

Em consulta ao sistema SPCE da Justiça Eleitoral foi verificada o ingresso de recursos financeiros no total de R$ 480,00 (quatrocentos e oitenta reais) oriundos de pessoa jurídica, em desacordo com o art. 31 da Resolução TSE n. 23.607/2019.

A Resolução TSE n. 23.607/2019 em seu art. 15, inciso I admite que o candidato pessoa física faça doação à sua campanha mediante depósito identificado com seu CPF, situação que não ocorreu no caso em exame.

O recorrente argumenta não ter condições de defesa relativamente à irregularidade, pois não há a indicação do número de CNPJ que teria realizado a doação.

Há boa dose de razão no alegado, por um motivo: igualmente não há, nos registros da prestação de contas, o recebimento do valor referido. Não se encontra, nos autos, vestígio ou indício de contribuição por parte de pessoa jurídica à campanha do prestador, razão pela qual a conclusão que se impõe é que a falha, bem como a ordem de recolhimento do valor de R$ 480,00, devem ser afastadas, pois não pertencentes à prestação de contas sob análise.

Em resumo, persiste apenas a segunda falha analisada.

Por fim, destaco que a irregularidade remanescente representa 42,40% das receitas declaradas, R$ 5.612,60, e seu valor nominal, R$ 2.380,00, é superior ao parâmetro de R$ 1.064,10 estabelecido no art. 43, caput, e referido no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19,  utilizado pela jurisprudência como autorizador de um juízo de aprovação com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para manter a desaprovação das contas e reduzir o recolhimento à quantia de R$ 2.380,00.