REl - 0601052-37.2020.6.21.0050 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/10/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos de origem não identificada no total de R$ 4.000,00.

No caso dos autos, o extrato bancário da conta de campanha apresenta quatro depósitos em dinheiro, nos valores de R$ 1.000,00 cada, realizados em 09.11.2020, cujo depositante foi identificado como LUIS FERNANDO SEIXAS MENEZES, CPF n. 355.918.620-04, em contrariedade ao art. 21, inc. I, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que estabelece o limite de R$ 1.064,09 para depósitos bancários em espécie de mesma data:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

§ 6º É vedado o uso de moedas virtuais para o recebimento de doações financeiras.

Foram juntados aos autos os extratos da conta bancária pessoa física do doador Luis Fernando Seixas Menezes, relativos ao mês de novembro de 2020, indicado como autor dos 04 depósitos de R$ 1.000,00 em espécie (ID 28637383). Nos extratos, realmente aparece a tentativa de efetuar duas Transferências Eletrônicas Disponíveis – TED, no valor de R$ 4.000,00 cada, nos dias 04 e 05.11.2020, para a conta do candidato, as quais foram estornadas.

Assim, o valor que o doador pretendia repassar para a campanha do recorrente, via TED, por algum motivo desconhecido, não ingressou na conta bancária do candidato.

Em 9.11.2020, dias após o insucesso das TEDs, o candidato recebeu em sua conta de campanha os quatro depósitos em dinheiro no valor de R$ 1.000,00 cada, totalizando R$ 4.000,00, com identificação do CPF de Luis Fernando Seixas Menezes no extrato de sua conta-corrente.

Entretanto, não há, no mês de novembro de 2020, registro de saque do valor depositado em dinheiro, ou seja, R$ 4.000,00, nos extratos bancários de Luis Fernando Seixas Menezes, que seria o suposto doador dessa quantia.

Desse modo, como bem apontou a Procuradoria Regional Eleitoral, não é possível verificar, nos extratos da conta-corrente de Luis Fernando Seixas Menezes, a origem do valor que ingressou, em dinheiro, na conta de campanha do recorrente, litteris:

O extrato da conta bancária do doador comprova que, efetivamente, entre os dias 04 e 05.11.2021, houve duas tentativas de realização de transferência eletrônica no valor de R$ 4.000,00, ambas estornadas (ID 28637383). Contudo, não consta no extrato apresentado registro de saque nesse valor no dia dos depósitos em dinheiro na conta de campanha, em 09.11.2021, o que constitui óbice à comprovação da origem dos recursos, não se podendo afirmar que os valores doados em espécie efetivamente pertenciam a esse doador. Em verdade, o extrato do suposto doador juntado, faz prova em sentido contrário, exatamente por não haver saque em valor correspondente aos depósitos realizados.
(grifos no original)

Na hipótese, nem mesmo os comprovantes de depósitos juntados aos autos, os quais estão praticamente ilegíveis e teriam a identificação com o CPF do doador (ID 28636583, 28636533, 28636383 e 28636333), são suficientes para afastar a irregularidade, devido ao comprometimento da confiabilidade da transparência da movimentação financeira.

Portanto, está correta a conclusão do juízo a quo no sentido de que os depósitos não estão com a origem devidamente identificada, em face da inobservância do art. 21, inc. I, §§ 1º 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme reiteradamente têm decidido esta Corte e o TSE:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. SENADOR E SUPLENTE. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. DOAÇÃO FINANCEIRA EFETUADA ATRAVÉS DE DEPÓSITO BANCÁRIO ACIMA DO LIMITE REGULAMENTAR. OMISSÃO DE DESPESA. IRREGULARIDADES RELATIVAS AO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Doações financeiras, mediante depósitos sucessivos em dinheiro, realizadas pelos mesmos doadores, nas mesmas datas, cuja soma ultrapassa o limite legal para depósitos em espécie previsto no arts. 22, §§ 1º e 2º, e 34, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17. As contribuições financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 só poderão ser efetivadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário, com a obrigatória identificação do primeiro. Eventuais doações sucessivas, realizadas por um mesmo doador, em uma mesma data, devem ser somadas para fins de aferição do limite regulamentar. Posicionamento firme do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o depósito, mesmo no caso de ser identificado, é meio incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória do ato. A ausência de comprovação segura do doador caracteriza o recurso como de origem não identificada, cujo valor correspondente deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos dos arts. 22, § 3º, e 34, caput, da Resolução TSE n. 23.553/17. (Prestação de Contas 0602017-39.2018.6.21.0000 - Porto Alegre – TRE/RS. Relator: Roberto Carvalho Fraga). (Grifei.)

Tal exigência normativa visa assegurar a rastreabilidade dos recursos (origem e destino) recebidos pelos candidatos, o que resta comprometido quando a operação é feita por meio diverso, como ocorreu neste caso.

Ainda que o prestador alegue equívoco no procedimento, em face do desconhecimento da legislação por parte do doador, essa tese não se mostra razoável. Veja-se que as doações foram depositadas em valores autorizados pelo § 1o do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, ou seja, inferiores a R$ 1.064,10, demonstrando conhecimento de parte das disposições que regulamentam o repasse de valores para campanhas eleitorais. O erro de procedimento, que caracterizou a receita como de origem não identificada, é relativo à previsão do § 2º da norma, o qual estabelece que a limitação de valor se aplica também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

Ademais, descabe imputar a irregularidade ao doador de campanha, pois a responsabilidade pela movimentação financeira é do candidato, na forma do § 2º do art. 45 da Resolução TSE n. 23.607/19. Desse modo, deveria o candidato, ao receber os depósitos em desacordo com a legislação, ter observado a regra do § 5º do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19, que determina a devolução da quantia ao doador, ou ter recolhido os valores ao erários, pois a utilização em campanha não lhe era permitida.

Ressalto que, na sessão de 13.12.2019, quando do julgamento da prestação de contas da campanha de 2018 da candidata ao cargo de senadora Carmen Flores, processo PC n. 0602017-39.2018.6.21.0000, da relatoria do Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, o TRE-RS filiou-se ao entendimento consolidado no âmbito do TSE de que o depósito em dinheiro acima do limite legal caracteriza-se como recurso de origem não identificada mesmo quando indicado o CPF.

O raciocínio é que o descumprimento da exigência de transferência bancária ou de cheque nominal cruzado não fica suprido pela realização de depósito em espécie identificado por determinada pessoa, circunstância que não se mostra apta para comprovar a efetiva origem do valor, devido à ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário.

Essa diretriz foi firmada pelo Tribunal Superior Eleitoral, segundo o qual o depósito em dinheiro igual ou acima de R$ 1.064,10, mesmo no caso de ser identificado com um CPF, é meio incapaz de comprovar a efetiva origem da receita, devido à natureza essencialmente declaratória do ato:

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.
1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.
2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.
3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.
4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.
5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.
6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.
7. Agravo regimental desprovido.
(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator Min. Jorge Mussi, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69)

Ademais não está sob julgamento a boa-fé do prestador, a potencialidade de desequilíbrio do pleito ou a eventual prática de abuso de poder econômico, mas tão somente o descumprimento de norma que deve ser observada por todos os candidatos.

Desse modo, as razões recursais e a documentação acostada às contas são insuficientes para sanar a irregularidade em questão.

No caso concreto, tendo em conta que os depósitos em dinheiro realizados na conta bancária caracterizam recursos de origem não identificada, devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional com fundamento no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesses termos, o recurso não comporta provimento, dado que remanesce a irregularidade de R$ 4.000,00, quantia que representa 57,14% das receitas financeiras, no montante de R$ 7.000,00, não sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, pois a falha é grave e compromete de forma insanável a confiabilidade da movimentação financeira.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 4.000,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.