REl - 0600211-20.2020.6.21.0025 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/10/2021 às 14:00

 VOTO

Na espécie, as partes foram intimadas da sentença em 13.04.2021, terça-feira (ID 41542433 e 41542483), e os 10 dias para ciência, contados a partir de 14.04.2021, findaram em 23.04.2021, sexta-feira, sendo que o recurso foi interposto em 27.04.2021, terça-feira, fora do referido prazo recursal.

No entanto, como bem salientado pela Procuradoria Eleitoral, consultando o processo no primeiro grau, verifica-se que a ciência foi dada no dia 23.04.2021, sendo que foi concedido pela Justiça Eleitoral o prazo maior de 3 (três) dias, razão pela qual deve ser tido por tempestivo o recurso.

No mérito, cuida-se de representação por veiculação de enquete eleitoral irregular acerca das intenções de voto para o cargo de prefeito em Jaguarão, denominada “Jaguarão 24 horas”, divulgada no perfil pessoal do recorrido no Facebook, durante o período eleitoral.

A pretensão recursal é no sentido de aplicação da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, por divulgação de pesquisa eleitoral sem registro:

Art. 33

[…]

§ 3º A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.

 

A sentença (ID 41542383) não reconheceu a possibilidade33 de equiparação de enquete à pesquisa eleitoral, rejeitando o pedido:

O Ministério Público Eleitoral, zelando pela lisura do processo eleitoral, representou contra o responsável pelo Grupo de Facebook “Jaguarão 24 horas” para que fosse retirada do ar enquete com os candidatos do pleito municipal e aplicada a multa elencada no §3º do art. 33 da lei 9504/97.

Embora este juízo haja considerado salutar a retirada da enquete da página do referido grupo, algumas ponderações são necessárias, observada a jurisprudência acerca do tema.

Primeiramente, quando se fala em pesquisa eleitoral, citada no art. 33 da lei 9504/97, compreendo que se trata de trabalho realizado por empresa ou entidade, consistente em instrumento com rigor científico, amplamente divulgado e capaz de influenciar a opinião de eleitores ao ponto de impactar o pleito eleitoral.

Sendo assim, observo que, no caso em tela, tratava-se de mera enquete, realizada sem o rigor científico ou metodologia e cujo acesso ou divulgação foi restrita aos membros do grupo “Jaguarão 24 horas”.

Dessa forma, não se trata de pesquisa eleitoral, contratada por candidato a instituto de pesquisa, com potencial de influenciar o pleito em questão por não ter o alcance ou requisitos científicos mínimos necessários ao instrumento referido no art. 33 da lei 9504/97.

Cito a jurisprudência sobre o tema, na forma da ementa do julgado TRE-RS – RE n.º 14965, que ilustra bem o tema tratado aqui:

Veiculação, no Facebook, de matéria relativa a intenções de voto, desprovida de qualquer dado técnico, a exemplo do número de entrevistados, período de realização, margem de erro, comparativos, índices, entre outros. Postagem desacompanhada de dados técnicos não equivale à pesquisa eleitoral propriamente dita. A norma proibitiva é dirigida aos protagonistas do pleito, aos institutos de pesquisas e grupos midiáticos que auferem ganhos diretos e indiretos com a produção, contratação e divulgação das pesquisas eleitorais. Situação diversa do caso concreto. Sentença reformada. Multa afastada.

Outrossim, cabe enumerar diversas decisões no mesmo sentido, nos julgados RE-RS – RE n.º 46775, TRE-SP – RE n.º 0600585-50, ou ainda, a TSE – REspe n.º 060769067 teor da ementa segue:

a divulgação de enquete no curso do período vedado não atrai a multa do art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97 – direcionada apenas às pesquisas eleitorais irregulares – por inexistir sancionamento legal específico. Precedentes.

O objetivo do art. 33 da Lei 9504/97 artigo é coibir o abuso econômico, protagonizado por partidos ou candidatos com intuito de se valer de um instrumento que goza de credibilidade científica para influenciar o pleito - a pesquisa - sem o devido registro na Justiça Eleitoral.

DIANTE DO EXPOSTO, tenho por adequado, tendo em vista que a enquete foi retirada do ar em obediência ao comando recebido e a jurisprudência citada, bem como os argumentos acima expostos, EXTINGUIR o presente feito sem o julgamento do mérito, por não haver equiparação de mera enquete de pequeno alcance e sem base científica com a autêntica pesquisa eleitoral propriamente dita.

 

Por certo que as pesquisas eleitorais possuem forte poder de influência sobre os eleitores, funcionando como termômetro das intenções de voto da população, especialmente pelo grau de idoneidade do complexo trabalho realizado pelas entidades de pesquisa de opinião pública.

Por conta dessa complexidade e potencial de influência, a legislação eleitoral impõe às empresas de pesquisa o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar um controle público e judicial das pesquisas, como se pode extrair do art. 33, caput, da Lei n. 9.504/97:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

 I - quem contratou a pesquisa;

 II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

 III - metodologia e período de realização da pesquisa;

 IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

 V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

 VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

 VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

 

Igualmente, por conta da natureza técnica das pesquisas e de seu potencial de influência sobre o eleitor, o § 3º do referido art. estabeleceu uma elevada penalidade pecuniária para o caso de divulgação de pesquisa sem prévio registro.

O fato é que a previsão supracitada sujeita os responsáveis (pela conduta de divulgação de pesquisa eleitoral irregular) à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais). A envergadura da multa impõe que a leitura do dispositivo ocorra em caráter restritivo, e não extensivo.

Ocorre que a hipótese dos autos se distancia das situações fáticas que a referida sanção busca coibir. A postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral, limitando-se a, de formar singela, divulgar uma mera sondagem de intenções de votos, desprovida de rigor científico e demais elementos caracterizadores de um levantamento técnico de pesquisa eleitoral.

Ausentes esses elementos, a exemplo do que concluiu o magistrado, tenho que a postagem se revestiu de mera manifestação eleitoral, sem caracterizar o tipo previsto pela legislação eleitoral de divulgação de pesquisa eleitoral sem registro.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no mesmo sentido:

 

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2016. PESQUISA ELEITORAL NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos que visava impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para que seja caracterizada pesquisa eleitoral, é necessária a indicação, dentro do rigor técnico-científico que a define, de percentuais, margem de erro, índices ou intenções de votos e alusão ao instituto responsável pelo levantamento. Precedentes.

3. O acórdão regional concluiu que a divulgação de gráfico de linha, composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, mostrando a evolução do desempenho da campanha dos diversos candidatos, desacompanhado da indicação de percentuais ou números, não caracteriza a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, mas, sim, propaganda eleitoral. A modificação dessas conclusões exigiria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

4. Tendo em vista que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal Superior, não se conhece do recurso por dissídio jurisprudencial (Súmula nº 30/TSE).

Agravo interno a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(Relator Min. Luis Roberto Barroso, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 288-13. 2016.6.26.0144 CLASSE 6 UBATUBA SÃO PAULO, DJE 25.02.2019.) (Grifo nosso)

 

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO DE DADOS DO GOOGLE TRENDS NA REDE SOCIAL FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A PESQUISA ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 33, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A norma contida no art. 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 desafia interpretação restritiva por encerrar hipótese de sanção, não sendo possível o seu alargamento para abranger situações que não foram expressamente previstas no dispositivo.

2. O recurso especial eleitoral interposto com o fim de reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos não admite cabimento em razão da vedação contida na Súmula nº 24 do TSE. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(TSE - AI: 06030074720186060000 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 07.05.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 111, Data 05.06.2020.) (Grifo nosso)

 

Nesse sentido, também a manifestação do douto Procurador Eleitoral, ilustrada por julgados desta Corte Eleitoral:
 

RECURSOS. REPRESENTAÇÃO. PESQUISA ELEITORAL SEMPRÉVIO REGISTRO. REDES SOCIAIS. SIMPLES REFERÊNCIA A PERCENTUAIS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS PARA CARACTERIZAR A POSTAGEM COMO PESQUISA. ART. 33 DALEI N. 9.504/97. DIVULGAÇÃO DE SONDAGEM OU ENQUETE. INAPLICABILIDADE DE MULTA. PROVIMENTO. EXTENSÃO DOS EFEITOS DOS EFEITOS. ART. 1.005 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AFASTADA A MULTA FIXADA. PROVIMENTO.

[…]

5. Não havendo elementos mínimos para caracterizar a publicação como verdadeira pesquisa eleitoral, incabível a imposição da multaprevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97. Remanesce, na configuração da conduta, a divulgação de enquete ou sondagem disposta no art. 23, § 1º, da Resolução TSE n. 23.600/19. Embora vedada a ação dos representados (art. 33, § 5º, da Lei n.9.504/97), incabível a aplicação de multa por difusão de sondagem ou enquete, em razão da ausência de previsão legal, mostrando-se suficiente a ordem de imediata remoção das postagens pelo magistrado, com base em seu poder de polícia eleitoral, tal como determinado pelo juízo e cumpridopelas empresas das redes sociais.

6. Provimento.

(Recurso Eleitoral n 060029477, ACÓRDÃO de 29.06.2021, Relator FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Publicação: PJE -Processo Judicial Eletrônico-PJE.)


 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROCEDENTE. DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL SEM REGISTRO. FACEBOOK. PAGAMENTO DE MULTA. INEXISTÊNCIA DE MÍNIMA POTENCIALIDADE LESIVA DAS POSTAGENS. NÃO CARACTERIZADA A PESQUISA ELEITORAL. ENQUETE. REFORMA DA SENTENÇA. AFASTADA A CONDENAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que, confirmando liminar, julgou procedente representação para condenar os recorrentes ao pagamento de multa por divulgação de pesquisa eleitoral sem registro.

2. Controvérsia restrita à caracterização ou não das postagensimpugnadas como sendo divulgação de pesquisa sem registro. A pesquisa eleitoral stricto sensu – aquela devidamente registrada na Justiça Eleitoral – difere da enquete ou sondagem. Esta consiste em mero levantamento de opiniões, sem controle de amostra, que não utiliza método científico para sua realização, dependendo apenas da participação espontânea do entrevistado.

3. Na hipótese, as postagens não se revelam como pesquisaeleitoral propriamente dita, sendo incapazes de induzir ou manipular o eleitorado. Publicações compartilhadas de página da internet sem especificar número de pessoas, bairros, margem de erro e demais características de uma pesquisa eleitoral. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de compreender que “simples enquete ou sondagem, sem referênciaa caráter científico ou metodológico, não se equipara ao instrumento de pesquisa preconizado em referido dispositivo” (REspe n. 754-92, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 20.4.2018).

4. Irrazoável eventual punição com a pesada multa prevista para a divulgação de pesquisa sem registro quando é possível concluir pela inexistência de mínima potencialidade lesiva nas postagens realizadas. Diante da ausência de informações claras e específicas sobre dados de efetivapesquisa eleitoral, como índices categóricos de desempenho entre candidatos, ou de outros argumentos de ordem técnica próprios de levantamentos estatísticos, o material não atrai a penalidade prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 9.504/97.5. Parcial provimento. Não reconhecida a irregularidade como divulgação de pesquisa eleitoral e afastada a condenação ao pagamento de multa.

(Recurso Eleitoral n 060029318, ACÓRDÃO de 15.04.2021, Relator: DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.)
 

 

Dessarte, não havendo elementos mínimos para a caracterização da divulgação como verdadeira pesquisa eleitoral, e inexistindo previsão legal de sancionamento pecuniário de sondagem ou enquete, incabível a pretensão recursal de imposição, por analogia, da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a sentença prolatada.