REl - 0600145-92.2020.6.21.0137 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/10/2021 às 10:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Juntada de documentos em grau recursal

Ainda em sede preliminar, cumpre registrar a viabilidade do documento apresentado com o recurso.

Sobre o tema, este Tribunal Regional, sempre em juízo de exceção, tem se pautado pela potencialização do direito de defesa no âmbito dos processos de prestação de contas, especialmente quando se trata de documento simples que dispense a necessidade de nova análise técnica ou de diligências complementares, não apresentando prejuízo à tramitação processual.

O posicionamento encontra previsão no art. 266 do Código Eleitoral e está amparado pela reiterada jurisprudência desse Tribunal Regional, conforme ilustra a ementa da seguinte decisão:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINARES. EFEITO SUSPENSIVO. NÃO CONHECIDO. DOCUMENTOS NOVOS EM GRAU RECURSAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO. DOAÇÃO. OMISSÃO DE RECEITAS E GASTOS ELEITORAIS. COMPROVAÇÃO. PROVIMENTO. APROVAÇÃO DAS CONTAS.

1. Preliminares. 1.1. Enquanto houver recurso pendente de análise jurisdicional, a sentença não gera qualquer restrição à esfera jurídica da parte, de modo que, conferido de forma automática e ex lege, não se vislumbra interesse no pleito de atribuição judicial de efeito suspensivo ao recurso. Não conhecimento. 1.2. Admitida a apresentação extemporânea de documentação, em grau recursal, nos termos do art. 266 do Código Eleitoral. Cabimento de novos documentos, não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura puder sanar irregularidades e não houver necessidade de nova análise técnica. (grifei)

2. Mérito. No caso dos autos, as falhas foram corrigidas pela documentação acostada, com a comprovação das doações, de forma a coincidir com a arrecadação dos valores oriundos das Direções Municipal e Estadual da agremiação, bem como pela compatibilidade das declarações de doador e candidata. Irregularidades sanadas. Confiabilidade e transparência das contas de campanha da candidata que não restaram comprometidas. Aprovação.

Provimento.

(Recurso Eleitoral n 37503, ACÓRDÃO de 07.03.2018, Relator DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 39, Data 09.03.2018, Página 2.)

Prossigo, passando ao exame do mérito.

 

Mérito

O juízo de origem desaprovou as contas do recorrente (ID 24301783), com fundamento no art. 14 da Resolução TSE n. 23.607/19, em virtude de arrecadação e gastos de campanha sem trânsito pela conta bancária.

In casu, inicialmente, o recorrente traz fundamento de defesa quanto à irregularidade consistente na ausência de comprovação da origem de 5 doações, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), cada.

No ponto, a sentença consignou que:

(…)

Resta configurado o recebimento recursos de origem não identificada as 5 doações de R$ 1.000,00 cada, por não terem sido efetuada transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

 

Contudo, tendo em vista o extrato bancário juntado (ID 76169164) que da conta que houve um erro de procedimento, e comprova a origem do recurso, deixo de determinar o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional por meio de GRU.

(…)

Assim, verifica-se que a decisão a quo afastou a irregularidade em questão, diante da comprovação da origem das doações que totalizam R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Não tendo havido recurso do Parquet quanto ao ponto, não resta interesse na discussão da tese trazida no recurso do candidato, uma vez que seu exame não lhe traria qualquer resultado prático.

Por outro lado, subsiste a falha envolvendo a arrecadação e o gasto de recursos sem o devido trânsito pela conta bancária de campanha.

De acordo com o parecer conclusivo (ID 24301283), foi identificada a doação de R$ 100,00 (cem reais), declarada como recursos próprios no SPCE, e o pagamento para o fornecedor “Empresa Jornalística Comunidade São Marcos Ltda.” no mesmo valor.

Contudo, embora tenham sido declaradas no SPCE, tanto a receita como a despesa não foram registradas no extrato bancário, situação que aponta para o trânsito de recursos financeiros de campanha por meio distinto da conta bancária.

Tal fato restou incontroverso. Apenas o recorrente alegou que a origem da doação foi comprovada, assim como sua destinação. Defende também que a irregularidade é de pequena monta, situação que não justifica a reprovação das contas.

Sobre o tema, dispõe o art. 14 da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

Conforme documentação acostada aos autos, embora haja declaração do candidato de que o valor de R$ 100,00 (cem reais) possui origem em recursos doados pelo próprio candidato, e que tal valor foi utilizado para o pagamento da despesa com a “Empresa Jornalística Comunidade São Marcos Ltda.”, tal fato não foi demonstrado por meio de provas isentas de caráter unilateral.

Assim, não comprovada a origem dos recursos, estes devem ser considerados como de origem não identificada, devendo a quantia ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Entretanto, tendo em vista que o juízo sentenciante não determinou o recolhimento da quantia aos cofres do Tesouro Nacional, e, tendo sido interposto recurso apenas pelo candidato, não cabe, nesta instância, de ofício, a imposição do dever de recolhimento, sob pena de violação do princípio da non reformatio in pejus.

Outrossim, ressalta-se que as irregularidades, somadas (R$ 200,00), representam apenas 3,19% das receitas declaradas (R$ 6.265,50), possibilitando, assim, a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para a aprovação das contas com ressalvas, seja pelo percentual ínfimo (abaixo de 10%), seja pelo valor módico (até R$ 1.064,10), conforme entendimento jurisprudencial desta Corte e do TSE.

Nesse sentido, colho o seguinte aresto deste Tribunal:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. DESPESAS COM COMBUSTÍVEL SEM REGISTRO DE CESSÃO DE VEÍCULO. PAGAMENTO DE DESPESAS SEM TRÂNSITO NA CONTA BANCÁRIA. BAIXO VALOR. PARCIAL PROVIMENTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Despesas com combustível sem a correspondente escrituração de automóveis. Falha superada com a apresentação de documentos comprovando a doação estimável em dinheiro

2. Todos os valores utilizados na campanha devem ter trânsito obrigatório na conta bancária dos candidatos. No caso, quitação de despesas com recursos em espécie que não transitaram pela conta bancária de campanha e sem esclarecimento da origem dos valores utilizados. Falha insignificante, representando 3% da totalidade das receitas recebidas pelo candidato.

Provimento parcial.

(Grifei.)

(RE 44360 SÃO MIGUEL DAS MISSÕES – RS; Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES; Julgamento: 19 de Dezembro de 2017; Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 12, Data 26/01/2018, Página 18).

Dessa forma, a sentença a quo deve ser reformada para aprovar com ressalvas as contas do candidato.

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de Fabrício Fontana Michelon, relativas ao pleito de 2020.