REl - 0600558-68.2020.6.21.0020 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/10/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Preliminarmente, conheço da documentação apresentada com o recurso, seguindo a orientação firmada nesta Corte:

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO 2016. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CONFIGURADO CERCEAMENTO DE DEFESA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DOCUMENTOS JUNTADOS COM O RECURSO. ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. IRREGULARIDADE SANADA. PROVIMENTO.

1. Preliminar. Afastada a nulidade da sentença. Ausente qualquer prejuízo ao recorrente, pressuposto essencial para a declaração de nulidade.

2. Constatado, pelo órgão técnico, o recebimento de recursos de origem não identificada. Documentos juntados pelo prestador em sede recursal, com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral. Irregularidade sanada. 3. Provimento do recurso para aprovação das contas.

(TRE-RS - RE: 2593 SÃO SEBASTIÃO DO CAÍ - RS, Relator: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 03.12.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 231, Data 11.12.2019, Página 2-4.) (Grifo nosso)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. CONHECIMENTO DE NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS AO RECURSO. ART. 266, CAPUT, DO CÓDIGO ELEITORAL. MÉRITO. RECEBIMENTO DE VALORES PROVENIENTES DO DIRETÓRIO NACIONAL DA AGREMIAÇÃO SEM A IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. DOCUMENTOS APRESENTADOS SUPRIRAM A FALHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar acolhida. Juntada de novos documentos com o recurso. Este Tribunal, com base no art. 266, caput, do Código Eleitoral, tem se posicionado pelo recebimento de documentos novos com as razões de recurso, até mesmo quando não submetidos a exame de primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura mostra capacidade de influir positivamente no exame das contas, ou seja, o saneamento da falha deve resultar de plano da documentação, sem necessidade de qualquer persecução complementar.

2. Recebimento de valores provenientes do diretório nacional da agremiação, sem a identificação dos doadores originários, em afronta ao art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15. Os esclarecimentos prestados, associados às informações constantes nos recibos das doações, permitem aferir, de forma clara, os doadores originários com seus respectivos CPFs, cumprindo a determinação normativa. Afastadas as sanções impostas. 3. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 1428 SANTIAGO - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 25.04.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 75, Data 29.04.2019, Página 7.) (Grifo nosso)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. CONHECIMENTO DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA INTEMPESTIVAMENTE. PREVISÃO DISPOSTA NO ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS PROVENIENTES DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.464/15. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. INCONSISTÊNCIA COM RELAÇÃO A GASTOS COM COMBUSTÍVEIS. SANADA PARTE DAS IRREGULARIDADES. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. MANTIDA A MULTA FIXADA NA SENTENÇA. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DOS VALORES FIXADA EXCLUSIVAMENTE À ESFERA PARTIDÁRIA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Conhecimento da documentação apresentada com o recurso, a teor do disposto no art. 266 do Código Eleitoral.

2. Recebimento de recursos oriundos de origem não identificada. Ainda que o número de inscrição no CPF corresponda ao do doador informado nas razões recursais, não foram apresentadas outras informações para subsidiar a fiscalização da licitude da receita, não sendo possível, sem a adoção dos procedimentos técnicos de exame destinados à verificação das fontes vedadas, atestar a regularidade do recurso arrecadado.

[…]

6. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 4589 ALVORADA - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 21.03.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 52, Data 22.03.2019, Página 4.) (Grifo nosso)

Ademais, o exame da documentação independe de novo parecer técnico.

 

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pela magistrada a quo, devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, não restando comprovada a despesa eleitoral no valor de R$ 450,00.

A sentença (ID 28590333), ao encontro do que constou do parecer conclusivo (ID 28590033), referiu o seguinte:

[...]

A candidata descumpriu os mencionados dispositivos legais, pois contratou três pessoas físicas para prestação de serviços na campanha, e não comprovou, no caso de uma delas, apontada a divergência entre o fornecedor declarado e a pessoa beneficiária do pagamento, a destinação dada aos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Instada a se manifestar, a candidata limitou-se a afirmar que desconhece o motivo de um dos pagamentos, no valor de R$ 450,00, destinado a DALTRO LUIZ PICOLI, ter se dirigido a uma pessoa jurídica denominada MERCADO LODI & LODI LTDA. Estava ao seu alcance, por exemplo, juntar novos documentos aos autos, como a Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações da Previdência Social, ou mesmo procurar o fornecedor hipoteticamente contratado para averiguar o motivo da diferença, mas a candidata optou, como dito, a afirmar que não sabe o que aconteceu.

Independentemente dos documentos juntados aos autos, insuficientes para a comprovação da despesa, e das afirmações feitas pela candidata, o fato é que uma pessoa jurídica, teoricamente não contratada para prestação de serviços na campanha, acabou por receber o pagamento feito com recursos do FEFC. A confiabilidade, higidez e transparência da prestação de contas foram comprometidas, falha grave que provoca a sua desaprovação.

Consequentemente, diante da ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, nos termos do artigo 79, § 1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, impõe-se a sua devolução ao Tesouro Nacional.

Assim, nos termos do art. 74, inciso III, da Resolução TSE nº 23.607/2019, cabível a desaprovação das contas.

 

A recorrente sustenta que houve equívoco da unidade técnica, pois, de fato, contratou três pessoas físicas para auxiliarem durante a campanha, prestando serviços de panfletagem, uma delas de nome Daltro Luiz de Picoli, a quem foi entregue o cheque nominal cruzado n. 67740173, gerando a emissão de recibo, com a devida identificação do prestador. Sobre o cheque ter sido sacado pela empresa Mercado Lodi e Lodi Ltda., alegou que tal estabelecimento comercial seria o único correspondente bancário do Banrisul em Itatiba do Sul, o qual reconheceu que, em vez de promover o depósito do cheque na conta do Senhor Daltro, permitiu, por erro, que o mesmo efetuasse o saque diretamente.

Com razão a recorrente.

Inicialmente, verifico que o cheque foi depositado na conta-corrente da candidata, não tendo havido o saque na “boca do caixa”, procedimento que impede a fiscalização da Justiça Eleitoral acerca da destinação do recurso. Dessa forma, é possível o rastreamento da despesa por meio da consulta ao extrato bancário da recorrente.

A controvérsia, entretanto, repousa no fato de que a contraparte que figura no https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/87157/210000724944/extratos é diversa do fornecedor de serviço. Constou na prestação de contas que os recursos públicos recebidos pela candidata foram endereçados a “DALTRO LUIZ DE PICOLI” por serviços de panfletagem, no valor de R$ 450,00. Entretanto, os extratos eletrônicos da conta bancária do Fundo Especial de Financiamento de Campanha demonstram que o numerário foi sacado por “MERCADO LODI E LODI LTDA”, pessoa jurídica, com finalidade diversa da distribuição de material gráfico.

Entretanto, o conjunto de documentos acostados com o recurso é suficiente a comprovar a despesa eleitoral: a) recibo no valor de R$ 450,00 e cheque nominal e cruzado a Daltro Luiz de Picoli (ID 28590633); b) comprovação de que a contraparte que figura no extrato bancário (Mercado Lodi & Lodi Ltda.) é correspondente bancário do Banrisul em Itatiba do Sul (ID 28590683, ID 28590733 e ID 28590783); c) declaração do prestador Daltro Luiz de Picoli que recebeu a importância de R$ 450,00 do correspondente bancário do Banrisul (ID 28590833); d) declaração do Mercado Lodi & Lodi Ltda. no sentido de que entregou R$ 450,00 em espécie a Daltro Luiz de Picoli (ID 28590883).

Dessarte, ainda que não haja coincidência entre o fornecedor e a contraparte no extrato bancário, o exame da documentação apresentada com o recurso permite demonstrar a destinação do recurso público, devendo ser provido o apelo para afastar a determinação de recolhimento da importância de R$ 450,00 ao Tesouro Nacional.

Conforme se verifica, a irregularidade representa 27,48% das receitas declaradas (R$ 1.637,50).

Contudo, tenho que, apesar de o percentual ser significativo frente ao somatório arrecadado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Nessas hipóteses, cabível a incidência dos postulados da razoabilidade e proporcionalidade, na esteira do que constou na decisão monocrática proferida pelo Ministro Luiz Edson Fachin, nos autos do RESPE n. 37447, em 13.06.2019:

Entendo que o limite percentual de 10% (dez por cento) adotado por este Tribunal Superior revela-se adequado e suficiente para limitar as hipóteses de incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

É de se harmonizar, contudo, a possibilidade de sobreposição dos critérios do valor diminuto e da aplicação dos princípios já citados. Em casos tais, deve prevalecer, até o limite aqui indicado, o critério de valor absoluto, aplicando-se o critério principiológico de forma subsidiária.

Assim, se o valor da irregularidade está dentro do máximo valor entendido como diminuto, é desnecessário aferir se é inferior a 10% (dez por cento) do total da arrecadação ou despesa, devendo se aplicar o critério do valor diminuto.

Apenas se superado o valor máximo absoluto considerado irrisório, aplicar-se-á o critério da proporcionalidade e da razoabilidade, devendo ser considerado o valor total da irregularidade analisada, ou seja, não deve ser desconsiderada a quantia de 1.000 UFIRs alcançada pelo critério do valor diminuto.

 

Nessa linha, a jurisprudência tem afastado o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha frente ao conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10.

A ilustrar, destaco o seguinte julgado, no qual o somatório das irregularidades alcançou a pequena cifra de R$ 694,90:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020.) (Grifo nosso)

 

Transcrevo, ainda, ementa de decisão do Plenário do TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data 29.09.2017.) (Grifo nosso)

Destarte, tendo em vista que a irregularidade perfaz quantia inexpressiva, tenho ser possível a aprovação das contas com ressalvas em homenagem aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade. Anoto que o apontamento das ressalvas deve persistir diante do descumprimento da forma.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de ANTONIA MODZEL DE MEDEIROS, afastando a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da importância de R$ 450,00.