REl - 0600605-57.2020.6.21.0015 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/10/2021 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

VALOIR CHAPUIS e LEONIR WENTZ recorrem da sentença que desaprovou suas contas de campanha aos cargos de prefeito e vice-prefeito em razão de (1) recebimento de recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, na conta Doações de Campanha, (2) despesas com combustíveis sem a correspondente cessão/locação de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, e (3) omissão de pagamento de despesa. A decisão hostilizada determinou o recolhimento de R$ 10.190,00 ao Tesouro Nacional.

Quanto à primeira irregularidade, verificou-se que os candidatos não abriram conta específica para recebimento dos recursos do FEFC, movimentando-os diretamente na conta Doações de Campanha, a qual é própria para o trânsito das verbas privadas.

A previsão da obrigatoriedade de abertura de contas distintas, conforme as verbas a serem movimentadas, advém dos arts. 8º e 9º da Resolução TSE n. 26.607/19:

Art. 8º É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil e que atendam à obrigação prevista no art. 13 desta Resolução.

(...)

Art. 9º Na hipótese de repasse de recursos oriundos do Fundo de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), os partidos políticos e os candidatos devem abrir contas bancárias distintas e específicas para o registro da movimentação financeira desses recursos.

(...)

§ 2º É vedada a transferência de recursos entre contas cujas fontes possuam naturezas distintas.

Sustentam os recorrentes que enfrentaram enorme dificuldade para a abertura da conta bancária "Doações de Campanha" e que, por esta razão, informaram a única conta existente para a movimentação dos valores oriundos do FEFC, declarando o fato na prestação. Pretendem o afastamento da ordem para devolução dos valores, ao entender serem receitas legítimas, ainda que movimentadas em conta indevida.

Adianto que as explicações não são suficientes para afastar a irregularidade, e o pedido é de inviável acolhimento.

A determinação de abertura de conta bancária específica para o caso de movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC tem por escopo viabilizar o efetivo controle da destinação desses valores, impedindo que haja confusão entre recursos recebidos por agremiações e candidatos. Ademais, as irregularidades atinentes a verbas públicas recebem tratamento diverso daquelas oriundas de doações privadas, mais rigoroso, incluindo o recolhimento ao Tesouro Nacional destes valores quando utilizados em desconformidade com a legislação de regência.

Nesse norte, ainda que tenha havido dificuldades no processo da abertura da conta, diga-se, encontrada pela maioria dos candidatos em razão das regras excepcionais vigentes durante a pandemia de COVID-19, cabia ao recorrente buscar auxílio junto à instituição bancária – em caso extremo reportando o fato, inclusive, à própria Justiça Eleitoral –, de forma a garantir um atendimento consentâneo com a legislação que lhe permitisse formalizar conta específica para os recursos públicos.

Por certo, os demais candidatos daquela localidade lograram esforços e obtiveram a conta bancária sob exame, até mesmo porque não há notícia da ocorrência de circunstâncias semelhantes à narrada pelos recorrentes. 

Em consequência, impõe-se a aplicação do art. 32, § 1º, inc. VI, da citada resolução, o qual determina o recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos de origem não identificada, entre os quais, “os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução”.

Não merece reparos a sentença hostilizada, no ponto.

No concernente à despesa no valor de R$ 2.283,50, paga com verbas privadas de campanha, declarada na prestação e referida nas notas fiscais emitidas por Bonatto e Schmidt Ltda., para um suposto adimplemento de gasto com combustíveis, verifica-se que os recorrentes não lograram comprovar o uso de veículo em qualquer das previsões constantes do art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35 (…)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

Alega a parte recorrente que os veículos abastecidos eram de propriedade dos candidatos, não constituindo despesa de campanha, sem necessidade de ingresso na prestação, e que a falta do termo de cedência configura mera falha formal.

Acostaram, em petição anterior à sentença, termo de cessão de uso juntamente dos comprovantes de propriedade dos veículos Peugeot/2008, placa IXO9897, e Chevrolet/Cobalt, placa IWC8086, respectivamente em nome de Valoir Chapuis e Leonir Wentz.

Insuficiente.

Noto que a falha apontada na sentença não recaía sobre a ausência de comprovação de propriedade dos veículos abastecidos ou a não apresentação de termos de cessão, mas sim sobre o pagamento de combustível com recursos de campanha eleitoral, em desacordo com a previsão legal.

Ademais, ao pretender justificar o abastecimento - indicando que ocorrera em automóvel utilizado pelos candidatos para atos de autopromoção eleitoral, os recorrentes revelam afronta ao disposto no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

(...)

Ou seja, confessada a desobediência à vedação legal que impede o pagamento de combustível com receitas de campanha, quer públicas, quer privadas.

Portanto, permanece a irregularidade.

O último apontamento refere que a prestação omitiu despesa identificada por meio das notas fiscais eletrônicas emitidas contra o CNPJ da campanha dos recorrentes, no valor de R$ 190,00.

Desde logo, observo que a omissão de gastos na campanha eleitoral é considerada falha relevante, pois impede a apuração da origem dos recursos utilizados para a correspondente quitação, e a utilização de tais verbas tem, como consequência, o juízo de desaprovação das contas, como segue:

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).
(...)

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

Na mesma linha da argumentação apresentada quanto ao item anterior, os recorrentes alegam que se tratou de abastecimento de veículo próprio e que a aposição do número do CNPJ na nota fiscal teria ocorrido por erro do funcionário do posto de combustíveis.

Uma vez mais, a alegação não merece acolhida, pois ausente o uso do número do CPF do candidato para a realização da compra, o que não ocorreu. A operação fiscal foi registrada com o CNPJ da campanha, caracterizando-a como eleitoral, de forma que é irretocável a observação do magistrado da origem, no sentido de que  “a emissão da Nota Fiscal pelo fornecedor consignou o CNPJ de campanha dos candidatos, vinculando tal despesa e desnaturalizando-a: de gasto pessoal para gasto eleitoral”.

Sublinho estar ausente nos autos a mínima comprovação de que a colocação do CNPJ na nota fiscal teria ocorrido por equívoco de funcionário do posto de combustíveis fornecedor, tratando-se de mera alegação, e destaco que as informações para preenchimento dos documentos foram prestadas pelo comprador por ocasião do abastecimento. Ora, os candidatos tiveram por longo período a posse das notas fiscais e estavam inteirados dos elementos que compuseram a emissão.

Dessa forma, cabia aos recorrentes, ao constatar que houve erro no procedimento adotado por alguns de seus fornecedores, buscar junto a estes a adequação necessária, no caso, cancelamento de notas fiscais e emissão de corretos documentos.

Por fim, destaco que as falhas alcançam o total de R$ 12.473,50 e correspondem a 50,78% da arrecadação da campanha, dados que inviabilizam a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, invocados pelos recorrentes, e impõem a manutenção do juízo tanto do juízo de desaprovação das contas, quanto da ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional no valor de R$ 10.190,00.

Ante o exposto, VOTO para negar provimento ao recurso.