REl - 0600484-10.2020.6.21.0086 - Voto Relator(a) - Sessão: 14/10/2021 às 14:00

 VOTO

Trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de campanha, eleições 2020, dos candidatos não eleitos aos cargos de prefeito e vice-prefeito, no Município de Bom Progresso.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada devido à omissão de registro de despesas no valor total de R$ 722,88, relativas à emissão de 3 notas fiscais, quantia que representa 1,72% da movimentação financeira declarada, no montante de R$ 41.927,15, conforme consta do seguinte trecho da sentença recorrida:

Houve a emissão das notas 46221, 46956 e 47559, respectivamente, nos valores de R$ 206,22 R$ 305,90 e R$ 210,76, referente aquisição de combustível para o CNPJ de campanha, notas estas que não foram canceladas pelo Posto de Combustível, e, não foram relacionadas na prestação de contas, podendo indicar inclusive omissão de gastos eleitorais.

Nesta situação, verifico tratarem-se de despesas pessoais do candidato, as quais não são consideradas gastos eleitorais e não deveriam ter sido emitidas no CNPJ de campanha.

Em diligência o prestador refere desconhecimento quanto as notas emitidas no CNPJ de campanha e que efetuou o pagamento com recursos de sua conta bancária particular. Vejamos: (ID 83129420).

A partir do conhecimento deste fato, o Candidato entrou em contato com a empresa JULITA THIESEN EIRELI a fim de verificar a existência desses lançamentos, o qual informou que emitiu equivocadamente as notas fiscais ali descritas, visto os abastecimentos efetuados no veículo pessoal do candidato. Com isso, o proprietário da empresa emitiu uma Declaração (anexo), informando tal fato e eximindo qualquer participação de Cloves na emissão dessas notas fiscais.

Deste modo, tenho que as contas NÃO estão regulares e, tampouco, atendem a todas as exigências da legislação eleitoral.

Nos termos do art. 74, III, da Resolução TSE nº 23.607/2019, quando constatadas falhas que comprometam a regularidade das contas, cabe a desaprovação.

 

Nas razões recursais, sustentam que as despesas consideradas omitidas são gastos pessoais com combustível e que, somente depois da prolação da sentença, tomaram conhecimento de que, por equívoco da fornecedora, os abastecimentos foram registrados no CNPJ da candidatura, e não no CPF do candidato Cloves de Oliveira.

Para a comprovação do equívoco, foi juntada ao recurso uma declaração datada de 18.03.2021, firmada por Julita Thiesen – Eireli, CNPJ n. 14.526.852/0001-21, na qual a empresa afirma que as notas fiscais foram equivocadamente emitidas constando o CNPJ de Cloves de Oliveira (ID 412333283).

Conheço do documento juntado com o recurso, na esteira da jurisprudência desta Corte e com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2016. CANDIDATO. PREFEITO. DESAPROVAÇÃO. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS COM O RECURSO. POSSIBILIDADE. EMISSÃO DE CHEQUES SEM FUNDOS. AUSÊNCIA DE ASSUNÇÃO DE DÍVIDA DE CAMPANHA PELO ÓRGÃO NACIONAL DE DIREÇÃO PARTIDÁRIA. QUANTIA ELEVADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

1. Preliminar afastada: possibilidade de juntada de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. 2. Mérito: mantém-se a sentença de desaprovação das contas de campanha em razão da emissão de cheques sem provisão de fundos e da ausência de assunção, pelo órgão nacional de direção partidária, da dívida de campanha. Irregularidade que representa 54,29% do total de despesas. Inobservância do preceito da transparência que deve nortear tanto a gestão de recursos na campanha quanto a elaboração final das contas, em prejuízo à atuação fiscalizatória da Justiça Eleitoral. Desprovimento.

(TRE-RS – REl n. 10486 GRAVATAÍ - RS, Relator: Des. Eleitoral SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 19.7.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 134, Data: 27.7.2018, p. 5.) (Grifo nosso)

 

Entretanto, a declaração apresentada não se afigura como documento idôneo para desconstituir o conteúdo das notas fiscais emitidas.

Com efeito, para afastamento da irregularidade seria necessário o cancelamento das notas fiscais, consoante previsão do art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19:

O cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular.

Esse é o entendimento da Corte, conforme ementa que reproduzo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. MAJORITÁRIA. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RONI. OMISSÃO DE DESPESAS COM COMBUSTÍVEL. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR A ORIGEM DO MONTANTE IRREGULAR. NECESSIDADE DE CANCELAMENTO DE NOTAS FISCAIS. VALOR ABSOLUTO INEXPRESSIVO. POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de candidato ao pleito majoritário, em virtude da utilização de recursos de origem não identificada e omissão do registro de despesas, determinando o recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional.

2. Desnecessário pedido para que o recurso seja recebido no efeito suspensivo, visto que a determinação de recolhimento de valores ao erário fixada na sentença somente pode ser executada após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas, na forma do art. 32, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Inaplicabilidade das disposições contidas na Resolução TSE n. 23.604/14, pois o feito versa sobre escrutínio realizado em 2020, balizado pela Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Omissão de despesas. Emissão de notas fiscais sem que fosse possível verificar a identidade do doador originário dos recursos. Alegado gasto pessoal com combustíveis, no qual, por equívoco, a empresa fornecedora teria lançado nota fiscal com o CNPJ da candidatura quando deveria ter registrado o CPF do recorrente. Entretanto, a documentação anexada não supre a irregularidade, pois não basta a simples declaração do emissor alegando equívoco na elaboração do documento fiscal, sendo necessário o cancelamento da nota. Determinação prevista no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. A irregularidade considerada como recurso de origem não identificada representa 2,93% do total de receitas movimentadas, além de constituir valor absoluto reduzido, inclusive inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10, considerado módico pela disciplina normativa das contas, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19). Circunstância na qual a jurisprudência do TRE-RS admite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas, ainda que mantida a necessidade de recolhimento da quantia impugnada ao Tesouro Nacional.

5. Provimento parcial.

(REl 0600474-12.2020.6.21.0103, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 01.07.2021.) (Grifo nosso)

 

Contudo, aplicando-se os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, é possível a aprovação das contas com ressalvas, em face do diminuto valor de R$ 722,88, relativo à emissão de 3 notas fiscais, quantia que representa 1,72% da movimentação financeira declarada, no montante de R$ 41.927,15.

Nesse sentido é o parecer da douta Procuradoria Eleitoral (ID 41893983):

Por fim, é o caso de aprovação das contas com ressalvas, vez que o valor das irregularidades (R$ 722,88) representa 1,72% do total das receitas declaradas (R$ 41.927,15), ficando, portanto, abaixo do percentual (10%) utilizado como limite para permitir a aprovação das contas com ressalvas na esteira da jurisprudência dessa egrégia Corte.

 

Assim, além de o percentual não ser significativo frente ao somatório arrecadado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Acerca da incidência dos aludidos princípios sobre irregularidades nominalmente diminutas, cumpre trazer à colação precedente do Tribunal Superior Eleitoral apontando a possibilidade de aprovação das contas com ressalvas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017.) (Grifo nosso)

 

De igual modo, a jurisprudência do TRE-RS admite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas quando o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020.) (Grifo nosso)

 

Dessarte, tendo em vista que as irregularidades perfazem quantia inexpressiva, tenho que o recurso comporta provimento parcial, com a aprovação com ressalvas das contas.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de CLOVES DE OLIVEIRA e IDINEI QUIONHA DOS SANTOS, candidatos, respectivamente, aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de Bom Progresso nas eleições de 2020.