REl - 0600480-06.2020.6.21.0075 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/10/2021 às 14:00

VOTO

Da leitura dos declaratórios e do acórdão embargado, observa-se que o embargante não aponta a existência de obscuridade ou contradição entre o raciocínio exposto e a conclusão do Tribunal, uma vez que o fundamento do recurso está na inconformidade com a interpretação dada ao art. 27, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ocorre que o inconformismo da parte com a justiça da decisão e a interpretação da legislação não se enquadra nas hipóteses que autorizam a oposição de embargos de declaração previstas no art. 1.022 do CPC, pois a insurgência deve ser exposta no recurso dirigido à instância superior.

Nos declaratórios, o embargante reitera a tese recursal afastada pelo acórdão embargado, na qual postulou que o recurso estimável em dinheiro, consistente no seu veículo pessoal, fosse excluído da contabilização de receitas próprias.

Essa alegação foi afastada de forma clara no seguinte trecho do julgado:

O recorrente alega que o recurso estimável em dinheiro, consistente no seu veículo pessoal, não poderia ser considerado como recurso financeiro, devendo ser excluído da contabilização de receitas próprias.

Esse entendimento não encontra amparo legal, pois os limites de gastos para cada eleição incluem as doações estimáveis em dinheiro. Essa é a inteligência do art. 5º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, devendo serem somadas todas as doações efetuadas pelo próprio candidato, inclusive as estimáveis.

Saliente-se que o parâmetro para aferição do limite de autofinanciamento de cada cargo em disputa visa à igualdade de oportunidades, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Quanto ao pedido de que na análise da falha seja considerada a exceção contida no art. 27, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, é preciso considerar que a regra não se destina a candidatos, e sim a pessoas físicas que não se enquadram como candidatos. O dispositivo prevê, somente para pessoas físicas, que o limite de doações de 10% dos rendimentos brutos do ano anterior não se aplica para os bens estimáveis móveis ou imóveis de propriedade do doador, ou seja, o eleitor, ou à prestação de serviços pelo eleitor, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00.

A exceção não abrange os candidatos, que seguem o limite previsto no § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, litteris:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

[...]

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

[...]

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência e a lisura da prestação de contas. Na hipótese, ainda que o recorrente tenha possibilitado a identificação das fontes e a origem dos financiamentos de sua campanha, houve descumprimento das regras contábeis aplicáveis a todos os candidatos.

 

Como se vê, as teses jurídicas e os dispositivos legais invocados nas razões de embargos foram expressamente considerados, tendo a Corte exposto de forma clara o raciocínio percorrido para a conclusão pelo desprovimento do recurso.

Cumpre referir que se a falha em questão trata de excesso de autofinanciamento, ou seja, de recursos próprios aplicados na campanha, o argumento contido no acórdão: “ainda que o recorrente tenha possibilitado a identificação das fontes e a origem dos financiamentos de sua campanha, houve descumprimento das regras contábeis aplicáveis a todos os candidatos”, é mera decorrência de raciocínio lógico.

Ora, se há excesso de autofinanciamento, por óbvio a fonte da receita está identificada, o que não impede que se constate a ocorrência de irregularidade pela inobservância do limite legal.

A decisão é clara e não deixa margem de dúvidas sobre a necessidade de contabilização do veículo pessoal para fins de aferição do limite de investimento de recursos próprios na campanha.

O certo é que a tese reiterada nas razões de embargos foi expressamente afastada pelas razões de decidir de forma literal, e não omissa, duvidosa ou obscura.

Desse modo, verifico que as razões de embargos, a par de aventar a existência de contradição e obscuridade no acórdão, apresentam exclusivamente o inconformismo do embargante com a justiça da decisão.

Contudo, se o embargante não concorda com o resultado do julgamento que lhe foi desfavorável, deve manejar o recurso próprio objetivando a reforma da decisão, não sendo os embargos de declaração o instrumento cabível para a rediscussão da matéria já decidida ou para alteração da conclusão do Tribunal.

O acerto ou o desacerto do julgado, o debate sobre a justiça da decisão e a polêmica sobre a interpretação de normas é matéria a ser tratada no competente recurso dirigido à superior instância, pois é pacífico o entendimento deste Tribunal e do TSE no sentido de que o que impõe a lei é esclarecer, na decisão, os motivos que levaram o julgador a dar a solução que lhe pareceu mais justa.

Com essas considerações, entendo que, em face da ausência de vícios sujeitos a aclaramento ou integração, o recurso merece ser desprovido, aplicando-se, quanto ao pedido de prequestionamento, o disposto no art. 1.025 do CPC.

 

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.