REl - 0600637-11.2020.6.21.0032 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/10/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é regular e tempestivo, comportando conhecimento.

 

Mérito

ERIVELTON ELISEU JAHN interpôs recurso contra a sentença que desaprovou as suas contas, em virtude do recebimento de doações em valor superior a R$ 1.064,10 por meio de depósitos bancários, com violação ao disposto no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que exige a transferência eletrônica ou utilização de cheque cruzado e nominal, determinando o recolhimento da quantia de R$ 1.200,00 ao Tesouro Nacional, bem como em razão de despesas relativas a serviço de contabilidade e à produção de jingles, ambas em desacordo com o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em relação ao primeiro fato, houve violação ao disposto no art. 21, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, a seguir transcrito:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

 

Na dicção do art. 21, § 1º, da citada resolução, as doações financeiras de pessoas físicas, em valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, devem ser efetivadas por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, ou mediante compensação de cheque cruzado e nominal.

Por força do § 2º daquele mesmo dispositivo legal, o regramento também se aplica às doações sucessivas efetuadas por um mesmo doador em um mesmo dia, como no caso dos autos, em que foram efetuados dois depósitos em dinheiro, na conta de campanha, no dia 13.11.2020, nas quantias de R$ 1.000,00 e R$ 120,00, as quais, somadas (R$ 1.120,00), ultrapassaram o valor de R$ 1.064,10.

Desde logo, necessário dizer que há erro material na sentença que identificou o valor nominal dos depósitos em R$ 1.200,00, quando na verdade somam a quantia de R$ 1.120,00 (ID 27296283).

Dessa forma, embora o candidato tenha informado que os depósitos acima do limite legal ocorreram por equívoco e que o valor foi devolvido ao doador, é indubitável a violação ao comando legal, porquanto, em operações dessa natureza, são lançadas as informações declaradas pelo depositante (doador imediato), inviabilizando a identificação da real origem dos recursos (doador mediato). Ou seja, não há controle da instituição financeira sobre a veracidade dessa informação e, por conseguinte, quanto à real origem dos valores. Daí a razão da exigência legal para que depósitos superiores a R$ 1.064,10 sejam realizados mediante transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, formas de doação que asseguram de qual conta partiu o recurso.

Cabe ressaltar, ainda, o posicionamento firme do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória do ato:

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator Min. Jorge Mussi, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69.)

 

Por consequência, não restou observado o disposto no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, caracterizando-se os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional nos termos do § 4º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual estabelece que, “No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução”.

Assim, como os recursos financeiros foram utilizados na campanha do candidato, a inobservância da normativa implica a sua caracterização como de origem não identificada, impondo-se o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, nos moldes do art. 21, § 4º, c/c o art. 32, § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, que reproduzo na sequência:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(...)

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

(…).

 

Quanto ao pedido subsidiário de que sejam considerados irregulares apenas os depósitos excedentes ao limite legal (R$ 1.064,09), também não assiste razão ao recorrente. Isso porque a jurisprudência deste Regional é uníssona ao compreender que os valores a serem recolhidos devem ser considerados em sua integralidade, “e não apenas no que ultrapassa o limite legal” (TRE/RS – RE 210-53.2016.6.21.0113, Rel. Des. El. Luciano André Losekann, Sessão de 17.7.2018).

No mesmo sentido é o recente julgado deste Tribunal, de relatoria do Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, cuja ementa a seguir transcrevo:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DEPÓSITOS SUCESSIVOS EM ESPÉCIE, NO MESMO DIA, NA CONTA DE CAMPANHA, PELO MESMO DOADOR. MONTANTE ACIMA DO LIMITE LEGAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas, em razão do recebimento de recursos em espécie em montante superior a R$ 1.064,10, através de dois depósitos na conta de campanha, realizados na mesma data, pelo mesmo depositante.

2. Depósitos em espécie na conta de campanha do candidato, realizados por um único doador, na mesma data e em duas diferentes operações, excedendo o patamar de R$ 1.064,10, em afronta ao disposto nos §§ 1º e 2º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19. Não se trata de erro formal, mas de afronta à previsão legal cujo objetivo é assegurar a transparência das origens dos recursos que alimentam as campanhas eleitorais. Falha que caracteriza o recurso, na sua totalidade, como de origem não identificada, conforme se depreende do disposto no art. 32, § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, devendo o valor correspondente ser recolhido ao Tesouro Nacional.

3. Provimento negado.

(REl n. 0600603-39.2020.6.21.0031, Relator Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, julgado em 20.5.2021.) (Grifei.)

 

Em relação à segunda irregularidade, o prestador das contas, em sua peça recursal (ID 27296833), discorreu detalhadamente sobre como fora realizada a contratação dos serviços contábeis, sanando qualquer dúvida sobre a regularidade da operação.

Conforme bem destacado pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral (ID 39932733):

Quanto à segunda irregularidade, prestador apresenta nota fiscal emitida pela fornecedora Essentjus (ID 27296183), bem como recibo de quitação de honorários (ID 27296883) referente a Elaine Andriolli, e contrato de prestação de serviços com os aludidos fornecedores (ID 27296133), no qual consta, no seu Anexo II, que o pagamento seria feito integralmente à empresa Essentjus, que repassaria a Elaine Andriolli o seu percentual.

Em que pese não ter sido observado com exatidão o disposto no art. 38 da Resolução TSE 23.607/19, pois os pagamentos têm que ser realizados diretamente ao fornecedor, os documentos acima referidos esclarecem a razão pela qual o pagamento foi feito integralmente à empresa Essentjus. Nesse sentido, o contrato de prestação de serviços de contabilidade foi firmado pelo candidato com a empresa Essentjus e com a contadora associada, Elaine Adriolli, daí ter constado, corretamente, os dois fornecedores nas declarações feitas pelo candidato.

Por outro lado, no contrato consta que o pagamento será realizado à empresa Essentjus, mas que esta repassará parte do valor à contadora associada, daí o pagamento, através de boleto, ter sido feito apenas à empresa. O recibo da contadora associada informa que a Essentjus lhe efetuou o pagamento devido, tudo como estabelecido no contrato juntado, ao qual se soma a nota fiscal emitida pela empresa para o pagamento da sua parte. Afastada, portanto, a aludida irregularidade.

 

A despesa eleitoral e o consequente pagamento da obrigação estão de acordo com o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Os documentos comprobatórios juntados pelo prestador das contas são suficientes a demonstrar o destino dos valores aplicados, o que afasta a irregularidade apontada na sentença.

Por fim, quanto ao pagamento das despesas com jingle em desacordo com o art. 38, não houve irresignação no recurso, razão pela qual permanece a falha apontada na sentença,

Assim, além da impropriedade do gasto com jingle, subsiste a primeira irregularidade assinalada na sentença, no valor corrigido de R$ 1.120,00, o qual representa 21,57% dos recursos declarados como recebidos (R$ 5.190,45), não sendo possível aplicar os postulados da proporcionalidade e razoabilidade a fim de aprovar as contas com ressalvas, razão pela qual o juízo de desaprovação deve ser mantido.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e parcial provimento do recurso para fins de afastar a segunda irregularidade apontada na sentença, mantendo a desaprovação das contas de ERIVELTON ELISEU JAHN, relativas ao pleito de 2020, e, corrigindo erro material da decisão de primeiro grau, determinando-lhe o recolhimento da quantia de R$ 1.120,00 ao Tesouro Nacional, com fundamento nos arts. 21, §§ 1º, 2º e 4º, e 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19.

É como voto, Senhor Presidente.