REl - 0600312-46.2024.6.21.0048 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/07/2025 às 16:00

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. 

No mérito, JOÃO FRANCISCO RENOSTO, candidato eleito ao cargo de vereador no Município de Cambará do Sul/RS, nas Eleições Municipais de 2024, recorre da sentença que desaprovou suas contas de campanha e o condenou ao recolhimento de e R$ 7.112,99 ao Tesouro Nacional, sendo R$ 3.556,49 a título de multa e outros R$ 3.556,49 por restituição de valores recebidos indevidamente, com fundamento no excesso de autofinanciamento com recursos próprios. 

O limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Cambará do Sul/RS, nas Eleições 2024, foi de R$ 15.985,08, teto informado pelo Tribunal Superior Eleitoral no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, o que impunha ao candidato a obediência ao limite equivalente a 10% deste valor ao utilizar recursos próprios, ou seja, R$ 1.598,50, nos termos do art. 23, § 2º-A, da Lei das Eleições.  

Na hipótese, o candidato realizou autofinanciamento no valor de R$ 5.155,00. Assim, teria excedido em R$ 3.556,49 o limite prescrito. 

A matéria está regulamentada na Resolução TSE n. 23.607/19: 

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pela doadora ou pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º). 

§ 1º A candidata ou o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A). 

[…]. 

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita a infratora ou o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de a candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º). 

 

Em suas razões recursais, o candidato reconhece que incidiu em excesso de gastos com recursos próprios, mas defende que agiu de boa-fé, pois “fez a doação de sua pessoa física para a campanha eleitoral utilizando por base o entendimento de que poderia ser aplicado o artigo 23, § 1º, da Lei Federal 9.504/95, o qual estabelece às pessoas físicas a possibilidade de doação de até 10% do valor declarado de imposto de renda do ano anterior para candidato”. 

Contudo, o desconhecimento da legislação, ou mesmo eventual erro de interpretação, não exime o candidato da rigorosa observância das normas atinentes ao financiamento de campanha, especialmente no que toca ao teto de gastos com recursos próprios, que tem natureza objetiva e o escopo de garantir a paridade de armas nas campanhas eleitorais. 

Logo, não se discute a boa ou a má-fé do recorrente nem a prática de abuso de poder econômico, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha em perspectiva isonômica a todos os concorrentes. 

Por outro lado, não existe amparo legal para a determinação cumulativa de recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional e multa de até 100% da quantia em excesso para a irregularidade em questão. 

A obrigatoriedade de devolução de quantias ao erário somente tem ensejo nas hipóteses de “recursos recebidos de fonte vedada, recursos de origem não identificada e de não comprovação da utilização indevida de recursos recebidos do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha” (TSE, AgR-REspEl n. 060145451, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 243, Data 24.11.2020). 

No caso sub examine, a irregularidade não reside no ingresso de recursos de origem vedada ou não identificada, tampouco na malversação de recursos públicos (Fundo Partidário ou FEFC). Trata-se, exclusivamente, de extrapolação do limite legalmente estabelecido para autofinanciamento, situação que atrai, como única consequência jurídica, a sanção de multa de até 100% sobre o montante excedente, a teor do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97, não se cogitando, por ausência de previsão legal, a devolução da quantia ao Tesouro Nacional. 

Logo, deve ser afastada a ordem de recolhimento de quantias ao Tesouro Nacional e mantida tão somente a multa judicial eleitoral para a infração em tela. 

No tocante a dosimetria da sanção pecuniária, este Tribunal estabeleceu que a multa deve ser arbitrada de forma proporcional ao percentual do excesso sobre o limite de autofinanciamento (Prestação de Contas Eleitorais n. 0603259-91/RS, Relatora: Desa. Eleitoral Patrícia da Silveira Oliveira, Acórdão de 06.9.2024, publicado no Diário de Justiça Eletrônico 201, data 10.9.2024). 

No caso, o valor da irregularidade (R$ 3.556,49) representa um excesso de 222% sobre o limite de autofinanciamento (R$ 1.598,50). Assim, deve ser mantida a multa de 100% sobre o valor irregular, observando-se o critério objetivo adotado por este Tribunal na análise das contas eleitorais, mantendo-se a penalidade na quantia de R$ 3.556,49. 

Não obstante, impõe-se, de ofício, a retificação do comando sentencial quanto ao destino da multa aplicada, a qual deve ser recolhida ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), como previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95, e não ao Tesouro Nacional, consoante entendimento pacificado no âmbito deste Tribunal (Recurso Eleitoral 060056679/RS, Relator: Des. Volnei dos Santos Coelho, Acórdão de 21.3.2025, Publicado no Diário de Justiça Eletrônico 56, data 27.3.2025). 

A falha constatada alcança R$ 3.556,49, que representa 66% do total das receitas arrecadadas pelo candidato (R$ 5.356,00), quantias que ultrapassam os valores considerados pela jurisprudência como irrisórios ou de reduzida gravidade no conjunto das contas. 

De acordo com o entendimento consolidado do Tribunal Superior Eleitoral, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade incidem na prestação de contas para fins de aprovação com ressalvas apenas quando o valor total das irregularidades for de até 10% do montante de recursos arrecadados ou quando o montante global irregular não ultrapassar R$ 1.064,10 (TSE; Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n. 060542160/SP, Relator: Min. Edson Fachin, Acórdão de 25.2.2021, publicado no Diário de Justiça Eletrônico 48, data 17.3.2021). 

Dessa forma, as cifras apontadas impedem que as falhas sejam consideradas irrelevantes ou de pequena repercussão e impõem a manutenção do juízo de desaprovação das contas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso apenas para afastar a determinação de recolhimento de R$ 3.556,49 ao Tesouro Nacional, mantendo a desaprovação das contas e a multa por excesso de autofinanciamento no valor de 100% da quantia excedida, a qual deve ser recolhida ao Fundo Partidário, nos termos da fundamentação.