REl - 0600475-61.2024.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/07/2025 às 16:00

VOTO

A inicial aponta a ocorrência de contratações temporárias em período vedado, após 6 de julho de 2024, consistentes em nomeações para as áreas de educação e infraestrutura.

A sentença reconheceu que parte das contratações - especialmente de professores e servidores ligados aos serviços essenciais de saúde - estaria justificada diante da situação excepcional enfrentada pelo Município em razão das enchentes ocorridas em maio de 2024.

Contudo, entendeu que, quanto à contratação de dois vigias e de um auxiliar de ensino, não restou comprovada a sua urgência ou imprescindibilidade, não se enquadrando nas exceções legais previstas no art. 73, inc. V, al. "d", da Lei das Eleições. O dispositivo veda, nos três meses que antecedem o pleito e até a posse dos eleitos, a nomeação e contratação de servidor público, ressalvados a nomeação de aprovados em concurso público homologado até o início daquele prazo e a nomeação ou contratação necessária ao funcionamento de serviços públicos essenciais:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

(...)

c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo;

d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo;

(...)

Em suas razões, o recorrente sustenta que a contratação de vigias se deu em atenção à política de reforço da segurança nas escolas, tendo em vista os recentes episódios de violência registrados no ambiente escolar. Foram contratados como vigias Joacir Luiz Machado Pinto (contratação temporária em 08 de agosto de 2024) e Sandro Alberi Prates de Oliveira (contratação temporária em 14 de agosto de 2024) e, como auxiliar de ensino, Genilce Pretes de Moraes (contratação temporária em 20 de agosto de 2024).

Quanto ao auxiliar de ensino, alega que a contratação foi motivada por laudo médico emitido em fevereiro de 2024, que indicava a necessidade de acompanhamento especializado de aluno com transtorno do espectro autista (TEA), o que demonstraria a imprescindibilidade da medida e a adequação à exceção prevista no art. 73, inc. V, al. "d", da Lei das Eleições.

Pois bem.

Observa-se que foram consideradas regulares as contratações de professores e irregular a contratação de uma auxiliar de ensino.

Entretanto, ambas as funções - professor e auxiliar de ensino - integram o mesmo serviço educacional prestado à população, sendo atividades complementares e interdependentes.

No caso concreto, o auxiliar foi contratado para atender um aluno com deficiência, com laudo médico juntado em grau recursal (CID F84 e CID 11: 6A024). Trata-se, portanto, não de um apoio genérico à escola, mas de cumprimento de obrigações constitucionais de atendimento especializado (CF, art. 208, inc. III). O atendimento educacional especializado é tão essencial quanto a presença do professor.

Entendo que a lógica que fundamentou a liberação do professor deveria ser complementar ao auxiliar pedagógico quando ele atua em função essencial, como inclusão educacional. Reproduzo as razões da sentença:

(...)

Na mesma linha, a contratação temporária de servidores para os cargos de professor dos anos iniciais e da educação infantil ocorreu na forma a garantir a continuidade das aulas no período, tendo em vista que os contratos anteriores se encerraram naquele período.

Assim, ciente da controvérsia jurisprudencial e doutrinária quanto ao tema, entendo que a manutenção de serviço educacional deve ser reconhecida como serviço público essencial. No ponto, filio-me ao entendimento de que a natureza do serviço prestado, voltado ao desenvolvimento e à formação de cidadãos, não se compatibiliza com a vedação prevista na legislação eleitoral, afastando-a em razão da imprescindibilidade da prestação ininterrupta e da relevância social e constitucional do ensino, diretamente relacionada à formação de crianças e jovens, pessoas em desenvolvimento a quem a própria Constituição garante atendimento e atenção prioritários. Portanto, na hipótese dos autos, tenho que a contratação de professores foi indispensável para assegurar a regularidade do serviço educacional.

No mesmo sentido:

TRE-GO; REl nº 06000806; Relator(a) Des. Ana Cláudia Veloso Magalhães; Julgamento: 16/09/2024. Ementa: Eleições de 2024. Recurso Eleitoral. Pedido de autorização para contratação temporária no período eleitoral. Excepcionalidade. Educação como serviço essencial. Autorização concedida. I. Caso em exame 1.1. Trata-se de recurso interposto pelo Poder Executivo Municipal, requerendo autorização para a contratação temporária de profissionais da educação, com base no art. 73, inciso V, alínea 'd', da Lei nº 9.504/1997, em razão de afastamentos de servidores efetivos durante o período vedado. 1.2. A contratação temporária é solicitada para manter a continuidade do serviço educacional no município, considerando o afastamento de diversos profissionais, por motivos legais. II. Questões em discussão. 2.1. A questão central é a possibilidade de autorizar a contratação temporária de profissionais da educação nos três meses que antecedem o pleito eleitoral, sob o argumento de que a educação constitui serviço público essencial. III. Razões de decidir. 3.1. O art. 73, inciso V, alínea 'd', da Lei nº 9.504/1997 permite a contratação de pessoal no período eleitoral quando necessária para o funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, desde que haja prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo. 3.2. Embora parte da jurisprudência não reconheça a educação como serviço essencial para fins de aplicação da exceção, o contexto atual demonstra a importância da continuidade do serviço educacional, especialmente no que tange ao desenvolvimento social, psicológico e à proteção das crianças, de maneira que se deve assegurar para a educação a característica de serviço essencial para aplicação da exceção prevista no art. 73, inciso V, alínea 'd', da Lei nº 9.504/1997. IV. Dispositivo e tese. 4.1. Recurso conhecido e provido para conceder a autorização de contratação temporária de profissionais da educação, com base na excepcionalidade prevista no art. 73, inciso V, alínea 'd', da Lei nº 9.504/1997. (Grifei).

Ainda, os documentos anexados com a contestação demonstram que a lista de espera do concurso público vigente foi utilizada para a contratação desses professores, afastando a conclusão pela irregularidade.

Por outro lado, entendo que merecem prosperar os pedidos do Ministério Público Eleitoral no que se refere às contratações de vigia municipal e auxiliar de ensino. Não se pode conferir à previsão da alínea "d" do art. 73 uma interpretação que possibilite admitir que a exceção à norma se torne regra.

Em relação à contratação temporária de vigia municipal, não restou suficientemente demonstrada a imprescindibilidade da continuidade de qualquer serviço público essencial que justificasse a contratação no período de vedação. O simples fato de se tratar de manutenção de contrato anterior não é capaz de afastar a vedação legal, impondo-se o reconhecimento da prática de conduta ilegal.

De igual forma, no que tange à contratação de auxiliar de ensino, embora o representado tenha mencionado que a medida se deu em razão da necessidade de acompanhamento de um aluno com necessidades especiais, não foi apresentada comprovação suficiente nesse sentido. Não é possível afirmar que, no momento da nomeação, a contratação fosse urgente e imprescindível a ponto de justificar a excepcionalidade que afastaria a vedação legal, especialmente considerando a possibilidade de que a criança, até aquele momento, não tenha contado com tal apoio. Portanto, não há elementos suficientes que permitam extrair a imprescindibilidade da referida contratação, cuja comprovação cabia ao requerido.

(...)

Conforme consta da sentença, a jurisprudência do TSE entende pela essencialidade de funções ligadas à saúde, segurança e sobrevivência; e há precedentes que, em situações específicas (como pandemia e enchentes), ampliam a interpretação para incluir funções educacionais essenciais.

A decisão de primeiro grau já tomou essa ampliação para os professores. Negar isso ao auxiliar parece-me malferir o princípio da isonomia e não guardar coerência com a situação fática verificada nos autos.

É juridicamente incoerente admitir a contratação de professores no período vedado - com fundamento na essencialidade do serviço educacional - e, ao mesmo tempo, negar essa qualificação à auxiliar de ensino que atuava diretamente com aluno com transtorno do espectro autista, necessitando de acompanhamento individual. Tal função não apenas integra o núcleo do serviço educacional prestado, como se revela obrigatória ao cumprimento do direito à educação inclusiva assegurado pela Constituição e pela legislação infraconstitucional.

A sentença conclui pela necessidade de manutenção do ensino - especialmente diante do contexto de calamidade - justificando a flexibilização da disposição legal do art. 73, inc. V, da Lei das Eleições e, por coerência sistêmica, a mesma lógica deveria alcançar o auxiliar de ensino que atua com aluno PCD.

Ainda, quanto ao entendimento de que deve ser desqualificada a contratação do auxiliar porque não havia demonstração de urgência "naquele momento específico" (20.8.2024), frente ao laudo médico acostado ao corpo do recurso, de fevereiro de 2024, anterior à vedação legal, entendo que a prova é suficiente para justificar a necessidade de contratação.

A eventual omissão ou inércia do gestor não afasta a essencialidade do serviço no momento da contratação, pois o serviço prestado por auxiliar era para acompanhamento individual de aluno com autismo, o que não é eventualidade ou conveniência, mas sim exigência de inclusão escolar. Ainda que a contratação tenha ocorrido apenas em agosto de 2024, durante o período vedado, tal circunstância não elimina a necessidade contínua e documentada do serviço.

Portanto, se o serviço educacional foi considerado essencial a ponto de incluir a contratação excepcional de professores, não há fundamento lógico nem jurídico razoável para excluir o apoio pedagógico especializado à criança com deficiência.

Concluo por demonstrada a essencialidade do serviço de auxiliar de ensino.

No tocante à contratação de vigia, não há razões suficientes para afastar a conclusão da sentença.

O recorrente alega que havia necessidade imprescindível da continuidade do serviço pelo fato de, no ano de 2023, ter reforçado a segurança pública do município, contratando inúmeros vigias municipais após o trágico fato ocorrido na cidade de Santa Catarina, onde 04 crianças foram mortas em ataque a creche.

Contudo, tal justificativa não contempla a hipótese de exceção legal.

Não há nos autos comprovação documental que demonstre situação de risco específica ou urgência que justifique a nomeação no período vedado, razão pela qual mantenho a sentença quanto a esse ponto.

Diante do afastamento da conduta vedada relativa à contratação de auxiliares de ensino, necessária a redução proporcional da multa em razão da menor gravidade da infração, referente ao contrato de apenas um servidor.

Assim, entendo adequado e razoável aplicar o mínimo legal da multa prevista no § 4º do art. 73 da Lei n. 9.504/97, que corresponde a R$ 5.320,50 (cinco mil trezentos e vinte reais e cinquenta centavos).

Com essas considerações, o recurso merece parcial provimento para a redução da multa aplicada de forma individual para o mínimo legal de R$ 5.320,50, mantendo-se o juízo de parcial procedência da representação.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para afastar a irregularidade quanto à contratação de auxiliares de ensino e reduzir a pena de multa fixada para o mínimo legal de R$ 5.320,50, nos termos da fundamentação.