REl - 0600214-06.2024.6.21.0034 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/07/2025 00:00 a 11/07/2025 23:59

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

 

Mérito

Como relatado, JOÃO CARLOS LOBO COSTA interpõe recurso em face de sentença que julgou procedente, com aplicação de multa, representação proposta por MARCIANO PERONDI, em virtude de divulgação de conteúdo irregular e ofensivo à honra do representante.

Na irresignação, em síntese, o recorrente aduz a inocorrência de anonimato e de divulgação de fato inverídico a autorizar a imposição de multa.

À luz dos elementos que informam os autos, não assiste razão ao recorrente.

Com efeito, o caso concreto que deu azo à representação e responsabilização do recorrente consiste em comentário em publicação na página do Facebook (https://www.facebook.com/share/p/jJqC6aYxhhCBhmmM/), na qual é replicada postagem do site "O Bairrista", com os seguintes dizeres: “PRF e Ecosul negam versão de pré-candidato do PL sobre acidente de trânsito que resultou na morte de um homem em Pelotas”.

Ao comentar a referida postagem, o recorrente JOÃO CARLOS LOBO COSTA assim asseverou: "Atropelou, fugiu e mentiu e quer ser prefeito de Pelotas!".

Eis a imagem:

 

Pois bem.

Como tem este julgador asseverado em feitos oriundos de Pelotas, não se nega o valor primordial da garantia constitucional relativa à "liberdade de expressão", especialmente no contexto do debate político-eleitoral, em que o exercício crítico é não apenas legítimo, mas essencial para a democracia.

Contudo, tal liberdade encontra limites claros na legislação eleitoral quando a manifestação compromete a honra e a imagem dos candidatos, especialmente mediante acusações criminais ainda pendentes de julgamento judicial.

No caso específico, ao afirmar que MARCIANO PERONDI teria fugido, o comentário tecido pelo recorrente, no meu modo de ver, ultrapassa esses limites, uma vez que atribuiu ao então candidato, aprioristicamente, a prática do crime de omissão de socorro sem respaldo em qualquer decisão judicial, ou mesmo em mínimos elementos colhidos em fases iniciais relativas à persecução penal.

Portanto, o recorrente não se limitou a simplesmente republicar notícias veiculadas na mídia e em redes sociais acerca do nefasto evento que envolveu o recorrente e então candidato a prefeito no pleito então em curso. Em cima das publicações fez comentário depreciativo acerca da postura do recorrente, com inequívoca intenção, não há se negar, de diminuí-lo e prejudicá-lo frente ao eleitorado pelotense.

Ora, a disseminação de informações carentes de qualquer comprovação e, repito, sem respaldo, sequer, em qualquer pronunciamento atinente à persecução penal, revela, insisto, na deliberada intenção em prejudicar indevidamente a reputação do candidato recorrente em momento decisivo do processo eleitoral que estava em curso. E, nesse passo, atingiu a honra e imagem do candidato, incidindo na limitação prescrita no § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.610/19, segundo o qual “A livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos (...)”.

Digo mais, eminentes colegas. Como reiteradamente tenho assinalado em julgamentos acerca dos mesmos fatos, não deixa de causar repugnância que um fausto acontecimento que qualquer pessoa está sujeita a ver-se envolvida e pendente de elucidação seja utilizado ou trazido à baila em campanha política para diminuir ou prejudicar candidato.

Aliás, neste colegiado foi recentemente julgado fato semelhante, em tudo guardando similitude com o que ora se cuida, onde se concluiu, à unanimidade, pela responsabilização do ofensor.

Vejamos.

Por incomum coincidência, envolvia justamente o candidato adverso do recorrido. Mais precisamente, o hoje Prefeito eleito de Pelotas FERNANDO STEPHAN MARRONI.

Naquele feito, relatado que foi pelo eminente Des. Volnei dos Santos Coelho, em lapidar voto condutor, diga-se de passagem, à unanimidade, repito, se decidiu pela responsabilização do lá ofensor por publicar, também com a intenção de prejudicar o hoje prefeito, fato idêntico ocorrido há mais de três décadas. Mais precisamente, o envolvimento do Prefeito FERNANDO MARRONI em homicídio culposo também ocorrido na cidade de Pelotas.

E em tal jugado, acrescento, restou assentado que “A veiculação de propaganda eleitoral na internet, que utiliza informações sabidamente inverídicas e manifestações ofensivas à honra de candidato, configura irregularidade que justifica a aplicação de multa, nos termos da legislação eleitoral”.

Naquele feito, para roborar, a postagem impugnada noticiava que “Há 39 anos a Sra. Zeli Furtado, perdeu sua filha de 8 anos atropelada pelo Marroni, bêbado e chapado, em frente ao Ginásio Estadual do Areal”.

O v. acórdão, por unanimidade como já dito, desproveu o recurso, mantendo integralmente a sentença que aplicou R$ 5.000,00 de multa ao autor da divulgação.

Transcrevo ementa do lapidar julgado, com grifos meus:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO SABIDAMENTE INVERÍDICA. OFENSAS À HONRA DE CANDIDATO. MULTA. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Insurgência contra a sentença que julgou procedente representação por propaganda eleitoral negativa veiculada na rede social Facebook e, acolhendo embargos de declaração, aplicou multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) ao recorrente.

1.2. Em suas razões, o recorrente alegou que a publicação não configura ofensa ou desinformação, invocando a liberdade de expressão e sustentando a inaplicabilidade da multa, por não se tratar de caso de anonimato.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. Há duas questões em discussão: (i) se a publicação veiculada em rede social configura propaganda eleitoral irregular por conter informações sabidamente inverídicas e ofensas à honra de candidato; (ii) se a aplicação da multa, prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, é legítima no caso concreto.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. A propaganda eleitoral está disciplinada na Lei n. 9.504/97, regulamentada pela Resolução TSE n. 23.610/19.

3.2. Na hipótese, divulgação de conteúdo calunioso e difamatório contra candidato. Utilização de evento trágico para atribuir pechas pessoais ofensivas. A propaganda, além de noticiar acidente ocorrido há quase 40 anos, imputa ao candidato a condição de estar “bêbado e chapado” na ocasião. Não entanto, não há informação de que o candidato tenha sido criminalmente responsabilizado pelo ocorrido. Divulgação que incorreu em vedação legal, considerada como sabidamente inverídica.

3.3. Extrapolação do direito de liberdade de expressão. A Justiça Eleitoral não pode se omitir em enfrentar os excessos realizados por candidatos ou apoiadores em nome da liberdade de expressão, entre eles, a propagação de mensagens difamatórias, caluniosas, injuriosas ou inverídicas, como no caso em tela.

3.4. Multa. Incabível a alegação de que a aplicação do art. 30, § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19 está limitada a infrações relacionadas à propaganda anônima. Jurisprudência pacificada do TSE e deste Tribunal, pela qual se admite sua aplicação, igualmente prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, na hipótese de abuso na liberdade de expressão realizada por meio de propaganda veiculada na internet. Manutenção da sentença.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: "A veiculação de propaganda eleitoral na internet, que utiliza informações sabidamente inverídicas e manifestações ofensivas à honra de candidato, configura irregularidade que justifica a aplicação de multa, nos termos da legislação eleitoral, sendo irrelevante a ausência de anonimato para a incidência da jurisdição."

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.504/97, art. 57-D, § 2º; Resolução TSE n. 23.610/19, art. 38.

Jurisprudência relevante: TSE, Rp: n. 060175450, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE 28.3.2023; TRE-RS, Rp: n. 0600425-26.2024.6.21.0007, Rel. Des. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, DJE 28.11.2024.

(TRE-RS, REl nº 0600269-54.2024.6.21.0034, Relator Des. Eleitoral Volnei dos Santos Coelho, julgado em 05/02/2025).

Em suma, eminentes colegas, quanto mais não fosse pelos fatos depreciativos e inverídicos imputados pelo recorrente ao recorrido, não responsabilizar aquele, maxima venia concessa, implicaria em estarmos a dispensar tratamento distinto para situações idênticas. Em outras palavras, frente à decisão anterior estaríamos a aplicar dois pesos e duas medidas, distanciando-se, em derradeira análise, da coerência e uniformidade de entendimento que devem sempre ser buscadas pelos órgãos colegiados.

Por fim, em relação à multa aplicada, conforme pacífico entendimento jurisprudencial, não há limitação à sua aplicação exclusivamente aos casos de anonimato. Portanto, plenamente cabível em situações como a presente em que reconhecido abuso da liberdade de expressão.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo hígida a sentença de primeiro grau.

É como voto.