REl - 0600399-68.2020.6.21.0039 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidata ao cargo de vereadora do Município de Rosário do Sul-RS, relativa às eleições do ano de 2020. 

O juízo de origem desaprovou as contas da recorrente (ID 30398133), em razão do recebimento de doações em valor superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais), mediante depósitos bancários realizados de forma distinta da opção de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, e determinou o recolhimento de R$ 1.265,00 (mil duzentos e sessenta e cinco reais) ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 21, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

Conforme consta nos autos, o analista técnico apontou, no relatório conclusivo (ID 30397933), que a candidata recebeu doações de recursos próprios mediante depósitos sucessivos em dinheiro, realizados na mesma data, conforme o seguinte quadro:

Tal fato restou incontroverso. A recorrente confirmou que os depósitos foram realizados em espécie, na mesma data (ID 30397583), explicando que o depósito no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) foi efetivado no dia 13.11.2020 (sexta-feira), com a emissão do recibo eleitoral n. 155551388315RS000001E, e o depósito no valor de R$ 265,00 (duzentos e sessenta e cinco reais) foi efetivado em 16.11.2020 (segunda-feira), representado pelo recibo eleitoral n. 155551388315RS000002E.

Compulsando os autos verifica-se que, de fato, o banco efetivou os depósitos nas datas alegadas pela recorrente.

De fato, o conjunto de operações em tela está em desacordo com o art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/2019, consoante o qual as doações financeiras acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais) devem ser realizadas por meio de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, in verbis:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I – transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

[...]

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

(Grifei.)

Embora os depósitos glosados, isoladamente, não tenham excedido o valor de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais), o conjunto de transações alcançou o montante de 1.265,00 (mil duzentos e sessenta e cinco reais), ultrapassando objetivamente, o limite previsto na legislação eleitoral.

No mesmo sentido, colho os seguintes arestos deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. DOAÇÕES SUCESSIVAS EM ESPÉCIE CUJA SOMA ULTRAPASSA O LIMITE REGULAMENTAR. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO DO VALOR CORRESPONDENTE AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 só poderão ser efetivadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação. Na hipótese, realizados depósitos sucessivos em dinheiro, realizadas pelos mesmos doadores, nas mesmas datas, cuja soma ultrapassa o limite legal para depósitos em espécie previsto nos arts. 22, §§ 1º e 2º, e 34, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17. As doações sucessivas, realizadas por um mesmo doador, em uma mesma data, devem ser somadas para fins de aferição do limite regulamentar.

2. Posicionamento firme do Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o depósito, mesmo no caso de ser identificado, é meio incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória do ato. A ausência de comprovação segura do doador caracteriza o recurso como de origem não identificada, devendo o valor correspondente ser recolhido ao Tesouro Nacional.

3. Desaprovação. (grifei) (Recurso Eleitoral nº 0602858-34.2018.6.21.0000, Acórdão, RELATOR: DES. ELEITORAL ROBERTO CARVALHO FRAGA Publicação: Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE) (Grifei.)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. MAJORITÁRIA. DESAPROVAÇÃO. VALORES RECEBIDOS VIA DEPÓSITOS SUCESSIVOS. EXTRAPO-LADO O LIMITE LEGAL. VIOLAÇÃO À NORMA REGENTE. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. APORTE IRREGULAR EM PERCENTUAL EXPRESSIVO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. DESPROVIMENTO

1. Insurgência contra sentença que desaprovou a contabilidade de campanha dos recorrentes, com determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, por violação ao disposto no art. 21, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Doações em valor superior a R$ 1.064,10 mediante depósitos bancários.

2. Ainda que cada um dos depósitos apresente valor inferior ao limite estabelecido, foram feitos no mesmo dia e pelos mesmos doadores. A realização de depósitos sucessivos em dinheiro demonstra a clara tentativa de burlar a norma eleitoral, o que é expressamente vedado pela citada resolução. Prática que permite o ingresso de valores na conta do candidato sem a possibilidade de segura verificação da pessoa do doador, vez que o CPF de identificação lançado pelo depositante não reflete, necessariamente, o autor da contribuição, o que somente poderia ser garantido por meio das operações indicadas nas normativas legais.

3. O montante recebido de forma irregular corresponde a 21,29% do total declarado como recebido, percentual que inviabiliza a aprovação das contas, mesmo com ressalvas, visto que compromete substancialmente a confiabilidade e transparência da movimentação contábil. Manutenção da sentença com determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional. (grifei) (TRE-RS – RE: 0600553-37.2020.6.21.0023, AJURICABA – RS, Relator: DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 11/05/2021, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE) (Grifei.)

Contudo, no caso dos autos, restou comprovado a origem do recurso doado (ID 30397883).

A recorrente demonstrou que, no dia 13.11.2020, foi realizado um saque no valor de R$ 1.265,00 (mil duzentos e sessenta e cinco reais) da conta conjunta n. 013.00029999-1, agência 0499 da Caixa Econômica Federal, que possui com seu pai, Roni Penteado Figueiredo, sendo nesse mesmo dia, realizado dois depósitos identificados, totalizando o mesmo valor, na sua conta de campanha.

Na hipótese, a identificação da origem do recurso doado, afasta o dever de recolhimento do valor aos cofres do Tesouro Nacional.

Outra não é a direção do parecer do ilustre Procurador Regional Eleitoral, Dr. Fábio Nesi Venzon, cujos fundamentos agrego às razões de decidir (ID 43606633):

[...]

Contudo, assiste razão à recorrente quando alega que, embora tenha ocorrido o descumprimento da forma prescrita na norma para realização de doações financeiras, não subsiste dúvida quanto à origem dos recursos depositados na conta de campanha. Para tanto a candidata acostou cópia de extrato da Conta 013.00029999-1, Ag. 0499, da Caixa Econômica Federal, em nome de Roni Penteado Figueiredo, e do respectivo cartão magnético em nome da própria candidata, informando tratar-se de conta conjunta que possui com seu genitor (confirmamos a filiação na identidade acostada ao registro de candidatura). Nota-se que o extrato da conta pessoal contém o registro de saque da importância de R$ 1.265,00, realizado em terminal de autoatendimento exatamente no dia 13.11.2020, data das doações.

Assim, comprovada a origem da doação em questão, não se fazem presentes quaisquer das hipóteses que determinam o recolhimento de quantia ao Tesouro Nacional, quais sejam: receitas de origem não identificada ou de fonte vedada, bem como a utilização indevida de recursos do FEFC ou do Fundo Partidário (arts. 16-C, § 11 e 24, § 4º, da Lei 9.504/97) e (arts. 17, § 9º, 19, § 9º, 21, §§ 3º e 4º, 27, § 1º, 31, § 4º, 32, 52, parágrafo único e 79, §1º, da Resolução TSE 23.607/2019).

Finalmente, remanescendo tão somente falha formal que, no caso em tela, não comprometeu a regularidade das contas, possível a aprovação com ressalvas.

Ante o exposto, opina-se pelo conhecimento e provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas e afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

[…] (Grifei.)

Assim, identificada a origem do recurso e inexistindo prejuízo para a fiscalização das contas pela Justiça Eleitoral, diante da ausência de má-fé pela prestadora, a irregularidade inicialmente constatada se traduz em mera impropriedade, situação que condiciona a aprovação das contas com ressalvas.

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo provimento do recurso para aprovar com ressalvas as contas de Luciana Flores Figueiredo Mendes, relativas ao pleito de 2020, afastando a determinação de recolhimento do valor de R$ 1.265,00 (mil duzentos e sessenta e cinco reais) ao Tesouro Nacional.