REl - 0600037-55.2021.6.21.0096 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2021 às 14:00

 VOTO

O recurso interposto é regular, adequado e tempestivo.

Os recorrentes imputam aos ora recorridos captação e gastos ilícitos de recursos em campanha eleitoral, por meio das seguintes condutas descritas na inicial (ID 40283783): a) promessa de doação de terrenos a eleitores em troca de votos; b) promessa de benfeitorias, como maquinários, mesas e utensílios para a comunidade; e c) promessa de destinação futura de verba parlamentar (“usará verba do governo federal”) para execução de projetos de interesse de comunidade do município.

A captação ou gasto ilícito de recursos eleitorais encontra-se disciplinada no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, abaixo reproduzido:

Art. 30-A. Qualquer partido político ou coligação poderá representar à Justiça Eleitoral, no prazo de 15 (quinze) dias da diplomação, relatando fatos e indicando provas, e pedir a abertura de investigação judicial para apurar condutas em desacordo com as normas desta Lei, relativas à arrecadação e gastos de recursos. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 107, de 2020)

§ 1º Na apuração de que trata este artigo, aplicar-se-á o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990, no que couber. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

§ 2º Comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

§ 3º O prazo de recurso contra decisões proferidas em representações propostas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

A respeito desse ilícito eleitoral, José Jairo Gomes leciona que:

É explícito o desiderato de sancionar a conduta de captar ou gastar ilicitamente recursos durante a campanha. O objetivo central dessa regra é fazer com que as campanhas políticas se desenvolvam e sejam financiadas de forma escorreita e transparente, dentro dos parâmetros legais. Só assim poderá haver disputa saudável e isonômica entre os concorrentes.

O termo captação ilícita remete tanto à fonte quanto à forma de obtenção de recursos. Assim, abrange não só o recebimento de recursos de fontes ilícitas e vedadas (vide art. 24 da LE), como também sua obtenção de modo ilícito, embora aqui a fonte seja legal. Exemplo deste último caso são os recursos obtidos à margem do sistema legal de controle, que compõem o que se tem denominado “caixa dois” de campanha.

(...)

O bem jurídico protegido é a lisura da campanha eleitoral. Arbor ex fructu cognoscitur, pelo fruto se conhece a árvore. Se a campanha é alimentada com recursos de fontes proibidas ou obtidos de modo ilícito ou, ainda, realiza gastos não tolerados, ela mesma acaba por contaminar-se, tornando-se ilícita. De campanha ilícita jamais poderá nascer mandato legítimo, pois árvore malsã não produz senão frutos doentios.

(Direito Eleitoral, 14ª ed., São Paulo: Editora Atlas, 2018, pp. 753-754).

 

 

A doutrina de Rodrigo López Zilio também ensina:

São duas as hipóteses de cabimento do art. 30-A da LE: captação ilícita de recursos e gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais.

Captar é atrair, conquistar, obter recursos. Em suma, a conduta de captação pressupõe o ingresso efetivo de recursos materiais no âmbito da campanha eleitoral. Assim, o mero pedido de recurso, a oferta do crédito ou a promessa de doação futura não configuram o elemento normativo do tipo. A captação pressupõe o ingresso do recurso financeiro no caixa de campanha; portanto, é um ato de conduta material. Não basta o aporte financeiro para a consumação da figura normativa do art.30-A da LE, pois é proscrito o ilegal ingresso de recurso financeiro na campanha eleitoral. De conseguinte, o recurso financeiro deve ser necessariamente ilícito para a configuração do tipo do art. 30-A da LE. Somente o efetivo aporte ilegal de recursos financeiros na campanha eleitoral configura o ilícito.

(Direito Eleitoral. 7ª ed., Ed. JusPodivm, 2020, p. 764)

 

À caracterização das condutas ilícitas é imprescindível que ostentem relevância jurídica para macular a higidez e a normalidade do pleito, especialmente porque as penalidades cominadas a este ilícito eleitoral são exclusivamente a denegação ou a cassação do diploma, conforme o caso, não se admitindo a mitigação por incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

A jurisprudência deste Regional, no que se alinha perfeitamente ao entendimento da Corte Eleitoral Superior, estabelece tais requisitos como indispensáveis à conformação do ilícito do art. 30-A da Lei n. 9.504/97, como colho da ementa a seguir colacionada:

RECURSO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO CUMULADA COM REPRESENTAÇÃO POR INFRAÇÃO AO ART. 30-A DA LEI N. 9.504/97. CAPTAÇÃO E GASTO ILÍCITO DE RECURSO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 22, INC. XIV, DA LEI COMPLEMENTAR N. 64/90. VEREADOR. SENTENÇA PROCEDENTE. ELEIÇÕES 2016. DISTRIBUIÇÃO DE VALES-COMBUSTÍVEL. OMISSÃO DE DESPESA NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA COMPROVAR OS FATOS ALEGADOS. REFORMA DA SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PROVIMENTO.

1. Aquisição e distribuição de vales-combustível e utilização ilícita de recursos na campanha eleitoral. A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo está prevista no art. 14, § 10, da Constituição Federal e comporta cabimento nas hipóteses de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude. A representação por infração ao art. 30-A da Lei n. 9.504/97, por sua vez, busca coibir e sancionar a arrecadação e a utilização de recursos em contrariedade às normas que regulamentam o processo de prestação de contas eleitoral.

2. A jurisprudência do TSE exige, na representação por captação e gastos ilícitos de recursos, a prova robusta do descumprimento qualificado das normas que regem a arrecadação de receitas e a realização de gastos na campanha, mediante a utilização dolosa de fontes vedadas de financiamento ou pela omissão grave e intencional de informações contábeis.

3. O abuso do poder econômico requer, para sua caracterização, a violação ao bem jurídico protegido, ou seja, está vinculado à gravidade da conduta, capaz de alterar a normalidade do pleito.

4. As exaustivas diligências realizadas não resultaram em provas inequívocas da aplicação irregular de recursos, tampouco da existência de abuso do poder econômico. O alegado envolvimento do candidato no fornecimento de vales-combustível não deve ser presumido. A participação deve estar seguramente demonstrada em sólidas evidências, o que não se verificou no caso concreto. Reformada a sentença e afastadas as condenações impostas.

5. Provimento. Improcedência da ação.

(RE n. 102, Relator Des. Eleitoral ROBERTO CARVALHO FRAGA, julgado na sessão de 26.3.2019.) (Grifo nosso)

 

 

Estabelecidas essas premissas, passo ao exame do recurso.

Quanto à litispendência reconhecida na decisão recorrida quanto aos fatos que são objeto da AIME 0600036-70.2021.6.21.0096, os recorrentes alegam, em suas razões recursais, que as ações possuem causas de pedir próprias e consequências jurídicas distintas. Ainda, sustentam que não há identidade de partes e inexiste vedação de que os mesmos fatos tenham, ao mesmo tempo, diferentes enquadramentos legais.

No ponto, o apelo deve ser provido.

Com efeito, à configuração da litispendência é necessária a identidade de partes, de causa de pedir e de pedido, o que não se verifica no caso.

Na AIME 0600036-70.2021.6.21.0096, julgada improcedente em virtude do reconhecimento da decadência, pelo fato de a ação haver sido ajuizada fora do prazo previsto no art. 14, § 10, da Constituição Federal, os fatos efetivamente são idênticos ao da presente ação: a) promessa de doação de terrenos a eleitores em troca de votos; b) promessa de benfeitorias, como maquinários, mesas e utensílios para a comunidade; e c) promessa de destinação futura de verba parlamentar (“usará verba do governo federal”) para execução de projetos de interesse de comunidade do município.

Contudo, não há identidade de partes: enquanto são autores nesta ação o PDT e PT de Guarani das Missões, a AIME 0600036-70.2021.6.21.0096 foi ajuizada também pelo candidato a prefeito (não eleito) Bertil Bolívar Nilsson, o qual não figura, no entanto, no polo ativo da presente representação. De outro vértice, embora ambas as ações tenham sido propostas contra JERONIMO JASKULSKI e LEANDRO INACIO WASTOWSKI, então prefeito e vice e candidatos à reeleição (reeleitos), percebe-se que a presente Representação foi proposta também contra ALCIDES JOSE MILCZAREK (BIO MILCZAREK), vereador e candidato à reeleição (reeleito), o qual, contudo, não consta no polo passivo da referida AIME.

Além disso, as ações eleitorais são instrumentos processuais autônomos com causas de pedir próprias e tutelando bens jurídicos distintos, impedindo a formação de litispendência e coisa julgada entre si.

Confira-se a seguinte ementa:

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2018. PRESIDENTE E VICE–PRESIDENTE DA REPÚBLICA. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. WHATSAPP. DISPARO DE MENSAGENS EM MASSA. NOTÍCIAS FALSAS (FAKE NEWS). MATÉRIA JORNALÍSTICA. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. ACUSAÇÃO AMPARADA EM CONJECTURAS. AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS A VINCULAR A CAMPANHA ELEITORAL AOS SUPOSTOS DISPAROS. IMPROCEDÊNCIA.

1. Os representados são acusados de (i) contratarem empresas especializadas em marketing digital para procederem ao disparo de mensagens com conteúdo falso via WhatsApp contra os oponentes da chapa de Jair Bolsonaro nas eleições 2018, em especial os candidatos do PT e do PDT; (ii) utilizarem indevidamente base de dados de usuários fornecida por empresas de estratégia digital; (iii) realizarem e receberem doação de pessoa jurídica e (iv) utilizarem valores acima do limite máximo permitido para gastos nas eleições.LITISPENDÊNCIA. REUNIÃO DAS AIJEs PARA INSTRUÇÃO E JULGAMENTO CONJUNTOS EM VIRTUDE DA CONEXÃO. INÉPCIA DA INICIAL. PRELIMINARES AFASTADAS.

2. O TSE já assentou não haver litispendência entre ações eleitorais as quais, conquanto calcadas em hipóteses similares, não possuem as mesmas partes, causa de pedir e pedido. (AIJE nº 060175489/DF, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 20.3.2019; AI em AgR nº 513/PI, Relator Ministro Luiz Fux, DJe de 14.9.2016.)

3. Há de se cuidar para que o reconhecimento da litispendência com fundamento na relação jurídica–base não alije da discussão qualquer dos legitimados ativos para a propositura da lide. No caso dos autos, guiar–se por tal critério implicaria excluir dos debates coligação diretamente interessada no deslinde da lide.

4. Ainda que se ancorem em um mesmo fato essencial e pretendam a cassação da chapa vencedora, com a declaração de sua inelegibilidade, não há falar em litispendência entre as AIJEs nºs 0601771–28 e 0601779–05, pois as partes são distintas e não há repetição de ação que já esteja em curso.

5. Por outro lado, na forma do art. 55 do CPC, o fenômeno da conexão nasce da identidade de causas de pedir e/ou pedidos e tem como efeito a reunião das ações para julgamento conjunto. A conexão é causa, enquanto a reunião é consequência. Em essência, a ratio subjacente do instituto da conexão é a preservação da harmonia dos julgados, sendo possível falar também em objetivo de promoção da economia processual.

6. Não é porque se cogita de conexão que dois ou mais processos necessariamente deverão ser instruídos e julgados em conjunto. Desde que estejam assegurados os já indicados valores da harmonia entre os julgados e da economia processual, a incidência do efeito da reunião de processos consubstancia escolha do magistrado, o qual, observando os requisitos legais, deverá analisar a oportunidade e a conveniência de fazê–lo. Precedentes.

7. No caso dos autos, considerados (i) a quantidade de réus que a reunião dos processos envolveria, (ii) os diferentes estágios processuais das quatro AIJEs e (iii) as diligências probatórias e suas implicações ainda pendentes em dois dos autos, a tramitação e a apreciação em bloco gerariam tumulto processual significativo, atrasando sobremaneira o desfecho das ações, sobretudo daquelas que já se encontram maduras para julgamento, como é o caso em exame.

8. Em que pese a regra geral do art. 96–B da Lei nº 9.504/97 disponha que serão reunidas para julgamento comum as ações eleitorais propostas por partes diversas sobre o mesmo fato, o dispositivo comporta interpretação, e, no caso concreto, a celeridade, a organicidade dos julgamentos, o bom andamento da marcha processual e o relevante interesse público envolvido recomendam seja mantida a separação. Precedentes.

9. A inobservância da regra do art. 96–B da Lei nº 9.504/97 não leva, por si só, à invalidação das decisões judiciais. O TSE possui precedentes no sentido de que, embora sempre que possível, ações eleitorais que tratem de fatos idênticos ou similares devam ser reunidas e julgadas em conjunto, tal reunião não é obrigatória. (AI nº 28.353/RJ, Relator Ministro Luís Roberto Barroso, DJe 31.5.2019; RO nº 2188–47/ES, Relator Ministro Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJe 18.5.2018).

[…]

 

(Ação de Investigação Judicial Eleitoral n. 060177905, Acórdão, Relator Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 44, Data 11.03.2021, Página 0.) (grifo nosso)

 

Ademais, a AIME tinha por objeto corrupção e abuso de poder econômico, tendo por bem jurídico tutelado a legitimidade e normalidade das eleições, enquanto a presente ação busca assegurar a igualdade entre os candidatos e a higidez das contas de campanha.

A propósito do que dispõe o art. 96-B da Lei n. 9.504/97, que determina a reunião de demandas eleitorais propostas por partes diversas sobre o mesmo fato para julgamento conjunto, sendo competente para apreciá-las o relator que tiver recebido a primeira delas, devem as ações, obviamente, estar no mesmo momento processual.

No caso, o Recurso da AIME 0600036-70.2021.6.21.0096 foi julgado no dia 27.07.2021, sendo reconhecida pela Corte, a decadência do direito de ação. Logo. não há que se cogitar da hipótese de reunião dos recursos.

Entretanto, na linha externada pelo douto Procurador Eleitoral, deve ser mantida a sentença que julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, em face da ausência de uma das condições da ação, qual seja, o interesse processual.

A sentença reconheceu a ausência de interesse de agir conforme trecho que transcrevo (ID 40284633):

[…]

In casu, verifica-se a ausência de interesse de agir dos demandantes, visto que, não obtido êxito na AIME ajuizada, reiteraram as alegações acerca de promessas supostamente efetuadas pelos demandados (“promessas de terrenos”), a influenciar, em tese, o resultado do pleito, pelo que evidenciada a inadequação da via eleita, apesar da tentativa de roupagem distinta à ação anteriormente ajuizada, cujos fatos ensejadores já foram, inclusive, comunicados ao Ministério Público Eleitoral, conforme documentos juntados aos autos.

Conforme exposto, destina-se a representação eleitoral por captação ou gastos ilícitos justamente a coibir a arrecadação ou os gastos ilícitos de recursos eleitorais, com vistas a assegurar a higidez das normas referentes à arrecadação e gastos de campanha eleitoral, como, por exemplo, o recebimento de doações acima do limite legal ou proveniente de fontes vedadas, a realização de gastos eleitorais antes da abertura da conta bancária da campanha eleitoral etc.

Ensina a doutrina de Nelson Nery Junior e de Rosa Maria de Andrade Nery que “existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático”. Se a parte autora mover a ação errada, ou utilizar-se do procedimento incorreto, “o provimento jurisdicional não lhe será útil, razão pela qual a inadequação procedimental acarreta a inexistência de interesse processual”.

Ademais, de acordo com Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz², “no que diz respeito ao interesse de agir, este repousa no binômio necessidade-adequação”. Há necessidade, quando o “direito material não pode ser realizado sem a intervenção do juiz. Contudo, além da necessidade, exige-se a adequação”. Se a parte requerer “providência jurisdicional incapaz de remediar a situação […] narrada na fundamentação de seu pedido, também falta o interesse de agir”.

 

Os recorrentes aduzem não subsistir a ausência de interesse processual, em razão da inexistência de bis in idem, remanescendo a necessidade de se apurarem os ilícitos narrados na exordial, consistentes na captação e gastos ilícitos de recursos, por meio da “oferta de valores e terrenos públicos para angariar votos”.

Sem razão.

Os fatos descritos na presente representação são idênticos aos que foram objeto da AIME 0600036-70.2021.6.21.0096:

Fato 1 - Denúncia João Vaz - oferta de terreno

Vídeo 1

O Sr. João Silvestre Vaz é pastor evangélico, no município de Guarani das Missões, e informa que 3 (três) dias antes das eleições municipais de 2020, o prefeito reeleito, Sr. Jerônimo Jaskulski, na companhia de um vereador, de alcunha “Bio”, ofereceu-lhe um terreno, caso viesse a apoiá-lo em sua campanha política. O teor da denúncia exibe clara “compra de voto” por parte do prefeito reeleito.

 

Fato 2 – Reunião de campanha política (PP e MDB) e promessa de bens

Áudio 1

Houve uma reunião entre militantes do PP e MDB, da coligação que buscava a reeleição pela majoritária, onde há clara promessa de benfeitorias, como maquinários, mesas e utensílios para a comunidade. As afirmações se dão durante boa parte do áudio, mas especialmente a partir de 1:02 (Uma hora e dois minutos) em diante.

Áudio 2

Na mesma reunião, o vereador, de alcunha “Bio”, que faz parte da coligação que reelegeu o prefeito Jerônimo, admite, a partir do segundo minuto, que usará a verba do governo federal para que o seu “grupo”, e somente este, faça uso, caso a comunidade apoie a candidatura do sr. Jerônimo Jaskulski. O contexto de sua narrativa, segundo o áudio em questão, conclui-se que tal verba irá somente para aqueles que venham a apoiar ele, como vereador, e o candidato a prefeito.

 

Fato 3 – Denúncia da Sra. Orilda

Áudio 3

A sra. Orilda afirma que tem conhecimento a respeito das ofertas de terrenos para obtenção de vantagem política, configurando a utilização do poder econômico para alterar o rumo das eleições por parte do candidato a prefeito, sr. Jerônimo Jaskulski, através do vereador “Bio”. Ainda, a sra. Orilda corrobora com o vídeo 1, do sr. João Silvestre Vaz.

 

Fato 4 – Cobrança da promessa de entrega de terrenos

Imagem 1 Em uma postagem da coligação que venceu a eleição, um cidadão cobra do prefeito a questão dos terrenos ofertados.

 

Os recorrentes defendem a subsunção dos fatos nas hipóteses previstas no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, contudo, da descrição das condutas não há como enquadrar a efetiva captação e dispêndio de recursos ilícitos em campanha.

Nesse sentido, o parecer da douta Procuradoria Eleitoral (ID 42983833):

Ademais, não se mostra possível inferir da mera alegação de supostas promessas de vantagem a ocorrência de quaisquer das hipóteses materiais de cabimento da representação insculpida no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, sobretudo na ausência de nenhum relato da efetiva realização de doação de vantagem a eleitor ou mesmo de distribuição gratuita de bens e serviços públicos, cingindo-se à imputação de suposta “promessa” de bens e valores.

Com efeito, a narrativa contida na exordial se ressente da ausência de descrição de condutas materiais aptas a denotar efetiva captação e dispêndio de recursos ilícitos em campanha, sobretudo por inexistir qualquer relato de efetivo recebimento de vantagem por eleitor, prejudicando a análise da questão sob a ótica de eventual violação ao bem jurídico tutelado, especificamente, pelas normas concernentes à arrecadação e gastos de recursos em campanha eleitoral.

 

Não desconheço o teor da Súmula-TSE n. 62, que preconiza que os limites do pedido são demarcados pelos fatos imputados na inicial, dos quais a parte se defende, e não pela capitulação legal atribuída pelo autor.

Entretanto, no caso, da própria descrição dos fatos não é possível proceder ao seu enquadramento em qualquer ilícito eleitoral, evidenciado-se a ausência de interesse de agir diante a inadequação da via eleita.

Nesse sentido:

RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PREFEITO E VICE ELEITOS. ABUSO DE PODER. USO INDEVIDO DE MEIO DE COMUNICAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. PRELIMINARES. PEDIDOS DE CONVERSÃO EM DILIGÊNCIA E CONCESSÃO DE PRAZO. INDEFERIDOS. BOCA DE URNA. PROPAGANDA EXTEMPORÂNEA. EXTINÇÃO, DE OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INADEQUAÇÃO DA VIA. MÉRITO. UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO DE COMUNICAÇÃO PARA PRODUZIR PROPAGANDA ELEITORAL PAGA COM RECURSOS PÚBLICOS. NÃO COMPROVADO. DISTRIBUIÇÃO DE BENESSES EM TROCADO VOTO. NÃO DEMONSTRADA A PRÁTICA ILÍCITA. IMPROCEDÊNCIA. DESPROVIMENTO. ELEIÇÕES 2016.

1. Questões prefaciais. 1.1.Os pedidos de conversão do feito em diligência e de concessão de prazo foram indeferidos. A produção de provas na fase recursal é medida excepcional, devendo ser realizada no momento oportuno, antes da sentença. Ademais, é permitida a juntada de documentos com o recurso, nas hipóteses previstas no art. 270 do Código Eleitoral. A pretensão de reabertura de prazo para análise documental revela-se descabida. As partes já tiveram acesso aos documentos juntados e a oportunidade de manifestação sobre a prova. 1.2. Preliminares de ofício. A alegada ocorrência de arregimentação de eleitores, ou “boca de urna”, deve ser averiguada em ação penal própria, promovida pelo Ministério Público Eleitoral. A propaganda eleitoral irregular deve ser apurada por meio de representação ajuizada até a data do pleito. Inadequação da via eleita. Extinção sem resolução do mérito.(…)

(Recurso Eleitoral n 77937, ACÓRDÃO de 05.09.2017,Relator JORGE LUÍS DALL`AGNOL, Publicação: DEJERS- Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 161, Data 08.09.2017, Página 3)

 

A propósito, mesmo que se cogitasse descrição de fatos que poderiam ser subsumidos à causa de pedir abuso do poder econômico ou político (Ação de Investigação Judicial Eleitoral), a ação de igual modo deveria ser julgada extinta, pois ajuizada após a diplomação, termo final para a sua propositura.

Assim, sob qualquer ângulo que se examine a matéria, a consequência jurídica é sua extinção.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, somente ao efeito de afastar o reconhecimento da litispendência, mantendo a sentença no que refere ao julgamento de extinção do processo, sem resolução do mérito, diante da ausência de interesse processual.