REl - 0600643-76.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada na origem, em razão da constatação de que JACQUELINE POSSEBOM DOS SANTOS realizou despesa com aluguel de veículo automotor em patamar superior ao limite de 20% do valor total dos gastos de campanha, sendo-lhe imposta multa na quantia de R$ 827,93.

A disciplina normativa afeta ao caso em exame encontra-se nos arts. 18-B, caput, e 26, § 1º, inc. II, da Lei n. 9.504/97 e nos arts. 6º, caput, e 42, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Lei n. 9.504/97

Art. 18-B. O descumprimento dos limites de gastos fixados para cada campanha acarretará o pagamento de multa em valor equivalente a 100% (cem por cento) da quantia que ultrapassar o limite estabelecido, sem prejuízo da apuração da ocorrência de abuso do poder econômico.

(...)

Art. 26. São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei:

§ 1º São estabelecidos os seguintes limites com relação ao total do gasto da campanha:

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

…………………………………...

Resolução TSE n. 23.607/19

Art. 6º Gastar recursos além dos limites estabelecidos sujeita os responsáveis ao pagamento de multa no valor equivalente a 100% (cem por cento) da quantia que exceder o limite estabelecido, a qual deverá ser recolhida no prazo de cinco dias úteis contados da intimação da decisão judicial, podendo os responsáveis responderem, ainda, por abuso do poder econômico, na forma do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990, sem prejuízo de outras sanções cabíveis (Lei nº 9.504/1997, art. 18-B).

(…)

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

(...)

II - aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

 

Desse modo, resta nítido que os dispêndios com locação de veículos ficam limitados a 20% do total dos gastos eleitorais, sob pena de ser caracterizada irregularidade atinente à aplicação dos recursos de campanha.

In casu, os gastos contratados pela candidata totalizaram R$ 4.860,35, de sorte que poderia ter sido despendido com aluguel de automóveis o valor máximo de R$ 972,07.

Porém, em violação às normas de regência, a despesa com o arrendamento do bem alcançou o patamar de R$ 1.800,00, extrapolando em R$ 827,93 o teto legal.

Entendo que as alegações trazidas pela recorrente não a socorrem, uma vez que está caracterizada a irregularidade quando o limite legal, objetivamente previsto, foi ultrapassado.

Ainda, a observação do limite de gastos configura condição para a equiparação de oportunidades e para o tratamento isonômico entre os candidatos, impondo-se ao pretendente de mandato eletivo elaborar seus planos e estratégias de campanha de acordo com os ditames legais.

Assim, em decorrência do descumprimento da norma inserida no inc. II do art. 42 da Resolução TSE n. 23.607/19, que incide de forma objetiva, independentemente de boa-fé, desconhecimento do texto legal, ou mero equívoco, o excesso cometido é irregularidade grave, capaz de gerar a desaprovação da contabilidade, tendo em vista o comprometimento da regularidade das contas da candidata, na linha de entendimento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO ESTADUAL. IRREGULARIDADES. APRESENTAÇÃO DE EXTRATOS BANCÁRIOS. AUSÊNCIA. GRAVIDADE. DESPESA COM ALUGUEL DE VEÍCULOS. LIMITE LEGAL. EXTRAPOLAÇÃO. ART. 45, II, DA RES.–TSE Nº 23.553/2017. PREJUÍZO À CONFIABILIDADE DAS CONTAS. DESAPROVAÇÃO. PRECEDENTES. SÚMULA Nº 30/TSE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. SÚMULA Nº 28/TSE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 24/TSE. DESPROVIMENTO.

(...)

2. No mesmo sentido, a extrapolação dos limites previstos para gastos com aluguel de veículo atrai a desaprovação das contas, sendo afastada tão somente nos casos em que ausente má–fé do candidato e representarem valores absolutos módicos.

(...)

(Recurso Especial Eleitoral n. 060192972, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 72, Data 15.4.2020.) Grifei.

 

Assim, a falha identificada nas contas alcança o importe de R$ 827,93, cifra que, conquanto represente 17,03% das receitas declaradas (R$ 4.860,35), mostra-se, em termos absolutos, reduzida e, inclusive, bastante inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR), quantia que a disciplina normativa das contas considera módica, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), possibilitando a aprovação das contas com ressalvas.

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação do critério do valor nominal diminuto, de modo a afastar o juízo de desaprovação das contas quando o somatório das irregularidades se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10 (TRE-RS: PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020).

Registro, ainda, que, conforme diretriz jurisprudencial estabelecida nesta Corte para o pleito de 2020, a análise da gravidade da falha está diretamente relacionada ao valor envolvido e ao percentual de impacto sobre a arrecadação, “não importando se os recursos se caracterizam como de origem não identificada, de fonte vedada ou são de natureza pública” (REl 0600329-27.2020.6.21.0047, Redator do acórdão: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, sessão de 10.08.2021).

Destarte, tendo em vista que a pretensão recursal se delimitou à aprovação das contas com ressalvas, tendo a recorrente expressamente consignado que “irá realizar o determinado no tocante ao recolhimento do valor excedente ao Tesouro Nacional”, cumpre dar integral provimento ao apelo, mantido o comando de recolhimento do valor de R$ 827,93.

Todavia, a penalidade imposta tem sua base legal no art. 18-B da Lei n. 9.504/97, razão pela qual deverá ser recolhida ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), nos exatos termos do art. 38, inc. I, da Lei 9.096/95, e não ao Tesouro Nacional como especificado no comando sentencial.

Assim, deve ser retificado o erro material constante da sentença, de modo que o valor da penalidade seja corretamente direcionado ao Fundo Partidário.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de campanha de JACQUELINE POSSEBOM DOS SANTOS, candidata a vereadora no Município de Santo Ângelo nas eleições de 2020, mantida a imposição do recolhimento de R$ 827,93, o qual, retificando-se erro material da sentença, deve ser destinado ao Fundo Partidário, nos termos do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.